“ Em uma democracia de massas, uma sucessão presidencial suspende a marcha ordinária da política, põe sob tela de juízo o script até então estabelecido e se abre às promessas da novidade. Como em uma novela, esse é um momento em que se começa a delinear o esboço de um próximo capítulo a partir da interpretação do que acaba de se viver. Toda história tem um autor, em princípio o senhor da trama que tece, mas todos já ouvimos falar da experiência de escritores que se surpreenderam quando viram personagens, nascidos da sua imaginação, ganharem animação autônoma, passando como que a agir por conta própria. ”
Política e cultura, segundo uma opção democrática, constitucionalista, reformista, plural.
quarta-feira, 26 de maio de 2010
Reflexão do dia – Luiz Werneck Vianna
“ Em uma democracia de massas, uma sucessão presidencial suspende a marcha ordinária da política, põe sob tela de juízo o script até então estabelecido e se abre às promessas da novidade. Como em uma novela, esse é um momento em que se começa a delinear o esboço de um próximo capítulo a partir da interpretação do que acaba de se viver. Toda história tem um autor, em princípio o senhor da trama que tece, mas todos já ouvimos falar da experiência de escritores que se surpreenderam quando viram personagens, nascidos da sua imaginação, ganharem animação autônoma, passando como que a agir por conta própria. ”
O fator Minas :: Merval Pereira
Minas Gerais mais uma vez está no centro da disputa política, e o que acontecer lá será fundamental para a eleição presidencial. O ex-governador Aécio Neves está chegando de Londres hoje e traz com ele muitas dúvidas e uma pequena chance de mudar de ideia para ser vice na chapa tucana. Do lado governista, indícios tênues de que a coalizão entre PT e PMDB pode não estar tão tranquila quanto aparenta.
O ex-prefeito Fernando Pimentel, escolhido em prévias partidárias o candidato do PT ao governo, parece estar se interessando pela campanha, o que colocaria em risco o apoio à candidatura de Hélio Costa pelo PMDB.
Uma decisão de Aécio em direção à vice de Serra teria um efeito que pode ser decisivo na eleição, mas será preciso convencê-lo disso.
E uma divisão na base governista em Minas pode provocar uma reviravolta na própria coalizão nacional com o PMDB, o que daria uma nova dimensão no programa de propaganda gratuita.
Vamos por partes: o governador Aécio Neves chega disposto a atualizar suas informações, e uma coisa é certa para os que conversaram com ele: a situação de hoje não é a mesma de 90 dias atrás, quando não havia força humana que pudesse fazêlo mudar de ideia.
Agora, há uma chance, embora pequena. O ex-governador não quer de jeito nenhum passar a ideia de que não se empenhou o suficiente para uma vitória nacional do PSDB.
A mudança, se ocorrer, terá sido porque ele se convenceu de que sua entrada em cena como vice pode ser decisiva na disputa, como hoje consideram alguns de seus principais conselheiros.
Ele ainda não se convenceu disso; vai ser preciso analisar pesquisas, certamente será um processo lento, e não é da índole dele decidir de chofre.
A entrada de Aécio na disputa direta traria alguns benefícios para o PSDB, e o principal deles, além de unir os dois maiores colégios eleitorais do país em torno da candidatura Serra, seria poder fazer duas campanhas ao mesmo tempo, pela dimensão política de ambos.
A campanha se multiplicaria, na visão predominante entre os tucanos. Além disso, essa definição pode ajudar a campanha de Antonio Anastasia ao governo de Minas, que ainda não decolou, embora já esteja próximo dos 20%, outra hipótese que ainda falta provar para convencer Aécio.
Até o momento, ele acha que sua presença em Minas na campanha para o Senado ajuda mais a do governador.
Seu primeiro movimento será na direção da campanha mineira, já neste fim de semana, enquanto deixa maturar a ideia de vir a ser vice.
Há ainda as contas que estão sendo feitas na direção nacional do PSDB, tendo em vista que a campanha polarizou de vez, e tudo indica que a disputa será acirrada em todas as regiões do país.
Diante desse quadro, é preciso colocar uma diferença grande nos dois estados, Minas e São Paulo, para compensar os lugares em que o PSDB vai perder com essa polarização.
Em Minas, embora a diferença esteja sendo reduzida, o PSDB está na frente depois de ter perdido as duas últimas eleições.
Os que defendem a presença de Aécio Neves na chapa tucana acreditam, que, se ele entrar, a diferença hoje, em torno de 300 mil votos pelas pesquisas, seria ampliada, podendo chegar a dois ou três milhões de votos, o que a história das eleições mostra que é perfeitamente factível.
Em 2002, Lula venceu em Minas com 2,8 milhões de votos de diferença, índice que caiu para cerca de um milhão de votos em 2006. Em 1994, Fernando Henrique venceu por cerca de três milhões de votos, diferença que caiu para dois milhões em 2006.
É preciso, porém, que Aécio se convença de que somente sendo vice poderá alavancar essa diferença para a chapa tucana.
A outra ponta da equação eleitoral mineira é a coalizão entre PT e PMDB, não inteiramente assimilada pelos petistas, que têm um partido muito forte no estado.
O ex-prefeito Fernando Pimentel, um dos coordenadores da campanha de Dilma Rousseff, parece estar nos últimos dias revendo sua posição sobre o partido dar apoio a Hélio Costa, dentro de um panorama mais amplo de resistência do PT nacional às exigências do PMDB.
Setores petistas já haviam feito chegar indiretamente à direção nacional do PMDB a ideia de que, se o partido insistisse em ter a cabeça de chapa em estados prioritários para o PT, como Minas, a coalizão poderia ser rompida, com o PSB indicando o vice da chapa oficial.
Essas bravatas, impulsionadas pelo resultado das últimas pesquisas, pareceram ao PMDB coisa de amador, e assim estão sendo tratadas até o momento.
No limite, pode haver uma reviravolta no cenário mineiro com o retorno do ex-governador Aécio Neves.
Já houve momentos das negociações, quando Dilma Rousseff apoiou a chapa Dilmasia Dilma e Anastasia , em que Hélio Costa ameaçou bandear-se para a ala tucana, defendendo a chapa Serrélio, numa referência ao apoio que poderia dar ao candidato tucano, José Serra.
Nada impede que uma negociação desse tipo seja feita, ou até mesmo que Hélio Costa, vendo seu desejo de ser candidato ao governo ser bombardeado pelo PT, prefira se candidatar novamente ao Senado numa coligação PMDB-PSDB, caso em que a candidatura de Aécio Neves a vice de Serra ganharia mais consistência.
Por enquanto, a maior possibilidade é a de que esses cenários não mudem tão drasticamente, e tudo indica que Aécio terá que atuar mesmo para emplacar seu candidato Antonio Anastasia contra a coligação PMDB-PT, com a candidata petista ressaltando a sua mineiridade.
Mas em política em Minas tudo pode acontecer.
Na coluna de domingo, por um lapso identifiquei Henry Kissinger como ex-secretário de Defesa dos Estados Unidos. Ele foi secretário de Estado.
Veracidade ideológica:: Dora Kramer
Quem almeja um posto por meio da conquista de votos evidentemente precisa mostrar os seus melhores atributos aos potenciais eleitores.
Daí que ressaltar qualidades e amenizar defeitos não subtrai legitimidade de candidatos nem faz de ninguém só por isso um fingidor. Mas há limites.
O exemplo clássico no que tange à ultrapassagem de todos eles na montagem de um candidato cujas ações eram meras reações às demandas detectadas pela área de marketing da campanha e depois de eleito revelou-se um presidente inepto, foi Fernando Collor de Mello.
Mas, deixemos as profundezas aos seus e voltemos à superfície que nada tem a ver com aquilo que nos serve apenas como referência extrema sobre os riscos dos exageros nos truques e das encenações a que se prestam os políticos para sensibilizar, despertar simpatia ou mesmo não ferir suscetibilidades do eleitorado.
Há maneiras e maneiras de se fazer isso. Resultados e resultados. Uns ficam pelo meio do caminho, vítimas de personagens excessivamente postiços. Quem se sai melhor aproveita o que já havia de bom em si e deixa fluir a autenticidade. Prova clássica e máxima: Luiz Inácio.
Mas, antes de falar dele nesse contexto face à campanha eleitoral em curso para dizer de Dilma Rousseff, falemos do adversário, José Serra, que ontem na sabatina dos candidatos (vamos nos acertar que pré-candidato é eufemismo?) na Confederação Nacional da Indústria apareceu de roupa nova.
Ou melhor, de roupa velha. Quem se sentou ali com os empresários já não era o sujeito inexpressivo que não se assumia de situação nem de oposição. Que depois de alinhavar um projeto de boas pensatas no marco inicial da trajetória em 10 de abril passou o resto do tempo fazendo repetidas louvações ao presidente da República.
Não que não pudesse elogiar Lula. Inclusive porque o faz no particular. Mas daí a transformar isso em exercício diário e exacerbado ao ponto de dizer que o presidente está "acima do bem e do mal", avalizando inclusive as infrações de Lula à Lei Eleitoral, já parecia algo meio tolo.
Ou ação decorrente de excesso de reverência estratégica ao axioma: em Lula ninguém mexe.
Uma parcela do eleitorado poderia até se perguntar por que Lula pode mexer com todo mundo sem encontrar paradeiro. Covardia? Cálculo? Neste caso, tanta amabilidade decorre de uma tentativa de criar uma situação ilusória.
Quem sentou no auditório da CNI? Um homem crítico, exigente que expôs o rol dos erros que sempre apontou no governo: taxa de juros, incapacidade de escalonar investimentos, aparelhamento da máquina, falta de planejamento, má qualidade de gestão etc.
Pediu confronto de ideias candidato a candidato. Delineou seu campo e pôs suas cartas. Vai agradar? Outros quinhentos a serem conferidos adiante, mas ao menos deixou de se fazer de desentendido a respeito de questões que alguém que pretende governar um país precisa necessariamente abordar com clareza.
O adversário pode não aceitar o embate proposto. Não é obrigado a jogar na regra do oponente.
Do ponto de vista de quem precisa escolher o governante interessa é ter o máximo de informações a respeito dos concorrentes. Quantitativa e qualitativamente falando. Os dados precisam ser verdadeiros, guardar relação com a realidade.
E aqui chegamos a Dilma e a candidaturas nascidas das costelas alheias. A origem não pode condená-las, é certo. Desde que no processo consigam adquirir vida própria.
A subida de Dilma nas pesquisas, e vamos nos ater apenas só à mais recente, é atribuída à presença do presidente Lula na televisão. Ninguém se refere a uma possível melhoria do desempenho dela.
Vamos que Dilma seja eleita presidente. Ela governará sob a escora de Lula que lhe transferirá expertise, por exemplo, para lidar com o Congresso?
Não? Então é preciso que se dê ao eleitor a chance de conferir, o que não se faz com pontos porcentuais em pesquisas produzidos artificialmente por colagem da imagem de outrem.
Calibragem:: Fernando Rodrigues
A longa exposição dos três principais candidatos a presidente ontem na Confederação Nacional da Indústria serviu para observar como cada um vai ajustando a sua estratégia.Dilma Rousseff (PT) fez o discurso conhecido. Números e relatos de realizações do governo. Falou o que os empresários gostam de ouvir, exceto ao defender a ortodoxia de Lula nos juros.
Embora ainda não esteja desenvolta como políticos tarimbados, é inegável o avanço da petista na técnica de falar em público. Está num estágio de ajustes.
Marina Silva (PV) convidou os empresários a "sonhar mais" e a "antecipar o futuro". É talvez o discurso mais simpático, mas soa desconectado da realidade. Pelo menos até agora, os eleitores não reverberam as palavras da candidata verde.
Por fim, José Serra (PSDB) continua perseguindo uma condição inaudita. Deseja atuar de três formas ao mesmo tempo:
1) sendo o candidato de oposição;
2) preservando o popular Lula;
3) atacando o lulismo patrimonialista no governo federal.
Trata-se de um algoritmo político difícil de ser decifrado. O tucano parece estar trabalhando com o método de tentativa e erro.
Ontem, ao discursar, Serra bateu no que chamou de falta de planejamento da administração federal. Foi sarcástico ao dizer não entender quando Dilma explica impostos e taxa de juros.
Em semanas recentes, Serra evitava apontar defeitos em Lula e em sua candidata. No encontro da CNI, mesmo sem ser beligerante, foi explícito nas críticas.
É uma calibragem nova. Talvez efeito da alta da petista nas pesquisas. Não há ainda como aferir o efeito dessa alteração tática. Mas o tucano sinaliza estar saindo da cartilha seguida nos últimos dias.
UGT rompe a aliança das centrais pró-Dilma
"Nossa base é pluripartidária, temos PT, PV e PSDB. Posso causar insatisfação. Não há consenso nem maioria"
Leila Suwwan
SÃO PAULO. A União Geral dos Trabalhadores (UGT) decidiu abandonar a Conferência Nacional dos Trabalhadores, em 1o -de junho, por considerar que o evento será uma demonstração de apoio a Dilma Rousseff, pré-candidata do PT à Presidência.
Os dirigentes da UGT avaliaram que a petista poderá comparecer ao estádio do Pacaembu, em São Paulo, apesar de não estar convidada, e romperam a aliança informal e inédita das seis centrais sindicais de apoio à petista.
O Lula é uma coisa. Do ponto de vista sindical, é o melhor presidente que já tivemos.
Mas, agora, estamos em outro processo, e isso merece toda cautela disse Ricardo Patah, presidente da UGT, que se declara admirador de Dilma.
Nossa base é pluripartidária, temos PT, PV e PSDB.
Não posso fazer uma atividade definida (de apoio a Dilma), porque posso causar insatisfação.
Não há consenso nem maioria.
Perguntado sobre se tem certeza de que a conferência será um ato de apoio a Dilma, Patah respondeu: Não há dúvida. É lógico! Desde janeiro, quando as seis centrais CUT, Força Sindical, CTB, CGTB, UGT e Nova Força começaram a planejar a conferência, a meta era produzir um documento único e declarar apoio ao pré-candidato mais adequado. À época, o presidente da CUT, Arthur Henrique, afirmou que as centrais são autônomas, mas têm lado na política: A direita nunca abriu espaços para os trabalhadores.
Pelo contrário, sabemos o que ela representa: privatização, desmonte do Estado, arrocho salarial, precarização e desemprego.
Das seis centrais sindicais, apenas a UGT e a Força Sindical não declararam apoio aberto a Dilma. Ligada ao PDT, partido que ocupa hoje o Ministério do Trabalho, a Força tem uma dissidência interna.
A tendência, segundo dirigentes, é permitir que os filiados sigam suas tendências políticas, mas Paulo Pereira da Silva, o Paulinho da Força, deve manter o discurso de apoio a Dilma e de rejeição ao tucano José Serra, que já chamou de político que não gosta de trabalhador.
O debate organizado pelas seis centrais sindicais em São Bernardo do Campo (SP), em 10 de abril, tornou-se uma espécie de comício pró-Dilma.
Os eventos sindicais de São Paulo no 1ode maio, também.
Para o evento de 1ode junho, Dilma não está mais convidada, e a expectativa oficial é de que o presidente Lula também não compareça.
No evento no estádio do Pacaembu, haverá a votação simbólica do documento com mais de 270 diretrizes eleitorais, que contém propostas como o direito irrestrito de greve, a descriminalização do aborto e a participação formal de sindicatos em empresas estatais, agências reguladoras e instâncias como o Comitê de Política Monetária (Copom).
Deputados do PMDB reagem a ameaça de Lupi
De constrangimento desnecessário a expressões mais duras, como chantagem, foram usadas ontem por deputados do PMDB para rebater o presidente nacional licenciado do PDT, Carlos Lupi. O pedetista ameaçou retirar o seu partido da aliança com José Fogaça (PMDB) para a disputa ao governo do Estado.
A reação de Lupi, também ministro do Trabalho de Lula, ocorreu depois do encontro da bancada estadual do PMDB com o candidato do PSDB à Presidência, José Serra, na quinta-feira, em Porto Alegre. O PDT cobra o apoio dos peemedebistas gaúchos a Dilma Rousseff (PT). A reunião também desagradou ao presidente regional do PMDB, o senador Pedro Simon, que disse só ter tomado conhecimento do encontro pela imprensa e que precisou intervir para apaziguar os pedetistas.
Responsável pela organização da reunião com Serra, o líder do PMDB na Assembleia, Gilberto Capoani, afirmou que o grupo recebeu o tucano por uma questão de cortesia e que está aberto a conversar com os demais candidatos a presidente.
Se alguém o visita em sua casa, você não o recebe? questionou Capoani, explicando que o encontro foi pedido por Serra, que chegou a convidar a bancada para um almoço em São Paulo.
Para parlamentar, ação de ministro foi chantagem
Segundo o deputado Alberto Oliveira, a bancada em nenhum momento se comprometeu com Serra.
A reação dos dirigentes do PDT é que produziu um constrangimento desnecessário ao PMDB, que não ajuda muito politicamente afirmou.
O deputado Marco Alba era um dos mais irritados:
Não há anomalia em conversar com Serra. Estranhamos o tom de Lupi. Pelo tamanho do PMDB, não podemos nos sujeitar a esse tipo de ameaça. A ferramenta da chantagem não funciona.
Simon deixou claro que não gostou de saber da reunião com Serra pela imprensa, mas garantiu que não aplicou nenhuma reprimenda à bancada. A ordem no PMDB é esfriar os ânimos e empurrar a definição sobre o assunto para a convenção nacional, em junho. Até lá, diz Simon, a única decisão do PMDB gaúcho é defender a candidatura própria à Presidência uma proposta virtualmente já derrotada com a decisão da executiva de indicar o presidente da Câmara, Michel Temer (SP), como vice de Dilma.
O problema virá depois da convenção. A expectativa dos peemedebistas gaúchos, explica o deputado Fernando Záchia, é de que a direção libere os Estados a assumirem uma decisão de neutralidade em relação à eleição presidencial, o que, na prática, permitiria o apoio ao tucano.
Fim de férias sem pressão
Depois de descansar fora do país, ex-governador Aécio Neves retorna hoje e se concentra na campanha eleitoral no estado. Aliados descartam vice e até Serra dá sinais de desistência
Ezequiel Fagundes e Juliana Cipriani
A pressão do tucanato paulista para que o ex-governador Aécio Neves deixe de disputar o Senado para ser candidato a vice na chapa do presidenciável José Serra não deve surtir efeito.
Com a expectativa pelo retorno de Aécio e a queda de Serra nas pesquisas de opinião pública, perdendo espaço para a pré-candidata do PT, Dilma Rousseff, os tucanos voltaram a pressionar pela chapa puro-sangue. Lideranças próximas ao ex-governador, no entanto, dizem que essa possibilidade é remota e que ele não é homem de aceitar pressão. “Aécio é candidato ao Senado, pois sabe que, desta forma, ajuda mais tanto ao Serra como ao Anastasia”, disse o secretário de Governo Danilo de Castro.
O próprio José Serra deu sinais ontem de que já não conta com Aécio em sua chapa. “Não há nada que imponha o Aécio ou não. O que está acontecendo agora nas pesquisas a gente previu. Uma coisa não tem nada a ver com a outra”, afirmou depois de sabatina dos pré-candidatos à Presidência promovida pela Confederação Nacional da Indústria, em São Paulo. O presidenciável também disse nunca ter exercido pressão sobre o colega de partido.
Aécio chegou a pleitear a vaga de candidato a presidente pelo PSDB e defendeu prévias partidárias para a escolha do nome. Com a indefinição de Serra e o adiamento de uma decisão por parte do partido, no entanto, acabou abrindo mão em favor do paulista. Desde então, Aécio sustenta que vai se voltar para o estado, como pré-candidato ao Senado.
Com um discurso pacificador, o ex-governador passou praticamente todo o ano passado tentando convencer Serra e o PSDB a realizar as primárias. Apesar de sempre estar colocado nas pesquisas, Aécio sustentou que o partido deveria observar também quem reuniria maiores condições de atrair novas alianças na corrida pela sucessão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Para Aécio, a definição do presidenciável tucano deveria ter ocorrido no segundo semestre de 2009 ou, no mais tardar, no fim do ano. Em alguns momentos, ele chegou a dizer que decisão não poderia ficar restrita nas mãos de um pequeno grupo como ocorreu em 2006, quando a cúpula do partido decidiu lançar a candidatura do ex-governador paulista Geraldo Alckmin a presidente da República.
Em solo mineiro, Aécio define hoje uma agenda de atividades ao lado de Anastasia. O ex-governador também se prepara para uma série de encontros com lideranças do estado. O tucano vai conduzir as negociações com os partidos aliados pela indicação do vice na chapa de Anastasia.
Tucano compara Ahmadinejad a Hitler
Os pré-candidatos à Presidência José Serra e Marina Silva também criticaram terça-feira a política externa do governo, especialmente em relação ao Irã.
Serra chamou o presidente iraniano, Mahmoud Ahmadinejad, de ditador, comparando-o a Hitler. Para o Tucano, Ahmadinejad faz parte de um grupo de ditadores da década de 30, como Hitler e Stalin.
Em seguida, amenizando as críticas, disse não duvidar das boas intenções do governo brasileiro ao intermediar acordo nuclear do Irã, mas que descnfia do governo iraniano em relação ao cumprimento do que estabelece o texto.
Não creio que haja má intenção, mas torço para dar certo afirmou Serra.
Mais cedo, no mesmo evento, a pré-candidata do PT, Dilma Rousseff, defendeu a atuação do governo brasileiro na questão nuclear iraniana, afirmando não acreditar na política de sanções.
A pré-candidata do PV, Marina Silva, criticou a diplomacia brasileira por apoiar o projeto nuclear iraniano. Marina se disse preocupada com a relação do Brasil com o regime iraniano, afirmando que Mahmoud Ahmadinejad quer fazer a bomba atômica.
Claro que todos vemos com preocupação. Temos que ter cuidado para não dar audiência a um governante que não respeita direitos humanos, que tem presos políticos, nega o Holocausto, uma série de questões inaceitáveis. O Brasil é a única democracia ocidental que dá audiência para o Ahmadinejad disse Marina.
Depois de 15 anos...
Serra, Dilma e Marina, que foram dos últimos governos, prometem reforma tributária a empresários
Chico de Gois, Adriana Vasconcelos, Gerson Camarotti, Maria Lima e Catarina Alencastro
BRASÍLIA - Para uma plateia de empresários, os três principais précandidatos à Presidência comprometeram-se ontem com uma reforma tributária ampla, divergindo, porém, sobre a política econômica do governo Lula. Enquanto José Serra (PSDB) atacou a condução do atual modelo adotado pelo presidente Lula, criticando a política de juros altos e a carga tributária excessiva, a ex-ministra da Casa Civil Dilma Rousseff (PT) foi na direção oposta e relacionou o que, em sua opinião, são pontos positivos da gestão de seu principal cabo eleitoral: a redução da taxa Selic de juros e o respeito a contratos. Ela prometeu priorizar a reforma tributária e disse que o sistema atual é caótico.
Marina Silva (PV) equilibrou-se entre os dois, elogiando e criticando ao mesmo tempo o atual modelo.
Empatado com Dilma, segundo as pesquisas eleitorais, Serra partiu para o ataque procurando atrair a petista para o confronto o que não deu certo, porque a petista já tinha falado. Ele citou Dilma cinco vezes em sua exposição, sempre questionando o que ela dissera. Foi contundente nos ataques à condução da política econômica pelo governo Lula, do qual Dilma se diz herdeira e uma das responsáveis.
Temos vários títulos mundiais, de campeões ou vice. Somos o país que tem a maior taxa de juros do mundo, a maior carga tributária entre todos os emergentes ou em desenvolvimento.
Somos o penúltimo país na taxa de investimento governamental, que vai para a infraestrutura. Só perdemos para o Turcomenistão, numa lista de 135 países. São dados objetivos para analisarmos disse ele, recebendo aplausos. Falta recurso? Não é só isso. Falta planejamento no investimento governamental, falta qualidade de gestão e capacidade para fazer um sequenciamento dos investimentos, porque quando tudo é prioritário, nada é prioritário.
Ao falar da necessidade de mudanças na política fiscal para reduzir a carga tributária, Serra disse: Prometo Eu não gosto de falar a palavra, então anuncio que, se eu vier a ser presidente, como espero, no dia 2 de janeiro tem um projeto eliminando o PIS/Cofins do (setor de) saneamento.
Serra voltou a dizer que o Banco Central não é a Santa Sé e alfinetou Dilma sobre a política tributária: Não entendi o que a ministra Dilma disse a respeito de tributação. Pensei até que ia poder saber qual é a posição do governo federal a esse respeito, porque passaram-se oito anos e não conseguiram votar nenhum projeto.
Primeira a falar, e sempre usando o verbo na primeira pessoa do plural, como se estivesse no governo, Dilma fez uma promessa enfática de manutenção de contratos, para desfazer qualquer receio do mercado com as propostas mais radicais: A revisão de contratos cria instabilidade de um lado e defasagens de outro. Para rever qualquer contrato, o Brasil para. Isso implicaria diminuição do crescimento. Criaria turbulência generalizada.
No governo do presidente Lula, do qual tive a honra de participar, demos demonstração de maturidade. Muitas vezes não concordamos, mas respeitamos todos os contratos.
Dilma prometeu direcionar todo o fôlego de seu eventual governo para aprovar a reforma tributária cobrada pelo empresários: O sistema (tributário) é caótico, onera todo mundo.
Na sabatina, Dilma não respondeu à pergunta de Paulo Safra, presidente da Câmara da Indústria da Construção, sobre o excessivo aparelhamento político das agências reguladoras.
Mas, em entrevista depois, disse: Queremos agências profissionais, critérios técnicos? Quero. Mas não acho que tem que acabar com indicação política, mas exigir indicação política com critérios técnicos.
Serra voltou a criticar a partidarização das agências, afirmando que isso desvirtuou as instituições: Fizemos as agências para ter um Estado regulador e não um Estado interventor.
A pré-candidata do PV, Marina Silva, foi a última a falar. Também se comprometeu a fazer a reforma tributária.
No entanto, fez questão de marcar diferenças entre ela, Serra e Dilma: (Tenho) o compromisso, sim, de que podemos fazer uma reforma tributária, mas não com falsas expectativas. Não é fácil. Se fosse fácil, já teriam feito. As pessoas assumem o compromisso com a reforma, mas, depois que ganham (a eleição), fazem a reforma do compromisso.
Marina garantiu que, se eleita, não haverá aventuras na economia: Em política econômica, não defendemos nenhum tipo de aventura.
A estabilidade econômica desses últimos 16 anos nos ensinou que não devemos, em hipótese alguma, abrir mão desse tripé (câmbio flutuante, metas de inflação e estabilidade fiscal).
A autonomia do BC deve permanecer disse Marina, contrapondose a Serra. E depois, se contrapondo a Dilma: Hoje se controla a inflação apenas com a elevação de juros, praticamente, mas sem reduzir gasto público.
E se você reduz gasto público obviamente que você terá condição de ter maiores investimentos.
PSDB acusa PT de evitar confronto direto
Petistas negam; sabatina não teve perguntas entre os pré-candidatos
BRASÍLIA. Os três principais pré-candidatos à Presidência estudaram bastante os temas da economia nacional para o primeiro debate com os representantes da indústria brasileira. José Serra, do PSDB, tentou mostrar bom humor matutino, apesar de ser um notívago declarado.
Ele também estava mais ofensivo contra Dilma Rousseff. A petista estava afiada e elegante, sem muita gracinha, e manteve o script do discurso técnico.
Por sorteio, Dilma falou primeiro; Serra, em seguida; e a candidata do PV, Marina Silva, por último.
Embora tenham se cumprimentado com beijinhos na chegada, Dilma e Serra ficaram estrategicamente separados na mesa pelo presidente da CNI, deputado Armando Monteiro. Pela quantidade de palmas, a simpatia por Serra não pôde ser disfarçada pelo empresariado, que lotou o auditório e em alguns momentos o aplaudiu de pé.
Dilma foi acompanhada por dezenas de parlamentares, coordenadores de campanha, como o ex-ministro da Fazenda Antonio Palocci, e assessores.
Na plateia, um fã inconveniente, o folclórico Roberval Uzeda, conhecido como pai Uzeda, tentava puxar palmas para a candidata.
Em vários momentos da fala de Dilma, ele gritava: De acordo, e batia palmas com estardalhaço.
Com respostas longas, Dilma prometeu atender aos pedidos para ser mais concisa.
Tá bom, agora a resposta vai ficar mais curtinha brincou, encurtando também o tempo de cinco minutos das considerações finais.
Mais solto que de costume, Serra não perdeu a oportunidade de alfinetar sua principal adversária.
Logo manifestou contrariedade com o formato dos debates promovidos sem confronto direto entre os pré-candidatos. A assessoria do PSDB informou que o comando de campanha do PT é que tem exigido que não haja perguntas entre eles.
A assessoria de Dilma nega que tenha partido do comando da campanha ou do PT veto ao debate direto. Segundo a assessoria, consultados, todos concordaram com o formato proposto pela CNI , que atende determinação do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), de não fazer debates diretos nesta fase da pré-campanha.
O estilo descontraído seria, segundo Serra, uma tática para não se estressar. Ele reconheceu, porém, que isso nem sempre deu certo. Mas prometeu não escorregar mais daqui para a frente. E disse que nem todo mundo o acha feio: Às vezes me acham feio. Minha neta me acha um Adônis.
Serra permeou as respostas com brincadeiras.
Contou que, à época do Ministério da Saúde, rejeitou a compra de camisinhas chinesas, mesmo mais baratas.
Quando eu abri a camisinha, ela tinha cheiro de pena de galinha fervida. E furos! Não sei se os chineses, lá naquela hora, gostam do cheiro de pena de galinha. Mas nós, não! disse Serra, arrancando gargalhadas.
Serra admitiu que usou parte da madrugada para ler as propostas da indústria para o crescimento da economia. E disse que as poucas horas de sono não haviam lhe tirado a disposição: Eu dormi três horas e meia esta noite. Mas eu podia jogar futebol agora. Porque estou fazendo o que gosto, é uma coisa prazerosa.
Marina temeu o esvaziamento do plenário, já que passava da hora do almoço, mas a maioria dos empresários se manteve firme até o fim de sua fala. Ela pediu para falar sentada, por causa de problemas de visão e para consultar documentos.
Foi interrompida por aplausos duas vezes.
Num plenário cujos integrantes estão preocupados com o fim de amarras para o crescimento, Marina foi questionada pelo presidente da Federação das Indústrias do Amazonas, que perguntou se ela era contra a construção de BRs na região.
Mostrando dados concretos sobre inviabilidade econômica e ambiental dos projetos, Marina disse que continuaria contra. Mas acabou aplaudida.
Quero agradecer os que ficaram aqui mesmo com fome. Com meus 12% me sinto honrada de estarem aqui para me ouvir brincou.
Na plateia estava o empresário Guilherme Leal, vice na chapa de Marina, que foi chamado de companheiro por alguns dos empresários presentes ao evento.
Candidatos defendem propostas que seus governos não tiraram do papel
E as medidas são pedidas pelo empresariado há muitas eleições
Regina Alvarez
BRASÍLIA. No debate na Confederação Nacional da Indústria (CNI), os candidatos defenderam propostas que estão na agenda do empresariado há muitas eleições: reforma tributária, mais investimentos em infraestrutura, redução da carga de impostos, dos juros e melhoria da renda per capita.
Uma agenda que esteve nos programas dos últimos governos, dos quais José Serra, Dilma Rousseff e Marina Silva fizeram parte. Mas algumas dessas demandas nunca saíram do papel e outras avançam num ritmo aquém das necessidades do país.
A reforma tributária, apontada pela candidata do governo Lula, Dilma Rousseff, como a reforma das reformas está parada no Congresso. Não recebeu do governo impulso para sair do papel, nem completa nem por partes, como defendiam setores do empresariado. O tema é espinhoso, os interesses conflitantes pois não existe um modelo de reforma tributária em que todos ganhem e a oposição não facilitou a negociação.
Algumas propostas, como a desoneração da folha de salários, por exemplo, uma das maiores reivindicações da indústria, não avançaram porque envolviam renúncia fiscal. Na divisão do bolo de recursos federais, os aumentos para o funcionalismo público prevaleceram na escolha das prioridades. Ontem, Dilma disse o que os empresários queriam ouvir: Assumo compromisso com a reforma tributária afirmou, se comprometendo indiretamente com a desoneração da folha: Num determinado momento, o Tesouro Nacional vai ter de arcar com a diferença para não quebrar a Previdência.
Investimento baixo preocupa
Já Serra abordou pontos que os tucanos consideram vulneráveis no atual governo e são compartilhados por parte do empresariado: os investimentos federais, mesmo com o aumento expressivo da arrecadação nos últimos anos e com o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), não ultrapassam a média de 2% do PIB, já computados os gastos das estatais.
Na visão do setor privado, este é um dos maiores gargalos que entravam o crescimento mais robusto e sustentado do país. Serra reforçou: (...) Somos o penúltimo país na taxa de investimento governamental.
Só perdemos para o Turcomenistão. Acho que são dados objetivos para raciocinar, discutir, sem questão político-partidária, mas como questão de um governo, do país.
A agenda não é nova, e o governo anterior, pilotado pelo tucano Fernando Henrique, não tem muito o que mostrar. Os investimentos na era FH ficaram abaixo do atual patamar.
Outro tema do debate abordado por Serra e caro aos empresários foi a taxa de juros. Em relação a esse ponto, a indústria tem assumido um discurso tão crítico quanto o do candidato da oposição, e deve elevar mais o tom com a retomada da alta dos juros iniciada pelo Banco Central para conter a inflação.
No topo do ranking mundial, os juros no Brasil já foram mais altos e, por isso, o atual governo lança mão dessas estatísticas para defender o BC. A Selic (taxa básica de juros) hoje em 9,5% ao ano atingiu picos estratosféricos no governo anterior, de 85,4%, por conta de sucessivas crises econômicas mundiais.
Dilma, que não é uma entusiasta da política do BC, saiu pela tangente, dizendo que a taxa ainda é alta, mas demonstra redução.
Em evento com Dilma, Serra vai ao ataque
O pré-candidato do PSDB à Presidência, José Serra, deixou de lado o estilo pacífico em evento dos presidenciáveis na Confederação Nacional da Indústria. O tucano criticou Dilma Rousseff (PT) e disse faltar "planejamento e qualidade de gestão" ao governo Lula. Já Dilma atacou o "apagão de planejamento" na gestão FHC e tentou associar a Serra o risco de uma eventual instabilidade econômica.
Serra e Dilma partem para o confronto
"Falta qualidade de gestão e planejamento"
Christiane Samarco, Denise Madueño
BRASÍLIA – Pressionado pelas últimas pesquisas de intenção de voto que registraram queda da candidatura tucana e provocaram ansiedade em aliados e correligionários, o pré-candidato do PSDB a presidente, José Serra, deixou de lado o figurino "paz e amor". Em evento promovido pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), com a presença de Dilma Rousseff (PT) e Marina Silva (PV), ele criticou o governo e chamou a petista para o debate.
A uma plateia de industriais e parlamentares, Serra elevou o tom das críticas ao Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). "Falta planejamento, qualidade de gestão e falta capacidade para fazer sequenciamento dos investimentos segundo a ordem de prioridade", afirmou.
Sorteado para falar em segundo lugar, logo após Dilma, ele atacou as altas taxas de juros, a carga tributária, os baixos níveis de investimentos e criticou a importação de produtos chineses. Chegou a ironizar a petista. "Não entendi a explicação da Dilma quando ela defende a política cambial e de juros. Entra governo, sai governo, continuamos com os maiores juros do mundo", disse.
Interação. Em resposta à plateia que cobrava a redução de impostos, de juros e de encargos trabalhistas, Serra defendeu o fim de dois tributos na construção de infraestrutura em saneamento e afirmou que, caso eleito, haverá "uma proposta eliminando o PIS e o Cofins do saneamento no dia 2 de janeiro".
Serra repetiu os ataques ao aparelhamento político das agências reguladoras e de postos importantes do Executivo e falta de planejamento. "Por que um partido quer a diretoria financeira de uma empresa pública?", questionou. Ao final, fez questão de destacar que foi um dos primeiros a defender o tripé macroeconômico que inclui juros flutuantes, as metas de inflação e responsabilidade fiscal.
Bem humorado, até debochou do temor que o mercado teria de suas ideias. "Eu ajudei a erguer a mesa da economia do Brasil, não vou derrubar esta mesa", afirmou, para concluir sob aplausos: "O importante é que a gente olhe para frente."
"Brasil teve um apagão do planejamento"
Disposta a dissipar rumores de que, se vencer a eleição, promoverá uma guinada à esquerda no Planalto, a pré-candidata do PT à Presidência, Dilma Rousseff, assumiu ontem compromisso com a estabilidade econômica e associou o risco de mudança ao adversário José Serra, do PSDB.
Primeira a responder às perguntas da sabatina promovida pela CNI, Dilma apresentou-se como a única garantia de continuidade de um governo bem avaliado. Em tom pausado, ela assegurou que respeitará os contratos e manterá a política de câmbio flutuante, combinada com metas de inflação e ajuste fiscal.
Para agradar à plateia de homens engravatados, Dilma foi mais longe e propôs a criação do Ministério da Micro, Pequena e Média Empresa. Não foi só: pregou a reforma de impostos que o governo não conseguiu aprovar no Congresso, chamou a situação tributária de "caótica" e disse que a desoneração da folha de salários é "fundamental". Na tentativa de neutralizar o discurso da gastança entoado por Serra, prometeu até cortar despesas, "desde que não comprometam os investimentos". Só não especificou onde seria a tesourada.
Meritocracia. "O Estado brasileiro tem de ser profissional e meritocrático, precisa ter gestão e regulação correta, sem prejuízo do setor privado", insistiu a ex-ministra da Casa Civil. Nas diretrizes do programa de governo, o PT defende um Estado forte.
Dilma lembrou que, quando assumiu o Ministério das Minas e Energia, em 2003, havia 20 motoristas e um engenheiro. "Não tenho nada contra motoristas, mas no passado foram feitos cortes irracionais e o Brasil teve um apagão do planejamento", criticou, numa referência ao governo de Fernando Henrique Cardoso.
Mais tarde, em entrevista, Dilma defendeu o preenchimento das vagas de agências reguladoras por "critérios técnicos". Em resposta a Serra, porém, ressalvou que "isso não significa acabar com indicação política". Ela também deu estocadas no tucano ao dizer que "todo mundo quer qualidade da educação, mas ninguém quer salário para o professor". Pouco antes de deixar o governo paulista, Serra enfrentou greve de professores.
Dilma sem Lula faz Serra subir o tom
O que mais chamou a atenção na sabatina dos presidenciáveis promovida ontem pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) foi a performance de José Serra. No primeiro ambiente em que dividiu as atenções com Dilma Rousseff, sem Lula a fazer sombra à candidata, o ex-governador partiu para o ataque. Produziu uma avant-première da campanha após a Copa do Mundo, pródigo em críticas ao governo e à exposição de sua antecessora na tribuna .
Do aparelhamento dos postos estratégicos do governo ? com ênfase nas agências reguladoras ?, passando pela desconstrução do projeto de reforma tributária defendida minutos antes por Dilma, até a condenação da política de juros do Banco Central, Serra foi um crítico contundente do governo, abandonando o figurino light que vestira até aqui.
Estava à vontade e ansioso pelo debate. Sinal claro de que aposta suas fichas na etapa da campanha em que estará frente a frente com Dilma na televisão.(E esta, por sua vez, aposta nos palanques com Lula.) Serra chegou a conclamar a anfitriã, CNI, a mudar o formato do evento, transformando-o de sabatina em debate (o que a legislação impede). E deu o tom de sua campanha: a Lula, reconhecimento pelos seus méritos; a Dilma, o ardor da oposição.
A rigor, os três candidatos saíram-se bem na sabatina de ontem, dentro daquilo a que se propuseram. Dilma comprovou que o processo de mídia training (sessões sucessivas de treinamento simulando debates e entrevistas) pode fazer com que candidatos superem suas dificuldades diante de plateias exigentes.
Preocupou-se em mostrar naturalidade na abordagem de temas econômicos complexos e de mostrar-se como garantia de continuidade não só de governo, mas também de preservação da estabilidade econômica. Prometeu não rasgar contratos, admitindo que seu perfil impõe esse temor.
Cometeu aí seu principal erro.
Não convenceu na abordagem da reforma tributária, porque se limitou a culpar o Congresso pela rejeição de uma proposta do governo nesse sentido, que, na sequência, José Serra demonstrou equivocado. Também não convenceu ao defender a política monetária, ficando menos à vontade que Serra nesse quesito, pois o que se conhece de sua posição sobre o tema combina mais com o pensamento do adversário do que com o do presidente do BC, Henrique Meirelles, a quem sempre se opôs dentro do governo. Respondeu à maioria das questões formuladas pelos empresários com o PAC, elegendo-o como a panaceia para todos os problemas.
Estruturou sua fala em cima daquilo que já foi realizado pelo governo Lula e que usou para se credenciar como a gestora da continuidade.
Favorecido pelo sorteio que lhe permitiu, como segundo orador, críticas sem réplica, Serra foi além do provável script que levara no bolso. Solto, completamente à vontade, muito longe da imagem fria que sempre o caracterizou, surpreendeu a plateia de empresários com análise técnica e política do cenário industrial e econômico, pontuada com piadas e ironias, finalizando com a promessa de, se eleito, desonerar a indústria de impostos estratégicos.
Marina Silva parecia condenada à repulsa íntima de cada espectador, por começar sua fala já após a hora normal de almoço, para uma plateia previamente disposta a acompanhar apenas os dois primeiro candidatos, na convicção de que a eleição está polarizada.
Surpreendeu, porém, ao manter a atenção de todos logo nos primeiros dos 25 minutos de sua exposição. "Negra, professora, analfabeta até os 16 anos, universitária oriunda do Mobral, latino-americana e sem carisma", definiu-se, conquistando a plateia.
Deixou um desafio aos seus antecessores: "A maioria vem aqui e assume compromisso com a reforma; uma vez eleita, reforma o compromisso", disse, para aplauso dos empresários. Definiu Dilma e Serra, pela ordem, como candidatos que prometem continuidade e mais realizações.
Dilma teve que assumir discurso da oposição para escapar de saia justa na CNI, diz Freire
Valéria de Oliveira
Freire: É de se perguntar o que PT e aliados fizeram em 8 anos no governo.
O presidente do PPS, Roberto Freire, disse que a pré-candidata do governo, Dilma Roussef, teve de assumir um discurso de oposição para conseguir sair da saia justa que lhe impôs o diagnóstico elaborado pela CNI (Confederação Nacional da Indústria) sobre a situação do país. O documento foi apresentado antes da exposição do ex-governador José Serra e da senadora Marina Silva, além de Dilma, em encontro promovido pela entidade nesta terça-feira. "Foi um verdadeiro libelo contra a política econômica do governo Lula", afirmou Freire.
O ex-senador ironizou a declaração da ex-ministra de que a situação tributária do Brasil é caótica. "É de se perguntar o que (PT e seus aliados) fizeram, em oito anos no governo, para evitar que chegássemos a esse quadro. Será que é culpa de Fernando Henrique Cardoso? Ora, é preciso respeitar a inteligência da sociedade brasileira", protestou Freire. Para ele, à candidata só restou concordar com a oposição porque os empresários, diplomaticamente, afirmaram que o Brasil surfou numa onda internacional excelente, mas o governo não se preocupou em construir as bases para um crescimento maior e melhor para.
Investimentos
"O governo falhou totalmente nisso; não cuidou do estrangulamento da infraestrutura, não fez investimentos, por causa da burocracia, não foi capaz de atender à demanda por formação de mão-de-obra; foi omisso na área educacional, enfim, foi um desastre", disse Freire. Ao analisar dados da economia brasileira, alertou ele, é que se vê que o país começa a ter problemas nas contas externas, na balança comercial, "que ele está se deindustrializando, voltando a adotar um modelo primário-exportador". A "caótica" realidade tributária à qual se referiu Dilma Roussef é, na opinião de Freire, apenas mais um dos graves problemas nacionais.
Para reverter essa situação, disse Freire, é necessário um presidente como José Serra, que lidera uma força de oposição, e que tem coragem para "colocar o dedo na ferida e assumir que esse modelo vai ter que ser mudado". O país, diz Freire, precisa de uma política industrial, fazer poupança para ter condições de investir e gerar emprego e renda. O ex-senador salientou ainda que é urgente uma preocupação "em não lotear o aparelho estatal, em não ter gastos excessivos, suntuosos e em ter uma política de austeridade em vez do inchaço da máquina administrativa".
Esse novo Brasil, diz Freire, deve ter também desenvolvimento sustentável. "A presença de Serra no evento da CNI foi marcante; O que deu para perceber é que ele demonstrou aos empresários que assistiram o encontro que é o mais capaz, o mais competente e o que tem mais espírito público, portanto é o melhor para a Presidência do Brasil".
A bagaceira dos candidatos:: Vinicius Torres Freire
Em sabatina de industriais, candidatos desconversam sobre impostos altos, BC, distribuição de renda etc.
Os empresários da indústria até que tentaram espremer o bagaço que é um candidato passado pela moenda marqueteira. Foi na sabatina de ontem com candidatos a presidente promovida pela Confederação Nacional da Indústria, a CNI. A bagaceira estava tão sequinha que, no último dos apertos, rendeu apenas algumas gotas de conversa fiada e algum humor involuntário.
Dilma Rousseff (PT), José Serra (PSDB) e Marina Silva (PV) fizeram exposições, foram entrevistados e não puderam se fazer perguntas.
De mais relevante, Serra repetiu sua frase "polêmica" sobre o Banco Central: que não seria a "Santa Sé"; os diretores do BC seriam "competentes", mas não os "donos da verdade". O que isso quer dizer?
Em si mesmo, nada, até porque espinafrar a Igreja Católica e Bento 16 é de graça, afora para os raros católicos sinceros. Parece que Serra quis dar novamente o recado vago e talvez contraproducente de que uma direção do BC em seu governo estará sob rédea mais curta.
Seguindo a metáfora tucana, os diretores do BC não serão "infalíveis" como o papa. Em tese, estariam sob uma jurisdição superior.
É isso? Difícil saber. Serra disse também que as política monetária e fiscal, as equipes do BC e da Fazenda, funcionarão de modo harmônico, sem disputas. É louvável a pregação de harmonia. Mas BC e Fazenda estarão de acordo em quê?
A Fazenda é que vai seguir o pessoal do BC? Vai haver metas fiscais (gasto público) e monetárias (inflação) conjuntas? A taxa de juros "básica", a do BC, não seria mais definida só de acordo com a inflação? Vai mudar o sistema atual? Pode ser boa ideia. Mas qual é a ideia?
A exposição de Dilma baseou-se na ideia de que ela quer que o país seja uma maravilha, sem pobres, inflação etc. A seguir, disse que a "reforma das reformas" é a tributária. Defendeu a redução ou a isenção de impostos sobre investimentos, exportações e emprego. Isto é, vai abrir mão de muito imposto.
Mas reformas tributárias apenas progridem quando um ente federativo absorve as perdas de receita. Como Estados e municípios jamais se entendem sobre o assunto, cabe ao governo federal desistir de mais receita. Dilma, pois, parece estar propondo um baita ajuste fiscal (um baita corte de gastos do governo federal). Está mesmo?
O momento de humor involuntário foi Dilma dizer algo parecido com "todo mundo vai estar acima da média" no Brasil. Ou melhor, a renda mínima será a da "classe média" ou a da "classe C" -as "classes" D e E seriam extintas. Antes de mais nada, deplore-se que esse conceito mercadológico de "classe", de fato útil para o pessoal de marketing e vendas, tenha-se tornado um critério de mensuração de política pública. Mas o que Dilma quis dizer?
Sem explicar quem fica com quanto, e em quanto tempo, a meta de Dilma nada significa, para nem falar da dificuldade de um governo determinar a alocação de renda.
Dilma quis dizer que a renda dos estratos mais pobres será mais ou menos de R$ 1.000, a da "classe C". Será essa a renda dos 10% mais pobres? Dos 30% mais pobres? Se tal coisa fosse assim manipulável e se a promessa é para o horizonte de um governo, a depender da distribuição da renda será preciso congelar ou talhar os ganhos da "classe A". É isso que ela quis dizer?
Presidente repete antecessores e recebe seleção em Brasília hoje
Eliane Cantanhêde - Colunista da Folha
Lula produz hoje no Palácio Alvorada uma cena que se repete a cada quatro anos desde 1958: a de presidentes confraternizando com a seleção brasileira de futebol.
Antes de ir para a África do Sul, a seleção de Dunga faz uma parada em Brasília às 15h para fotos com Lula.
A prática começou em 1958 com Juscelino Kubitschek, que recebeu Pelé depois do primeiro título mundial, na Suécia. E continuou em 1962, quando João Goulart repetiu a cena na conquista do bi no Chile. Já em 1970, o general Emílio Médici capitalizou politicamente o tri no México.
Fernando Collor jogou uma "pelada" com a seleção antes da Copa de 1990. O sucessor Itamar Franco comemorou o tetra de 1994.
Fernando Henrique Cardoso levantou a taça do penta em 2002, mas bateu boca ao defender a convocação de Romário. Ele levou um "chega pra lá" de Rivaldo, mas, vencida a Copa, veio a paz. Em 2006, foi Lula quem se meteu onde não devia, ao perguntar ao então técnico Parreira se Ronaldo estava "gordo". O craque respondeu que jamais diria que "o presidente bebe pra caramba".
Canto a García Lorca :: Murilo Mendes
Nas oliveiras desertas,
O lamento de água oculta
Nos pátios da Andaluzia.
Trago-te o canto poroso,
O lamento consciente
Da palavra à outra palavra
Que fundaste com rigor.
O lamento substantivo
Sem ponto de exclamação:
Diverso do rito antigo,
Une a aridez ao fervor,
Recordando que soubeste
Defrontar a morte seca
Vinda no gume certeiro
Da espada silenciosa
Fazendo irromper o jacto
De vermelho: cor do mito
Criado com a força humana
Em que sonho e realidade
Ajustam seu contraponto.
Consolo-me da tua morte.
Que ela nos elucidou
Tua linguagem corporal
Onde el duende é alimentado
Pelo sal da inteligência,
Onde Espanha é calculada
Em número, peso e medida.
In: MENDES, Murilo. Antologia poética. Sel. João Cabral de Melo Neto. Introd. José Guilherme Merquior. Rio de Janeiro: Fontana; Brasília: INL, 1976