sábado, 2 de abril de 2016

Opinião do dia – Fernando Henrique Cardoso

"Diante da incapacidade do governo de governar, de flagrantes abusos que ferem a nossa Constituição praticados reiteradamente por aqueles que detêm o poder, infelizmente, não resta outro caminho se não marcharmos para o impeachment. Não tem nada a ver com golpe, é um remédio constitucional."
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Fernando Henrique Cardoso, sociólogo, foi presidente da República. O Estado de S. Paulo, 1/4/2016

Moro liga Lava- Jato a mensalão e Celso Daniel

• Silvinho, ex-secretário do PT, recebeu R$ 1 milhão de empreiteiras

Ex-tesoureiro do PT condenado no mensalão, Delúbio Soares foi levado para depor; PT acusa o juiz de extrapolar suas funções, mas petistas admitem temer o que o ex-secretário do partido possa falar

A operação Carbono 14, 27ª fase da Lava-Jato, ligou o escândalo de corrupção na Petrobras ao mensalão do PT e também ao assassinato do prefeito petista Celso Daniel, em 2002. Condenado no mensalão, o ex-secretário do PT Sílvio Pereira foi preso. Segundo a PF, ele recebeu, de 2009 a 2012, R$ 1,1 milhão de empreiteiras. Também foi preso o dono do jornal “Diário do Grande ABC”, Ronan Maria Pinto, que recebeu, em 2004, R$ 6 milhões do PT, dinheiro de empréstimo obtido pelo partido junto ao Banco Schahin em troca de contrato com a Petrobras. O juiz Sérgio Moro disse considerar “possível” que “esse esquema” tenha relação com o assassinato de Celso Daniel. O PT acusou Moro de extrapolar sua competência. Nos bastidores, o partido teme o que Silvinho possa falar.

Escândalos interligados

• Operação Carbono 14 liga corrupção na Petrobras a mensalão e ainda envolve caso Celso Daniel

Cleide Carvalho, Thiago Herdy e Tiago Dantas - O Globo

SÃO PAULO - A 27ª fase da Operação LavaJato deflagrada ontem ressuscitou velhos fantasmas do PT, associando os métodos de corrupção do mensalão ao esquema de desvios na Petrobras. Batizada de “Carbono 14” — em referência ao elemento químico usado pela ciência para datar fósseis —, a investigação busca esclarecer por que o dono do jornal “Diário do Grande ABC”, Ronan Maria Pinto recebeu, em 2004, R$ 6 milhões do PT, dinheiro oriundo de propina obtida pelo partido junto ao Grupo Schahin. O dinheiro foi recebido por meio de um empréstimo fraudulento com o Banco Schahin — mesmo método usado no escândalo do mensalão com o BMG e o Banco Rural.

Ontem foram presos Ronan Maria Pinto e o ex-secretário nacional do PT Sílvio Pereira, que teria participado da negociação do pagamento para o empresário do ABC paulista.

Em despacho, o juiz Sérgio Moro, da 13ª Vara Federal em Curitiba, admitiu ainda relação do esquema com a morte do ex-prefeito petista de Santo André Celso Daniel: “É possível que este esquema criminoso tenha alguma relação com o homicídio, em janeiro de 2002, do então prefeito de Santo André, Celso Daniel, o que é ainda mais grave”.

Embora a Lava-Jato não tenha trazido fatos novos relacionados à investigação da morte de Celso Daniel — que a Polícia Civil de São Paulo concluiu se tratar de crime comum —, no processo foram anexados depoimentos do operador do mensalão Marcos Valério e de um irmão do ex-prefeito petista, Bruno Daniel, que associam a morte do prefeito à descoberta de esquema de corrupção na prefeitura de Santo André.

Em depoimento de 2012, Valério disse ter tido conhecimento do pagamento a Ronan Pinto como forma de evitar que ele continuasse a chantagear Gilberto Carvalho, José Dirceu e até o ex-presidente Lula. Embora tenha dito que não soubesse o motivo da chantagem, Valério afirmou que Ronan mencionou haver relação entre a morte de Celso Daniel e a corrupção na prefeitura petista.

Agora, quatro anos depois, a Lava-Jato conseguiu confirmar, por meio de quebras de sigilos bancários e depoimentos de testemunhas, que Ronan de fato recebeu o pagamento mencionado por Valério. O dinheiro é parte de um empréstimo fictício celebrado entre o Banco Schahin e o pecuarista José Carlos Bumlai, em 2004, no valor de R$ 12 milhões, a pedido do PT.

A força-tarefa descobriu que os R$ 6 milhões passaram por três intermediários antes de chegar a Ronan Pinto, que na época era empresário de ônibus em Santo André: por Bumlai, pelo grupo Bertin e por uma empresa chamada Remar Agenciamento.

Os R$ 12 milhões obtidos por Bumlai para o PT nunca foram pagos — o empréstimo foi oficialmente considerado quitado em 2009, quando empresas do Grupo Schahin fecharam contrato de US$ 1,6 bilhão com a Petrobras para construção da sonda Vitória 10000. Em depoimento, Bumlai e integrantes do Grupo Schahin admitiram ter acertado com o ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto o esquecimento da dívida mediante a assinatura do contrato. Os R$ 6 milhões restantes do empréstimo teriam sido usados para pagar dívidas de campanha do PT para a prefeitura de Campinas, em 2004.

— Há peculiaridades nessa fase, que envolve uma tipologia semelhante à encontrada no mensalão, pelo uso de uma instituição financeira, um empréstimo fraudulento. Enquanto no mensalão o pagamento desses empréstimos fraudulentos era feito mediante favores do governo federal, inclusive com edição de decretos e medidas que favoreciam as instituições financeiras, no caso presente, o favorecimento, o favor para o pagamento desse empréstimo, foi a utilização de um contrato bilionário com a Petrobras — explicou Diogo Castor de Mattos, procurador do MPF, um dos responsáveis pela investigação que apura crimes de extorsão, falsidade ideológica, fraude, corrupção ativa e passiva, e lavagem de dinheiro.

Ronan e Altman rebatem acusações
O procurador afirmou não haver, até agora, provas que liguem o pagamento de R$ 6 milhões a Ronan Pinto ao assassinato de Celso Daniel.

— Tudo é conjectura, nada é comprovado. Por ora, todas as hipóteses permanecem em aberto — afirmou.

Nesta 27ª fase, foram cumpridos oito mandados de busca e apreensão em endereços ligados a Ronan Pinto e a Sílvio Pereira na capital paulista e no interior de São Paulo. Apontado como interlocutor do PT junto a Ronan Pinto, o jornalista do site “Opera Mundi”, Breno Altman, foi conduzido coercivamente para prestar depoimento à PF. O mesmo ocorreu com o ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares, dirigente que teria participado de reuniões no Banco Schahin como representante do partido.

Em nota divulgada ontem, a defesa de Ronan disse que ele “reafirmará não ter relação com os fatos mencionados e estar sendo vítima de uma situação que poderá ser esclarecida de uma vez por todas”.

Em sua página em uma rede social, Breno Altman afirmou que a Lava-Jato “faz da intimidação, do espetáculo e do arbítrio suas principais ferramentas de intervenção”. No texto, ele escreveu não ter sido apresentada, durante o interrogatório, “prova ou indício” do seu envolvimento no caso investigado.

Silvinho recebeu R$ 1,1 milhão de empresas investigadas

• Cúpula do PT teme depoimento do ex-secretário geral do partido

Cleide Carvalho, Sérgio Roxo, Thiago Herdy e Tiago Dantas - O Globo

CURITIBA e SÃO PAULO - Retirado do ostracismo e preso ontem na 27ª fase da Lava-Jato, Sílvio Pereira, ex-secretário geral do PT e braço-direito do ex-ministro José Dirceu, não aceitou apenas uma Land Rover “de presente” da empresa GDK, fornecedora da Petrobras, como foi revelado na época do mensalão. As investigações da Polícia Federal mostram que Silvinho, como é conhecido, recebeu R$ 1,1 milhão de empreiteiras ou operadores de propina no esquema da Petrobras entre 2009 e 2012.

A prisão de ontem deixou a cúpula do PT em alerta, porque o histórico do ex-dirigente mostra que ele não reage bem sob pressão. Em 2006, em entrevista ao GLOBO, Silvinho revelou detalhes sobre o funcionamento do mensalão, disse que o plano do operador Marcos Valério era arrecadar R$ 1 bilhão com negócios que envolviam pendências do governo e falou sobre o envolvimento da cúpula partidária nas irregularidades. Ao final da entrevista, arrependeuse do que havia falado e quebrou objetos em seu apartamento. A avaliação na cúpula petista é que qualquer menção a Lula que possa ser feita agora por Silvinho vai contribuir para desgastar a imagem do ex-presidente.

Logo depois que veio à tona a história do Land Rover, em 2005, Silvinho se desfiliou do PT. Mas os investigadores da Lava-Jato suspeitam que o afastamento ficou apenas no papel, porque ele continuou a receber propina para não contar o que sabia. Em janeiro passado, o lobista Fernando Moura afirmou aos investigadores que Silvinho era beneficiário de um “cala-boca” mensal de R$ 50 mil.

Levantamento feito pela força-tarefa da Lava-Jato mostra que os pagamentos ao ex-petista foram feitos por meio de duas empresas das quais ele foi sócio, a DNP Eventos e a Central de Eventos e Produções. A quebra do sigilo bancário indica que a OAS pagou à DNP R$ 486,1 mil entre 2009 e 2011. Em 2011, a UTC Engenharia, do empresário Ricardo Pessoa, um dos delatores da Lava-Jato, repassou R$ 22,5 mil para a empresa. O delator Júlio Camargo pagou R$ 12,3 mil à DNP em 2012. A Projetec, do também delator e empresário Augusto Mendonça Neto, fez depósitos, em 2010, num total de R$ 154 mil. Outros R$ 50 mil foram pagos em 2009 à Central de Eventos pela empresa SP Terraplanagem, uma das empresas de fachada controladas por Adir Assad, condenado na Lava-Jato.

O Ministério Público Federal também identificou pagamentos de R$ 400,4 mil da TGS Consultoria, outra empresa que movimentou propina, para a Central de Eventos, empresa de Júlio César dos Santos, amigo e sócio do ex-ministro José Dirceu, para a DNP. Júlio César chegou a ser preso e responde ação no âmbito da Lava-Jato por lavagem de dinheiro e associação criminosa.

No despacho em que decretou a prisão temporária de Silvinho, o juiz Sérgio Moro afirma que as duas empresas do ex-secretário do PT não aparentam ter estrutura compatível com os valores recebidos. No endereço da DNP, existe apenas um restaurante pequeno. O endereço da Central de Eventos não foi localizado.

O ex-dirigente petista foi preso na casa onde vive em um condomínio fechado em Carapicuíba, na Região Metropolitana de São Paulo. O imóvel foi comprado em 2010 por R$ 600 mil. Desde que seu nome surgiu na Lava-Jato, Silvinho tem tentando submergir, como fez na época do mensalão. No segundo semestre do ano passado, ele fechou o restaurante que tinha em Osasco, também na Grande São Paulo, e encerrou as atividades da DNP.

O responsável pela defesa de Sílvio Pereira não foi localizado. O advogado que o defendeu no mensalão informou que não trabalha mais para o ex-dirigente petista.

Contrato de gaveta liga Valério à Lava-Jato

• Ronan Maria Pinto teria tentado receber dinheiro do PT via empresa de operador

- O Globo

Condenado a 37 anos de prisão no escândalo do mensalão e cumprindo pena em presídio de Minas Gerais, o operador Marcos Valério pode ser novamente denunciado por lavagem de dinheiro em função das investigações da 27ª fase da Lava-Jato. Uma de suas empresas, a 2S Participações, celebrou um contrato de gaveta com uma empresa de Ronan Maria Pinto, como forma de garantir que o empresário recebesse cerca de R$ 6 milhões do PT.

A empresa de Valério acabou não sendo usada para operacionalizar o pagamento — em seu lugar, foi usado um esquema montado por José Carlos Bumlai, pecuarista e empresário de confiança do ex-presidente Lula. Ainda assim, os procuradores entendem que, ao emprestar o nome de sua empresa para tentar resolver o problema, Valério também deve ser investigado.

Um depoimento prestado pelo operador à Procuradoria-Geral da República (PGR) em 2012 foi utilizado pelos procuradores para embasar parte da operação de ontem. Na tentativa de delação premiada, Valério contou à PGR que o ex-secretário-geral do PT Sílvio Pereira o procurou em 2004 pedindo ajuda, porque Lula e os ex-ministros José Dirceu e Gilberto Carvalho estariam sendo chantageados por Ronan Maria Pinto. Ainda segundo ele, o empresário do ABC teria pedido R$ 6 milhões para comprar um jornal. O valor acabaria sendo obtido por Bumlai junto ao Banco Schahin como contribuição ao PT e repassado a Ronan Maria Pinto.

Valério não foi ouvido pela força- tarefa da Lava-Jato, segundo o MPF. Caso os procuradores queiram usar os fatos narrados por ele na denúncia, terão que marcar um novo depoimento. Na avaliação de Diogo Castor e Paulo Galvão, outros depoimentos já confirmam as informações prestadas por Marcos Valério.

— Não sabemos ainda se iremos ouvi-lo de novo. O depoimento é público, e ele nos ajuda a ter uma ideia das circunstâncias em que o empréstimo foi feito. Mas, para uma eventual denúncia, não precisamos saber necessariamente qual foi a circunstância (dos pagamentos), desde que consigamos comprovar que a operação foi ilegal — disse o procurador Galvão.

Além de denunciar a operação para Ronan Maria Pinto, no depoimento de 2012 Valério disse ter sido ameaçado de morte por Paulo Okamotto, braço-direito de Lula, para não contar o que sabia sobre o mensalão. Disse também ter falado pessoalmente com Lula, em reunião no Palácio do Planalto, sobre os empréstimos fictícios contraídos por sua empresa para abastecer o mensalão. Okamotto e Lula negaram as acusações.

PGR deve incluir Lula no inquérito principal

• Investigação aberta no STF é sobre o crime de formação de quadrilha no esquema de desvios na Petrobras

Ex-presidente é o político mais citado na delação de Delcídio Amaral: são, ao todo, oito acusações contra o líder petista

Vinicius Sassine - O Globo

BRASÍLIA - A Procuradoria-Geral da República (PGR) deve pedir ao Supremo Tribunal Federal (STF) que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva seja investigado no principal procedimento da Operação Lava-Jato na Corte, o inquérito-mãe que apura crime de formação de quadrilha no esquema de desvios de recursos da Petrobras. O grupo de trabalho responsável pela Lava-Jato na PGR prepara os primeiros pedidos de abertura de inquérito a partir da delação premiada do senador Delcídio Amaral (sem partido-MS), já homologada pelo STF e tornada pública no último dia 15 de março.

Parte das citações a Lula seria encaminhada ao procedimento já existente, conforme um pedido em análise no MPF. O ex-presidente é o político mais citado na delação de Delcídio: são, ao todo, oito acusações ao petista.

Dilma e Temer também na mira
A Lava-Jato já resultou em quase 40 inquéritos abertos no STF para investigar autoridades com foro privilegiado e outros políticos conectados às acusações apuradas. Entre eles estão deputados e senadores dos principais partidos que integram ou integraram a base de apoio do governo e os presidentes da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL). A delação de Delcídio vai ampliar a quantidade de inquéritos da Lava-Jato no STF. Além de Lula, a PGR estuda pedir a abertura de procedimentos para investigar a presidente Dilma Rousseff, o vice-presidente Michel Temer e o principal líder da oposição, Aécio Neves (PSDB-MG).

O inquérito número 3.989, com 39 políticos investigados, é considerado como o principal em curso no STF, dentre os procedimentos relacionados à Lava-Jato. É o único que investiga o crime de formação de quadrilha e que conecta parlamentares do PP, do PMDB e o ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto, preso em Curitiba. Este inquérito-mãe é visto como oportunidade para se investigar o suposto funcionamento de uma organização criminosa no fatiamento das diretorias da Petrobras entre partidos da base aliada, com pagamentos de propina a partir de contratos superfaturados, em troca de suporte político a diretores.

A delação de Delcídio já foi fatiada pelo ministro Teori Zavascki, relator da Lava-Jato no STF, em 19 petições. Este é o passo prévio ao pedido de abertura de inquéritos. No caso de Lula, fontes consideram provável tanto o pedido de remessa de acusações ao inquéritomãe quanto solicitações de novos inquéritos. Esta possibilidade já existia antes da delação de Delcídio. Investigações em curso apontavam para uma conexão de Lula — sem foro privilegiado — a irregularidades associadas a autoridades com foro, o que motivaria uma apuração em conjunto no STF.

Na delação, Delcídio chegou a afirmar que o ex-presidente foi um “grande ‘sponsor’ (patrocinador) dos negócios do BTG”. A narrativa mais detalhada diz respeito à tentativa de se evitar a delação do ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró. Delcídio ficou preso por tentar interferir na colaboração de Cerveró, com proposta de ajuda financeira a familiares e até mesmo um plano de fuga para o ex-diretor. Segundo Delcídio, partiu de Lula pedido para que intercedesse por José Carlos Bumlai, amigo do ex-presidente.

O pedido teria sido feito no Instituto Lula, em maio de 2015, conforme o delator. “Lula manifestou grande preocupação com a situação de José Carlos Bumlai em relação às investigações da Lava Jato. Lula expressou que Bumlai poderia ser preso em razão das colaborações premiadas que estavam vindo à tona, particularmente de Fernando Baiano e Cerveró e que, por conta disso, Bumlai precisava ser ajudado”, disse Delcídio.

A partir dessa conversa, o filho de Bumlai, Maurício Bumlai, foi procurado, “momento em que transmitiu o recado e as preocupações de Lula”. “O pedido de Lula para auxiliar Bumlai, no contexto de ‘segurar’ as delações de Cerveró, certamente visaria o silêncio deste último e o custeio financeiro de sua respectiva família”, interpretou o delator.

O Instituto Lula disse que “não comenta falatórios”. “Quem quiser levantar suspeitas em relação ao ex-presidente Lula que o faça diretamente e apresente provas, ou não merecerá resposta.” O instituto lembrou que Lula já prestou depoimento no inquérito-mãe da Lava-Jato.

“Época”: Lula e o lobista da Odebrecht
De acordo com a revista “Época”, a Polícia Federal encontrou provas de que Lula, ainda como presidente, atendeu a pedido de um lobista da Odebrecht. Um e-mail recuperado pela Lava Jato indica uma ação de Lula para favorecer a Braskem — uma empresa do grupo Odebrecht — em negócio no México.

A Odebrecht queria que Lula fosse ao México, em 2009, se encontrar com o então presidente, Felipe Calderón, em reunião para assinatura de um contrato da Braskem com a mexicana Idesa. O acerto previa a construção de um complexo petroquímico de US$ 5,2 bilhões no estado mexicano de Veracruz.

Em fevereiro de 2010, Lula esteve no México para a 2ª Cúpula da América Latina e do Caribe sobre Integração e Desenvolvimento. No dia 23, Lula teve a reunião com Calderón, na qual se comemorou a assinatura do contrato entre a Braskem e a Idesa.

PT diz que Moro age à revelia da lei e extrapola competência

• Oposição avalia que nova fase da operação reforça impeachment

Depois de uma semana positiva ao PT, nova fase da Lava-Jato preocupa a cúpula do partido

- O Globo

BRASÍLIA e SÃO PAULO - Em reação à 27ª fase da Lava-Jato, o vice-líder do PT na Câmara, deputado Paulo Pimenta (RS), disse ontem que o juiz Sérgio Moro e os investigadores da Lava-Jato “extrapolam suas competências, agem à revelia da lei” e “como se fossem juízes e promotores criminais do estado de São Paulo”. O petista criticou o que considera uma tentativa de vincular as investigações à morte do ex-prefeito de Santo André Celso Daniel (PT) e interferir no processo político.

Depois de uma semana com notícias favoráveis ao PT e ao governo, a 27ª fase da Lava-Jato, batizada de Carbono 14, caiu como uma ducha de água fria na cúpula da legenda. Os petistas acreditam que Moro novamente agiu politicamente ao deflagrar a operação.

— O Sérgio Moro puxou a Carbono 14 porque está semana estava boa para nós. Ele não tem limites. Pega uma coisa que estava na gaveta e vai soltando aos poucos, de pedacinho em pedacinho — afirmou um petista próximo ao ex-presidente Lula.

O objetivo, na avaliação dos aliados de Lula, é buscar uma declaração de Sílvio Pereira sobre o pecuarista e José Carlos Bumlai, amigo de Lula. O nome Carbono 14 (em referência a procedimentos utilizados pela ciência para a datação de itens e a investigação de fatos antigos), mostraria, segundo integrantes da cúpula do PT, que o objetivo é apenas requentar episódios do passado.

Na avaliação dos petistas próximos a Lula, uma conjunção de fatores tinha permitido ao governo respirar, nos últimos dias. Entre os pontos citados estão a decisão da presidente Dilma Rousseff de adotar um tom mais agressivo na batalha contra o impeachment, a forma como o PMDB anunciou o desembarque do governo e a enquadrada dada pelo novo ministro da Justiça, Eugênio Aragão, na Polícia Federal. Tudo isso agora está ameaçado com a nova fase da Lava-Jato, que trará ao noticiário assuntos incômodos para o partido, como a morte de Celso Daniel.

— O episódio da morte de Celso Daniel foi objeto de inúmeras manifestações na esfera criminal em São Paulo, já existem pessoas cumprindo pena por isso. Tentar reascender isso no imaginário da opinião pública, tentar fazer um vínculo sobre a investigação da Lava-Jato na Petrobras com esse episódio é algo absolutamente artificial, algo absolutamente incompreensível — disse Pimenta. — O Moro não é juiz criminal de São Paulo, os investigadores da Lava-Jato não são investigadores que atuam em todo o Brasil e não são da esfera criminal. Se houve uma assassinato, ele já foi esclarecido. Não tem nada a ver com a Lava-Jato. Tentar fazer esse vínculo é tentar semear na opinião pública mais elementos de instabilidade, de caos social, de ódio, é isto que está se produzindo.

Pimenta disse estranhar que, a cada vez que se faz um ato favorável ao governo, “imediatamente surge mais um fato para criar esse ambiente de espetáculo”. Para ele, a investigação sobre Celso Daniel não se justificam no âmbito da Lava-Jato. Integrantes da cúpula do PT e representantes do Planalto mostraram preocupação com o impacto da nova fase da operação. A avaliação é que a Carbono 14 atinja diretamente pessoas que foram ligadas ao PT e trazem à tona episódios traumáticos, como a morte de Celso Daniel.

Lula e Dilma continuam promovendo o troca-troca em cargos de segundo escalão. Mas as maiores trocas, segundo um interlocutor do governo, entraram em compasso de espera até a próxima semana, esperando “decantar” os desdobramentos da Lava-Jato, inclusive junto aos partidos da base que negociam cargos. Lula deve voltar a Brasília no início da próxima semana. Segundo um petista, há “muita preocupação” com essa ação da PF.

Dilma pretendia ter ontem uma definição sobre os ministérios do PMDB. Mas o movimento foi adiado. A tendência é a petista manter titulares como Helder Barbalho (Portos), em deferência ao senador Jader Barbalho (PMDB-PA), que se reuniu com Lula na quarta-feira.

A oposição avalia que a nova fase reforça ainda mais o processo de impeachment de Dilma, pois agrega ao rol de suspeitas envolvendo o petrolão um novo componente, o criminal. Segundo os líderes oposicionistas, as investigações trazem à tona um crime que nunca foi elucidado e sobre o qual pairam suspeitas, o de Celso Daniel.

— Além da esfera de crimes de corrupção temos agora a de crime de morte. Esse caso assusta não apenas o país, mas o Congresso Nacional que vai votar o impeachment da presidente. Assusta e motiva ainda mais os que vão votar pelo impeachment da presidente — afirmou o líder do PSDB na Câmara, Antonio Imbassahy, acrescentando: — A Lava-Jato começa a elucidar os motivos do crime e certamente vai chegar nos mandantes.

Nova fase da Lava Jato e Silvinho preocupam Planalto

• O 'núcleo duro' do Palácio do Planalto avaliou a nova fase da Operação Lava Jato, nesta sexta-feira, como mais uma tentativa do juiz Sérgio Moro de envolver o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em novo escândalo

Vera Rosa - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - O “núcleo duro” do Palácio do Planalto avaliou a nova fase da Operação Lava Jato, nesta sexta-feira, como mais uma tentativa do juiz Sérgio Moro de envolver o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em novo escândalo, um dia depois da decisão do Supremo Tribunal Federal de manter na Corte todas as investigações sobre o petista. Embora o discurso oficial seja o de que Moro está “politizando” a Lava Jato, há no Planalto uma preocupação com denúncias que possam aparecer às vésperas da votação do processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff na Câmara.

No caso em questão, o “imponderável” tem nome e sobrenome: Silvio Pereira, personagem de destaque no escândalo do mensalão, em 2005. Conhecido como Silvinho, o ex-secretário-geral do PT era o homem que tinha em mãos o mapa dos cargos no início do primeiro mandato de Lula, em 2003, e atuava em dobradinha com o então ministro da Casa Civil José Dirceu, preso pela Lava Jato. Silvinho foi detido nesta sexta-feira e o ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares – preso na época do mensalão – foi alvo de condução coercitiva, obrigado pela Polícia Federal a depor.

Ministros do PT que conhecem Silvinho disseram ontem à presidente que ele não resiste à mínima pressão e pode até “inventar” coisas para se salvar. Para o Ministério Público Federal, o esquema de corrupção na Petrobrás é mais um braço do mensalão. Em janeiro, o delator Fernando Moura afirmou, em acordo de delação premiada, que Silvinho recebia das empreiteiras OAS e UTC Engenharia um “cala boca” de R$ 50 mil mensais para não contar tudo o que sabia.

Moura contou ao Ministério Público que Roberto Marques, o Bob, ex-assessor de Dirceu, pediu a ele que “protegesse” Silvinho. Questionado sobre o motivo, o delator disse: “Não sei, o problema do Sílvio com o PT é muito forte porque todo esse processo que foi feito de Petrobrás quem começou foi o Sílvio.”

Na busca de votos para barrar o impeachment de Dilma na Câmara dos Deputados, o governo faz de tudo para manter distância de mais turbulências, pois qualquer fato com potencial de desgaste provoca instabilidade e pode agravar a crise política.

O Planalto está confiante no julgamento do Supremo que decidirá sobre a nomeação de Lula na Casa Civil, nos próximos dias, mas teme que novas delações esbarrem no ex-presidente e atinjam Dilma. No PT o comentário é que o juiz Moro vai levar a Lava Jato no mínimo até as eleições municipais de outubro, por causa do impacto das investigações sobre as disputas.

Irmão de Celso Daniel acusa PT de tentar abafar crime e diz que Lava Jato pode esclarecer caso

• Bruno Daniel e outros familiares do ex-prefeito de Santo André defendem a tese de crime político, pela qual ele teria sido morto para evitar denúncias sobre esquemas de corrupção em financiamento de campanhas petistas e de aliados

Ana Fernandes - O Estado de S. Paulo

SÃO PAULO - O irmão do ex-prefeito de Santo André Celso Daniel, morto em janeiro de 2002, Bruno Daniel, disse em entrevista à Rádio Estadão nesta sexta-feira, 1º, ter esperança que a 27ª fase da Lava Jato, Carbono 14, deflagrada durante a manhã, possa lançar luz sobre as investigações do assassinato. Bruno e outros familiares de Celso Daniel defendem a tese de crime político, pela qual o ex-prefeito teria sido morto para evitar denúncias sobre esquemas de corrupção em financiamento de campanhas do PT e de aliados.

"A operação Lava Jato, nesta etapa Carbono 14, pode lançar luz sobre o que aconteceu naquela época", afirmou Bruno. "É necessário esclarecer por que razão a direção do PT teria remetido, através de esquemas ilícitos, cerca de R$ 6 milhões ao empresário Ronan Maria Pinto, dinheiro com qual ele teria adquirido o jornal do Grande ABC mediante chantagem ao Lula, ao José Dirceu e ao Gilberto Carvalho", complementa.

Bruno Daniel acusa o PT de tentar dissuadir a família de seguir pressionando pela apuração do caso. "O partido fez tudo o que era possível e imaginável para reforçar a tese da polícia, segundo a qual o crime seria um crime comum. Isso foi feito por inúmeros estratagemas. Por que razão o Partido dos Trabalhadores, com pouquíssimas exceções, se portou desse jeito?", questionou. Ele citou apenas três pessoas do PT, Hélio Bicudo - hoje um dos autores do processo de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff -, o ex-senador Eduardo Suplicy e o então vereador em Santo André Ricardo Alvarez de não serem coniventes com os indícios de crime político.

A Carbono 14 investiga supostos repasses do pecuarista José Carlos Bumlai, amigo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a Ronan. Segundo as investigações, Bumlai tomou um empréstimo fraudulento de R$ 12 milhões em 2004 do Banco Schahin. Parte dos recursos foi destinada a pagar dívidas do PT. Metade do valor, segundo disse Bumlai à Polícia Federal, teria sido destinada a quitar dívidas da campanha petista em Campinas, em 2002 e 2004. A força-tarefa diz também que a operacionalização do esquema se deu inicialmente com o Frigorífico Bertin. De acordo com os investigadores, os outros R$ 6 milhões do montante foram destinados a Ronan Maria Pinto. Os procuradores agora querem saber o porquê. Em coletiva nesta manhã, a Lava Jato admitiu que investiga o elo com a morte de Celso Daniel, mas não deu maiores detalhes.

Bruno disse que cabe à polícia investigar, mas que ele acredita que Ronan teria informações sobre a morte de seu irmão e que obteve recursos ao chantagear dirigentes petistas para manter o silêncio. "Imagino, agora é só imaginação, pois quem deve elucidar isso é a investigação, mas imagino que ele (Ronan) tenha chantageado essas pessoas porque ele revelaria coisas relativas ao assassinato do Celso", afirmou.

Gilberto Carvalho. O irmão lembrou que foi encontrado um dossiê sobre corrupção na prefeitura de Santo André, no apartamento de Celso Daniel, três meses após a morte. Bruno alega que o documento foi produzido pelo ex-ministro Gilberto Carvalho. Bruno também acusa Carvalho de tentar dissuadir a ele e seu irmão, João Francisco Daniel, a não insistirem no caso.

"À época da missa de sétimo dia do Celso, meu irmão e eu fomos procurados pelo Gilberto Carvalho, que disse que havia um esquema para arrecadação de recursos para campanhas eleitorais do PT e aliados e que ele próprio (Carvalho) havia levado ao José Dirceu, então presidente do Partido dos Trabalhadores a quantia de R$ 1,2 milhão no seu 'corsinha' preto", relatou. "Nos perguntamos por que razão ele teria dito isso. A hipótese que a gente trabalha é que isso nos desestimularia a prosseguir nas investigações porque isso poderia representar uma mancha na história do Celso."

"Se houve problemas relacionados a esquemas espúrios de arrecadação de recursos, isso teria que ser apurado, mas nada justifica tortura e assassinato de quem quer que fosse", declarou.

Outro petista citado por Bruno na entrevista foi o atual prefeito de Mauá, Donisete Braga. "O então deputado estadual, Donisete Braga, teve seu celular rastreado na região do cativeiro do meu irmão, isso nunca foi esclarecido. O que estaria ele fazendo na região do cativeiro?"

Crime político. Na entrevista, Bruno Daniel lembrou que a polícia trabalhou o tempo todo com a tese, a seu ver "estapafúrdia", de crime comum, e que o Ministério Público, a pedido da família, seguiu a tese de crime político. Bruno lembrou também o caso do legista Carlos Delmonte Printes, que à época veio a público dizer que o assassinato de Celso Daniel tinha indícios que apontavam para queima de arquivo. O legista deu uma entrevista ao programa de Jô Soares, na TV Globo, e pouco depois apareceu morto. A polícia, na ocasião, encerrou o caso como suicídio, destacou Bruno. "Não foi encontrado nada no corpo dele que indicasse suicídio.

Ele inclusive era de origem judaica e a família não aceitou que ele fosse enterrado em área separada no cemitério, como é da tradição deles", apontou.

Bruno destacou que seis pessoas já foram condenadas por envolvimento no caso da morte de seu irmão, mas que o suposto mandante Sergio Gomes da Silva, o 'Sombra', não foi ainda levado a júri popular. Bruno Daniel diz que também seria importante questionar de onde o 'Sombra' tirou recursos para pagar o advogado, Roberto Podval. "De onde saem os recursos de Sergio Gomes da Silva pra pagar o escritório de advocacia do doutor Podval, que cobra o olho da cara por seus serviços, de onde saem esses recursos?", insistiu. Podval é também o defensor de José Dirceu, que foi preso na Lava Jato.

Outro lado. Contatado pela reportagem, Donisete Braga disse que sua resposta é "a resposta da Justiça". "O Tribunal de Justiça, por decisão unânime, por 25 votos a zero, rejeitou a denúncia, bem como o promotor Rodrigo Pinto. Inclusive o próprio governador do Estado, Geraldo Alckmin, fez um documento informando minha presença no Palácio dos Bandeirantes no horário (do suposto rastreamento do celular", disse o prefeito de Mauá.

Donisete Braga destacou ainda que a questão lhe causou dano político e pessoal e incluiu, em sua resposta, que até mesmo sua adversária na disputa eleitoral pela prefeitura em 2012, Vanessa Damo (PMDB), ficou inelegível por ter recorrido ao tema na campanha. "Não quero repetir esse assunto que causou um transtorno imenso à minha vida", disse. Sobre a acusação de Bruno Daniel de que praticamente todos os membros do PT tentaram abafar a investigação do crime político, Donisete Braga disse que não iria se pronunciar. "Sem comentários", disse.

Gilberto Carvalho disse, por meio de sua assessoria de imprensa, que junto com o PT e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva fez esforços para que o assassinato de Celso Daniel fosse esclarecido. Ele lembrou que o caso foi amplamente investigado durante a CPI dos Bingos e criticou o “uso político” do crime.

“Este caso foi amplamente abordado na CPI dos Bingos, ocasião em que Carvalho prestou dois depoimentos, entre eles uma acareação com os irmãos Daniel e nenhuma evidência contra ele foi encontrada. Gilberto declara ter todo o interesse em que as investigações sejam realizadas com objetividade e sem o uso político que mais uma vez se pretende dar ao assunto. A morte de Celso Daniel representou a perda de um grande companheiro e um excelente quadro político”, diz a nota emitida pelo ex-ministro.

O advogado Roberto Podval diz que, em respeito à perda da família, prefere não comentar as citações de Bruno.

A reportagem também tentou contato com o presidente nacional do PT, Rui Falcão, com o Instituto Lula e com o próprio partido, mas não recebeu retorno até a publicação desta matéria.

Lava Jato identificou caminho do dinheiro da Schahin até empresário de Santo André

• Por meio de quebras de sigilos e documentos apreendidos, procuradores trilharam caminho dos R$ 6 milhões repassados por José Carlos Bumlai para Ronan Maria Pinto, preso junto com o ex-secretário do PT Silvio Pereira, alvos da Carbono 14

Por Julia Affonso, Ricardo Brandt, Fausto Macedo – O Estado de S. Paulo

A Operação Carbono 14, desdobramento 27 da Lava Jato, trilhou do caminho do dinheiro – R$ 12 milhões – emprestado pelo Banco Schahin, em 2004, ao pecuarista José Carlos Bumlai, amigo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, até ao repasse de R$ 6 milhões ao Ronan Maria Pinto, de Santo André (SP). Dono do Diário do Grande ABC e da Expresso Nova, ele preso nesta sexta-feira, 1.
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Em outubro de 2004, Bumlai contraiu um empréstimo junto ao Schahin de R$ 12,176 milhões. A partir da quebra de sigilo bancário e fiscal decretada pelo juiz federal Sérgio Moro, os investigadores descobriram que em 21 de outubro de 2004, no mesmo dia em que recebeu os recursos do Banco Schahin em sua conta-corrente, o pecuarista transferiu integralmente os valores para o Frigorífico Bertin.

“A partir do acesso aos dados de quebra de sigilo bancário, foi possível rastrear parte do destino final do dinheiro”, destaca o relatório do Ministério Público Federal na Carbono 14.

Segundo a Lava Jato, do total do montante, R$ 6,02 milhões foram transferidos do Frigorífico Bertin para a Remar Agenciamento e Assessoria. Os procuradores afirmam, no documento, que o responsável pela empresa Remar, Oswaldo Vieira Filho foi ouvido e disse que, por indicação do empresário Luiz Carlos Casante, de São Paulo, elaborou dois contratos de empréstimo no valor de R$ 6 milhões. Um com a empresa 2S do operador do mensalão Marcos Valério e o segundo com a Expresso Nova Santo André.

“Acrescentou que a 2S não transferiu valores para a Remar. Assim, houve transferência de recursos tão somente da sua empresa Remar para a Expresso Nova Santo André e outras pessoas indicadas por Ronan Maria Pinto. Afirmou que não houve devolução de recursos emprestados pela Expresso Nova Santo André, confirmando, ainda, que para realizar a operação receberia uma comissão “spread” de 5% que seria dividida com Luiz Carlos Casante. Juntou documentação comprobatória do pagamento a Luiz Carlos Casante da sua parte da comissão”, afirma o relatório da Procuradoria.

Do valor de R$ 5.673.569,21, o montante de R$ 2.943.407,91 foi repassado diretamente para a empresa Expresso Nova Santo André, de acordo com os procuradores. Após o recebimentos, a Expresso Nova Santo André fez seis transferências diretas de aproximadamente R$ 210 mil para as contas de Maury Dotto como pagamento pela venda das ações do Diário do Grande ABC. Maury Campos Dotto foi identificado pela força-tarefa como o acionista que vendeu o controle do Jornal Diário do Grande ABC para Ronan Maria Pinto em 2004.

Segundo as declarações de Imposto de Renda de Ronan Maria Pinto, em outubro de 2004, o empresário comprou 38,83% das quotas do Diário do Grande ABC por intermédio de empréstimo recebido da Expresso Nova Santo André no valor de R$3.652 milhões.

“Logo, do dinheiro que saiu do Banco Schahin, ao menos R$ 1.470 milhão foram utilizados para pagar diretamente a compra de ações do Jornal Diário do Grande ABC, sendo possível, neste ponto, vincular diretamente o esquema da fraude do empréstimo do Banco Schahin à compra do periódico”, destaca o Ministério Público Federal.

Durante as investigações da Lava Jato, foi apreendida a minuta de contrato no escritório da contadora Meire Poza, – que trabalhava para o doleiro Alberto Youssef – de empréstimo de R$ 6 milhões entre a empresa Remar Agenciamento e Assessoria, de propriedade de Oswaldo Rodrigues Vieira Filho, e a empresa 2S, de Marcos Valério.

Lava Jato prende ex-secretário do PT e empresário ligado ao partido

- Folha de S. Paulo

BRASÍLIA, SÃO PAULO e CURITIBA - A 27ª fase da Operação Lava Jato, deflagrada nesta sexta-feira (1º), apura um elo entre os desvios na Petrobras e o caso Celso Daniel, prefeito petista de Santo André morto em 2002 em um crime nunca esclarecido.

Foram presos na operação, batizada de "Carbono 14", o ex-secretário-geral do PT Silvio Pereira e o empresário Ronan Maria Pinto, que já tinham sido mencionados na investigação sobre a morte.

O foco dessa fase da investigação é o destino de um empréstimo de R$ 12 milhões contraído pelo pecuarista José Carlos Bumlai, hoje em prisão domiciliar, junto ao Banco Schahin, em 2004.

Bumlai afirmou à Polícia Federal no ano passado ter adquirido o montante para direcioná-lo ao PT.

A suspeita é que parte da quantia tenha sido usada para comprar o silêncio de Ronan, dono de uma empresa de ônibus e de um jornal no ABC paulista.

Também foram alvos de condução coercitiva (levados para prestar depoimento à polícia), o ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares e o jornalista Breno Altman. Ao todo, foram cumpridas 12 ordens judiciais, sendo oito mandados de busca e apreensão.

De acordo com a força-tarefa da Lava Jato, o grupo Schahin, por ter concedido o empréstimo a Bumlai, obteve o direito de operação do navio-sonda Vitória 10.000, da Petrobras.

Os procuradores da Lava Jato dizem que não investigam a morte de Celso Daniel, embora tenham questionado testemunhas, durante a investigação, sobre a possibilidade de envolvimento da cúpula do PT no crime.

"O foco da nossa investigação é a lavagem de dinheiro. Os desdobramentos em relação a Santo André e à morte de Celso Daniel são investigados pelo MP-SP [Ministério Público de São Paulo]", disse o procurador Diogo Castor de Mattos.

Ao contrário da declaração do procurador, em seu despacho nesta sexta, o juiz Sergio Moro disse ser possível que haja uma ligação entre um esquema de corrupção na Prefeitura de Santo André com a morte de Celso Daniel.

O nome da operação é uma referência a análises utilizadas para identificar a datação de fósseis.

Um dos documentos usados para embasar a investigação da 27ª fase foi um depoimento concedido em 2012 pelo ex-publicitário Marcos Valério de Souza em tentativa de fazer acordo de delação premiada. Nele, Valério, pivô do escândalo do mensalão, afirmou que Ronan teria recebido dinheiro para evitar que revelasse nomes de envolvidos na morte do ex-prefeito petista.

Cerca de R$ 6 milhões, metade do dinheiro do empréstimo, segundo o procurador, foram repassados a Ronan e teriam sido usados para pagar dívidas pessoais e para comprar o jornal "Diário do Grande ABC".

O valor serviria, segundo a investigação, para que o empresário parasse de chantagear o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o então chefe de gabinete da Presidência, Gilberto Carvalho, e o então ministro da Casa Civil, José Dirceu.

A outra metade, segundo depoimento de Bumlai do final do 2015, foi usada para saldar dívidas de campanha eleitoral do PT de Campinas (SP) da época.

Mesada
Silvio Pereira teve prisão temporária decretada por ter, segundo os investigadores, pedido a Marcos Valério para que intermediasse o repasse a Ronan Maria Pinto.

A investigação apontou ainda que mesmo depois do mensalão, entre 2009 e 2011, o ex-secretário do PT se beneficiou do pagamento de R$ 486,1 mil da OAS para a DNP Eventos Ltda, empresa da qual é dono. Também há uma transferência da UTC à DNP de R$ 22 mil, além de repasses de Augusto Mendonça, da Toyo Setal, e o consultor Julio Camargo, também alvos da Lava Jato em fases anteriores e hoje delatores.

Segundo o procurador, não foi encontrada nenhuma contrapartida de serviços prestados para que Pereira recebesse esse montante.

Delúbio Soares foi alvo de condução coercitiva por suspeita de representar interesses do PT na contratação do empréstimo de R$ 12 milhões.

Outro lado
Alvos da 27ª fase da Operação da Lava Jato que se manifestaram nesta sexta-feira (1º) negam envolvimento no suposto esquema de corrupção baseado no diretório do PT em Santo André (SP).

A defesa do empresário Ronan Maria Pinto, preso temporariamente sob suspeita de receber R$ 6 milhões para não revelar irregularidades do partido, afirmou que o cliente não tem "relação com os fatos mencionados" e está "sendo vítima de uma situação que, com certeza, agora, poderá ser esclarecida de uma vez por todas".

Em nota, a defesa afirma ainda que o empresário sempre esteve à disposição das autoridades para "esclarecer com total tranquilidade e isenção as dúvidas e as investigações do âmbito da operação, assim como a citação indevida de seu nome".

"Inclusive ampla e abertamente oferecendo-se de forma espontânea para prestar as informações de que necessitassem", declara a nota.

Apontado como um dos intermediários do repasse a Ronan, o jornalista Breno Altman, amigo do ex-ministro José Dirceu e ligado ao PT, disse que foi surpreendido com a notícia de que a PF estivera em sua casa, em São Paulo, com mandados de condução coercitiva e de busca e apreensão. Ele estava em Brasília, onde prestou depoimento e foi liberado.

"Minhas declarações sobre a investigação em curso, no entanto, poderiam ter sido tomadas através de intimação regular, com data e horário determinados pelas autoridades", escreveu Altman em sua página do Facebook.

No texto, ele afirma que, durante o interrogatório, não foi apresentada "qualquer prova ou indício de eventual envolvimento no caso investigado". E critica a operação, que chamou de "seletiva" e "contaminada".

"Só posso reagir com indignação ao regime de exceção que o juiz Sergio Moro resolveu estabelecer para alguns dos intimados da chamada Operação Carbono 14", afirmou. "Sou apenas mais um dos alvos deste tornado antidemocrático." Ele reiterou as declarações à Folha.

Petistas
Os procuradores da Lava Jato afirmam ter também indícios da participação dos ex-ministros petistas Gilberto Carvalho e José Dirceu no esquema de corrupção e no pagamento a Ronan.

Procurada, a defesa de Dirceu declarou que ele "não tem nada a ver com isso".

A assessoria de Carvalho informou que "ele não participou de nenhuma negociação com Ronan Maria Pinto, conforme evidências apontadas" pelos investigadores.

Sobre a morte de Celso Daniel, fato que teria motivado o repasse, a assessoria de Carvalho disse que o PT, desde o início, "teve o máximo interesse no esclarecimento dos fatos". Acrescentou que a investigação esteve sob comando da Polícia Federal do tucano Fernando Henrique Cardoso e da Polícia Civil do tucano Geraldo Alckmin.

"A morte de Celso Daniel representou a perda de um grande companheiro e um excelente quadro político."

O diretório nacional do PT negou envolvimento com o banco Schahin. "O PT nunca contraiu empréstimo com o referido banco. Todas as doações recebidas pelo partido ocorreram estritamente dentro da legalidade e foram posteriormente declaradas à Justiça Eleitoral", afirmou a sigla.

A reportagem não localizou as defesas de Silvio Pereira e de Delúbio Soares até a publicação dessa reportagem.

Palácio do Planalto, a trincheira de Dilma

• Em 15 dias, presidente fez 5 atos oficiais, sem risco de hostilidade, para se defender do afastamento e acusar opositores

Eduardo Barretto - O Globo

BRASÍLIA - Há 15 dias, a presidente faz do Palácio do Planalto o bunker de sua luta contra o impeachment. Ela convocou aliados e fez cinco atos no período, com ataques ao Judiciário e ao Legislativo, comparações com o golpe de 1964 e convocações à resistência contra a aprovação do impedimento. A presidente da República, Dilma Rousseff, transformou o Palácio do Planalto em uma trincheira na sua luta contra o impeachment. Desde a posse frustrada do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva como ministro da Casa Civil — impedida por liminar do ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal —, o Palácio passou a receber juristas, artistas e integrantes de movimentos sociais para eventos em que Dilma combate o que considera a gestação de um golpe. Em pouco mais de 15 dias, cinco atos, todos em um ambiente sem nenhum risco de hostilidade, abrigaram ataques ao Judiciário e ao Legislativo, comparações do momento político atual com o período que antecedeu a ditadura de 1964 e convocações à resistência contra a aprovação do impedimento pelo Congresso.

Ontem, com o principal auditório do Palácio lotado, Dilma fez a terceira cerimônia consecutiva esta semana, todas defendendo seu mandato. Ela assinou atos de desapropriação de terras para a reforma agrária e povos quilombolas, além de decretos para ações contra o racismo. No discurso, disse que o país tem a democracia ameaçada e afirmou que “eles”, ao se referir a seus opositores, são violentos, ao contrário dos simpatizantes do governo.

Na última quarta, Dilma anunciou nova fase do Minha Casa Minha Vida: contratação de 2 milhões de casas, um milhão a menos do que o prometido. A cerimônia para as novas unidades habitacionais teve militantes uniformizados e com bandeiras. Um dia depois, quinta, artistas e intelectuais compareceram a um ato “contra o golpe”, a exemplo de ato com juristas no Palácio, mas dessa vez em número bem menor de presentes.

Ontem, o público voltou a ser de beneficiários diretos de programas sociais e militantes. A presidente voltou a defender a tese de que o país tem a democracia “ameaçada”. A fala de Dilma foi precedida por duros discursos de líderes de que ameaçaram invadir propriedades.

— Nós, hoje, precisamos nos manter vigilantes e oferecer resistências às tendências antidemocráticas, oferecer resistência também às provocações. Nós não defendemos qualquer processo de perseguição de qualquer autoridade porque pensa assim ou assado. Nós não defendemos a violência. Eles defendem. Eles exercem a violência. Nós, não — declarou Dilma, que, em cerimônia no Planalto na véspera, comparou a intolerância a petistas ao nazismo.

Pouco antes de a presidente fazer seu discurso, Aristides Santos, secretário de Finanças e Administração da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag), criticou a “bancada da bala” no Congresso, e ameaçou “ocupar” e “incomodar” as casas, fazendas e propriedades desses parlamentares.

— Vamos ocupar as propriedades deles (parlamentares da “bancada da bala”), as casas deles no campo. É a Contag e os movimentos sociais que vão fazer isso. Vamos ocupar os gabinetes, mas também as fazendas deles. Se eles são capazes de incomodar um ministro do Supremo Tribunal Federal, vamos incomodar as casas deles, as fazendas e as propriedades deles. Vai ter reforma agrária, vai ter luta e não vai ter golpe — disse Aristides.

DEM recorre ao ministério público
O líder do DEM na Câmara, Pauderney Avelino (AM), decidiu acionar o Ministério Público no Distrito Federal (MP-DF) questionando a atitude dela nas instalações do Planalto, classificados por ele como “atos de campanha e comícios políticos”. Pauderney quer que o MP-DF investigue Dilma por improbidade administrativa.

— A presidente Dilma tem sistematicamente feito atos políticos no Palácio do Planalto que consideramos atos de campanha política. Ela quer mostrar que está prestigiada. — disse Pauderney. — Dilma está instrumentalizando o Planalto. É um desrespeito com o Palácio.

Na cerimônia de ontem, a presidente assinou 25 decretos que abrangem 56.512 hectares, 21 para desapropriação de terra para a reforma agrária e quatro para a regularização de territórios quilombolas. De acordo com o governo, 799 famílias quilombolas serão beneficiadas.

O ministro do Desenvolvimento Agrário, Patrus Ananias, em seu discurso acrescentou ao bordão “Não teremos golpe” o “Teremos reforma agrária”, e foi endossado por Dilma.

— Forças empenhadas no retrocesso no passado já demonstraram que não têm maior apego à democracia quando se apegam com maior vigor aos seus interesses e seus privilégios — afirmou o ministro.

A média de assentamentos de famílias para a reforma agrária no governo Dilma é muito inferior às dos ex-presidentes Lula e Fernando Henrique. Ano passado, Dilma assentou 26.670 famílias. Em 2014, ano em que mais assentou famílias, foram beneficiadas com títulos de terra 32.019 famílias. Esse número é menor do que o registrado em qualquer ano das gestões e Lula e FH. A quantidade de famílias assentadas sob Lula variaram de 36.301 em 2003 a 136.358 em 2006. Na gestão de FH, o número de assentados oscilou de 42.912 em 1995 (ano em que entrou na Presidência) a 101.094 em 1998.

Líder do PSDB pede investigação de Dilma e líder do MTST por incitação à violência

• Assinada por Antonio Imbassahy, a representação também pede abertura de inquérito para apurar possível prática de constituição de 'milícia armada' e improbidade administrativa

Daiene Cardoso - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - A oposição protocolou nesta sexta-feira, 1º, uma representação na Procuradoria Geral da República (PGR) contra a presidente Dilma Rousseff e o coordenador nacional do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), Guilherme Boulos, por suposta prática de incitação a violência como resistência ao pedido de impeachment em trâmite na Câmara dos Deputados.

Assinada pelo líder do PSDB na Câmara, Antonio Imbassahy (BA), a representação também pede abertura de inquérito para apurar possível prática de constituição de "milícia armada" e improbidade administrativa.

Boulos, representante do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto, teria dito nesta semana, em evento no Palácio do Planalto, que haverá mobilização nas ruas "para resistir a esse golpe". "Isso (golpe) não funciona mais hoje. Não funcionará e é por isso que dizemos: vai ter luta, vai ter resistência. Não passarão com esse golpe de araque no Brasil", teria dito Boulos, de acordo com a petição protocolada por Imbassahy.

Na representação, Imbassahy diz que Dilma fez pronunciamentos "indecorosos e indignos do cargo que ocupa", ratificando o discurso de Boulos de que o atual processo de impeachment é um golpe. "Ora, a Presidente da República não tem o direito de dizer que um procedimento de impeachment que já foi analisado pelo Supremo Tribunal Federal, e considerado legítimo, é golpe. O procedimento de impeachment existe justamente para saber se houve ou não o crime de responsabilidade. Se a Presidente da República considera que não há crime de responsabilidade, cabe a ela defender-se nos autos desse processo. Esse é o direito que lhe assiste. Mas não lhe cabe provocar discursos inflamados, tentar jogar a população contra as instituições e tolerar ou amplificar promessas de resistência armada feitas nas barbas dos poderes constituídos brasileiros", diz a petição.

O líder da oposição na Câmara, deputado Miguel Haddad (PSDB-SP), anunciou hoje que também vai pedir investigação contra Dilma, contra o coordenador nacional do MST, Alexandre Conceição, e o secretário de finanças e administração da Contag, Aristides Santos. Durante evento de regularização de propriedades rurais no Palácio do Planalto, eles teriam incitado a violência como resistência ao processo de impedimento da presidente.

Os discursos da petista e os eventos no Palácio do Planalto que terminaram em atos para defender seu mandato têm incomodado a oposição. "É inadmissível que o governo Dilma utilize a máquina pública para promover palanque de apoio e incitação à violência. O governo está agindo de forma irresponsável e deve responder por isso", justificou Haddad, em nota divulgada nesta tarde.

O tucano reclama que Dilma não coibiu os discursos provocadores, entre eles o de Aristides Santos, que teria dito: "a forma de enfrentar a bancada da bala contra o golpe é ocupar as propriedades deles nas bases e no campo. Porque se eles são capazes de incomodar o ministro do Supremo Tribunal Federal, nós vamos incomodar também as casas e as fazendas deles." Haddad também menciona crítica do coordenador do MST ao juiz Sérgio Moro, que teria sido chamado de "golpista".

Janot acusa PP de 668 atos de corrupção

• Denúncia pede o ressarcimento de R$ 357,9 milhões à União

Vinicius Sassine - O Globo

BRASÍLIA - O PP, cortejado pelo Planalto, é acusado pela Lava- Jato de desviar pelo menos R$ 357 milhões da Petrobras. A Procuradoria-Geral da República (PGR) atribui 668 atos de corrupção passiva e 1.091 atos de lavagem de dinheiro aos sete parlamentares e ex-parlamentares do PP denunciados ao Supremo Tribunal Federal (STF) na última terça-feira. A denúncia contempla quatro inquéritos da Operação Lava-Jato em curso no STF.

O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, pede na denúncia a perda de bens e valores dos acusados em favor da União no valor de R$ 357,9 milhões — montante que o MPF diz que foi desviado para os integrantes do partido — e reparação por danos morais e materiais neste mesmo valor. O procurador-geral também solicita perda de função pública e dos mandatos em caso de condenação pelo STF.

Votos cobiçados
Na acusação de mais de 250 páginas, Janot diz que os desvios da Petrobras garantiram a permanência do PP na base de apoio ao governo. A busca pelo controle da propina, inclusive, chegou a motivar a troca do líder do partido na Câmara em 2011, conforme a denúncia.

Agora, o PP passou a ser um dos partidos mais cobiçados pela presidente Dilma Rousseff para tentar evitar o impeachment no Congresso, depois do desembarque do PMDB nesta semana. No balcão de cargos, o PP passou a ter prioridade.

O suposto esquema de arrecadação de propina que coube ao partido, a partir da Diretoria de Abastecimento da Petrobras, contou com o protagonismo de dois ex- deputados federais: Mário Negromonte, que também foi ministro das Cidades no primeiro governo Dilma e depois conselheiro do Tribunal de Contas dos Municípios ( TCM) da Bahia, e João Pizzolatti Júnior, secretário extraordinário de Relações Institucionais do governo de Roraima.

A denúncia ao STF atribui 288 atos de corrupção e 665 de lavagem a Negromonte. A Pizzolatti, são 280 e 326, respectivamente.

Os outros cinco denunciados do PP estão no exercício de seus mandatos na Câmara e são considerados importantes na guerra por votos do impeachment. Mário Negromonte Júnior (BA) foi acusado de 90 atos de corrupção passiva, 90 de lavagem de dinheiro e um de integração de organização criminosa.

Negromonte Júnior é suspeito de ter movimentado dinheiro desviado da Petrobras em contas conjuntas com o pai. A acusação de organização criminosa quema existente e atuavam na Câmara para mantê- lo, por meio de sustentação política ao então diretor de Abastecimento da Petrobras, Paulo Roberto Costa, ligado ao PP.

“A sustentação política fornecida por Pizzolatti e Negromonte à indicação e manutenção de Paulo Roberto consistia na sinalização continuada, através do PP, de que a preservação desse estado de coisas era um dos fatores da permanência da agremiação partidária na ‘situação’, ou seja, na coalização partidária que dava ao governo base de votos no Congresso Nacional”, registra a denúncia ao STF.

Fornecedores fantasmas
Ainda conforme a acusação, Pizzolatti e Negromonte “agiram no sentido de direcionar vantagens indevidas a outros membros do PP, previamente ajustado com estes, que tinham pleno conhecimento dos fatos, a fim de que eles se elegessem ou se reelegessem, ampliando ou menos mantendo a base de sustentação política do esquema de corrupção e lavagem de dinheiro”. A PGR cita que diversos fornecedores das campanhas de parlamentares do PP não existem, uma prova de que o sistema eleitoral teria sido usado como “ficção para receber propina”.

A denúncia registra ainda que Pizzolatti buscou dinheiro junto ao doleiro Alberto Youssef, considerado o operador do PP, por 23 vezes, no próprio escritório do doleiro. O dinheiro arrecadado somou R$ 3,9 milhões, conforme a acusação.

Os investigadores detectaram entregas de dinheiro vivo, depósitos bancários a assessores e repasses a parentes de Pizzolatti e de Negromonte.

Dornelles diz que 'todo governo do PT é um desastre', mas defende permanência do PP no governo

• Apesar de criticar o partido, governador em exercício do Rio diz não ver base para impeachment e fala em 'governabilidade'

Luciana Nunes Leal - O Estado de S. Paulo

RIO - Aos 81 anos, Francisco Dornelles (PP) assumiu o governo do Rio de Janeiro durante a licença de 30 dias do governador Luiz Fernando Pezão (PMDB) - que se trata de um câncer no sistema linfático - e encontrou uma “situação de tragédia”, como descreve. Diz que a penúria dos Estados está ligada à crise nacional, mas rejeita a tese do impeachment da presidente Dilma Rousseff, embora seja implacável com o PT. “O PT não sabe governar, todo governo do PT é um desastre. Mas ninguém faz oposição e baderna nas ruas tão bem quanto ele”, disse Dornelles ao Estado. “Um afastamento pode começar um processo de baderna que tem que ser medido, principalmente se for feito um impeachment sem muita base. O PP tem que pensar em governabilidade”.

No momento em que o PP discute o rompimento com o governo e recebe oferta para ocupar o Ministério da Saúde, o governador em exercício diz que a hora é de ficar com Dilma. “O PP não deveria sair do governo. Deveria ficar e fazer propostas para o governo recuperar credibilidade. Abandonar o barco em uma hora dessas não é o caminho desejado”. Ressaltou, no entanto, que o partido “não pode marcar posição em decorrência de cargos”. O PP ocupa o Ministério da Integração Nacional.

Ex-deputado, ex-senador, ex-secretário da Receita Federal e três vezes ministro, Dornelles tem bom relacionamento com políticos de várias tendências. Nas eleições de 2014, o PP do Rio apoiou o candidato tucano à Presidência da República, Aécio Neves, primo de Dornelles. O vínculo com Aécio não impede o governador em exercício de rejeitar o impeachment, defendida pelo PSDB. “Não pode fazer impeachment na base da vontade de cada um. A hora é de deixar o fígado de lado e pensar em termos elevados. Impeachment só deve acontecer com causas muito claras. No exame superficial que fiz, não me parece que existam razões para esse impeachment.”

Testemunha de momentos de grave crise no País, como a que levou ao suicídio do presidente Getúlio Vargas em 1954, a deposição de João Goulart pelos militares, dez anos depois, e o impeachment de Fernando Collor, em 1992, Dornelles diz que a mobilização popular não pode ser o único fator levado em conta pelos políticos ao decidirem sobre o impeachment. “No dia 23 de agosto de 1954 (véspera do suicídio de Vargas), todo o Brasil pedia a saída de Getúlio. No dia 25, Carlos Lacerda, que era o líder do movimento (oposicionista), se asilou na embaixada de Cuba e Getúlio tomou conta das ruas. Não estou dizendo que a situação é igual, mas mostrando que a opinião pública é muito volátil”, afirmou.

Dornelles diz que a Operação Lava Jato não deve cometer exageros, defende acordos de leniência que salvem as empresas investigadas e está convencido de que um serviço de inteligência eficiente poderia ter descoberto o esquema de corrupção na Petrobrás e evitado que tomasse a dimensão revelada pelas investigações.

Questionado sobre os políticos do PP investigados por suspeita de ligação com o esquema, ele disse que a punição deve atingir todos que tiverem participação comprovada. “Nunca podia imaginar na vida que houvesse um esquema na Petrobrás nessa proporção. Deve haver punição muito rígida e muito dura contra os que participaram desse saque à Petrobrás. Mas não acho justo punir as empresas. Vejo um viés antiempresarial que é perigoso.”

Embora reconheça os méritos da Lava Jato, Dornelles pede cuidado com excessos. “Alguns vazamentos têm sido exagerados, parece que existe vazamento de alguns e não de outros. Diria que há um vazamento seletivo que é muito ruim. Acho também que algumas prisões preventivas são muito longas, excederam o período necessário para investigação. Isso gera a impressão de que é um instrumento que obriga a delação premiada, que não pode ser instrumento de coerção”, criticou.

Dornelles elogiou Dilma, “pessoa séria, preocupada com o bem público, incapaz de tomar uma medida que a beneficiasse de forma pouco republicana”. Qualquer que seja o desfecho do processo do impeachment, ele defende um pacto pela governabilidade. “Seja a Dilma continuando ou Michel Temer assumindo, tem que esquecer o passado e fazer um governo de pacificação nacional, de entendimento, com um programa mínimo”, diz o ex-ministro, que defende um amplo programa de privatizações, concessões e Parcerias Público Privadas (PPPs).

O governador disse também entender os protestos de servidores do Estado, que tiveram os salários atrasados em março e a segunda parcela do 13º dividida cinco vezes. “Eles têm toda razão, o problema é que não podemos fabricar dinheiro. É preciso mostrar a eles a situação caótica, com antecedência. Se tivermos que atrasar ou parcelar, temos que dar explicação e não gerar falsas expectativas.”

PT articula ‘reconciliação’ com antecipação de eleições

PT já fala em ‘reconciliação nacional’

  • Se Dilma escapar do impeachment, setores do partido defendem uma união com a oposição e até a convocação de novas eleições gerais

Ricardo Galhardo - O Estado de S. Paulo

Setores do governo e do PT defendem que, caso a Câmara não aceite o pedido de impeachment, a presidente Dilma Rousseff lidere um amplo processo de reconciliação nacional como forma retomar a estabilidade política, a governabilidade e viabilizar saídas para a crise econômica.

Segundo fontes do Planalto e do PT, o processo seria liderado pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, na condição de ministro da Casa Civil, e passaria por um entendimento com setores da oposição. A ideia de Dilma enviar ao Congresso um projeto para abreviar seu mandato e convocar novas eleições para presidente, deputados e senadores voltou a ganhar força entre setores do PT e do governo.
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Aliados da presidente consideram um novo pleito como uma alternativa viável pela retomada da estabilidade. “Do jeito que está, ninguém ganha”, argumentou um parlamentar.

A ferramenta legal para convocar novas eleições seria uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) de iniciativa do Executivo que precisa de aprovação do Congresso.

Algumas lideranças petistas sugerem que Dilma apresente a PEC em algum momento entre a decisão da Comissão Especial do impeachment e a votação do afastamento na Câmara. A proposta não foi bem vista no Planalto por passar a impressão de que Dilma entregou os pontos.

De acordo com interlocutores da presidente, Dilma tem demonstrado preocupação com o quadro político depois da votação do pedido de impeachment na Câmara. Um dos cenários avaliados pelo governo é de que a instabilidade que marcou o segundo mandato de Dilma até aqui continue mesmo que a presidente consiga barrar o impeachment no Congresso.

Entre os elementos citados por assessores de Dilma estão o pedido de impeachment protocolado pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), que cita a delação do senador Delcídio Amaral (sem partido-MS) e o julgamento do processo que pede a cassação da chapa Dilma/Michel Temer (PMDB) em tramitação no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Nas últimas semanas, esse processo ganhou relevância devido às novas revelações da Operação Lava Jato sobre o uso de dinheiro desviado do esquema de corrupção da Petrobrás para o pagamento de despesas da campanha pela reeleição da petista. O PT alega que todas as doações ao partido foram feitas de forma legal e estão devidamente declaradas na corte eleitoral.

Constituinte. Mas o motivo que mais preocupa os aliados de Dilma é a dificuldade em compor uma maioria que garanta governabilidade durante o restante do mandato.

“Não adianta trocar o PMDB por outros dois ou três partidos que depois de amanhã podem fazer a mesma coisa”, disse um influente parlamentar petista em referência à decisão do partido de Temer de desembarcar do governo.

A estratégia proposta por setores do governo é manter a mobilização dos movimentos populares próximos ao PT mesmo depois da votação do impeachment na Câmara. O foco, a partir de então, seria a reforma política por meio de uma Constituinte exclusiva para reformular todo o sistema eleitoral e partidário brasileiro.

Ao mesmo tempo, Lula chamaria todas as forças políticas, econômicas e sociais do Brasil para um pacto em torno da retomada da estabilidade. O ex-presidente já disse a interlocutores que pretende procurar a oposição para conversar depois da votação do impeachment, caso Dilma seja mantida. “Estamos dispostos a fazer concessões à oposição”, disse um colaborador de Dilma.

Saídas. Para lideranças petistas, apontar saídas para o pós-impeachment é um dos elementos fundamentais na estratégia para evitar a queda de Dilma.

O PT e o governo não confiam nos cálculos de números de deputados contrários ou favoráveis ao afastamento de Dilma, mesmo com o loteamento de cargos entre deputados indecisos. Por isso, avaliam que a estratégia mais eficaz é “melhorar a conjuntura da votação”, criando um ambiente favorável ao governo até as vésperas da decisão da Câmara.

O recuo da inflação em março e os sinais de mudanças na política econômica, como o lançamento da terceira fase do Minha Casa Minha Vida, são vistos como elementos positivos.

Além de “acenar para o futuro”, o governo aposta na manutenção das mobilizações populares contra o impeachment e na distribuição de cargos para influenciar deputados indecisos.

Mobilização da sociedade derrotará cooptação do governo, diz Freire sobre impeachment

• Para o presidente do PPS, 'não é hora de esmorecer' diante do 'balcão de negócios' montado pelo Palácio do Planalto para evitar o afastamento de Dilma

Por Fábio Matos - Assessoria do Parlamentar

A tentativa desesperada do governo de Dilma Rousseff de cooptar parlamentares de partidos da base aliada com o objetivo de evitar a aprovação do impeachment no Congresso Nacional será derrotada pela mobilização da opinião pública, que não pode “esmorecer” neste momento. A avaliação é do deputado Roberto Freire (SP), presidente nacional do PPS, que acredita no afastamento da petista pelos crimes de responsabilidade que cometeu.

“Não é hora de esmorecer. Derrotaremos este governo e aprovaremos o impeachment de Dilma, mas isso depende da nossa mobilização”, afirmou Freire nesta sexta-feira (1º). “As pessoas não podem desanimar e precisam continuar mobilizadas. A disputa democrática não é como um passeio plácido ou uma travessia tranquila. É preciso continuar na luta.”

O parlamentar criticou a investida do Palácio do Planalto sobre parlamentares e partidos políticos que ainda compõem a base aliada. Este movimento se intensificou desde o início da semana, quando o PMDB anunciou oficialmente o rompimento com o governo do PT e deixou a situação de Dilma ainda mais delicada no Parlamento.

“O governo está utilizando de ilegalidades e dos meios escusos que lhe são próprios, montando um balcão de negócios, como aconteceu no mensalão e no petrolão, em uma tentativa desbragada de cooptação de políticos e partidos”, criticou Freire. “O mensalão não era outra coisa senão um grande balcão e o petrolão seguiu por esse caminho. Mas eles [governistas] serão derrotados. A pressão da opinião pública é muito mais forte do que o dinheiro sujo do governo Dilma/Lula para cooptar e comprar parlamentares.”

Lava Jato
Segundo o presidente do PPS, a sociedade também deve estar atenta aos novos desdobramentos da Operação Lava Jato, que enredam ainda mais o PT e os governos de Dilma e Lula em uma teia de ilegalidades. Na manhã desta sexta, a Polícia Federal deflagrou a 27ª fase da operação, cumprindo dois mandados de prisão temporária e dois de condução coercitiva.

Entre os presos, estão Sílvio Pereira, o Silvinho, ex-secretário nacional do PT, enquanto Delúbio Soares, ex-tesoureiro da legenda, foi conduzido coercitivamente para prestar esclarecimentos. “A Lava Jato é um alento e nos dá ainda mais motivação para continuarmos nesta luta”, comentou Freire.

Tristes tempos - Cristovam Buarque

• Debate político se limita ao confronto entre dois grupos que se acusam

- O Globo

Tristes tempos em que até o dicionário foi corrompido. Para alguns, um instrumento constitucional é definido por golpe, mesmo se houver prova de crime pela presidente; para outros, o uso deste instrumento se justifica diante da corrupção e do desgoverno, antes mesmo de analisar provas do crime.

Tristes tempos quando o debate político se limita ao enfrentamento entre dois grupos que se acusam mutuamente de corruptos ou de golpistas. Um lado preocupado apenas em interromper um governo legal, mas que perdeu a legitimidade, por ser inoperante, incapaz de conduzir as reformas sociais e econômicas de que o país precisa, contaminado pela corrupção; o outro concentrado na defesa deste governo a qualquer custo, cego aos erros e às mentiras; chegando ao ponto de dizer que o desemprego decorre da luta contra a corrupção.

Ambos acreditam que, depois da decisão sobre o impeachment, aprovado ou recusado, o país retomará seu rumo, seja sob o novo governo Temer ou o velho governo Dilma. Não se vê debate sobre como: retomar o crescimento do PIB e fazê-lo contemporâneo com o avanço técnico e científico; distribuir a renda; erradicar o analfabetismo; assegurar educação de qualidade para cada criança independente da renda dos pais e da cidade onde mora; como recuperar nosso abismal atraso na capacidade científica e tecnológica e de inovação; como aumentar a produtividade, garantir estabilidade monetária e fiscal, equilibrar as contas públicas, controlar os endividamentos; como atender à saúde, enfrentar a violência urbana, dar sustentabilidade à Previdência; como emancipar os pobres da necessidade de bolsas e cotas. Parece que o Brasil real desapareceu.

Tristes tempos em que a política se faz sem percepção da história. Como se estivéssemos em um campeonato de futebol, com apito final depois de cada eleição. Não se discute as causas atuais e históricas que nos condenam. Nem se considera que, no dia seguinte ao impeachment, se aprovado, mesmo com a credibilidade de novo presidente, todos os problemas continuarão, inclusive as suspeitas sobre os políticos; e que os derrotados irão para as ruas em nome da luta contra o que, acreditam, foi um golpe. Tampouco se discute que, se o impeachment não passar, a população, indignada e desencantada, continuará nas ruas com apoio crescente de desesperados, desempregados, empobrecidos, manifestando-se contra um governo desacreditado e submetido a outros pedidos de impeachment.

A solução estaria em uma eleição antecipada, seja para todos os cargos ou apenas para presidente e vice-presidente. Havendo aceitação dos principais atores, isto é possível com uma reforma constitucional. Mas, é pequena a probabilidade de aceitação de uma medida de bom senso, diferente das propostas pelo debate simplista e imediatista do impeachment ou não impeachment.

Tristes tempos em que as pessoas de bom senso se sentem estrangeiras em seu próprio país.

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Cristovam Buarque é senador (PPS-DF)

Sequestraram a esperança - Miguel Reale Júnior*

- O Estado de S. Paulo

No desespero por se manter no poder e garantir o emprego de milhares de apaniguados, o PT bate tambores, timbrando o mantra de ser o impeachment um golpe e de não haver crime. Todavia bastariam as denominadas “pedaladas fiscais” para verificar ter ocorrido um grave crime, cujos danos são extremamente sentidos pelos mais pobres.

Há um comportamento reiterado de tratar o público com se privado fosse, tendo-se por subproduto o surgimento de nova elite, a elite da propina, de que é exemplo o ocupar, como milionário, sítio e tríplex na praia recebidos como benesses pelas vantagens viabilizadas ao longo do governo.

Esse o clima prevalecente nos detentores do poder, que dele se assenhorearam para usufruir ao máximo, sem limites, os benefícios de viver à tripla forra à custa do bem público.

Ora, é dentro desse espírito e desse clima de fruição e manutenção do poder a qualquer custo que se adotou o expediente das pedaladas fiscais. Não era possível que os governantes – presidente, ministro da Fazenda, ministro do Planejamento, secretário do Tesouro Nacional – não soubessem, não previssem o desastre que estavam a brevemente causar à economia do Brasil e ao cotidiano de milhões de trabalhadores e milhares de empresários da indústria e do comércio.

As pedaladas fiscais constituíram perigoso e malicioso artifício por via do qual se realizaram operações de crédito – mútuos entre o Tesouro Nacional e as instituições financeiras controladas pela União – para pagamento de gastos primários, como Bolsa Família, seguro-desemprego, subvenções do Programa Minha Casa, Minha Vida, diferença entre os juros efetivos e os privilegiados cobrados pelo BNDES das grandes empresas.

Esses mútuos não foram meros adiantamentos, fluxo de caixa, como pode ter ocorrido nos governos passados, por breve tempo e em valores pequenos. Dizer isso é uma falácia. Acórdão do Tribunal de Contas da União (TCU) considera impossível ver valores dessa magnitude, em ritmo crescente, como mero fluxo de caixa entre banco e Tesouro. Ao ver do TCU, tratava-se de empréstimo, e não mero atraso, à beira do descontrole. Os níveis efetivamente foram elevadíssimos.

E o que é pior: essa dívida não foi registrada no Banco Central como passivo, enquanto as instituições financeiras as anotavam como crédito. Tal omissão dolosa de registro de dívida constitui crime de falsidade ideológica.

Construiu-se, deliberadamente, um saldo devedor enorme, escondido dos agentes econômicos e da população, escamoteando a existência de um débito fiscal que só aumentava como bola de neve e cuja consequência foi a débâcle da nossa economia.

É o que o economista Marcos Fernandes da Silva denomina “populismo fiscal eleitoral”, pois, sem caixa, se criaram dívidas escondidas, para aparentar falsamente saúde financeira inexistente, dando sequência a medidas populares que sangravam o Tesouro, como desonerações tributárias, redução dos preços de eletricidade, congelamento do preço da gasolina, incentivo ao crédito consignado, montando um cenário paradisíaco falso para ganhar eleições.

Ao longo de 2014 e até meados de 2015, em vez de medidas corretivas dos erros econômicos e morais visíveis, o governo adotou a manutenção dos vícios, servindo-se das “pedaladas fiscais” como meio artificioso “para que os gastos não fossem devidamente computados nas contas públicas visando a mascarar o déficit fiscal,” como acentua José Roberto Afonso, um dos autores da Lei de Responsabilidade Fiscal. Assim, aos poucos foi se desfazendo a ilusão de crescimento de 4% com inflação controlada. A realidade era outra: destruíram um dos fundamentos da economia, o equilíbrio fiscal, e sequestraram a esperança.

A economia havia desandado: para obter meios o governo teve de disponibilizar títulos no mercado, que só os adquiria a juros mais elevados, dando início ao processo inflacionário. O preço da luz e o da gasolina tiveram de ser colocados em níveis reais, os investimentos reduziram-se. O governo, sem plano de ação administrativa, via suas grandes empresas encolherem, chafurdadas na mais impressionante corrupção.

Resultado: descrença no futuro como consequência da desconfiança absoluta na presidente e no seu governo, que agora, às vésperas da votação do impeachment, reincide nos pecados da desonestidade ao tentar cooptar no varejo, por meios heterodoxos, deputados a seu favor.

Mas àqueles que, à míngua de argumentos, insistem em dizer que não há crime cabe repetir tutelar-se a responsabilidade fiscal, valioso bem da República, por via da incriminação constante do artigo 359 A do Código Penal, e do artigo 10, n.º 9, na Lei 1.079/50, a lei do impeachment.

A Lei de Responsabilidade Fiscal edita no artigo 36 que é proibida operação de crédito da União com instituição financeira por ela controlada. O artigo 359 A do Código Penal, introduzido pela Lei n.º 10.028/2001, edita que constitui delito, punido com reclusão de um a dois anos, “ordenar, autorizar ou realizar operação de crédito, interno ou externo, sem prévia autorização legal”. Se a lei já proíbe nem poderia haver autorização.

Por sua vez, a Lei 1079/50, no item 9 do artigo 10, introduzido pela mesma Lei 10.028, estatui ser crime de responsabilidade “ordenar ou autorizar, em desacordo com a lei, a realização de crédito com qualquer ente da Federação, inclusive suas entidades da administração indireta”. Pena: perda do mandato.

Sábias essas disposições. E quem responde por esses atos contra a lei orçamentária é a presidente, seus ministros e secretários. E a presidente era unha e carne com o mentor da pedaladas fiscais, o secretário do Tesouro Nacional, com quem se reunia costumeiramente.

Assim, há, sim, crime de responsabilidade. Dizer o contrário, feito papagaio, é querer dar o golpe de joão sem braço, fingir-se de desentendida. Mude o disco, Dilma: não há golpe, há impeachment.

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*Miguel Reale Júnior é advogado, professor titular da Faculdade de Direito da USP, membro da Academia Paulista de Letras e foi ministro da Justiça