quinta-feira, 3 de agosto de 2023

Merval Pereira – Chanchada

O Globo

Walter Delgatti, o hacker de Araraquara, comparado pela esquerda a Snowden, acabou nos braços de Bolsonaro

Este caso do hacker de Araraquara, que ajudou a tirar Lula da cadeia e pode levar Bolsonaro a ela, é típico de uma chanchada bem brasileira. Walter Delgatti jura que entrou no aplicativo Telegram dos procuradores da Lava-Jato e do então juiz Sergio Moro, por acaso, quando estava hackeando um juiz que o condenara. Fez o trabalho sujo de revelar os diálogos do que ficou conhecido por Vaza-Jato de graça, sem interesses políticos ou monetários.

Como teria ficado magoado com o tratamento do PT, que não lhe deu o devido valor pela desmoralização da Lava-Jato e consequente soltura do hoje presidente Lula, foi procurar abrigo no governo Bolsonaro e acabou invadindo a rede do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) a pedido da deputada federal Carla Zambelli.

O advogado Ariovaldo Moreira, em entrevista memorável no Estúdio I, da GloboNews, em que seu silêncio confirmou muitas informações, insinua que Delgatti prepara-se para uma delação premiada. Teria ouvido de Bolsonaro pessoalmente, e depois por celular frio, uma encomenda para invadir as comunicações do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes e para provar que as urnas eletrônicas eram vulneráveis. As urnas passaram no teste, e o hacker não conseguiu invadi-las. Mas o sistema do CNJ e os dados do ministro do Supremo teriam sido violados, a ponto de Delgatti ter expedido uma ordem de prisão de Moraes contra si mesmo, numa molecagem eletrônica sem valor jurídico, mas de resultado político inegável. Bolsonaro deve ter morrido de rir.

Míriam Leitão - BC começa bem o ciclo de queda

O Globo

O Copom cortou a Selic em meio ponto porque havia espaço e isso até os que apostavam em 0,25 ponto concordam. É o início do ciclo de redução que irá até o ano que vem

O que o Banco Central iniciou ontem foi um ciclo de queda dos juros que vai se estender até o ano que vem. A queda de 0,5 ponto percentual era a previsão minoritária no mercado, mas foi a decisão acertada, já que todas as condições estão dadas para isso. A mais importante delas é a desinflação que, em um ano, levou o índice de preços dos dois dígitos aos 3%. Parte desse resultado é trabalho do próprio Banco Central. A decisão de ontem não foi resposta à pressão política nem reflexo das críticas de autoridades do governo, mas sim consequência natural da evolução dos indicadores. Havia espaço para a queda.

O BC votou dividido e os dois indicados pelo governo Lula fizeram a diferença. Os diretores de política monetária e de fiscalização, Gabriel Galípolo e Ailton de Aquino votaram com outros três dirigentes, entre eles, o presidente do BC, Roberto Campos Neto, pela redução de meio ponto. Quatro diretores ficaram em minoria na defesa de um corte de 0,25 ponto. Essa divisão vai desaparecer, e nas próximas três reuniões do ano, a taxa deve cair outros 0,5 ponto e com a unanimidade dos votos porque isso foi dito no comunicado.

Malu Gaspar – Lula x Lira

O Globo

Lula opera guerra de nervos com Lira de olho na sucessão da Câmara

Já fez “mesversário” a negociação para a entrada da trupe de Arthur Lira no governo Lula. A conversa começou animada e com o PP confiante, reivindicando uma cesta de cargos em que o Ministério da Saúde ocupava o topo das prioridades. Lula mandou dizer que nada feito. A pretensão foi mudando, e agora o partido quer a presidência da Caixa e mais um ministério, de preferência o do Desenvolvimento e Assistência Social. Nos dois casos, os nomeados seriam parceiros incondicionais do presidente da Câmara: a ex-deputada federal Margarete Coelho, do PP do Piauí, que iria para o banco estatal, e o deputado André Fufuca, do PP do Maranhão, a quem caberia o ministério.

Depois de um julho de muita conversa e telefonemas entre Lula e Lira intermediados pelo ministro Alexandre Padilha, o Congresso voltou do recesso contando que o chefe do Centrão e o do Planalto se reuniriam logo nos primeiros dias de agosto para desfazer o impasse. Pois agosto começou, os parlamentares desembarcaram em Brasília, Lula analisou as propostas de Padilha para acomodar os interesses de todos na reforma ministerial e… nada aconteceu.

Luiz Carlos Azedo - Ações policiais no Rio e São Paulo lembram o “Esquadrão da Morte”

Correio Braziliense

Os governadores Cláudio Castro (PL) e Tarcísio de Freitas (PR) endossaram a escalada das ações policiais como política de segurança e, simultaneamente, um ativo eleitoral

Como jovem repórter dos jornais O Dia e a Notícia, no começo dos anos 1970, trabalhei na Baixada Fluminense, mais precisamente em Duque de Caxias (RJ). Como esses veículos alavancavam suas vendas com notícias policiais, a sucursal local disputava a manchete do jornal um dia sim e o outro também, por causa da violência que existia naquela região, onde antigos laranjais foram loteados e transformados numa espécie de terra de ninguém.

O falecido repórter Airton Assis, meu colega, realizava todos os dias uma ronda pelas delegacias da região, que havia se tornado uma das mais violentas do país. Era raro o dia em que terminava o périplo pelas delegacias dos distritos de Nova Iguaçu, Nilópolis e São João de Meriti sem o registro de um latrocínio, um feminicídio ou, principalmente, uma execução policial.

Maria Hermínia Tavares* - Resistência em surdina

Folha de S. Paulo

Investidas de desmonte não faltaram nos quatro anos do pesadelo do qual o país há pouco despertou

Quem hoje discute como o país e a democracia sobreviveram a Bolsonaro aponta, com razão, o papel desempenhado pelo STF (Supremo Tribunal Federal) e o TSE (Tribunal Superior Eleitoral); pelo Congresso; por estados e municípios; pela grande imprensa; e por ampla parcela da sociedade civil organizada. Juntos, ergueram uma barreira que não só limitou a capacidade do ex-capitão de produzir estragos irremediáveis, mas fez gorar seus planos golpistas, depois da derrota nas urnas.

Ainda assim, a história da resistência democrática não estará contada por inteiro sem que nela se inclua a ação silenciosa de setores importantes da burocracia às tentativas de desmanche da capacidade de ação estatal orientadas pelo Planalto. Esse capítulo pouco conhecido é um dos assuntos centrais do livro "Desmonte e reconfiguração de políticas públicas (2016-2022)", recém-publicado pelo Ipea (Instituto e Pesquisa Econômica Aplicada). É o respeitável resultado do trabalho de 40 pesquisadores coordenados por Alexandre de Avila Gomide, Michelle de Sá e Silva e Maria Antonieta Leopoldi.

Bruno Boghossian – Eles só pensavam naquilo

Folha de S. Paulo

Missões dadas ao hacker eram sinal de desespero golpista

A gana bolsonarista por um golpe pode ser medida pelo número de vezes em que a turma acionou o hacker Walter Delgatti na reta final da eleição. Ele teria recebido quatro missões para tumultuar a campanha, atacar a credibilidade do TSE e abrir caminhos para melar a votação.

A convocação do hacker foi uma daquelas ideias ambiciosas de quem tem teorias da conspiração nas veias. Ao conhecer Delgatti em setembro de 2022, a deputada Carla Zambelli perguntou se ele conseguiria invadir as urnas eletrônicas para provar uma suposta vulnerabilidade.

Thiago Amparo - Chacina por vingança

Folha de S. Paulo

Onde estão as câmeras que mostrarão a tortura a céu aberto?

O governador está nu, e por baixo dele há sangue. Tarcísio, o político vendido como um bolsonarista moderado (um oxímoro), desmoderou o que nunca foi comedimento: por baixo da roupagem de um político que sabe, ao contrário de Bolsonaro, aparentar seriedade quando lhe convém, resta a promoção explícita da violência, único produto que o seu partido, o do fuzil, sabe vender. O governador paulista quer vender uma ideia: inevitabilidade.

Quer que acreditemos que é inevitável que segurança pública signifique torturar, até a morte, o vendedor ambulante Felipe Vieira Nunes, 30. "Ouvimos tiros. Ele só gemia de dor e implorava por ajuda", disse uma moradora de 28 anos. Quer que acreditemos que é inevitável que segurança pública signifique aterrorizar a população. "Ele [policial] disse que daria um tiro na minha cara na frente da minha filha", declarou um morador de 34 anos. Não é.

Ruy Castro - Homens que sabiam demais

Folha de S. Paulo

O assassinato de Marielle está custando caro a quem o praticou e a quem o encomendou

De todos os crimes previstos no catálogo, um dos com mais agravantes é a obstrução da Justiça. Comete-se um assassinato e pode-se pegar longa cana por ele; mas, se se tenta impedir que a lei chegue a quem o encomendou, a pena deveria dobrar. Afinal, o encobrimento, às vezes, é mais complexo do que o crime em si. Exige o apagamento tanto de armas, impressões digitais, pistas telefônicas, transações bancárias, câmeras de segurança e processos judiciais quanto de testemunhas, cúmplices e intermediários.

Maria Cristina Fernandes - A polícia que desafia Tarcísio e ameaça SP

Valor Econômico

Operação no Guarujá expõe a pressão pela sobrevivência política do bolsonarismo

A reação policial à morte do soldado Patrick Reis, no Guarujá, litoral paulista, expôs a fratura pelo controle político do Estado de São Paulo.

A eleição que levou Tarcísio de Freitas ao Palácio dos Bandeirantes recrudesceu a guerra interna entre as forças policiais e desafia a autoridade do governador sobre o aparato de segurança do Estado.

Até sua posse, prevaleceu, sobre a banda “bandido bom é bandido morto” da polícia, uma política de segurança baseada em evidências, com ouvidoria e convênios com entidades civis.

Prevalência não pressupõe supressão. A polícia de São Paulo sempre abrigou matadores travestidos de policiais e sócios de atividades econômicas ilegais, dominadas por facção criminosa, sendo o tráfico de drogas a maior delas.

A prevalência levou à adoção de câmeras nos uniformes policiais. Vários Estados adotaram a política, mas não com a obrigação de descarregar as imagens numa central que permite o acesso diário de comandantes de batalhões ao cotidiano dos policiais.

Luiz Antônio de Lima Jr* - As lições do monetarismo

Valor Econômico

Contração do estoque de moeda nos EUA foi mais forte que no Reino Unido

Um nome muito conhecido nos bastidores da economia é Paul Volcker, ex-presidente do Banco Central dos EUA (Fed), que presidiu a autoridade monetária entre 1979 e 1987. Apesar de Volcker ter feito algumas críticas ao monetarista Milton Friedman, ele é conhecido como herói por ter acabado com o período de elevada inflação nos EUA, período conhecido como estagflação, por meio do uso do receituário monetarista proposto por Friedman.

No final da década de 70, o Fed reduziu em uma velocidade acelerada a quantidade de moeda na economia, fazendo com que a taxa de juros subisse de 10,94%, em agosto de 1979 (ano em que Volcker assumiu o Fed), para 13,78% em dezembro de 1979, e 18,9% no final de 1980. Essa política monetária arrastou a economia norte-americana e do mundo para uma rápida, porém severa, recessão que logo foi debelada com a queda da inflação e consequente queda da taxa de juros.

O clima de incerteza política, com toques de irresponsabilidade, causou um pânico no mercado financeiro britânico e mundial, o que forçou o BoE a anunciar uma expansão no estoque de moeda, num momento em que os juros disparavam e a libra derretia

William Waack – Para que?

O Estado de S. Paulo

Megacoligação costurada por Lula impede unidade de ação

Lula 3 caminha para ser o governo coração de mãe, onde sempre cabe mais um. No caso, mais um partido numa megacomposição governista em linha com a essência da política brasileira: a acomodação dos mais variados interesses privados e setoriais via cofres públicos.

Essa fórmula de amplo espectro nada tem a ver com um “pacto” ou uma “concertación” nacional diante de crises ou desafios importantes para o País. Ela espelha uma enorme dispersão de projetos, impulsos, problemas a serem resolvidos e linhas de atuação, sem uma clara direção central.

Lula 3 quer gastar mais sem tributar mais, reindustrializar via Estado sem ter recursos suficientes, corrigir distorções sem mexer nelas, atender a interesses contraditórios (como na transição energética) sem antagonizar nenhum. As negociações com o Centrão expressam exatamente essa salada de linhas de atuação, sem que se possa esperar o “triunfo” decisivo de qualquer uma delas (incluindo as do PT).

Rolf Kuntz - Otimismo e pressão política

O Estado de S. Paulo

Ao cortar 0,5 ponto, o Copom pode ter enviado um sinal de paz ao presidente da República

Vitória de Lula ou política de juros em novo estilo, mais parecido com a do Federal Reserve (Fed), o banco central americano? Ao cortar 0,5 ponto porcentual da taxa básica, o dobro da redução projetada pela maior parte dos analistas, o Comitê de Política Monetária (Copom) pode ter enviado um sinal de paz ao presidente da República, um crítico impiedoso da austeridade monetária. Mas também pode ter simplesmente iniciado uma nova estratégia – trabalhar contemplando um prazo maior, para alcançar no prazo de dois anos a meta de inflação de 3%. As próximas decisões poderão esclarecer esse ponto.

A meta de 3% coincide com a inflação estimada pelos economistas do BC para 2025. Os condutores da política anti-inflacionária podem ter antecipado a mudança discutida recentemente, no Conselho Monetário Nacional (CMN), com os ministros da Fazenda e do Planejamento. A nota divulgada logo depois da reunião do comitê, ontem, menciona a conversa entre os membros do Conselho.

Felipe Salto* - O risco de um IVA com maior alíquota do mundo

O Estado de S. Paulo

Quanto mais exceções, maior será a alíquota somada do IBS e da CBS para gerar 11,8% do PIB (12,5% menos 0,7% de IPI). O mesmo raciocínio vale para a sonegação

A Câmara dos Deputados aprovou a PEC n.º 45/2019 antes do recesso parlamentar. Agora, o Senado poderá, como fez no caso do novo arcabouço fiscal, apresentar emendas. Outro caminho é a alteração mais expressiva por meio da chamada emenda aglutinativa. Vou abordar, neste artigo, um dos oito problemas que apontei na coluna da quinzena passada: as exceções e seus impactos na alíquota do Imposto sobre Valor Adicionado (IVA).

O objetivo da reforma é substituir cinco tributos sobre bens e serviços por um imposto que se aproxime de um IVA não cumulativo e no destino (consumo final). Para viabilizar a aprovação na Câmara, optou-se pelo IVA dual: a CBS, em substituição à Confins e ao PIS; e o IBS, em substituição ao ICMS e ao ISS. Já o IPI será substituído pelo imposto seletivo, incidente sobre bens prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente.

Noves fora o festival de letras, a descrição acima é a essência da reforma que se pretende empreender desde há muito. Entretanto, o maior risco está no rumo que a proposta tomou. É preciso destacar que os cinco tributos a serem substituídos arrecadam 12,5% do PIB (média de 2017 a 2021), algo como R$ 1 trilhão. O diabo mora nos detalhes e, no caso em tela, dá as caras logo no caput de cada artigo da PEC.

Um dos muitos desafios é conter os grupos de interesse que pressionam por tratamento diferenciado. Quanto mais exceções, maior será a alíquota somada do IBS e da CBS para gerar 11,8% do PIB (12,5% menos 0,7% de IPI). O mesmo raciocínio vale para a sonegação.

Roberto Macedo* - Selic e inflação: a dosagem inadequada

O Estado de S. Paulo

O Copom se atrasou ao aumentar a taxa básica de juros e, se ela caiu ontem, também houve atraso na sua redução

Escrevi este texto antes de o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central anunciar ontem a decisão de queda ou não da Selic, a taxa básica de juros, que estava em 13,75% ao ano. Na terça-feira, este jornal publicou a matéria 70% do mercado vê Selic 0,25 menor (1/8, B1). Os 30% restantes previam redução de 0,50. A Selic passou a subir quando estava em 2% e repetiu-se, aqui, um debate que na literatura sobre o assunto é conhecido como um entre gaviões e pombos.

Os gaviões argumentam que manter a inflação baixa é a prioridade maior da política monetária, enquanto os pombos defendem, entre outros aspectos, reduções da taxa básica de juros para estimular o crescimento da economia. Aqui, no Brasil, o líder do primeiro grupo é o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, enquanto Lula se destaca no segundo grupo, tendo o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, como seu parceiro, ainda que mais discreto.

O que a mídia pensa: Editoriais / Opiniões

BC inicia ciclo de queda dos juros com corte de 0,5 ponto

Valor Econômico

Voto de Campos Neto normaliza a nova realidade: os diretores, afinal, divergem e isso não é ruim

O Banco Central deu início ontem ao ciclo de baixa dos juros com um corte significativo de 0,5 ponto percentual e sinal de nova redução da mesma magnitude na próxima reunião. O tamanho do corte, de 0,25 ou 0,50 ponto, não era a única dúvida dos investidores. A outra, igualmente delicada, era sobre como os novos indicados para a diretoria de Política Monetária, Gabriel Galípolo e de Fiscalização, Ailton Aquino, abririam divergência com a ala mais ortodoxa do Banco Central, como seria expressa no comunicado do Copom suas posições e qual seria a atitude do colegiado. Galípolo e Aquino defenderam o corte de 0,5%, mas foram apoiados pelo presidente do BC, Roberto Campos Neto e mais os diretores Carolina Barros e Otávio Damaso. A decisão foi apertada: 5 a 4. O diretor de Política Econômica, Diego Guillen, a diretora de Assuntos Internacionais, Fernanda Guardado e mais dois diretores votaram por ajuste mais moderado, de 0,25 ponto percentual.

Poesia | Fernando Pessoa - Quadras ao gosto popular

 

Música | João Bosco - Quando o amor acontece