- O Estado de S.Paulo
A que está dada entre o bolsonarismo e o lulismo só beneficia o atraso político
Política é luta, disputa, busca de poder. Não pode ser vivida e praticada como se a harmonia e o entendimento apagassem contradições e diferenças. O elogio do conflito como fator de propulsão política é comum ao pluralismo liberal e à teoria da luta de classes.
O dissenso – o direito a ele, a liberdade de expressão, pensamento e crítica – faz parte da democracia, que não pode viver sem ele e sem os embates por ele propiciados. Nem toda polarização produz guerra de extermínio. Nas democracias os polos se respeitam, convivem, fiscalizam-se, podem até cooperar.
A ideia de consenso deve ser posta em termos claros, determinados. Apresentada em abstrato é uma ilusão perigosa, que pode levar à banalização do conflito e à “reconciliação” entre atores que precisam manter-se como diferentes para que a luta política adquira pleno significado e possa até mesmo dissolver os antagonismos maniqueístas. Consenso de modo algum significa a suspensão do conflito ou a dissolução das diferenças.
Observadores da cena política nacional dizem que a atual polarização entre bolsonarismo e lulismo não pode ser eliminada por um consenso centrista, que não teria força social para prevalecer. Alguns veem o consenso não como algo a ser construído, mas como mera tradução da realidade. Acreditam que, se nenhum bloco de forças é suficientemente forte, a proposição de um amplo entendimento seria diversionismo fadado ao fracasso.
Para complicar, entendem a polarização de modo restrito: só a percebem como virtude, numa reprodução empobrecida da visão liberal-pluralista que concebe o conflito como impulsionador da democracia. Preocupam-se em atacar uma hipotética “terceira via”, que entendem em chave funcionalista, como “meio-termo”. Pensam que ser radical é proclamar as razões de um polo contra outro, com o que rejeitam qualquer esforço de mediação.