sexta-feira, 1 de setembro de 2023

Fernando Abrucio* - Os cidadãos são a razão da reforma

Eu & / Valor Econômico

Só demagogos defendem soluções mágicas. Os retornos obtidos com a redução de despesas advindas de uma reforma administrativa virão ao longo de anos

Toda vez que o Congresso Nacional anuncia que fará uma reforma administrativa, muitos compram a ideia de que sairá daí uma solução rápida e salvadora para reduzir os gastos públicos. Embora seja fundamental e possível cortar várias despesas que são ineficientes e injustas, qualquer grande projeto de reformulação da gestão pública tem de se guiar por um objetivo maior: criar as condições para servir melhor aos cidadãos. Mais do que uma proposta restritiva de administração pública, precisamos capacitar o Estado para responder efetivamente à sociedade.

Há 30 anos pesquiso o tema da reforma do Estado e da gestão pública. Aprendi muito com minhas pesquisas e consultorias, e obviamente muito mais com outros estudiosos brasileiros e estrangeiros, sem me esquecer do aprendizado advindo do convívio com gestores públicos e da conversa com os vulneráveis que mais dependem das políticas públicas.

Mas meu grande mestre no tema sempre foi Luiz Carlos Bresser-Pereira, com sua sabedoria de fazer as perguntas mais profundas, sua criatividade em propor soluções práticas e inovadoras, sua integridade em lidar com a coisa pública e, não posso esquecer, sua generosidade no debate intelectual. E, dos ensinamentos dele, nunca esquecerei o mais importante: a reforma do Estado tem como pressuposto último melhorar a vida dos cidadãos - o resto deve vir para realizar esse intento.

José de Souza Martins: O quilombo Cafundó

Eu & /Valor Econômico

Escolas do país têm adotado a criativa orientação de visitar e conhecer o que os historiadores europeus chamam de lugares da memória, marcos históricos e antropológicos da identidade do povo

Foi parar na polícia o questionamento de uma visita pedagógica ao quilombo Cafundó, no dia 18 de agosto, de adolescentes do 7º ano, acompanhados de professores, de uma escola pública de Salto de Pirapora (SP).

A mãe de um aluno, que não participou da visita, viu na internet fotos do lugar e inseriu na rede um protesto, definindo o quilombo como verdadeira macumbaria. Certamente não é o caso de afirmar, perguntando, como faz o pai da atual onda de intolerância social e cultural no Brasil: “E daí?”.

Não é o caso, porque a ocorrência expressa a extrema gravidade de tudo que a ocorrência significa e acarreta como violação da liberdade pedagógica dos docentes em relação ao teor, aos temas e às técnicas de ensino que adotam, com base em programas oficiais.

César Felício - PEC 9 abre brecha para financiamento privado

Valor Econômico

Proposta abre ‘porteira para o desconhecido’ uma vez que dívidas com fornecedores não são facilmente aferidas

 “Fica permitida a arrecadação de recursos de pessoas jurídicas por partido político, em qualquer instância, para quitar dívidas com fornecedores contraídas ou assumidas até agosto de 2015”. O financiamento de empresas a partidos estará de volta, sem alarde, caso a proposta de emenda constitucional (PEC) 9, em tramitação no Congresso Nacional, seja aprovada.

A brecha está no último ponto do artigo primeiro da PEC 9, muito polêmica pelos dois pontos anteriores, que estabelecem anistia (pela quarta vez) aos partidos que não tiverem cumprido as cotas mínimas de gênero e raça ou que tiverem recebido “sanções de qualquer natureza” em prestações de contas ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

Tamanha celeuma a PEC 9 despertou pelo “liberou geral” das duas primeiras mudanças legais propostas, que tornam letra morta a fixação de cotas para mulheres e negros, que pouca atenção é dada à terceira inovação. Um alerta foi feito de modo lateral por debatedores de audiência pública realizada na Câmara dos Deputados na terça (29). O que está sendo proposto não é trivial.

Claudia Safatle - A bomba- relógio dos precatórios

Valor Econômico

Ministro Fernando Haddad, avalia soluções para esse problema deixado pelo governo de Jair Bolsonaro

Com uma rolagem de precatórios de cerca de R$ 100 bilhões prevista para o ano que vem, segundo informou a ministra do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet, ao externar preocupação com a bola de neve que está se formando e ponderar que seria bom ter uma solução para esse problema já no próximo ano. Para este ano, ela disse que estão sendo rolados R$ 56 bilhões e, no ano passado, foram R$ 22 bilhões.

Agora, o ministro Fernando Haddad, avalia soluções para essa bomba-relógio deixada pelo governo de Jair Bolsonaro. Uma das hipóteses aventadas seria a de incluir, em uma proposta de emenda constitucional, a possibilidade de classificar tal despesa como financeira

Tal medida permitiria ao Tesouro Nacional ampliar os pagamentos dos precatórios sem estourar os limites do novo marco fiscal, dado que foi confirmada a meta de zerar o déficit para o próximo ano, conforme consta do projeto de lei do Orçamento da União. O Ploa foi entregue ontem ao Congresso Nacional.

Armando Castelar Pinheiro* - Escolhas de política econômica

Valor Econômico

Faz todo sentido que se discuta estabelecer um teto para a carga tributária

Em artigo de 1992, intitulado “Law or Economics”, George Stigler observa que “enquanto a eficiência constitui-se no problema fundamental dos economistas, a justiça é a preocupação que norteia os homens do direito (...) é profunda a diferença” entre esses dois focos, o que “significa, basicamente, que o economista e o jurista vivem em mundos diferentes e falam diferentes línguas”.

O mesmo poderia ser dito, claro, em relação a economistas e políticos, estes mais focados na popularidade e no impacto eleitoral dos seus atos. Isso explica muito da frustração dos economistas por não emplacar reformas econômicas cujos benefícios lhes parecem claros. O que não significa que haja erro: em uma democracia os políticos procuram refletir, em suas escolhas, as preferências de seus eleitores, como deveria ser.

Reinaldo Azevedo - Haddad, sabotadores e 'tersitismo'

Folha de S. Paulo

Chegou a hora de os sedizentes liberais fazerem a lição de casa

Vou aqui empregar, pela primeira vez, à parte alguma distração, a expressão "fazer a lição de casa". Ela frequenta, com sinonímias variadas, o discurso dos sedizentes liberais brasileiros quando se referem a governos, notando à margem que a turma "raiz" não lotaria uma Kombi —do tipo elétrica, claro, para atualizar um chiste antigo. E por que essa conversa sempre me aborreceu? Lembro-me lá dos tempos do primário. Havia a "tarefa": era uma obrigação extra a cumprir. Certamente colaborava com o aprendizado. Mas era também um exercício de disciplina. Como governos não são estudantes de calças curtas (outra antiguidade...), a metáfora sempre me pareceu imprópria. Quando a esse papo-furado se junta o "tersitismo", tanto pior. Hein?

Uma das principais críticas que a turma a que me refiro faz ao arcabouço fiscal negociado pelo ministro Fernando Haddad (Fazenda), que atua em nome do presidente Lula, sempre é bom lembrar, diz respeito à sua excessiva dependência do crescimento da receita.

Priscilla Bacalhau - A voz do povo

Folha de S. Paulo

"Um país democrático, justo, desenvolvido e ambientalmente sustentável, onde todas as pessoas vivam com qualidade, dignidade e respeito às diversidades". Essa é a visão de futuro que o atual governo federal pretende alcançar até 2027, conforme consta no projeto de lei do Plano Plurianual (PPA) apresentado nesta quarta-feira, 30. O PPA é um instrumento de planejamento orçamentário para os quatro anos seguintes e precisa ser aprovado até o fim do primeiro ano de mandato.

Para alcançar a visão de futuro, dessa vez, os programas incluídos no PPA não se restringem àqueles relacionados às promessas da campanha eleitoral, como combate à fome e redução das desigualdades. A elaboração do PPA contou com a participação da parte mais interessada: o povo. Mais de 34 mil pessoas participaram de plenárias presenciais que ocorreram em todas as capitais do país nos últimos meses.

Bruno Boghossian - O barulho e a Polícia Federal

Folha de S. Paulo

Ministro e diretor-geral poderiam pensar duas vezes antes de comentar ações contra principal adversário político de Lula

No dia em que a Polícia Federal desbaratou o esquema das joias, o ministro da Justiça emitiu uma sentença. Flávio Dino disse haver "direta relação" entre o golpismo e a venda dos presentes. "Era uma tentativa de golpe monetizado", anotou. Se a ideia era fazer um juízo político e tirar proveito do noticiário fervente, era melhor ter pensado duas vezes.

Hélio Schwartsman - Lula, Aristóteles e o esoterismo

Folha de S. Paulo

Presidente vai contra os fatos quando diz que TRF-1 concluiu que pedaladas de Dilma não existiram

Lula tem todo o direito de achar que o impeachment de Dilma foi um golpe. O termo "golpe" é polissêmico o suficiente para comportar ampla gama de interpretações. Lula também pode, sem nenhum problema, propor que se faça uma reparação simbólica à ex-presidente. Vivemos numa sociedade aberta em que é facultado a qualquer um pedir qualquer coisa. Um niilista empedernido pode, se desejar, pedir a extinção da humanidade; ele só ultrapassará a linha do inaceitável se tentar pôr essa ideia em prática.

Fernando Gabeira - A discreta transição verde

O Estado de S. Paulo

Estamos caminhando, mas é necessária uma sacudida. Já não se trata tanto de rumo, mas da velocidade que os tempos exigem

Vivemos um tsunami de informações no mundo e dentro do Brasil. Há temas importantes, outros secundários, joias reluzentes, hackers, capítulos inteiros de novelas jornalísticas.

Como determinar hierarquias nesse tumulto? Como definir o que é importante e observá-lo prioritariamente, sem se distrair muito?

A resposta a isso depende do observador. Na minha opinião, o fato mais importante no planeta é a emergência climática, determinada pelo aquecimento global. As consequências já se fazem sentir, sobretudo na frequência dos eventos extremos.

Luiz Carlos Azedo - Orçamento de 2024 traduz conflito distributivo no governo Lula

Correio Braziliense

Haddad e Tebet terão que administrar simultaneamente o “fogo amigo” da Esplanada e as bolas nas costas da Comissão Mista de Orçamento do Congresso

O Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) de 2024, encaminhado nesta quinta-feira pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ao Congresso Nacional, reflete o conflito distributivo existente no país, que repercute dentro do próprio governo federal. Nada demais, a disputa por verbas na Esplanada faz parte, não fosse o fato de que as decisões sobre o Orçamento da União são tomadas pelo Parlamento, que joga para a arquibancada, e não para o equilíbrio da economia, embora a narrativa seja essa. Ao mesmo tempo em que prorroga a desoneração da folha de pagamento de 17 setores da economia, que impacta fortemente a arrecadação federal, o Congresso não quer cortar na própria carne, ou seja, nas emendas parlamentares.

Vera Magalhães - O pacote do 7 de Setembro

O Globo

Nem a habilidade de Múcio garante que será possível evitar que os militares sejam confrontados com alguns fatos dos anos Bolsonaro

Com a costura sutil, em fio de náilon transparente, do ministro José Múcio, vai sendo alinhavado um acordo para uma espécie de armistício entre as Forças Armadas e o governo. Ele passa, como sempre, pela expectativa de ganhos pecuniários por parte dos militares, mas não só.

A contemporização que o ministro da Defesa advoga, em que tem obtido surpreendente sucesso, inclui variáveis além da capacidade de composição interna com o próprio governo, o que confere à empreitada certo grau de imprevisibilidade.

Bernardo Mello Franco – Silêncio é ouro

O Globo

Com ou sem depoimento, investigadores já têm provas de desvio e venda ilegal de joias

Diz um provérbio árabe que a palavra é prata e o silêncio é ouro. No caso da família Bolsonaro, cabe a pergunta: ouro amarelo, branco ou rosé?

O ex-presidente e a ex-primeira-dama se calaram ontem diante de delegados da Polícia Federal. Os dois haviam sido intimados a depor sobre o escândalo das joias sauditas.

A PF apura o desvio de presentes recebidos em viagens oficiais. Entre os mimos, um Rolex em ouro branco cravejado de diamantes e um kit com anel, relógio e abotoaduras em ouro rosé.

Flávia Oliveira - Contra a fome, sem barganha

O Globo

Partidos do Centrão integraram o governo que permitiu a deterioração dos indicadores de miséria e pobreza

Não é de hoje que Lula põe o enfrentamento à miséria no topo dos programas de governo que o levaram a três mandatos presidenciais. Nas gestões petistas anteriores, em decorrência de programas de erradicação da extrema pobreza, o Brasil saiu do Mapa da Fome da ONU. Nos anos de Jair Bolsonaro no Planalto, o misto de indiferença e incompetência empurrou 33 milhões de brasileiros para a insegurança alimentar severa, conforme pesquisa da Rede Penssan em 2022. É o caminho de superação dessa tragédia que se pretende trilhar com o lançamento hoje, no Piauí, do Brasil Sem Fome. Contraditório é que ele se dê simultaneamente ao debate escancarado sobre a cisão do Ministério do Desenvolvimento Social (MDS) para saciar o apetite do Centrão pelo Orçamento público.

Rogério Furquim Werneck - O descaminho fácil do populismo

O Globo

Por que voltou a ser tão fácil vender ao público políticas que pareciam desacreditadas?

Em artigo recente, intitulado "A vantagem populista, Raghuram Rajan analisa por que voltou a ser tão fácil vender ao público políticas que pareciam completamente desacreditadas.

Rajan tem sido um dos participantes mais argutos do debate econômico mundial. Indiano, com doutorado no MIT, é há muitos anos professor da Booth School of Business da Universidade de Chicago. Em 2003, com 40 anos, tornou-se o primeiro economista-chefe do FMI proveniente de um país emergente. E, de 2013 a 2016, presidiu o Banco Central da Índia (Reserve Bank of India).

Em 2005, Rajan notabilizou-se pelo discurso estraga-festa que proferiu na reunião anual de Jackson Hole, nos EUA. Para grande irritação da plateia de banqueiros centrais e executivos das principais instituições do sistema financeiro mundial, que comemorava mais um ano de prosperidade da era Greenspan, Rajan declarou que os bancos já não sabiam que riscos vinham tomando nos mercados de derivativos.

J. B. Pontes (*) - Acorda Brasil!

Como afirmamos no início do atual governo, Lula teria grandes dificuldades para realizar a contento o seu terceiro mandato como presidente da república. E os principais motivos para essa afirmação eram: a condição de “terra arrasada” do Estado deixada pelo governo anterior do inelegível, aliada a um Congresso Nacional, indubitavelmente o mais desqualificado e descompromissado com os interesses do País que já se registrou na nossa história.

A eleição de 2022 nos trouxe uma boa novidade: a rejeição de um dos governos mais desastroso e corrupto que o País já teve. Mas, ao mesmo tempo, uma grande decepção: a eleição de um parlamento, notadamente da Câmara dos Deputados, que fortaleceu em muito o chamado “Centrão”, grupo político composto por parlamentares fisiológicos, cujo único objetivo é se apoderar dos recursos públicos para ampliação de patrimônios privados e do poderia político.

O que a mídia pensa: editoriais / opiniões

Meta fiscal do Orçamento é pouco realista

O Globo

Para cumprir compromisso de zerar déficit, governo aposta em receitas incertas em vez de cortar despesas

A primeira versão do Orçamento de 2024 encaminhada ao Congresso revela o tamanho do desafio que o próprio governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva se impôs: obter receitas adicionais da ordem de R$ 168 bilhões para cumprir a meta de zerar o déficit no ano que vem. É uma meta que se mostra pouco realista quando confrontada com o resultado fiscal dos últimos meses.

A gastança neste ano tem batido recordes. O governo federal fechou julho com déficit de R$ 35,9 bilhões, o segundo pior resultado para o mês na série histórica iniciada em 1997. Nos sete primeiros meses de 2023, as contas ficaram R$ 78,2 bilhões no vermelho, ante resultado positivo de R$ 73,2 bilhões no mesmo período de 2022. As despesas cresceram 8,7% em termos reais, ante queda de 5,3% nas receitas.

O gasto elevado foi resultado da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Transição, uma licença para gastar R$ 168,9 bilhões adicionais aprovada a pedido do PT. A intenção era tornar permanentes os valores do então Auxílio Brasil, que voltou a se chamar Bolsa Família, e recompor gastos sociais. A Fazenda prometeu manter o déficit deste ano perto de R$ 100 bilhões, mas o último relatório do Ministério do Planejamento elevou a previsão para R$ 145,4 bilhões, ao redor de 1,4% do PIB.

Poesia | Minha namorada - Vinícius de Moraes

 

Música | Khatia Buniatishvili: Tchaikovsky - Piano Concerto No. 1 in B-flat minor, Op. 23 (Klaus Makela & OP)