*Luiz Werneck Vianna, sociólogo (PUC-Rio), "A questão social e a democracia política: mais uma oportunidade". Blog Democracia Política e Novo Reformismo, 28.1.2022.
Política e cultura, segundo uma opção democrática, constitucionalista, reformista, plural.
*Luiz Werneck Vianna, sociólogo (PUC-Rio), "A questão social e a democracia política: mais uma oportunidade". Blog Democracia Política e Novo Reformismo, 28.1.2022.
Folha de S. Paulo
A desonestidade do Estado e de parte da
sociedade brasileira com seus jovens é constrangedora
A perversa e persistente estratégia de
desenvolvimento nacional, fundada em altos níveis de concentração de renda,
baixos padrões
educacionais, desigualdade social, racismo
estrutural e na violência e
arbítrio como formas de ordenação social, nunca foram tão evidentes como no
presente momento.
Dois relatórios publicados recentemente escancaram o quanto a sociedade brasileira, leia-se os adultos, temos descumprido nossas obrigações, plasmadas no artigo 227 da Constituição Federal, de assegurar às crianças e adolescentes "com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação... à dignidade..., além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão".
Folha de S. Paulo
A turbulência está só começando; apertemos
os cintos
Bolsonaro apresentou, nos últimos dias,
pequena mostra de como será sua campanha à reeleição. Dá para identificar três
eixos muito bem coordenados. Um deles é o discurso e a produção de símbolos
para arregimentação de suas bases. Nisso, merecem destaque sua imagem em um
clube de tiro e os palavrões, emitidos em estudado tom de desabafo, em comício,
no Nordeste.
Também voltaram os ataques golpistas ao sistema eletrônico de votação e deturpações, como a expressão "ditadura das canetas", em evidente alusão às decisões de ministros do STF. Misturadas a muitas baboseiras, proliferam ameaças explícitas, como a que foi feita por Eduardo Bolsonaro: "(...) a gente vai dar um golpe que a gente vai acabar com o Lula". São apitos para mobilizar os cães de guerra.
Folha de S. Paulo
Pela violência que inevitavelmente encerra,
deve permanecer como 'ultima ratio'
"Ultima ratio regum" é a frase
que o cardeal Richelieu mandou inscrever nos canhões franceses utilizados na
Guerra dos Trinta Anos (1618-48). Significa "o último recurso dos
reis". No século 20, a expressão "ultima ratio", agora sem o
"regum", passou a ser usada para evocar o princípio da
proporcionalidade no direito, em especial no penal. Esse ramo do direito
recorre sempre a algum grau de violência.
Na versão "light", é intrusivo e abre flanco para o arbítrio de autoridades. Na pesada, joga pessoas na cadeia por longos períodos. Pelo princípio da proporcionalidade, leis penais deveriam ser o último recurso do legislador e dos órgãos repressores, usadas só para prevenir e reparar males piores do que aqueles que a própria violência estatal enseja.
Folha de S. Paulo
Macron contesta liderança dos EUA em visita
à Rússia
Macron sentou-se no lado oposto da interminável
mesa de Putin e entoou música para os ouvidos do russo. Um sistema de
"segurança coletiva" negociado "entre europeus" —eis a
senha pronunciada pelo francês. São ecos de Charles De Gaulle, um ruído
horrendo para os ouvidos de Biden. No fundo, a França reativou o debate sobre
os contornos da Europa.
Do ponto de vista de Washington, segurança
coletiva não se negocia, pois já existe: a OTAN, que prende a Europa à
liderança dos EUA e exclui a Rússia. O presidente francês contestou
precisamente este dogma, enraizado na Guerra Fria.
De Gaulle falou, exatos 60 anos atrás, numa "Europa do Atlântico aos Urais", que incluiria a Rússia (na época, núcleo da URSS) e excluiria os EUA. A recuperação do tema gaullista revela uma fratura ainda mais ou menos oculta na Aliança Atlântica.
O Estado de S. Paulo
Relatórios bianuais do EIU divulgados desde 2006 mostram uma acentuada redução na qualidade de nossa democracia
O leitor certamente conhece o instituto de
pesquisas inglês Economist Intelligence Unit (EIU), ligado à revista The
Economist, que compila anualmente um “índice de democracia” para mais de 60
países. Baseando-se em diversos indicadores, o EIU classifica tais países com
base em diversos indicadores e situação conjuntural de cada um.
Em seu relatório de 2020 – o mais recente
divulgado –, a instituição traçou um quadro sombrio, indicando um enorme
retrocesso em todos os continentes. O título do relatório, In sickness and in
health? (Na doença e na saúde?), já sugere o fator posto em relevo: a pandemia
de covid-19, que forçou a maioria dos governos a tomar medidas que
provavelmente seriam rejeitadas pelos cidadãos caso fossem submetidas a algum
tipo de plebiscito. Esse trágico painel reforça numerosas análises que vêm há
anos prognosticando o iminente fim da democracia liberal-representativa.
O EIU classifica os países estudados em quatro categorias. A “nata” da democracia, designada como “democracias plenas”, compreende apenas 23 países, nos quais vivem 8,4% da população mundial. Os países nórdicos da Europa e o Canadá ocupam as posições mais altas. Na América Latina, só três países – Uruguai, Chile e Costa Rica – podem gabar-se de ser “plenamente” democráticos.
O Estado de S. Paulo
Depois de uma era viciada em mitos, teremos um ganho se o debate for baseado em evidências
Evidências não é apenas a música mais
cantada nos karaokês da pequena Tóquio encravada no centro de São Paulo. A
palavra é recorrente no jargão acadêmico atual, a ponto de ser a marca da nova
geração de intelectuais brasileiros.
Dizer que o conhecimento se baseia em
evidências é, claro, uma obviedade. Toda boa pesquisa acadêmica se assenta em
fatos. Num país onde as “fake news” se tornaram moeda corrente, no entanto, a
“geração evidências” se destaca por trazer algum rigor à conversa.
Será lançado na próxima semana o livro
Reconstrução, um belo cartão de visitas da “geração evidências”. Ele reúne
ensaios sobre o Brasil escritos por intelectuais que juntam as duas
características: o amor pelos fatos e – como destaca o economista Persio Arida
no prefácio – a juventude. A média de idade dos autores é 34 anos. A orelha do
livro ficou a cargo de Arminio Fraga.
O livro, organizado por João Villaverde, Laura Karpuska e Felipe Salto – os dois últimos são colaboradores fixos do Estadão –, nasceu de uma angústia. “Todos víamos a destruição que este governo vem perpetrando em várias áreas das políticas públicas”, diz João Villaverde, professor da Fundação Getúlio Vargas e entrevistado no minipodcast da semana. “Montamos um grupo para ver o que poderíamos fazer a respeito.”
Revista Veja
A ideia dos partidos é usar federações para
criar bolsões de poder no Congresso
Se a chamada terceira via tiver de morrer
antes mesmo de chegar à praia (das urnas), não será por vontade do eleitorado,
que a ela ainda não foi devidamente apresentado. Caso as candidaturas
alternativas ao embate Jair Bolsonaro/Luiz Inácio da Silva venham a falecer,
será obra de morte matada. Encomendada pelos partidos que as lançaram e agora
se ocupam em firmar alianças sob a nova regra das federações.
Sabem do que se trata? Pois então, devido à
proibição de coligações nas eleições proporcionais (deputados e vereadores) em
setembro do ano passado, o Congresso autorizou os partidos a se juntar sem a
necessidade de fusão, mas os obrigou a fazê-lo de modo uniforme em todo o país
e assim permanecer durante quatro anos. Ah, sim, obriga também a que tenham
identidade programático-ideológica, coisa um tanto fantasiosa em nosso cenário
de doutrinas partidárias bastante gelatinosas.
A ideia em si não é má ou, por outra, é boa. Em tese poderia resultar na redução da quantidade de partidos, acabar com a extrema dispersão na representação popular e facilitar a interlocução entre os poderes Executivo e Legislativo.
'
Nós vamos ter que convergir lá na frente', diz Simone Tebet sobre terceira via de centroSenadora diz que os nomes terão que se
unir, mas descarta abrir mão da cabeça de chapa para ser vice. Ela tem como
desafio se tornar conhecida e como trunfo, a baixa rejeição
Julia Lindner e Camila Zarur / O Globo
BRASÍLIA — Pré-candidata do MDB à
Presidência da República, a senadora Simone Tebet (MS) é vista como a vice
ideal por alguns de seus concorrentes nas eleições deste ano. Em contraponto,
ela diz que a sua candidatura está se tornando irreversível, sob os argumentos
de que alguns integrantes da terceira via já “ficaram pelo meio do caminho” e
de que seu nome enfrenta uma baixa rejeição do público. A pré-candidata
ressalta ainda representar o eleitorado feminino — 52% do total. Simone foi a
primeira mulher a presidir a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do
Senado, a mais importante da Casa.
Apesar de ter conquistado projeção nacional
durante a CPI da Covid, a senadora ainda é desconhecida na maior parte do país
e, até o momento, não decolou nas pesquisas de intenção de voto. Para reverter
esse cenário, aposta na convergência do centro para quebrar a polarização entre
o presidente Jair Bolsonaro e o ex-presidente Lula. A pré-candidata aposta que
o grande tema da eleição será a economia, com foco na desigualdade social, na
fome e no desemprego. E acredita que o combate à corrupção, embora importante,
não terá papel central como na disputa de 2018.
O GLOBO vai convidar para entrevistas todos
os pré-candidatos a presidente à medida que eles forem anunciados formalmente
por seus partidos.
Alguns pré-candidatos avaliam
a senhora como uma boa vice. Como vê isso?
Para responder a essa pergunta eu teria que
perguntar a eles o porquê que acham que sou o melhor nome para vice. Se a
resposta for porque me acham preparada, responsável, ética, compromissada com o
país, sou tudo isso, tenho capacidade de ser cabeça de chapa e pedir também que
algum deles ceda o espaço para que possa ser meu vice. Com isso, a gente não
tira do processo a única pré-candidata mulher para falar o que a mulher pensa,
o que a mulher quer para o Brasil. Eu não tenho plano B, pelo menos não a nível
nacional.
O senador Renan Calheiros
(MDB-AL) falou recentemente que, se o partido não tiver um nome competitivo,
deveria apoiar Lula.
Ele foi honesto. E tudo que a gente espera de um companheiro é honestidade. Eu prezo por isso. Eu, que já fui traída diversas vezes, prefiro aqueles que falam “olha, eu não vou te acompanhar por isso e por aquilo”, do que aqueles que falam que vão estar contigo e te abandonam. Ele tem um histórico de ligação com o PT e com o próprio Lula. Mas nós vamos ter a unidade do partido na convenção.
O Globo
Se o petista conseguir fazer no estado a
média de votos que tem no resto do país, pode fechar a conta ainda no primeiro
turno
Não há hipótese de Lula fazer
corpo mole na campanha eleitoral no Rio. Tampouco caberá ambiguidade neste
pleito, como já ocorreu em outras eleições. O candidato do PT terá
indiscutivelmente que se posicionar de um lado, porque do outro estará seu
adversário, o presidente Jair Bolsonaro. Se tergiversar, dança. Não que o Rio
seja decisivo num pleito em dois turnos. Mas se quiser resolver no primeiro, é
bom olhar com atenção para o estado onde seu partido vem perdendo eleitores
seguidamente desde 2002. Naquele ano, Lula ganhou de Serra aqui com 79% dos
votos. Em 2006, fez 69% contra Alckmin. Dilma ganhou com 60% sobre Serra em
2010 e passou apertada por Aécio em 2014, com apenas 51,64% dos votos. Em 2018,
Haddad perdeu para Bolsonaro com apenas 32% dos eleitores ao seu lado.
Lula precisa de um candidato forte no Rio, forte suficiente para rivalizar com o governador Cláudio Castro, candidato à reeleição que terá Bolsonaro em seu palanque, além de todas as demais forças de direita no estado. Esse candidato, de acordo com todas as pesquisas feitas até agora, deveria ser o deputado Marcelo Freixo, ex-PT, ex-PSOL, hoje no PSB. O palanque de Freixo terá a cara da esquerda, mais moderna e flexível do que a representada pelo PT, mas ainda assim de esquerda e anti-Bolsonaro. Uma solução caseira, pode ser redundante. Restam ainda alternativas ao centro, com o presidente da OAB, Felipe Santa Cruz, ou brizolista, com o candidato do PDT, Rodrigo Neves.
O Globo
Após a tragédia de Moïse, deveríamos tentar
nos tornarmos aquilo que pensamos ser: um país aberto e receptivo
O brutal assassinato de Moïse Kabagambe na
orla carioca, entre outras reverberações, nos força a repensar a autoimagem que
temos sobre o Brasil. Sempre nos vimos como um país de imigrantes, receptivo à
maioria dos estrangeiros. Mas a realidade é que já não somos um país de
imigrantes e nem sempre fomos receptivos a todos os que vêm para cá.
É verdade que, historicamente, o Brasil recebeu levas de imigrantes portugueses, italianos, japoneses e sírio-libaneses, dentre outros; bem como de africanos trazidos em cativeiro para aqui. Mas, hoje em dia, nascidos no estrangeiro que vivem no Brasil são cada vez mais raros.
O Globo
A controvérsia do começo da semana sobre um
episódio do podcast Flow, em que o apresentador Monark defendeu a liberdade de
defender ideias nazistas e antijudaicas, mostra a dificuldade que temos tido em
travar debates produtivos num ambiente capturado pelas guerras culturais.
Caso algum leitor ainda não saiba, o Flow, um dos podcasts mais ouvidos do país, recebeu na segunda-feira os deputados Kim Kataguiri e Tabata Amaral. No meio da conversa com eles, o apresentador Monark defendeu uma concepção radical de liberdade de expressão que permitiria a difusão de ideias nazistas e antijudaicas e sua organização política.
O Globo
Em 1969, um executivo anônimo de uma
fabricante de cigarros dos Estados Unidos redigiu um memorando de nove páginas
com o título “Tabagismo e Saúde: Proposta”. O problema a enfrentar era as
pessoas saberem que tabaco causa câncer. O memorando é histórico porque contém
a quase poética frase “dúvida é nosso produto”. Menos conhecida é a conclusão
do raciocínio: a dúvida é o produto porque “é o modo de estabelecer uma
controvérsia”.
Em poucas linhas, esse soldado desconhecido da guerra corporativa articulou o princípio básico do negacionismo enquanto estratégia política: produzir dúvida com o objetivo de semear, na mente do público, a falsa noção de que existe uma controvérsia legítima a debater. Da negação do aquecimento global antropogênico ao estímulo bolsonarista à hesitação vacinal, chegando até mesmo a ideologias mais antigas, como o fundamentalismo bíblico (“ensine a controvérsia!” tornou-se o grito de guerra dos criacionistas a partir da década de 1990), os defensores de ideias derrotadas pelos fatos e pela ciência parecem ter abraçado, em massa, a fabricação de dúvida como atividade principal.
É sabido que a política se assemelha a um
jogo de xadrez. O único prazo que os políticos respeitam é o prazo legal. Antes
a realidade fica povoada de balões de ensaios, blefes, dissimulações, factoides.
Em março, três prazos legais impactarão a armação do tabuleiro.
O primeiro é o da chamada janela partidária. Os 35 partidos políticos brasileiros existentes, com raras exceções, não primam pela consistência programática e ideológica e pela coerência política. A fidelidade partidária é baixa. A janela permite ao parlamentar mudar de partido sem perder o mandato. É de se prever uma verdadeira revoada de deputados. Isso mexerá com a correlação de forças.
EDITORIAIS
Analfabetismo infantil exige reação urgente
O Globo
Os estragos provocados por dois anos de
escolas fechadas na pandemia começam a ser traduzidos em números e, como se
previa, são catastróficos. Uma nota técnica do Todos Pela Educação divulgada
nesta semana mostrou que cresceu 66% o número de crianças de 6 a 7 anos que não
sabem ler ou escrever neste período em que o mundo foi assombrado pelo
coronavírus. Com base em dados do IBGE, a nota afirma que esse contingente
passou de 1,42 milhão, em 2019, para 2,36 milhões em 2021. A Base Nacional
Comum Curricular (BNCC) prevê que todas as crianças sejam alfabetizadas até os
7 anos.
Em termos percentuais, a fatia de crianças de 6 a 7 anos não alfabetizadas subiu de 25,1% em 2019 para 40,8% em 2021. Quase metade dos alunos brasileiros nessa faixa etária não aprendeu o básico: ler e escrever. Convém lembrar que essa tragédia infelizmente não se restringe aos anos de 2020 e 2021, de fato atípicos. Ela compromete inexoravelmente o futuro dessas crianças. Sem as ferramentas básicas para ingressar na vida escolar, dificilmente elas terão como acompanhar as aulas. “Um aluno que não consegue se alfabetizar bem tem a sua trajetória prejudicada pelo resto da vida”, disse ao GLOBO Olavo Nogueira Filho, diretor executivo do Todos pela Educação.
Macaíbeiras chovendo