segunda-feira, 1 de fevereiro de 2016

Opinião do dia – José de Souza Martins

Por que o senhor afirma em seu livro que o PT é um partido conservador?

O Partido dos Trabalhadores surgiu no ABC paulista como uma alternativa ao comunismo. Não que fosse ideologicamente contra os comunistas, mas nunca chegou a ser um partido de esquerda. Tratava-se, do ponto de vista formal, de um partido católico. O PT foi gestado desde os anos 50 pelo primeiro bispo de Anto André, dom Jorge Marques de Oliveira, como uma espécie de mediação conservadora para a luta operária. Dom Jorge me disse que os trabalhadores do ABC ficavam no Centro Operário Católico jogando pingue-pongue. Ele os incentivava a ir para a porta de fábrica. Dom Jorge inventou, antes que Lula soubesse disso, ao criar as bases para o surgimento do PT.

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José de Souza Martins, sociólogo, autor do livro: ‘Do PT das Lutas Sociais ao PT do Poder’ (Editora Contexto), da entrevista à revista Veja, edição 2 463 – ano 49 – nº 5, 3 de fevereiro de 2016.

Lula admite ida a tríplex com OAS, mas nega ser dono

• Ex-presidente diz que desistiu de imóvel em novembro de 2015

Petista alega ter feito uma visita, embora zelador do Edifício Solaris tenha afirmado que ele foi ao local duas vezes. Promotor vê incoerência na explicação

O ex-presidente Lula admitiu ontem, em nota, que visitou o tríplex em Guarujá na companhia do então presidente da construtora OAS, Léo Pinheiro, condenado na Lava- Jato. Lula voltou a negar ser dono do imóvel e informou que, em 26 de novembro de 2015, sua mulher, Marisa Letícia, assinou um documento desistindo de participar do empreendimento. A suposta desistência, porém, só ocorreu depois de O GLOBO ter noticiado o caso. A nota diz que o ex-presidente esteve uma única vez no edifício, embora, em depoimento, o zelador José Afonso Pinheiro tenha afirmado que ele foi ao local duas vezes. Na visita, Lula e a mulher avaliaram que o imóvel “não se adequava às necessidades da família”. Segundo a nota, “notícias infundadas, boatos e ilações romperam a privacidade necessária ao uso”. O promotor Cássio Conserino considerou incoerente a explicação dada pelo Instituto Lula.

Lula visitou tríplex

• Petista admite ida a prédio com executivo da OAS, mas nega ser dono do imóvel; promotor vê incoerência

- O Globo

- SÃO PAULO- O ex- presidente Luiz Inácio Lula da Silva admitiu ontem, em nota divulgada pelo Instituto Lula, que visitou o tríplex no edifício Solaris, na praia das Astúrias, no Guarujá, apesar de ter negado novamente ser dono do imóvel. Na nota, o petista disse que esteve no apartamento, junto com o então presidente da construtora OAS, Léo Pinheiro, condenado na LavaJato a 16 anos pelos crimes de corrupção ativa, lavagem de dinheiro e organização criminosa. A visita ocorreu um ano após a OAS concluir a construção do edifício.

A nota diz que Lula esteve uma única vez no edifício, embora, em depoimento ao Ministério Público estadual, o zelador do prédio, José Afonso Pinheiro, tenha afirmado que o ex- presidente foi ao local duas vezes. Na ocasião da visita, segundo o instituto, Lula e sua mulher, Marisa, avaliaram que o imóvel “não se adequava às necessidades e características da família, nas condições em que se encontrava”.

A nota do petista dá a entender que, depois da visita de Lula e de Marisa, a OAS decidiu fazer uma reforma no tríplex para adequá- lo às necessidades da família. O Instituto Lula diz que a família desistiu do apartamento, em 26 de novembro de 2015, porque, “mesmo tendo sido realizadas reformas e modificações no imóvel ( que naturalmente seriam incorporadas ao valor final da compra), as notícias infundadas, boatos e ilações romperam a privacidade necessária ao uso familiar do apartamento”.

Em depoimento ao MP, o engenheiro Armando Dagre, da Talento Construtora, contratada pela OAS para fazer as reformas, disse que a obra custou R$ 777 mil. A obra incluiu a instalação de um elevador privativo. A assessoria do ex- presidente reconhece que Marisa e Fábio Luís Lula da Silva, o Lulinha, filho do casal, estiveram na unidade durante a reforma, sem especificar quantas vezes. “Em nenhum momento Lula ou seus familiares utilizaram o apartamento para qualquer finalidade.”

“Escândalo a partir de invencionices”
O Instituto Lula afirmou na nota que os adversários do petista e a imprensa “tentam criar um escândalo a partir de invencionices”. A nota tem o título de “Os documentos do Guarujá: desmontando a farsa”. O Instituto Lula afirma que Lula está processando jornalistas do GLOBO em grau de recurso, mas não deixa claro que o ex-presidente perdeu em primeira instância. E que ele só desistiu do imóvel após a publicação de reportagem do jornal, em agosto do ano passado. O MP de São Paulo investiga ocultação de patrimônio por parte do ex- presidente com relação ao imóvel, e a força- tarefa da Operação Lava- Jato põe o tríplex numa lista de 11 apartamentos suspeitos de terem sido usados para lavar dinheiro de contratos da Petrobras.

Na nota, Lula diz agora que, quando Marisa Letícia se associou à Bancoop ( Cooperativa Habitacional dos Bancários de São Paulo), em 2005, escolheu um apartamento comum, e não o tríplex. No termo de adesão à Bancoop, divulgado junto com a nota, está escrito que o casal ficaria com a unidade 141 do edifício, um apartamento de três quartos. Essa unidade é padrão do prédio, com 82,5 metros quadrados, de acordo com o instituto. Até então, a defesa do ex-presidente afirmava apenas que Marisa Letícia tinha cotas no empreendimento, não vinculadas a qualquer apartamento.

O promotor Cássio Conserino, do Ministério Público de São Paulo, que apura o caso do tríplex, disse ontem à noite que viu incoerência nas explicações apresentadas pelo Instituto Lula.

— É incoerente com as próprias notas do instituto. Antes diziam que tinham uma cota e agora eles têm uma unidade habitacional específica. Eles não sabem o que têm — disse o promotor.

O instituto acrescenta ainda que, até setembro de 2009, a família Lula investiu R$ 179.650,80 (R$ 286.479,32 em valores de hoje) no apartamento. Afirma também que, naquela época, a Bancoop passava por uma crise e transferiu empreendimentos para incorporadoras, entre elas a OAS. Quando a OAS assumiu o prédio do Guarujá, Marisa Letícia deixou de fazer os pagamentos mensais porque não recebeu mais boletos da Bancoop, e também não fez a adesão ao contrato com a nova incorporadora. Por isso, perdeu a reserva do 141.

Entre 2009 e 2014, pelo que diz a nota, a família de Lula não teria tentado receber de volta os R$ 179.650,80 que havia pago à Bancoop. Ao todo, 6 mil cooperados perderam dinheiro na operação da Bancoop. Segundo o Instituto Lula, só em 2014, um ano após a obra ser concluída, o ex- presidente e a sua mulher visitaram, junto com Léo Pinheiro, uma unidade à venda no prédio: o tríplex 164- A, de 215 metros quadrados.

Ainda na versão de Lula, a desistência do apartamento ocorreu em 26 de novembro de 2015, por causa das notícias sobre o imóvel. O documento de desistência assinado por Marisa e encaminhado pelo Instituto Lula tem a data de 2009, e os valores que o casal teria direito de receber de volta são os da época ( sem correção pela inflação). Segundo o instituto, “como se trata de um formulário padrão, criado na ocasião em que os associados foram chamados a optar entre requerer a cota ou aderir ao contrato com a OAS ( entre setembro e outubro de 2009), ao final do documento consta o ano de 2009”. O dinheiro ainda não começou a ser devolvido.

Lula também alega que não ocultou patrimônio, como acusa o promotor Cássio Conserino, porque declarou, em seu Imposto de Renda, a “cota- parte” da Bancoop que possuía.

Lula perdeu em 1 ª instância ação contra O Globo

• Nota do instituto fala de processo por reportagem sobre prédio no Guarujá, mas não de decisão de juiz

- O Globo

Na nota divulgada ontem, o Instituto Lula diz que o ex-presidente está processando jornalistas do GLOBO por reportagem sobre o apartamento no Guarujá em grau de recurso, mas não deixa claro que perdeu a ação em 1 ª instância. Ao julgar a ação improcedente, o juiz Mauro Nicolau Junior, da 48 ª Vara Cível do Rio, expôs as contradições de Lula: “A conduta da assessoria de imprensa do autor se revela contraditória, ora afirmando ser o imóvel de propriedade do autor e de sua família, ora negando”.

O processo foi movido por Lula depois que o jornal mostrou, em 12 de agosto do ano passado, que um grupo empresarial recebera R$ 3,7 milhões da GFD — empresa usada para lavar dinheiro do doleiro Alberto Youssef — e repassou quase a mesma quantia para a construtora OAS, na finalização das obras do prédio no Guarujá. Lula sustentou que repórteres do GLOBO tiveram a intenção de atacar a sua honra ao publicar a reportagem.

Ao negar o pedido, em sentença de 14 de dezembro, o juiz entendeu que os jornalistas “não praticaram qualquer ato ilícito” e apenas exerceram o direito de liberdade de expressão. Por essa razão, julgou a ação improcedente e registrou que os fatos narrados pela reportagem são de interesse público. “É de notório conhecimento que o país vive momento histórico ímpar, iniciado pela ‘ Operação Lava- Jato’, promovida por iniciativa de Polícia Federal e Ministério Público Federal, que busca deflagrar esquemas de corrupção em empresas públicas, e entre empreiteiras e agentes públicos. Qualquer fato que possa estar ligado a essa operação é de grande interesse público e merece ser noticiado”.

O magistrado também refutou alegação da defesa de Lula de que o apartamento não pertencia ao ex- presidente. Na ocasião, Lula disse que sua mulher, Marisa Letícia, possuía cota de participação da Bancoop referente ao apartamento. Mas o juiz lembrou que, em 2010, a própria assessoria do Instituto Lula informou que o imóvel era do ex-presidente.

O juiz ressaltou que, se há investigações sobre o empreendimento, isso deve ser público. “Na hipótese de haver investigações criminais em curso sobre as obras do edifício em que o autor ( Lula) seria proprietário de unidade, ou que sua esposa teria quotas conversíveis em unidade do edifício, tal fato não deve passar despercebido pela imprensa. Tem sim esta o direito, mais que isso, o dever, de noticiar tais fatos, desde que devidamente embasadas suas afirmações e apresentadas as versões dos envolvidos, o que é observado na matéria jornalística tratada neste processo.”

Para salvar ex- presidente, PT quer tentar tirar credibilidade da Lava- Jato

• Sigla alegará que ex-presidente sofre ‘ massacre’; aliados admitem desgaste

Fernanda Krakovics, Sérgio Roxo, Simone Iglesias - O Globo

- RIO, SÃO PAULO e BRASÍLIA- Com a Operação Lava- Jato cada vez mais próxima do ex- presidente Lula, o PT investirá em um discurso de vitimização de sua maior liderança, alegando que ele é alvo de um “massacre”. Apesar da estratégia, pessoas próximas do petista reconhecem que o desgaste é real e que ele terá dificuldade para atuar como cabo eleitoral nas eleições municipais deste ano como fez em 2012.

Os petistas apostam na radicalização para mobilizar sua militância e pretendem partir para o enfrentamento, afirmando que há seletividade nas investigações e no vazamento de informações. O objetivo é não só tentar tirar a credibilidade da Lava- Jato, mas também desgastar políticos da oposição que já foram citados.

Apesar do cenário, cresce no PT a pressão para que Lula seja candidato à Presidência da República em 2018, com o argumento de que ele terá que defender seu nome e seu legado.

— Agora só tem um caminho, que é Lula ser candidato. Ele pode estar desgastado agora, mas não o subestimem — diz o senador Lindbergh Farias (PT-RJ).

Para um petista que frequenta o Instituto Lula, o estrago da imagem do ex- presidente está em curso, mas ainda é cedo para avaliar o impacto que as denúncias terão na disputa presidencial de 2018.

— Se depois de todo esse noticiário, não se confirmar nada, ele se recupera e se fortalece. Agora, se alguma coisa grave aparecer ou for interpretada assim, é outra história. Tem que dar tempo ao tempo. A vaca foi brejo? Não. Ele perdeu popularidade? Perdeu, sem dúvida.

Esse aliado considera “um milagre” Lula ainda aparecer em torno dos 20% das intenções de voto nas pesquisas presidenciais. Para outro petista próximo ao ex- presidente, Lula enfrentou na semana passada o ataque mais “cerrado” até agora:

— Quando você acusa muito uma pessoa, gera uma desconfiança. Cria uma atmosfera. Num primeiro momento, é fatal. O prestígio dele vai ser afetado. Vamos ver as próximas pesquisas. Não está fácil a vida para ele.

Esse impacto na popularidade deve fazer com que Lula tenha uma postura mais reservada na eleição deste ano. O partido já decidiu, por exemplo, tirar o expresidente dos comerciais que serão exibidos no mês que vem. Há quatro anos, Lula tomou a frente de campanhas para prefeito da legenda e, principalmente, ajudou a eleger o estreante Fernando Haddad em São Paulo.

Por outro lado, petistas próximos a Lula afirmam que o crescimento das denúncias contra o ex-presidente levará ao acirramento de ânimos da militância.

— Ninguém vai para a rua muito animado para defender a Dilma. Com Lula é bem diferente — disse um amigo.

O deputado Paulo Pimenta (PT- SP) lista as investigações contra o ex- presidente e sua família, além dos vazamentos de informação, para dizer que há “seletividade” nesse processo e cobrar o mesmo tratamento para políticos da oposição:

— Isso cada vez mais reforça um sentimento de seletividade na nossa base social, que nunca viu a imprensa investigar o Fernando Henrique (Cardoso), o Aécio (Neves), o (José) Serra.

A base do PT está se mobilizando para defender o ex-presidente. O argumento é que a intenção das investigações seria acabar com a possibilidade dele voltar a concorrer.

— Querem é colocar algemas no Lula e uma coisa ele não tem: medo. É bom o pessoal tomar cuidado para não o transformar em mártir — disse um amigo do ex-presidente.

Lula confirma que visitou tríplex; MP vê incoerência em defesa

Lula admite visita a tríplex com Léo Pinheiro; promotor vê incoerência

• Instituto ligado ao ex-presidente afirma que petista e ex-primeira-dama foram ao apartamento no Guarujá acompanhados do empreiteiro alvo da Lava Jato, mas desistiram de sua compra e em nenhum momento utilizaram o imóvel ‘para qualquer finalidade

Letícia Sorg, Eduardo Kattah - O Estado de S. Paulo

O Instituto Lula publicou ontem em seu site reproduções de documentos para voltar a negar que o apartamento no condomínio Solaris, no Guarujá, pertença a Luiz Inácio Lula da Silva e sua família. A entidade, presidida por Paulo Okamotto, confirmou que o ex-presidente esteve na unidade 164-A, um tríplex de 215 m2, em uma “única ocasião”, em 2014, acompanhado da mulher, Marisa Letícia, e de José Adelmário Pinheiro, o Léo Pinheiro, sócio da OAS.

Lula e Marisa foram intimados na semana passada a depor no próximo dia 17 como investigados em inquérito do Ministério Público Estadual que apura oito empreendimentos da Cooperativa Habitacional dos Bancários do Estado de São Paulo (Bancoop) assumidos pela OAS, alvo da Lava Jato por formação de cartel na Petrobrás entre 2004 e 2014. Um desses empreendimentos é o condomínio Solaris – também alvo da Operação Triplo X, 22.ª fase da Lava Jato.

O comunicado divulgado ontem pelo Instituto Lula faz um histórico da negociação envolvendo o empreendimento e acusa a imprensa e “agentes públicos partidarizados” de promover uma “farsa” para incriminar o ex-presidente da República.

No Ministério Público paulista, contudo, a avaliação inicial é de que as informações corroboram os indícios de tentativa de ocultação de patrimônio. O promotor Cássio Conserino afirmou que viu incoerência nas informações apresentadas.

Desde que surgiram suspeitas na relação do tríplex 164-A com a família Lula, o instituto do ex-presidente vinha divulgando notas afirmando que o petista e sua família nunca adquiriram o apartamento em si, mas uma cota-parte da Bancoop para aquisição de um imóvel no edifício, e que, posteriormente, desistiram da compra.

Na nota de ontem, o instituto afirma que a cota adquirida por Marisa Letícia se referia à unidade 141, de 82,5 m2. Em setembro de 2009, quando o empreendimento foi incorporado pela OAS, diz a nota que Marisa interrompeu os pagamentos porque deixou de receber os boletos da Bancoop e não aderiu ao contrato com a OAS. Até então, a família havia pago R$ 179.650,80 (em valores de hoje a R$ 286 mil) pela cota.

De acordo com o comunicado, em 2014, quando o edifício estava concluído, Lula e Marisa, acompanhados de Léo Pinheiro, visitaram o tríplex 164-A, que estava à venda, mas não aprovaram o imóvel como estava. Em novembro de 2015 Marisa teria, enfim, assinado o termo da Bancoop requerendo sua “demissão” do empreendimento. No documento, diz a nota, consta o ano de 2009.

“O que eu posso falar é que é incoerente com as próprias notas do instituto. Antes eles tinham uma cota e agora eles têm uma unidade habitacional específica. Nem eles sabem o que eles têm”, disse Conserino ao Estado. O promotor já afirmou que via indícios para denunciar Lula por lavagem de dinheiro. O inquérito do MP-SP investiga a suspeita de que as operações envolvendo a Bancoop e a OAS provocaram prejuízos de aproximadamente R$ 250 milhões aos cooperados.

‘Boatos’. Ontem o Instituto Lula afirmou que o ex-presidente e Marisa Letícia avaliaram que o tríplex no condomínio Solaris “não se adequava às necessidades e características da família, nas condições em que se encontrava”. O instituto afirma que a ex-primeira-dama e Fábio Luís Lula da Silva voltaram ao apartamento quando este estava em obras. O apartamento está em nome da OAS.

A nota diz que a família desistiu do negócio “mesmo tendo sido realizadas reformas e modificações no imóvel (que naturalmente seriam incorporadas ao valor final da compra)” por causa de “notícias infundadas, boatos e ilações que romperam a privacidade necessária ao uso familiar do apartamento”.

O instituto voltou a criticar a decisão do promotor de intimar Lula e sua mulher a depor como investigados. “Além de infundada, a acusação leviana do promotor desrespeitou todos os procedimentos do Ministério Público, pois Lula e Marisa sequer tinham sido ouvidos no processo.”

A Polícia Federal incluiu o tríplex 164-A no rol de imóveis com “alto grau de suspeita quanto à sua real titularidade”.

Offshore terá que identificar dono real

• Receita prepara norma por mais transparência de empresas offshore no Brasil

Andreza Matais - O Estado de S. Paulo

A Receita Federal prepara norma que irá obrigar empresas offshore que queiram operar no Brasil a identificar seus beneficiários finais. Hoje, esse tipo de firma pode fazer investimento direto, comprar imóveis e ter participação em empresas brasileiras sem que ninguém saiba quem são seus verdadeiros donos uma vez que são registradas com ações ao portador.

A identificação dos controladores de offshores – empresas registradas no exterior, normalmente em paraísos fiscais – tem sido cobrada do Brasil por autoridades internacionais na área de transparência financeira que veem na medida uma forma de ajudar no combate à lavagem de dinheiro por essas firmas.

Se a norma já estivesse em vigor, a Operação Lava Jato teria mais facilidade para identificar, por exemplo, quem são os verdadeiros donos das empresas offshore criadas pela panamenha Mossack Fonseca, alvo da 22ª fase da investigação, supostamente para lavar dinheiro de corrupção da Petrobrás. No cenário atual, para cada firma descoberta será necessário uma investigação mais aprofundada que pode ou não levar aos verdadeiros donos. “Ação ao portador é a lavagem de dinheiro em pessoa”, disse ao Estado um dos responsáveis pela elaboração da nova norma, que deve ficar pronta até março deste ano.

Uma das offshores abertas pela firma panamenha, a Murray Holdings LLC, comprou um tríplex no Guarujá (SP) no mesmo condomínio Solaris onde o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva teria um imóvel. A documentação registrada na Receita Federal brasileira só permite saber que a empresa foi aberta em Las Vegas, Estado de Nevada, nos Estados Unidos. Apenas a Mossack tem as informações completas sobre os beneficiários finais.

Demora. A exigência de se identificar os controladores de offshores parece algo simples de ser colocado em prática, mas a discussão se arrasta no governo há 12 anos no âmbito da Estratégia Nacional de Combate à Corrupção e Lavagem de Dinheiro (Enccla), organismo que reúne mais de 60 órgãos.

O tema é considerado complexo porque, segundo apurou o Estado, autoridades financeiras do governo temiam que a exigência provocasse fuga de capital estrangeiro do Brasil.

Com o passar dos anos, vários países adotaram esse tipo de norma e as resistências no País foram superadas. Tanto que em 2009, o Banco Central obrigou instituições financeiras a exigirem a informação do beneficiário final ao iniciar relação com pessoa jurídica.

Não há, contudo, mecanismo eficiente para acesso rápido a essa informação pelos órgãos de fiscalização e persecução penal. “Agora a discussão é sobre como se dará a exigência dessa informação quanto à constituição da sociedade”, explicou um dos envolvidos no trabalho.

A partir desse entendimento, a discussão saiu da Enccla e hoje é feita por um grupo menor formado por Receita, BC e Comissão de Valores Mobiliários, que regulamenta o mercado de capitais. O Uruguai e o Panamá já aprovaram a exigência do registro do proprietário real.

Hoje, para poder operar no Brasil, as offshores pedem à Receita Federal um CNPJ. Preenchem um cadastro para se habilitar a ter o registro sem o qual não conseguem fazer nenhum tipo de negócio no País. A Receita já incluiu no cadastro um campo para ser preenchido com a identificação do beneficiário final da offshore.

Mas, sem a vigência da norma, não há punição em caso de informação incorreta. Em muitos casos, o representante apresentado como beneficiário final da empresa é um “laranja”.

O Estado apurou que será obrigatório o registro de todos os nomes dos sócios. Caso a informação seja omitida, a offshore será proibida de operar no País.

Luis Claudio e lobista se contradizem

Por Letícia Casado, Murillo Camarotto e André Guilherme Vieira – Valor Econômico

BRASÍLIA e SÃO PAULO - Os depoimentos prestados por Luís Cláudio Lula da Silva e pelo lobista Mauro Marcondes sobre os contratos de consultoria firmados entre os dois apresentam uma série de contradições. Documentos da Operação Zelotes obtidos pelo Valorrevelam diferenças tanto em relação ao objeto dos contratos quanto à forma pela qual eles começaram a fazer negócios.
Também chama a atenção a baixa qualidade de um dos trabalhos prestados pelo filho do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Datado de dezembro de 2014 e orçado em R$ 600 mil, o relatório "Análise do esporte como fator de motivação e integração nas empresas" apresenta erros básicos de português, como na repetição, em 25 páginas seguidas, da grafia da palavra "fases" com a letra "z": "fazes".

A Marcondes & Mautoni, consultoria especializada em "diplomacia corporativa", realizou nove pagamentos à LFT Marketing Esportivo, empresa de Luís Cláudio Lula da Silva. Entre junho de 2014 e março de 2015, o filho do ex-presidente recebeu pouco mais de R$ 2,55 milhões. No depoimento à Polícia Federal, ele mencionou quatro contratos que, segundo atestam os documentos apreendidos na investigação, somam R$ 2,4 milhões.

Quando foi preso, em 26 de outubro de 2015, Mauro Marcondes disse à PF que conhece Luís Cláudio e que contratou a LFT para um projeto de construção de um centro de exposições no interior de São Paulo. Marcondes disse que não poderia dar mais detalhes, já que o projeto estava "em andamento".

No dia 4 de novembro, Luís Cláudio disse à PF que prestou consultoria a quatro projetos: a análise dos resultados das marcas na Copa do Mundo de 2014; o esporte dentro das empresas; o uso das arenas para exposição de marcas; e análise de risco de investimento para patrocínio dos Jogos Olímpicos de 2016. Luís Cláudio afirmou que não se lembrava dos valores dos contratos.

As minutas desses contratos diferem de todas as outras apreendidas pela Zelotes e juntadas ao inquérito policial. O contrato de maior valor - R$ 1 milhão - tinha como objeto "elaboração de análise de marketing esportivo para a indústria automobilística nacional visando a Copa do Mundo de 2014 e as Olimpíadas de 2016". A data do documento é de 2 de junho, dez dias antes de a Copa do Mundo começar.

O contrato foi assinado naquele mesmo dia, mas com outro objeto: "Análise de estudo de mercado para a indústria automobilística nacional visando as Olimpíadas de 2016, indicando os meios mais eficientes de veiculação e o material a ser divulgado". O pagamento seria feito em julho de 2014, mas acabou dividido em duas parcelas, uma em junho e outra em agosto.

Em 20 de julho, a Marcondes & Mautoni preparou minutas de contratos de serviços para a LFT. Em um deles, o objeto do contrato era "elaboração de análise de marketing esportivo como fator de motivação e integração nas empresas, com exposição de casos e oportunidades", no valor de R$ 600 mil. O contrato foi assinado em 20 de outubro e o material deveria ser entregue até 15 de dezembro de 2014.

Nele se discorre sobre a organização de um torneio esportivo. Na primeira fase, por exemplo, informa que "o líder deve ser proativo, comunicativo e ter maturidade"; na quarta, diz que "a empresa deve parabenizar o time vencedor".

Procurado, o advogado Cristiano Zanin, que representa Luís Cláudio, sustenta que não há contradições nos depoimentos de seu cliente e que a avaliação sobre a qualidade do trabalho da LFT "cabe apenas e exclusivamente ao contratante".

Zanin negou que, em seu depoimento, o filho do ex-presidente Lula teria se esquecido dos valores dos contratos. De acordo com o advogado, Luís Cláudio reconheceu que os contratos foram firmados exatamente na forma dos instrumentos assinados pelas partes que estão anexados ao inquérito policial.

Outros dois contratos foram negociados entre a LFT e a Marcondes & Mautoni, mas não chegaram a ser assinados. Somados aos quatro citados por Luís Cláudio no depoimento, os valores chegam a R$ 3,6 milhões. Segundo Marcondes, o modo adotado para se estabelecer o valor dos contratos "foi a consulta a algumas empresas, e os valores apresentados nas consultas correspondiam". Cinco minutas foram preparadas em 20 de julho de 2014.

Em relatório sobre a análise dos trabalhos apresentados pela LFT, a PF anotou que o material foi montado com base em artigos disponíveis na internet "visando camuflar sua identidade". As artes gráficas e as fotografias também foram copiadas, segundo a PF. "Verifica-se que há fortes indícios de que tais relatórios tenham sido produzidos meramente com o propósito de justificar vultosas movimentações financeiras entre as empresas investigadas", diz o relatório.

Luís Cláudio disse à PF que conheceu Marcondes no primeiro semestre de 2014, quando procurava patrocínios para o campeonato de futebol americano organizado por sua empresa. Já Marcondes alega que a contratação da LFT foi feita especialmente para dar subsídio ao projeto da construção do centro de exposições e que conheceu Luís Cláudio "através de membros que fazem parte deste projeto". Ele disse ter sido apresentado ao filho de Lula por um jornalista, do qual diz recordar apenas o primeiro nome: Alberto.

Os investigadores apuram se os pagamentos à LFT estão relacionados a um suposto esquema de compra de medidas provisórias em benefício do setor automobilístico. O material da investigação também traz documentos em que Marcondes defende o interesse de grupos suecos, entre os quais a fabricante de caças Saab, que no ano passado assinou um contrato com a Aeronáutica. Procurado, o advogado de Marcondes, Roberto Podval, afirmou que quando o empresário for interrogado "dará todas as explicações".

Instituto confirma visita de Lula a triplex no Guarujá

Por Cristiane Agostine e César Felício - Valor Econômico

SÃO PAULO - O Instituto Lula confirmou, por meio de nota divulgada em sua página na internet, que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva de fato visitou o triplex no edifício Solaris, no Guarujá (SP), em companhia do ex-presidente da OAS Léo Pinheiro e de familiares, conforme relataram testemunhas em inquérito tocado pelo Ministério Público de São Paulo. Mas a nota mostra uma reação dura do ex-presidente à iniciativa do MP paulista em investigá-lo por suposta ocultação de patrimônio, em um texto longo e acompanhado de fac-símile de diversos documentos, como recibos e contratos.

A nota qualifica o noticiário que vincula Lula ao imóvel como "armação" e "um escândalo a partir de invencionices", que estariam partindo dos "adversários de Lula e sua imprensa". O texto nega que o casal seja o verdadeiro dono de um imóvel de propriedade da empresa investigada por irregularidades em contratos públicos.

A nota sustenta que a mulher de Lula, Marisa Letícia, era sócia-cotista da Bancoop, cooperativa dos bancários, incorporadora original do empreendimento, desde 2005. Inicialmente, estava interessada em comprar um apartamento de 82 metros quadrados no edifício. Em 2009, quando a OAS sucedeu à Bancoop como incorporadora, Marisa Letícia teria perdido o direito à reserva deste imóvel, mas mantendo a prerrogativa de escolher outra unidade.

Segundo o texto, publicado na página do instituto na noite de sábado, Lula e sua mulher Marisa Letícia estiveram no triplex em 2014, mas teriam avaliado que o imóvel, com 215 metros de área privativa, "não se adequava às necessidades e características da família, nas condições em que se encontrava". A nota afirmou que esta havia sido a única vez em que o ex-presidente visitara o imóvel, mas que Marisa Letícia e o filho de Lula, Fábio Luís, estiveram em outra ocasião no apartamento, "quando este estava em obras". Em novembro de 2015, Marisa Letícia teria formalizado termo de desistência da compra de imóvel e pedido de resgate das cotas da cooperativa, em função do noticiário. " As notícias infundadas, boatos e ilações romperam a privacidade necessária ao uso familiar ", diz a nota.

O termo de desistência foi assinado com data retroativa a 2009. De acordo com a nota, tratava-se de um formulário padrão, de seis anos atrás, apresentado aos associados na ocasião em que tinham que optar entre resgatar a cota ou fazer a opção por novo imóvel.

Lula deve depor no inquérito sobre a Bancoop no próximo dia 17, perante o promotor Cássio Conserino, já na condição de investigado.

O ex-presidente demonstrou na nota preocupação com duas outras operações em que pode ser potencialmente atingido: a Zelotes, que apura a interferências na redação de textos de medidas provisórias; inclusive de Mauro Marcondes, de quem o filho do ex-presidente, Luis Claudio Lula da Silva, recebeu R$ 2,5 milhões por serviços de consultoria; e a Lava-Jato, que deflagrou na semana passada a Operação Triplo X, para apurar o fato de uma offshore panamenha usada pela OAS em casos investigados pela Lava-Jato ser dona de um imóvel no edifício Solaris.

No caso da Zelotes, a nota afirma que "caminham para o fracasso tentativas de envolver o ex-presidente com denúncias levianas alimentadas pela imprensa". Em relação à Lava-Jato, a nota se apoia nas declarações de investigadores de que Lula não está sendo formalmente investigado. A nota encerra com uma aposta de que Lula deve sair fortalecido politicamente das suspeições em torno de seu patrimônio. "Sem ideias, sem propostas, sem rumo, a oposição acabou no Guarujá. Na mesma praia se expõem ao ridículo uma imprensa facciosa e seus agentes públicos partidarizados".

O documento é um indicativo de uma reação que será partidária. O PT deve usar a propaganda partidária na televisão, que será veiculada a partir de amanhã, para defender-se das denúncias de corrupção. Na mira das investigações da Operação Lava-Jato, a legenda tenta responder aos ataques e planeja pelo menos dois atos neste mês em apoio a Lula.

A propaganda deve seguir a tese de que o PT tem sido atacado por conta das ações voltadas aos mais carentes nas gestões de Lula e Dilma e que há uma tentativa de acabar com a legenda e com Lula. Na sexta-feira, o presidente nacional da legenda, Rui Falcão, afirmou, em nota divulgada pelas redes sociais, que a oposição quer "derreter" o ex-presidente petista. Lula se reuniu neste dia com seus advogados para traçar a estratégia jurídica e de comunicação para responder às suspeitas de envolvimento em esquemas ilícitos.

Na própria sexta, o instituto Lula divulgara outra nota, desta vez para confirmar que frequenta em Atibaia (SP) "um sítio de propriedade de amigos da família". A nota foi motivada pela notícia do jornal "Folha de S.Paulo" de que o imóvel rural havia sido reformado pela Odebrecht, de acordo com fornecedores. A empresa negou a informação. O sítio é de propriedade dos sócios de Fábio Luís na empresa Gamecorp, Fernando Bittar e Jonas Suassuna.

A reação do PT às investigações da Lava-Jato deve ser discutida no dia 15, em reunião com cerca de 40 petistas em um hotel em São Paulo, que deve contar com a presença de Lula. Na ocasião, os petistas devem prestar solidariedade ao ex-presidente. Lula deve ser alvo de novas homenagens dos petistas na comemoração do aniversário do PT, em 26 e 27 de fevereiro, no Rio de Janeiro. (colaborou André Guilherme Vieira)

Dilma cogitou deixar PT no auge da crise, no fim do ano passado

Daniela Lima, Marina Dias – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - A presidente Dilma Rousseff cogitou se licenciar do PT e propor a composição de um governo suprapartidário no momento em que a fratura entre ela e a cúpula de seu partido se tornou exposta, em dezembro do ano passado.

As conversas sobre um afastamento formal da legenda à qual é filiada há 15 anos ocorreram em meio aos debates sobre qual posição os deputados do PT deveriam adotar no Conselho de Ética da Câmara sobre o processo que pode levar à cassação do presidente da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ).

Até então, o Planalto tentava convencer os três deputados petistas que integram o colegiado a votar pelo fim da investigação sobre Cunha, para evitar que ele deflagrasse o impeachment.

O PT reagiu. O presidente da sigla, Rui Falcão, pressionou publicamente seus deputados a votarem contra o peemedebista. O fim do impasse é conhecido: Cunha perdeu no conselho e, ato contínuo, acolheu um pedido de afastamento da petista.

O descompasso entre os interesses do Planalto e os da cúpula do PT nunca tinha ficado tão evidente, embora ambos os lados dessem sinais de fadiga há tempos. A crise política e econômica e os desdobramentos constantes da Operação Lava Jato desgastaram a relação entre Dilma e a sigla.

Diversos dirigentes da cúpula petista diziam que a presidente era a responsável por "afundar" a sigla, deixando em segundo plano os escândalos de corrupção que levaram à cadeia quadros importantes, como o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu.

Entre os petistas, havia a avaliação de que o partido não deveria mais compartilhar "o desgaste" do governo Dilma, que vinha defendendo o ajuste fiscal proposto pelo ex-ministro Joaquim Levy (Fazenda), considerado severo, ortodoxo e inadequado pela direção do PT.

Houve, naquele momento, quem defendesse o descolamento completo entre a legenda e o governo.

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, por sua vez, ainda acreditava em Dilma. A aliados, Lula confidenciou seus objetivos: salvar sua biografia, a imagem do PT e então o governo da presidente. Mas já admitia que, caso fosse preciso, lutaria para salvar o projeto do partido. Sem ela.

Foi nesse cenário que Dilma ventilou a possibilidade de se afastar do PT. A ideia era sinalizar na direção de uma gestão na qual partidos de oposição e da base aliada poderiam, juntos, encontrar saídas para a crise. A presidente também se comprometeria a não se envolver na disputa por sua sucessão, em 2018.

A tese foi debatida dentro do Palácio do Planalto e com parlamentares da base aliada e do próprio PT. Foi consenso que a estratégia até poderia render um suspiro de alívio, mas poderia também ser o atalho para o isolamento completo de Dilma. Ela, então, preferiu não arriscar.

Distância
A fase mais aguda da crise passou, admitem ambos os lados, mas dirigentes do PT afirmam que o partido hoje está mais distante do Planalto do que há um ano. Há uma determinação na cúpula da legenda de se posicionar sempre que a agenda do governo for contra os interesses da sigla.

A defesa da reforma previdenciária, por exemplo, está fora de cogitação para os petistas. Segundo um dirigente petista, naquilo que é "inegociável" com as bases do partido, o PT ficará na trincheira oposta à do governo, mas não haverá ruptura.

A cúpula da legenda avalia ainda que acertou ao forçar o rompimento entre Dilma e Cunha, dando a ela, num momento de pressão, um antagonista desgastado.

Mas reconhece que, à medida que a agenda do impeachment perdeu força, o foco da Lava Jato se voltou para Lula. O PT acredita que há uma operação para comprometer a imagem do petista e impedir sua candidatura em 2018.

Congresso retoma os trabalhos em clima conflagrado

• Câmara dos Deputados promete travar votações até que o rito do impeachment seja esclarecido pelo STF

Débora Álvares, Mariana Haubert – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - De um lado, o Palácio do Planalto tenta juntar forças em sua base aliada conflagrada para impedir o avanço do impeachment da presidente Dilma Rousseff e garantir governabilidade para aprovar medidas importantes para fazer o país caminhar.

Do outro, a oposição vai trabalhar pelo afastamento da petista, com obstruções e promessas de endurecimento de discursos.

É nesse clima que deputados e senadores retornam ao Congresso após cerca de um mês e meio de recesso. Apesar dos ânimos acirrados, cada Casa lidará de modo diferente com o início do ano.

Enquanto na Câmara a promessa é travar os trabalhos até que o rito do impeachment seja esclarecido pelo STF (Supremo Tribunal Federal), a dúvida é se o Senado continuará sendo o bastião de salvaguarda do Planalto.

O papel dos senadores será fundamental na análise das contas de 2014 da presidente, que só poderão ser reprovadas com o aval das duas Casas. Além disso, caberá ao Senado dar a palavra final do Congresso sobre o processo do impeachment.

A comissão especial da Câmara que analisará o pedido de afastamento de Dilma deve ser instalada até março. A novela, contudo, começa nesta semana.

O presidente da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), vai protocolar no STF embargos de declaração para questionar a decisão dos ministros de proibir que a eleição do colegiado seja secreta e para que se dê com a participação de chapas avulsas.

Vai ainda argumentar sobre o poder dado pelo STF ao Senado, não o obrigando a instaurar o processo após a autorização dos deputados.

Enquanto aguarda a Corte se manifestar, a ordem de Cunha é que nenhuma comissão temática eleja presidente. Com isso, o peemedebista pressiona o governo, que precisa dos colegiados funcionando para ver projetos de interesse aprovados. De quebra, se beneficia ao paralisar, por consequência, o processo de cassação de seu mandato no Conselho de Ética.

Isso porque há recursos à CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) e à Mesa Diretora da Casa com pedidos de anulação da sessão que deu continuidade ao seu processo. Seu advogado vai ao STF pedir a deliberação dos recursos antes de entregar a defesa escrita, cujo prazo terminaria em 11 de fevereiro.

Clima político
Nesse clima de tensão, a liderança na Câmara do maior partido da base aliada, o PMDB, também está em jogo. A disputa está entre a reeleição do aliado do Planalto, Leonardo Picciani (RJ), e o afilhado de Cunha, Hugo Motta (PB). O cargo é determinante no quebra-cabeça que o governo precisa montar para reconstruir maioria na Casa.

Apesar de admitirem fragilidade, governistas dizem começar o ano otimistas, com expectativas de desobstruir a pauta e votar as propostas de interesse. E que o Palácio do Planalto está disposto ao diálogo com a base aliada e, até mesmo, com a oposição.

Aliados do governo confessam, contudo, que Cunha representa um problema e que ele vai continuar ditando o ritmo da Câmara da forma como bem entender. "Estamos nas mãos da Justiça", desabafou um dos vice-líderes do governo na Casa.

Para tentar passar por cima disso, na terça (2) Ricardo Berzoini (Secretaria de Governo) reúne os líderes da base aliada. A presença mais esperada, contudo, é do ministro da Fazenda, Nelson Barbosa. Ele deve fazer apelos por projetos importantes para o governo, como o da reforma da previdência, a CPMF e a DRU. Ouvirá, contudo, uma lista de dificuldades para a aprovação de todos eles.

Parlamentares da base e da oposição já se pronunciaram contra, por exemplo, a reedição do imposto do cheque.

Para além do protagonismo de Cunha, o Congresso tem um protocolo a cumprir para começar a funcionar. A sessão de abertura dos trabalhos será na tarde de terça.

O cerimonial do Congresso convidou todo o primeiro escalão do governo federal. Apesar de ter cogitado marcar presença, a presidente Dilma Rousseff deve mandar, como de costume, o ministro da Casa Civil, Jaques Wagner, para representá-la.

MPF apura discurso de Dilma de 2010

• Inquérito investiga licitação de estaleiro em SP citada pela então ministra

- O Globo

A Procuradoria-Geral da República investiga suposta fraude em licitação de estaleiro em Araçatuba (SP). Quando chefe da Casa Civil, em discurso, Dilma mencionou a obra na cidade antes do lançamento do edital. 

- SÃO PAULO- A Procuradoria Geral da República está usando um discurso feito em março de 2010 pela presidente Dilma Rousseff, que na época era ministra da Casa Civil, para embasar um inquérito que investiga se houve fraude em licitação para construção do Estaleiro Rio Tietê, em Araçatuba, no interior paulista. Como noticiou ontem o jornal “Folha de S. Paulo”, a Lava- Jato investiga se houve algum pagamento indevido ao presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e ao ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado, afilhado político do senador.

No dia 10 de março de 2010, um dia antes de as empresas serem convidadas a participar do certame, Dilma, que era pré-candidata à Presidência, esteve em Araçatuba para participar de uma feira empresarial e afirmou em discurso: “Aqui para Araçatuba é uma grande vantagem você ter um estaleiro produzindo barcaça. Fazer barcaça aqui em Araçatuba é estratégico”.

Segundo a denúncia do MPF paulista, as cartas- convite da Transpetro — então presidida por Sérgio Machado — às empresas que participariam do certame começaram a ser enviadas apenas no dia 11 de março; e não havia, segundo os documentos, qualquer exigência de localização, exceto que fosse em território nacional. A ação do MPF envolve nove empresas e 16 pessoas por fraude em licitação para compra de barcaças para transporte de etanol na hidrovia Tietê- Paraná, um negócio de R$ 432 milhões.

Além de supostamente beneficiar o consórcio, o certame da Transpetro teria sido direcionado para beneficiar o município de Araçatuba, cujo prefeito era o petista Cido Sério. O procurador Paulo de Tarso Garcia Astolphi afirmou na denúncia que a área para a construção do estaleiro, por exemplo, foi arrendada em março de 2010 — seis meses e 20 dias antes de ser conhecido o ganhador da licitação. A ação de improbidade está no Superior Tribunal de Justiça, que deverá decidir se ela será julgada em Araçatuba, sede do estaleiro, ou no Rio.

“Na visita a Araçatuba, a então ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, apenas ressaltou o potencial da região como centro de atividade de etanol e o fato de exibir todas as condições para abrigar a obra. Não fez menção, portanto, a qualquer resultado antecipado para o edital de licitação da Transpetro”, afirmou em nota a Secretaria de Imprensa da Presidência da República. O estaleiro também nega irregularidades.

A licitação também teria beneficiado o consórcio. Paulo Roberto Costa, ex- diretor da Petrobras e delator da Lava- Jato, disse ter recebido R$ 1,4 milhão de propina de empresas do consórcio, mas que foi apenas “um agrado”, pois não tinha poder para definir a licitação. Recebeu o valor em espécie das mãos de Fernando Soares, o Fernando Baiano. Costa esteve no mesmo evento em que Dilma discursou. Quem assinou como gerente do contrato pelo consórcio foi um executivo ligado ao Grupo Pragmática — nome dado às empresas de um dos genros de Costa.

O estaleiro foi alvo de buscas em dezembro passado durante a Operação Catilinárias da Polícia Federal, um desdobramento da Lava- Jato que teve como alvo políticos do PMDB. “A Justiça já se manifestou ao negar a diligência solicitada”, afirmou a assessoria do senador Renan Calheiros.

O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, chegou a ser informado pelo Ministério Público Federal em 2014 sobre o discurso de Dilma, mas disse, na época, que não se justificava abertura de investigação.

Portas se fecham no varejo

• Setor encerra atividades de 80 mil lojas em 2015, e recessão não poupa nem as grandes redes

Roberta Scrivano, Marcello Corrêa, Ana Paula Ribeiro - O Globo

- SÃO PAULO e RIO- A recessão obrigou gigantes e pequenas empresas do varejo a diminuir de tamanho. Para se adequar ao consumo em queda, as grandes redes fecham lojas e cortam vagas. Recentemente, seis empresas anunciaram o fim de 153 unidades, incluindo Walmart, Ponto Frio, Casas Bahia, Extra, Marisa e C& A. Os números das líderes do mercado se somam aos milhares de pontos de venda que foram fechados no ano passado, num segmento em que predominam as microempresas. Dados preliminares da Confederação Nacional do Comércio (CNC), compilados a pedido do GLOBO, mostram que, em 2015, no total, 80,1 mil lojas fecharam as portas. O resultado representa um aumento de 52% em relação a 2014, quando 52,7 mil estabelecimentos encerraram as atividades. Para analistas, a redução de custos é uma tendência que deve se manter ao longo de 2016, e os segmentos dependentes de crédito tendem a ser mais afetados.

De acordo com a confederação, o número de lojas de grande porte caiu 9,5% em 12 meses considerando dados até outubro, um percentual superior ao dos pequenos varejistas, que tiveram queda de 8,3%.

— O fechamento de lojas é generalizado. A renda do consumidor caiu, e o custo do crédito aumentou. As taxas de juros reais em torno de 8% inviabilizam o consumo de bens duráveis (como eletrodomésticos), mais sensíveis ao crédito. Há uma relação clara entre o desempenho de vendas e o fechamento de lojas — explica Izis Ferreira, economista da CNC.

Um dos casos mais emblemáticos é o do Grupo Pão de Açúcar, que controla redes como Ponto Frio, que fechou 73 lojas, e Casas Bahia (três unidades encerraram atividades). No ano passado, 18 mil trabalhadores foram demitidos, uma redução de 11,2% no quadro, segundo dados do balanço até setembro. O número inclui todas as dez bandeiras da empresa. Segundo o Pão de Açúcar, as condições macroeconômicas justificam os cortes de vagas e a companhia diz que houve redução de custos. “É dever da administração adequar a companhia à demanda do mercado, sempre preservando a qualidade e nível de serviço nas lojas e entrega aos clientes. A adequação do quadro de pessoal faz parte deste processo”, afirmou, em nota, a empresa.

Há duas semanas, o Walmart anunciou o fechamento de 60 lojas. O corte representa mais de 10% da rede de 544 lojas no país. O motivo: baixa performance de vendas.

— O varejo tem rotatividade elevada, de mais de 40%, então as grandes redes não precisam necessariamente demitir para reduzir o custo de uma loja. É só parar de contratar. A expectativa é que mais lojas sem um patamar de venda adequado à estrutura de custos sejam fechadas. Isso deve ocorrer mais no primeiro trimestre, quando já passou o período mais forte de vendas — disse Luiz Carlos Cesta, analista de varejo do Banco Votorantim.

Comércio cortou 180,9 mil vagas
Em 2015, o comércio varejista cortou 180,9 mil vagas formais. Nas grandes redes, segundo a União Geral dos Trabalhadores (UGT) houve 62 mil dispensas. O levantamento de demissões foi feito com informações da própria UGT, do Dieese e dos balanços das empresas, mas em muitos casos não inclui dados sobre as admissões no período. Para Ricardo Patah, presidente da UGT e do sindicato dos comerciários de São Paulo, esses são os primeiros sinais do mau momento do varejo.

— A crise chegou ao comércio. Em 2014, quando ela ainda estava se iniciando, não tivemos desemprego. Em 2015, começamos a sentir, porque será neste ano o grande volume de demissões no setor — afirma Patah.

Segundo a UGT, foram 3.500 homologações do Carrefour. A empresa, porém, afirma que se trata de um movimento normal no varejo e que as vagas foram repostas: “O Carrefour informa que não houve redução em seu quadro de colaboradores em 2015. Os desligamentos no período fazem parte do turno ver, movimento natural em um setor dinâmico como o varejo. As posições em aberto foram repostas”, informou.

Nelson Barrizzelli, especialista em varejo, avalia que as demissões e o fechamento de lojas refletem também a consolidação das vendas on-line. Cálculos da UGT mostram que cada emprego no comércio digital equivale a cinco nas lojas convencionais.

— Os vendedores de linha branca são os que mais sofrerão — disse Barrizzelli.

Para Haroldo Monteiro, coordenador da pós- graduação em Gestão Estratégica no Varejo do Ibmec/ RJ, mais empresas terão de negociar valores que pesam na operação, como aluguel e condomínio:

— O conceito de lojas enormes com muitos vendedores está mudando. O e-commerce está fazendo com que as lojas físicas fechem ou diminuam de tamanho. Por isso, vão ocorrendo demissões para adequar a quantidade de vendedores na loja.

Analista diz que ajuste continua este ano
O momento de ajuste ocorre após um período de crescimento exagerado, estimulado por políticas de incentivo ao consumo, avalia Claudio Felisoni, presidente do Instituto Brasileiro de Executivos de Varejo e Mercado de Consumo (Ibevar). Ele vê com ceticismo a tentativa de reativar a economia com base no estímulo ao crédito:


— Depois da festa, vem a ressaca. Infelizmente, essa é uma situação previsível. Era sabido que o que sustenta consumo é investimento.

Mas nem só de corte de custos sobreviverá o varejo na crise. Para Enéas Pestana, dono de uma consultoria e ex-presidente do Pão de Açúcar, o setor precisa focar na melhoria da gestão.

— Não acredito só em corte de despesas, porque depois a conta vem. Não adianta cortar metade dos funcionários, porque há risco de a empresa não se sustentar — disse Pestana, que trabalha na integração das bandeiras da Máquina de Vendas, a holding formada por Ricardo Eletro, Insinuante, Eletroshopping, City Lar e Salfer.

Uma redução do número de lojas da Máquina de Vendas não está descartada. Procurada, a empresa não se manifestou oficialmente. Segundo Pestana, avaliar unidades com desempenho ruim faz parte do cardápio de opções:

— Claro que a gente olha lojas deficitárias. Nesse segmento de bens duráveis é mais fácil. O custo de implantação de uma loja de eletroeletrônicos é muito menor do que de um supermercado.

Ana Paula Tozzi, presidente da GS & AGR Consultores, do grupo Gouvea & Souza, afirma que o ajuste não terminou e não vai terminar antes do fim do ano: — Diversas redes vão ter que se reposicionar. Mesmo com possíveis medidas de estímulo ao crédito, Maria Cristina Costa, analista da Lopes Filho, avalia que, com o desemprego ainda alto, o consumo não vai aumentar.

— Não vejo motivo para otimismo.

Aécio Neves: A vida sem começo

- Folha de S. Paulo

"Eu tinha tantos planos para ele." O desalento de um pai, na semana passada, ao ser informado de que seu filho recém-nascido era portador de microcefalia traduz o sofrimento das famílias já afetadas pela epidemia do vírus zika que, tendo o Brasil como epicentro, amedronta o mundo. Quem mantém viva no coração a memória do instante do nascimento dos próprios filhos, pode avaliar bem o tamanho da dor.

Já são mais de 4 mil casos suspeitos. A perspectiva é muito pior. Milhares de brasileiros sem autonomia, inteiramente dependentes, para sempre, da atenção familiar e da proteção do poder público. É uma tristeza sem fim. Chegamos a esse ponto por descuido e incompetência. Números como esses não nascem do acaso. Nascem do descaso.

O vírus zika sem controle retrata o fracasso das políticas públicas de saúde. Ações do governo são fundamentais, mas seria ingênuo supor que, nesse estágio, seriam suficientes para debelar a epidemia. Essa luta exige comprometimento efetivo de toda a nação.

Precisamos de uma grande mobilização que envolva, além do Poder Executivo em todas as esferas, empresas, instituições de pesquisa, escolas, universidades, igrejas, Forças Armadas, além da sociedade civil. Muitas vezes incorremos no Brasil em uma distorção do conceito do que é responsabilidade pública: se é pública, parece ser de ninguém quando, na verdade, é de todos. Temos, nesse desafio, uma responsabilidade coletiva.

O Congresso também precisa dar a sua contribuição. Se o governo falhou ao não prevenir a tragédia, que possamos somar forças no seu enfrentamento. Precisamos implementar ações objetivas de apoio às famílias vítimas da microcefalia e debater, com urgência, medidas efetivas que vão desde a ampliação do prazo de licença maternidade, ao suporte financeiro e ao apoio às instituições que podem ajudar essas crianças e seus responsáveis diretos a construírem a nova vida familiar.

Não podemos permitir que essas crianças sejam relegadas à sombra da omissão do poder público, quando deixarem de ser manchete de jornal. O debate deve ultrapassar a fronteira da generalidade e alcançar a dimensão concreta da realidade. Números aterrorizantes de estatísticas precisam ganhar rostos e nomes.

Precisamos ter coragem de enfrentar perguntas difíceis. Onde esses pequenos brasileiros vão se tratar? Onde famílias de baixa renda encontrarão recursos e apoio para rotinas que serão marcadas por tantas dificuldades?

Milhares de crianças serão para sempre o retrato da incompetência do governo. Que possam ser acolhidas e se transformar também no testemunho da dimensão da solidariedade brasileira. Como pais e como país, devemos isso a cada uma delas.
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Aécio Neves, senador (MG) e presidente nacional do PSDB

Ricardo Noblat: Eu, pecador, confesso...

- O Globo

“Se tem uma coisa de que me orgulho é que não tem, neste país, uma viva alma mais honesta do que eu”. LULA

A Lava- Jato começa a unir o que o mensalão havia separado — Lula e José Dirceu. Uma vez descoberta a “sofisticada organização criminosa” que tentava se apoderar da máquina administrativa do Estado, Lula foi à televisão e disse ter sido traído, sem apontar, contudo, os traidores. Em seguida, para driblar o risco de perder a sua, entregou a cabeça de Dirceu, o mais poderoso ministro do governo.

NA SEMANA PASSADA, a cabeça de Lula surgiu no radar do juiz Sérgio Moro. Pouco antes de interrogar Dirceu, preso e acusado de receber propinas de lobistas envolvidos com a roubalheira na Petrobras, Moro autorizara uma nova operação da Polícia Federal, desta vez para apurar a abertura de empresas offshores e contas no exterior destinadas a ocultar crimes de corrupção. E Lula com isso?

ERA UMA VEZ uma cooperativa do Sindicato dos Bancários de São Paulo, controlada pelo PT, que se aventurou a construir prédios de apartamentos. Não demorou a quebrar. A pedido de Lula, então presidente da República, a construtora OAS, metida até o talo no saque à Petrobras, assumiu a construção do Condomínio Solaris na Praia de Guarujá, em São Paulo. Quem tem ou tinha ali um apartamento?

LULA CITOU O apartamento de Guarujá na sua declaração de bens de 2006. Dali a quatro anos, a Presidência da República confirmou que ele era, de fato, proprietário do tríplex 164- A do Condomínio Solaris. Em dezembro de 2014, o Instituto Lula informou que Marisa Letícia, mulher de Lula, era quem possuía “uma cota do empreendimento”. Em agosto do ano passado, a assessoria de Lula revelou que era ele o dono da cota.

COM 297 M² E VISTA para o mar, avaliado, a preço de hoje, entre R$ 1,5 milhão e R$ 1,8 milhão, o tríplex está em nome da OAS. Reformá- lo por encomenda de Lula custou à construtora quase R$ 800 mil. E mais R$ 400 mil com mobília e eletrodomésticos. Tudo foi acompanhado de perto por Lula e Marisa Letícia, que visitaram a obra várias vezes. Só que...

SÓ QUE MORO quer saber se o tríplex não foi o meio encontrado pela OAS para, digamos, retribuir favores prestados a ela por Lula quando governava. Só que, para escapar da encrenca, Lula passou a dizer agora que o apartamento jamais foi dele. Marisa Letícia é que teria comprado uma cota do condomínio por R$ 47 mil. Depois, desistiu do negócio e recebeu seu dinheiro de volta.

AINDA SUJEITA A retoques ou a mudanças bruscas de direção, fica assim a mais recente versão dos Silva para o que aconteceu com o tríplex 164- A: a OAS desembolsou porque quis cerca de R$ 1,2 milhão para reformar e equipar um apartamento que poderia vir a interessar ao casal Lula. Marisa Letícia chegou a receber as chaves do imóvel e a participar de reunião de condomínio. Aí pensou melhor e renunciou à compra.

NÃO FOI SÓ A OAS que mimou os Silva. O clã tem um sítio em Atibaia, interior de São Paulo, com 173 mil m² , o equivalente a 24 campos de futebol. Registrado em nome de dois sócios de Fábio Luís da Silva, o Lulinha, o sítio foi reformado pela Odebrecht, que gastou, ali, meio milhão de reais. Moro quer saber se a gentileza feita pela construtora nada tem a ver com o que ela faturou na Petrobras.

DIRCEU CONFESSOU a Moro o que o advogado dele chamou de “pecados”. Para não confessar os seus, Lula é capaz de entregar a mulher e os filhos à Justiça.

José Roberto de Toledo: O vetor da corrupção

• É fazendo favores e apresentando pessoas que o vetor se aproxima de seu alvo

- O Estado de S. Paulo

Ele costuma ser simpático, sorriso fácil, sempre prestativo. Se o hospedeiro precisa ir a algum lugar com rapidez, ele arruma um helicóptero. Se é mais longe, um jatinho. Se o outro quer relaxar, ele descola uma casa na praia, uma fazenda para pescar, um apartamento em Paris. Ele se antecipa e descobre qual uísque o hospedeiro gosta de beber, o que sua mulher gosta de comer e em qual cidade a ex-amante do hospedeiro gostaria de morar.

Ele também entende tudo de reformas: casa na praia, sítio de lazer, cozinha gourmet – seja o que for, tem sempre um conhecido que pode fazer o projeto e tocar a obra “sem custos”. Ainda arruma emprego, sócios ou clientes para os filhos do hospedeiro.

É fazendo favores, gerando oportunidades e apresentando pessoas que o vetor se aproxima de seu alvo. Cria intimidade e, no passo seguinte, cumplicidade. Divide segredos. Ganha confiança.

Ele tem muitos nomes: intermediário, facilitador, lobista. Mas – em tempos de zika, dengue e chikungunya – pode ser chamado também de “Aedes corruptus”. Como um mosquito, ele é o vetor da corrupção. Vive de sugar o sangue alheio e espalhar o vírus “uma mão lava a outra”, o “toma lá dá cá” e o “15% é pro partido”.

Em época de eleição, vira arrecadador de campanha. Se não tiver outro jeito, doa do próprio bolso, mas prefere passar o chapéu entre empresários. Assim, suga dois com uma picada só: fica com crédito junto ao hospedeiro e ainda prospecta futuros clientes.

Estabelecida a confiança mútua, o hospedeiro está infectado: pode pretender ignorar, não apresentar sintomas, chamar o vetor de amigo, mas, conscientemente ou não, será usado para propagar a doença. O “Aedes corruptus” vai explorar sua proximidade com os poderosos para fechar negócios. Vai se gabar de ter acesso fácil para vender serviços – que pode ou não entregar.

É um aspecto singular do contágio. Basta ao mosquito saber antes o que o hospedeiro fará para vender como obra sua algo que já é certo mas ainda não foi anunciado. Os clientes estão tão acostumados à corrupção que, numa projeção de si próprios, julgam que tudo só acontece se engraxam a mão de alguém. O “Aedes corruptus” conhece sua clientela, e usa isso a seu favor.

Se detectar dúvida, pode cometer uma indiscrição para provar que convive com a família do poderoso infectado. Mostra no celular para o potencial cliente uma foto dele com o hospedeiro, conta um causo do último encontro, revela apelidos de família.

Quando a doença se alastra e o hospedeiro deixa de ser assintomático, o vetor muda de status e vira operador. Começa a intermediar nomeações, distribuir comissões e montar sociedades. Aumenta, porém, o risco de ser descoberto. Se é pego pelas autoridades sanitárias, é o primeiro a delatar. Entrega todo mundo, abranda sua pena e fica com parte do que ganhou. Enquanto isso, o hospedeiro enfraquece e, às vezes, morre, politicamente.

Podem achar que o mosquito acabou, mas ele só está buscando um novo vírus para transmitir. Se ficou manjado como vetor federal, vai traficar no local. Se não der para ele, vai dar para outros de sua espécie. Sempre haverá “Aedes corruptos” zunindo por aí.

A corrupção é endêmica no Brasil. Infecta tantas pessoas que se tornou o comportamento normal – com variações sazonais e espaciais, mas dentro do máximo esperado. Surtos epidêmicos são raros, porém, ocorrem. E sempre na mesma ocasião: quando há troca em massa no poder e uma nova população sem anticorpos vira alvo do “Aedes corruptus”. A propagação, aí, costuma ser explosiva, muito além do desvio padrão. É a festa do mosquito.

Como toda epidemia, uma hora ela acaba – seja porque aquele esquema foi descoberto, seja porque dizimou os hospedeiros. Aí voltamos ao nível endêmico de corrupção ao qual estamos acostumados. Vão-se os hospedeiros, ficam os mosquitos.

Valdo Cruz: Destruindo o destruído

- Folha de S. Paulo

Querem derreter o Lula para destruir o PT. Tentam acabar com o Lula para evitar que ele volte à Presidência. É o que esbravejam petistas, desesperadamente, depois que as investigações se aproximaram perigosamente do grande líder do Partido dos Trabalhadores.

Enquanto estratégia para tentar desviar o foco e dar justificativas a seus convertidos, faz lá seu sentido. É até compreensível. Mas o coro dos desesperados está, diríamos, um bocado descolado da realidade.

Tudo bem que derreter o Lula é a pá de cal no PT. Só que, até infelizmente por seu passado de glórias, o presente do partido lulista já é desabonador o suficiente para desidratá-lo nas próximas eleições.

Quanto ao ex-presidente, um retorno ao Palácio do Planalto é algo bem improvável, para não dizer impossível diante do atual cenário político e policial. Arriscaria até que, no fundo, está fora de seus planos.

Neste momento, faz parte do manual de sobrevivência de Lula alardear que, quanto mais o atacam, mais quer ser candidato a presidente –mais ameaça do que outra coisa.

Afinal, Luiz Inácio Lula da Silva chegou lá, no Palácio do Planalto, é bom lembrar, depois que decidiu vestir o figurino paz e amor e, com isso, atraiu, o voto da classe média.

Até então, ele sempre batia nos 30% do eleitorado que o PT tinha no passado. Superou essa marca depois que engavetou o discurso raivoso e se mostrou mais confiável.

Hoje, primeiro, o PT não tem mais aquela fatia do eleitorado. Segundo, Lula voltou a ser o "barbudo" que assusta boa parte do eleitorado. E a Lava Jato ainda vai causar mais estragos no mundo petista.

Agora, a salvação petista, de um final menos tenebroso a fim de permitir uma ressurreição mais à frente, está nas mãos do governo Dilma.

Mas, como disse um executivo na saída do Conselhão, não basta jogar crédito na economia para sairmos da recessão. É preciso recuperar a confiança –algo ainda distante.

Marcos Nobre: O que muda com Lula como alvo

• Não existe impeachment de ex-presidente

- Valor Econômico

2015 foi o ano em que uma entrevista de um grande empresário podia dar a Dilma mais uma semana de sobrevida ou jogar mais gasolina na fogueira da sua deposição. Uma manifestação de rua podia desencadear o impeachment ou enterrá-lo. É um claro sintoma de pane geral do sistema político. Ao mesmo tempo, levou à novidade muito interessante de uma espécie de retomada da política pela sociedade. Em lugar de partidos, o centro da disputa política foi tomado por núcleos sociais com posições divergentes, com sugestões diferentes quanto ao rumo mais adequado a seguir. Em um ou outro caso, pode ser que tenham vinculação a um partido. Mas, no geral, expressam posições que não cabem dentro de um partido. Pelo menos não na confusão partidária atual.

Mas se são movimentos que não estão diretamente ligados à política oficial, não deixam por isso de se orientar por ela de alguma maneira. Essa é a segunda novidade que saiu de 2015. Tendo sobrevivido ao impeachment, o governo Dilma acabou por se tornar uma arena de disputa entre projetos opostos sobre qual o melhor rumo a seguir. É um governo que opera como se estivesse aberto para ser tomado por qualquer um dos lados, desde que acumulem força suficiente para isso. Mesmo que seja por cima das convicções pessoais da presidente, que são muitas e persistentes. É um governo que não se decide por um dos lados nem abandona nenhum deles. Ao contrário, todo dia dá uma no cravo e outra na ferradura.

A entrada de Lula na mira da Lava-Jato e do MP de São Paulo pode mudar esse rearranjo construído a duras penas ao longo de 2015. Como não existe impeachment de ex-presidente, a disputa sai do sistema político diretamente para a sociedade. Não há como encontrar expressão no sistema político para o ataque e a defesa públicos de Lula. A disputa vai para a rua. Os nós do debate público que estão ainda conectados de alguma maneira a esse governo que se apresenta como arena de batalha de resultado indefinido serão imediatamente invadidos pela luta social direta. Enfim, é uma crise de cara nova.

O sistema político que entrou em pane funcionava como um trem: não importa qual era a locomotiva, os vagões que apoiavam o governo eram sempre os mesmos. A eleição presidencial decidia apenas qual locomotiva devia empurrar esses mesmos vagões de sempre, cheios de PMDBs. Como são vagões pesados, difíceis de puxar, as locomotivas são obrigadas a andar a passo lento, seja para que direção for. Logística não é, de fato, o ponto forte do país.

A crise atual é a crise desse modelo ferroviário da política. No primeiro mandato de Dilma, a locomotiva se desconectou por um tempo dos vagões, ganhando velocidade e direção próprias. Dilma se aventurou a reformar o capitalismo brasileiro de alto a baixo, passando por cima dessa lógica ferroviária da política. Quando o PMDB acordou para o problema, já era tarde. Na eleição de 2014, dividiu-se ao meio entre Dilma Rousseff e Aécio Neves. Mas aí veio a Lava-Jato e o trem pemedebista simplesmente descarrilou.

A agonia de 2015 foi a somatória de todos esses acidentes. A ferrovia foi desativada e nenhuma operação de transporte alternativo foi oferecida. As locomotivas dos últimos vinte anos, PT e PSDB, entraram em manutenção por tempo indeterminado. Os vagões de apoio parlamentar tentam desesperadamente voltar aos trilhos e encontrar desvios para fugir da ação saneadora da Lava-Jato.

Com a pane do sistema ferroviário da política veio a limitação da margem de ação de Dilma. A permanente ameaça de destituição e a constante impossibilidade de constituir uma base parlamentar com alguma consistência garantiram que a presidente não estivesse em condições de repetir uma política como a de seu primeiro mandato. Quando parecia encontrar algum respiro, lá vinha alguma pedra a quebrar a vidraça recém-trocada. Cada avanço da Lava-Jato fortalecia o mandato de Dilma, ao mesmo tempo em que desorganizava o sistema político, fragilizando o governo.

A característica da situação atual é que Dilma acabou assumindo o lugar de gestora do tráfego político que ainda resta. A movimentação vem de organizações formais e informais da sociedade, vem do debate público que se tem. Dilma se colocou no lugar de quem arbitra as disputas entre as posições sem dar vitória a nenhuma delas. Contra os interesses de locomotivas e vagões do sistema político, não mexe uma palha para atrapalhar a Lava-Jato. A favor de posições liberais, defende o ajuste fiscal e alguma reforma na Previdência. A favor de posições social-desenvolvimentistas, raspa o cofre para oferecer crédito em bancos públicos e se recusa a fazer cortes ainda mais profundos no orçamento. Vai de um lado para o outro conforme a necessidade e as circunstâncias. É o que aproxima o seu segundo governo do período Itamar Franco.

Em lugar dos vagões pesados do pemedebismo, o que ata Dilma agora é a pressão do debate público e dos lobbies no governo dos diferentes projetos para o país. Tanto no sentido de impedi-la de executar uma política própria como no sentido de obrigá-la a se espremer entre orientações políticas irreconciliáveis. Não é à toa que uma mesma pessoa que declara o governo incapaz de governar exige ao mesmo tempo que ele governe. É a receita certa para travar o país em suas crises econômica e política. Até que o tempo as resolva, sabe-se lá.

Mas esse arranjo foi também a maneira de garantir que a disputa não fosse resolvida de uma vez por todas em favor de nenhum dos lados enquanto não se reorganizar em novas bases o sistema político, enquanto não se abandonar o modelo ferroviário em favor de uma democracia que tenha de fato bancadas de situação e de oposição disputando em condições de igualdade no Congresso. E, muito provavelmente, enquanto não vierem as eleições de 2018. É essa forma de governar e esse calendário político que podem ter caducado com a substituição de Dilma por Lula no papel de ícone de todas as desgraças.

Pausa na contribuição para este espaço. Volto no último dia de fevereiro deste ano bissexto de 2016. Até lá.
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Marcos Nobre é professor de filosofia política da Unicamp e pesquisador do Cebrap.

Marcus Pestana: Eleições municipais e a Federação agonizante

- O Tempo (MG)

Viramos o ano levando uma herança nada positiva: 2015 parece não querer acabar. Impeachment, Lava Jato, crise econômica, desemprego, recessão prolongada, inflação alta, falta de credibilidade do governo são traços de continuidade transferidos para 2016. O Carnaval se aproxima, e não há muitos motivos alimentando a folia.

Depois do feriado, faltarão apenas sete meses e meio para as eleições municipais. E aí será hora de jogar foco numa das faces mais dramáticas da atual crise do país: o estrangulamento dos municípios brasileiros. Inclusive, essa realidade angustiante levou diversos prefeitos a cancelar os eventos do Carnaval.

Num país continental e com tamanha diversidade como o Brasil, a descentralização deveria ser diretriz principal. A defesa do redesenho do pacto federativo e do municipalismo, mais que retórica política, é uma necessidade histórica. Não é possível a nenhum governo abraçar o Brasil, suas diferenças e suas desigualdades a partir de Brasília. A descentralização financeira e administrativa tornaria as políticas públicas mais coerentes com a realidade regional e local, diminuiria custos operacionais e de intermediação e aguçaria o controle social. No entanto, não é esse o rumo.

Os municípios atravessam a maior crise das últimas décadas. Muitas prefeituras se encontram com salários atrasados. Manter o pagamento de fornecedores essenciais em dia é um luxo. O nível de investimentos é próximo de zero.

Sabemos todos que o Brasil tem uma das maiores cargas tributárias entre os países emergentes, aproximadamente 37% do seu PIB. Mas os recursos ficam concentrados nas mãos do governo federal, que abocanha 60% do total dos tributos. Aos municípios restam apenas 15%. Porém, as demandas sociais explodem é no âmbito municipal.

A crise atual e suas repercussões no plano municipal têm raízes na condução desastrosa da economia nos últimos anos e em múltiplas faces: recessão abalando o desempenho da economia e fazendo despencar as receitas do ICMS, da Cide, do FPM e do ISS; desonerações unilaterais pelo governo federal, retirando receitas sem compartilhamento das decisões; novos encargos importantes oriundos de decisões nacionais, mas sem a devida contrapartida financeira (piso nacional dos professores, política de valorização do salário mínimo, piso do agente comunitário, sobrecarga no transporte escolar e na assistência à saúde).

Mesmo municípios com maior autonomia sofrem com a drástica redução dos royalties derivada de problemas setoriais (mineração, petróleo e energia). E, para agravar o quadro, a interrupção radical da transferência de recursos de convênios e financiamentos por parte dos governos federal e estaduais.

Dentro da necessária agenda de reformas estruturais para relançar o país na trajetória do desenvolvimento, é imprescindível colocar o fortalecimento dos municípios no centro das discussões sobre a reforma do Estado, a reforma tributária e fiscal e a nova dinâmica federativa.
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Marcus Pestana, deputado federal (PSDB-MG)

O PT desconfia de tudo – Editorial / O Estado de S. Paulo

A Constituição Federal proíbe as candidaturas independentes. Há norma expressa estabelecendo como uma das condições de elegibilidade a filiação partidária (art. 14, § 3.º, V). Não se trata de uma regra meramente formal – é parte constitutiva do sistema político brasileiro que a representação seja intermediada pelos partidos políticos. O PT, no entanto, deseja inverter essa lógica, passando a assumir expressamente a identidade de um covil de quem lá queira se abrigar.

Recentemente o presidente nacional do PT, Rui Falcão, informou que o partido introduzirá na carta compromisso dos candidatos petistas nas eleições municipais de outubro uma cláusula em que se declaram “plenamente responsáveis” por sua campanha, especialmente em relação ao financiamento – aspecto que, como se sabe, nos últimos anos vem dando muita dor de cabeça às lideranças petistas, além de presença constante nas páginas policiais.

A medida anunciada por Falcão evidencia que o partido não deseja se responsabilizar por seus candidatos e suas campanhas. A mensagem é clara: cada um por si. A filiação partidária torna-se adereço formal. Ora, isso é o oposto da razão de ser dos partidos enquanto agrupamentos políticos com identidade e compromisso não apenas ideológico, mas também de cumprimento da lei.

Com a novidade petista, o eleitor passa a se relacionar diretamente com o candidato, sendo o partido absolutamente irrelevante durante a campanha eleitoral. Pior. Se a legenda não confia em seus candidatos – e exige que cada um assuma “plenamente” a responsabilidade por sua campanha –, por que o cidadão entra nessa relação de desconfiança, dando seu voto ao candidato em descrédito ou ao partido irresponsável? Trata-se de um profundo retrocesso político e institucional essa formalização da desconfiança.

Durante a reunião da Executiva Nacional do PT, Rui Falcão afirmou que “não é desconfiança de ninguém, mas, como muitas vezes há um erro, um deslize, não queremos que haja nenhuma responsabilização do partido”. Pode-se usar as palavras que queira, mas a proposta do PT passa distante de qualquer relação de confiança. A mensagem de Falcão é cristalina – o PT não quer se responsabilizar pela lisura das campanhas de seus candidatos.

Além de ser um abandono da ideia de partido – como entidade de intermediação política, congregando ideias e pessoas e assumindo plenamente as candidaturas de seus filiados –, a esquiva da responsabilidade pelas campanhas indica também que o PT não se julga capaz de permanecer íntegro nos limites da lei.

Depois de tantas denúncias de corrupção envolvendo campanhas petistas – e constando no histórico da legenda a prisão de dois de seus tesoureiros –, era de esperar que o PT se emendasse, revendo seus procedimentos e acompanhando muito de perto as campanhas de seus candidatos. Assim, ao menos, mostraria algum aprendizado depois de anos de tanta lambança.

O partido, no entanto, não parece disposto a mudar de rota. A novidade anunciada por Rui Falcão é simplesmente a blindagem da legenda, para que não seja responsabilizada por atos de corrupção eleitoral praticados por seus candidatos. A preocupação não é fazer com que as campanhas sejam conduzidas estritamente dentro da lei. A Executiva Nacional do PT está preocupada, isso sim, em proteger o partido dos efeitos da lei.

Essa atitude demonstra também uma absoluta despreocupação com os reclamos da sociedade, que exige novos patamares de honestidade na política. Depois de tantas denúncias de corrupção e condenações judiciais envolvendo políticos, o mínimo que se pode esperar dos partidos nas próximas eleições municipais é um claro compromisso com a ética. A sociedade está cansada de subterfúgios, de manobras, de saídas pela tangente, de soluções jurídicas enviesadas cuja única finalidade é a manutenção de um jogo político com práticas mafiosas. O PT, no entanto, despreza soberbamente tais anseios – e contribui mais uma vez para que a sociedade descreia da política. Será apenas natural que o eleitor não confie no candidato do qual o próprio partido – o Partido dos Trabalhadores – desconfiou.