segunda-feira, 1 de dezembro de 2014

Opinião do dia – Aécio Neves

Essa campanha passará para a História. A sordidez, as calúnias, as ofensas, o aparelhamento da máquina pública, a chantagem com os mais pobres, dizendo que nós terminaríamos com todos os programas sociais. Não só eu fui vítima disso. O Eduardo (Campos) foi vítima disso, a Marina (Silva) foi vítima disso e eu também. Essa sordidez para se manter no poder é uma marca perversa que essa eleição deixará.

Perdi a eleição para uma organização criminosa.

Aécio Neves, senador por Minas Gerais e candidato, derrotado a presidência da República pelo PSDB, em entrevista ao jornalista Roberto D"Ávila, da GloboNews, que foi ao ar na noite de sábado.

Doleiro reforça envolvimento do PP em esquema de corrupção na Petrobrás

• Alberto Youssef afirma em delação premiada que 'só sobram dois' na legenda ao citar participação de políticos nos crimes investigados

Andreza Matais, Fábio Fabrini - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - O doleiro Alberto Youssef afirmou a investigadores da Operação Lava Jato que "só sobram dois no PP" ao reforçar o envolvimento de políticos do partido no esquema de corrupção da Petrobrás. Youssef voltou a citar integrantes do partido em delação premiada aos procuradores da força-tarefa que apura crimes relacionados a negócios da estatal. O doleiro é o principal acusado de lavar dinheiro desviado de contratos superfaturados da Petrobrás para a legenda.

O PP tem papel de protagonista no escândalo, segundo a investigação. A força-tarefa da Lava Jato acredita que os desvios na petrolífera ocorrem há pelos menos 15 anos. Mas foi o ex-deputado José Janene (PP-PR), réu no processo do mensalão morto em 2010, quem organizou a corrupção na estatal, fazendo com que as cúpulas das siglas envolvidas fossem beneficiadas diretamente.

Nas palavras de um investigador, "Janene transformou a corrupção no varejo em esquema de organização partidária". O modelo que ele teria criado consistia em concentrar a negociação e o pagamento de propinas num diretor, e não mais em vários agentes públicos dentro da estatal.

Em depoimentos no processo que tramita na Justiça Federal no Paraná, o ex-diretor de Abastecimento da Petrobrás Paulo Roberto Costa e o doleiro afirmaram que ao menos 1% do valor dos contratos da Diretoria de Abastecimento era repassado para o PP. A ideia teria sido copiada por PT e PMDB, os dois principais partidos da coalizão governista.

Caberá ao Supremo Tribunal Federal autorizar a investigação sobre o suposto envolvimento de autoridades com direito a foro privilegiado, como ministros de Estado e congressistas, no esquema da Petrobrás. O ministro do Supremo Teori Zavascki é o relator do processo. Os nomes dos políticos estão sendo citados em delações premiadas, cujo conteúdo integral está sob sigilo.

Com o fim da contribuição de Youssef, que prestou seu último depoimento na semana passada, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, pretende começar a pedir as primeiras aberturas de inquérito ao STF. Para Janot, já há elementos para que a participação de políticos seja apurada.

Início. De acordo com a investigação, o esquema organizado por Janene começou em 2004 - ocasião em que o PP emplacou Paulo Roberto Costa na Diretoria de Abastecimento da estatal - e funcionou ao menos até março deste ano, quando a Operação Lava Jato foi deflagrada pela Polícia Federal. Percorreu, portanto, dois governos e três legislaturas. Nesse período, o partido se tornou a quarta maior bancada da Câmara dos Deputados, com 40 representantes, e contou com cinco senadores. Hoje, em bloco com o PROS, é a terceira maior força do Congresso.

Conforme revelou o Estado, nos últimos dias, os investigadores da Lava Jato identificaram um homem apontado como o segundo operador do PP - além do doleiro Alberto Youssef - no esquema: Henry Hoyer de Carvalho, que já foi assessor do ex-senador e ex-líder do PMDB no Senado Ney Suassuna.

No governo Dilma Rousseff, o PP controla o Ministério das Cidades, uma das pastas de maior orçamento na Esplanada, responsável por obras de saneamento e pelo Programa Minha Casa Minha Vida.

O irmão do ex-ministro das Cidades Mário Negromonte, Adarico Negromonte, é um dos investigados na Lava Jato, acusado de transportar dinheiro da propina para Youssef. Na sexta-feira, após ter a prisão temporária revogada pela Justiça, Adarico deixou a carceragem da Polícia Federal em Curitiba para responder ao processo em liberdade.

"O Congresso todo conhecia o Paulo Roberto (Costa). As evidências estão surgindo e ninguém mais pode duvidar disso", disse ao Estado Mário Negromonte, que foi líder do partido na fase pós-Janene. Neste ano, ele se desfiliou do PP para assumir cargo de conselheiro do Tribunal de Contas da Bahia.

O deputado reeleito Esperidião Amim (PP-SC) também avalia que o partido será atingido, mas os alvos, para ele, devem ser dirigentes antigos e não atuais da sigla.

'Nada oficial'. O presidente do PP, senador Ciro Nogueira (PI), não quis comentar a declaração de Youssef sobre o envolvimento do partido no esquema. Nogueira disse que, até o momento, "não há nada de oficial" que envolva parlamentares da legenda e que está à disposição das autoridades para colaborar com as investigações e prestar esclarecimentos. / Colaborou Ricardo Brito

Corrupção na Petrobras reduz ganho de acionistas

A conta paga pelo acionista

• Ajuste contábil por corrupção deve reduzir parcela do lucro da estatal distribuída a investidores

Ana Paula Ribeiro – O Globo

SÃO PAULO e RIO - O adiamento do balanço financeiro da Petrobras - após a empresa ser pressionada pela auditoria PricewaterhouseCoopers (PwC) a reconhecer nos números o impacto dos desvios denunciados nas delações premiadas da operação Lava Jato - trará prejuízo a seus acionistas, inclusive a União. Não bastasse o valor das ações ter despencado 48% nos últimos meses - a preferencial (PN) caiu de R$ 24,56 em 2 de setembro para R$ 12,80 na última sexta-feira -, a empresa também deverá reduzir o pagamento de dividendos, ou seja, a parcela de lucro distribuída aos acionistas, após o ajuste no seu balanço, preveem analistas. E isso depois de a empresa ter distribuído um valor recorde de dividendos no primeiro semestre: R$ 8,731 bilhões, mais que o triplo dos R$ 2,87 bilhões destinados em igual período de 2013 e o maior montante desde o segundo semestre de 2009.

Ao todo, a petrolífera tem mais de 290 mil investidores, sendo que 279 mil são pessoas físicas. Ao reconhecer na contabilidade o impacto da corrupção, a empresa terá que rever seu fôlego para novos investimentos e a folga de caixa que terá para distribuir dividendos será menor.

Segundo projeções do Itaú BBA, se a perda estimada pela empresa com os desvios chegar a R$ 10 bilhões, os acionistas que têm ações ON (com direito a voto, porém sem preferência na distribuição de dividendos) receberão apenas R$ 0,17 por ação em 2015. É um valor de menos da metade do R$ 0,37 anteriormente previsto pelo banco, já considerando o impacto, para a empresa, do dólar mais alto e da queda no preço do petróleo.

A estimativa do Itaú BBA calcula o impacto da baixa contábil. No caso da Petrobras, é preciso ajustar parte do valor de investimentos feitos e que estão inflados pelas obras superfaturadas. No caso dos investidores de papéis preferenciais (que, como o próprio nome diz, têm preferência nos dividendos), a legislação brasileira estabelece que a distribuição do lucro aos acionistas seja de no mínimo 25%, o que, na visão dos analisas do Itaú BBA, fará com que o impacto da baixa contábil seja mínimo para os donos desses papéis.

União e BNDES têm 60% das ações ON
E os acionistas já vêm sofrendo com a queda no valor das ações. Só em novembro, o valor de mercado da empresa caiu 15,8%, ou R$ 32,5 bilhões, para R$ 162,1 bilhões. É o mesmo que dizer que a Petrobras em um mês perdeu quase uma JBS, que está sendo negociada a R$ 35,3 bilhões e mais que uma TIM Participações (R$ 30,1 bilhões). Atualmente, a estatal é a quarta maior empresa em valor de mercado na Bovespa. Já foi a primeira, mas perdeu o posto para a Ambev (R$ 264,6 bilhões) e, depois, a segunda colocação, para o Itaú Unibanco (R$ 201,3 bilhões) e o terceiro lugar para o Bradesco (R$ 163,4 bilhões).

A maior detentora de ações ONs da Petrobras é a União que, junto com o BNDES, possui pouco mais de 60% desses papéis. A outra parcela está pulverizada entre investidores locais e estrangeiros. No caso das preferenciais, 70% das ações estão divididas entre investidores pessoas físicas, instituições financeiras e empresas, estrangeiros ou não. "A baixa contábil poderia ter um impacto relevante sobre os dividendos das ações ordinárias da Petrobras", afirmam, em relatório, os analistas Paula Kovarsky, Diego Mendes e Pablo Castelo, reforçando que sacrificar esses dividendos pode ser uma forma de se antecipar a restrições de caixa.

A preocupação com o caixa não é exagerada. Com as denúncias de desvios e a investigação da Polícia Federal, a Petrobras não conseguiu publicar o balanço do terceiro trimestre até a data limite, 14 de novembro, uma vez que a auditoria se recusou a assinar as demonstrações financeiras. Sem isso, o mercado internacional de capitais fica praticamente fechado, ou seja, a estatal não consegue emitir dívidas para financiar o plano de expansão.

Na avaliação do operador sênior da Guide Investimentos Fabio Galdino, é difícil calcular o valor das perdas da Petrobras, mas a única saída para a empresa é fazer o ajuste (baixa contábil) no ativo. Em contrapartida, será preciso ajustar o lado do passivo, com redução do patrimônio líquido ou do capital social.

- Isso vai aparecer na demonstração de resultados e terá impacto no lucro, afetando os investidores. Se tiver corte de dividendo, fatalmente será maior nas ações ordinárias - considerou, acrescentando que, no limite, caso o ajuste gere prejuízo no balanço anual, os preferencialistas também serão afetados.

Estimativa do Morgan Stanley aponta para perdas com os desvios que podem variar de quase R$ 5 bilhões a R$ 21 bilhões. A simulação considera o investimento realizado nos últimos cinco anos pela empresa (R$ 416 bilhões) e perdas que variam de 1% a 5% desse total - as investigações em curso apontam que as construtoras pagavam propina a diretores da Petrobras em troca de contratos superfaturados e, em um dos depoimentos, o ex-diretor de Abastecimento da estatal Paulo Roberto Costa afirmou que 3% do valor das contratações era desviado para partidos políticos.

Dificuldade para captações externas
Nas contas do Morgan Stanley, independentemente do cenário, os portadores de ações preferenciais receberiam R$ 0,93 por ação, mas aqueles que possuem ordinárias receberiam algo entre R$ 0,38, no cenário mais benigno, e apenas R$ 0,02 por ação, na pior previsão.

O analista responsável pelo cálculo, Bruno Montonari, também mostrou preocupação com os efeitos que as investigações sobre corrupção terão no acesso a recursos do mercado de capitais por parte da empresa. A estimativa é que a Petrobras precise de US$ 15 bilhões para arcar com o projeto de investimentos para 2015. Tradicionalmente, a empresa levanta recursos no exterior no início do ano.

"Entretanto, com a falta de um balanço auditado e o aumento da percepção de risco, o ambiente pode não ser propício para uma grande oferta de dívida. Além disso, pensamos que o custo do financiamento pode aumentar", afirmou, em relatório.

O executivo de um banco de investimento afirmou que a Petrobras deve conseguir em breve publicar seu balanço, mesmo que com ressalvas, voltando a ter acesso ao mercado internacional. No entanto, o custo vai subir. A estatal é considerada grau de investimento pelas agências de classificação de risco e em geral costumava ter as melhores condições de acesso ao mercado, com baixo custo e prazos longos.

- Isso com certeza vai mudar. Ela vai ter que pagar um prêmio de risco por essa situação - afirmou o executivo, sob a condição de anonimato.

Lava-Jato encontra rastro de operadores políticos na Suíça

André Guilherme Vieira, Letícia Casado e Assis Moreira - Valor Econômico

CURITIBA e LAUSANNE - Os integrantes da força-tarefa da operação Lava-Jato retornaram da Suíça munidos de extratos bancários que contêm rastros deixados por operadores de partidos políticos. Com os documentos, já é possível identificar parlamentares brasileiros que receberam propina paga com recursos da Petrobras, apurou o Valor.

Dezenas de parlamentares suspeitos de integrar o suposto esquema de corrupção na Petrobras foram mencionados pelo delator Paulo Roberto Costa, ex-diretor de Abastecimento da estatal. Costa e o doleiro Alberto Youssef disseram que lidavam com operadores de PT, PMD e PP. Os partidos negam ligação com o esquema de propina na Petrobras.

Os documentos, protegidos por sigilo bancário, encontrados na Suíça são considerados reveladores, dizem pessoas ligadas ao caso. Procurados pela reportagem, os procuradores evitaram responder sobre o material suíço ao qual tiveram acesso ou se conseguiram identificar outros operadores; tampouco disseram a quais partidos pertenceriam essas pessoas. Com as indicações fornecidas por Paulo Roberto Costa, porém, sabe-se que o trabalho de vasculhar dados bancários foi facilitado.

O sucesso da missão suíça foi comunicado ao relator da Lava-Jato no Supremo Tribunal Federal, ministro Teori Zavascki. Ele cercou-se de especialistas em lavagem de dinheiro e crimes transnacionais e está preparado para julgar os "agentes políticos", uma vez que deputados e senadores gozam de privilégio constitucional e só podem ser processados criminalmente pelo Supremo.

No entanto, a consolidação das evidências do envolvimento de deputados federais e senadores com esquema de cartel e superfaturamento na petrolífera depende de documentação adicional. Os papéis não foram disponibilizados aos procuradores brasileiros durante a viagem. O acordo de cooperação internacional Brasil-Suíça prevê a necessidade de envio de ofício formal de requisição.

Detalhes fornecidos pelo também delator Alberto Youssef foram essenciais para entender a trama de operações financeiras, dizem fontes ligadas ao caso. A avaliação é que Youssef inovou ao utilizar operações comerciais simuladas para evadir dinheiro do país.

Representantes do Ministério Público suíço ficaram impressionados com o volume de dinheiro movimentado em mais de 150 contratos de prestação de serviços firmados entre empreiteiras investigadas e as empresas de fachada de Youssef, apurou a reportagem. Ao todo, mais de R$ 11 bilhões foram movimentados pelo esquema, segundo a Polícia Federal.

A dimensão do escândalo da Petrobras deixou os suíços em alerta; eles planejam vir ao Brasil em 2015 para ter acesso aos autos da investigação brasileira.

Na decisão em que decreta a prisão dos executivos das empreiteiras, emitido em 10 de novembro, o juiz Sergio Moro, que conduz o processo da Lava-Jato, relata que as companhias "formariam uma espécie de cartel, definindo previamente as vencedoras das licitações da Petrobras"; assim, elas cobravam preços mais altos pelos serviços e pagavam um percentual de 2% ou 3% sobre o valor dos contratos "a agentes públicos". (Colaborou Andrea Jubé, de Fortaleza)

"Se Dilma for coerente, tem que tirar a banda podre da Petrobras"

'Tem que acabar com o loteamento político nas estatais'

Entrevista
Luiz Pinguelli Rosa - Diretor da Coppe/UFRJ

Nicola Pamplona, Octávio Costa – Brasil Econômico

Atuante nos setores de energia e meio ambiente, o físico Luiz Pinguelli Rosa integrou o "núcleo duro" da equipe que definiu o programa energético petista para o primeiro mandato de Lula. Mas deixou o governo um ano depois, porque não garantia votos no Congresso, segundo a versão corrente à época. Hoje diretor da Coppe/UFRJ, vê no loteamento político a raiz para as denúncias de corrupção na Petrobras, mas acredita que a crise atual pode significar uma mudança positiva na gestão das estatais do país. "Essa é a vantagem desse escândalo, que botou a história em evidência e não há alternativa que não mudar essa prática", afirma ele, que se diz perplexo diante dos valores relacionados às denúncias na empresa. Na sua opinião, o segundo mandato Dilma herda, no setor energético, problemas criados em seu primeiro mandato, como a demora em acionar as térmicas para poupar água nas hidrelétricas e a falta de programas de conscientização do uso da eletricidade. "Mas ficamos esperando chover...", comenta.

O setor energético brasileiro passa hoje por um momento preocupante para o futuro da Petrobras e do setor de petróleo, com a crise energética e as investigações da Lava Jato. É possível traçar um cenário do que pode sair daí?

Dilma está herdando dela mesma uma porção de problemas. Não só no petróleo, na energia elétrica também, embora o petróleo tenha uma conotação mais política por causa das irregularidades dentro da Petrobras. A Petrobras se expôs, são várias pessoas, pelos dados que estão sendo divulgados. Tem um diretor que foi indicado pelo PP, que não devia indicar diretor nenhum, é um partido sem nenhuma importância. Porque o PP? Porque o Lula aceitou isso? É uma situação que já vinha sendo colocada de uns meses para cá, mas agora, nas últimas semanas, descobrimos que envolve também outras pessoas, engenheiros, nomes que surpreendem. Sempre tem a história de dinheiro para partido, que é outro problema mundial, que volta e meia ocorre em outros países. Mas parece que houve também dinheiro para as pessoas, porque um deles se dispõe a devolver não sei quantos milhões, uma quantidade de dinheiro fabulosa. A esse problema se somam outros de gestão, como o preço dos combustíveis, que ficou defasado demais, e a Petrobras ficou com dificuldades para executar os investimentos. Fora a questão da imagem muito abalada, a Petrobras tem o problema do preço dos derivados, deixou atrasar demais a execução das refinarias novas, foi obrigada a importar derivados, principalmente gasolina e diesel, e acabou em certos momentos vendendo combustíveis por um preço que não compensava em relação ao preço de importação. Isso é um desastre. Mas, apesar disso, manteve o programa de investimentos, principalmente na parte de produção, que considero bem sucedida. Não se pode dizer o mesmo do refino. O refino atrasou, fez aquela operação de Pasadena, que tem uma lógica, mas foi mal executada...

O sr. acha que Pasadena fazia sentido?

Claro. A Petrobras sempre precisou exportar parte do seu petróleo muito pesado para trazer petróleo leve e fazer um blend de leve com pesado. Então, Pasadena era uma oportunidade de fazer investimento naquela usina, adaptá-la para refinar o petróleo pesado brasileiro e ter acesso ao mercado norte-americano. O pacote incluía uma base de estocagem, que é importante. Então, em vez de vender óleo pesado a baixo preço, por um valor muito abaixo do petróleo pesado, vende derivado no mercado norte-americano, com uma parcela do óleo que já exporto. Isso era razoável. Agora, daí em diante, não sei mais o que aconteceu. Quer dizer, o início da história era plausível, vender derivados no mercado norte-americano, melhorando o ganho com a exportação do petróleo.

A negociação em si é que foi um problema...

Aí eu já não sei dizer, mas as notícias indicam que tudo parece péssimo, os valores são meio disparatados... Agora, as histórias são todas contadas de forma enviesada, porque é notória uma posição de oposição ao governo de muitos dos que se manifestam sobre isso. Estão se manifestando com uma visão muito carregada. Mas acho que, tirando isso, ainda sobram dúvidas. Ainda mais nesse quadro em que vemos outras irregularidades aparecerem. É presumido que tenha ali também um negócio com valores exagerados.

Uma coisa que se questiona é o loteamento político da Petrobras. Dá para reverter isso? A direção da empresa pode ser eminentemente técnica?

Pode. Há, no mundo, exemplos a serem seguidos. A EDF francesa, por exemplo, é uma empresa 100% estatal, mas é técnica, não é uma bagunça igual aqui no Brasil. Aí faço um contraponto: a corrupção foi descoberta em um momento, com esta ação da Polícia Federal, mas não é de agora. Vamos lembrar o Paulo Francis, que era de posição política neoliberal, e fez uma acusação durante o governo Fernando Henrique de fortes irregularidades na Petrobras. Não foi comprovado, ele inclusive morreu processado pelo pessoal da Petrobras. Mas ficou a pulga atrás da orelha. Isso parece que é um esquemão que se propagou, se manteve ao longo de várias administrações. Mas que pode ser diferente, pode. Não vejo nenhuma necessidade de botar gente ligada a partidos para dirigir a empresa. Isso é um preço a pagar para composição de governo. Ficou aquela história que vale tudo para compor maioria no Congresso. Isso é deplorável. Aquela história do PTB nos Correios também era horrível. Pode ser diferente, tem que ser resolvido. Essa é a vantagem desse escândalo, que botou a história em evidência, e não há alternativa que não mudar essa prática. Acho que a Dilma é a pessoa adequada para fazer isso. Porque ela tem se manifestado com bastante rigor com relação a essas irregularidades. Se for coerente com o que está dizendo, ela terá que corrigir isso e tirar essa banda podre de dentro da Petrobras. Isso é o ponto número um. E botar a Petrobras para funcionar. Até o momento, ela funcionou na parte de exploração no mar. Mas no refino, não. Acho então que vai ter que botar a Petrobras nos eixos, fazer uma limpa nisso que foi descoberto e botar gente técnica competente, que se dedique.

O sr. acha que a diretoria de governança, recém-criada pela empresa, pode resolver?

Não, é só mais advogado, mais procurador... O Brasil já é o país dos advogados, dos procuradores. Você abre a geladeira e sai um lá de dentro, liga TV e sai outro. É um país travado, uma confusão de procedimentos. O TCU resolveu alguma coisa? A CGU descobriu alguma roubalheira? Quem descobriu foi a Polícia Federal, que é outra coisa: investiga a pessoa, tem poder de polícia. Agora, essas coisas, para mim, servem para arrumar emprego para advogado.

Mas qual seria a solução?

Eu não sei te dizer. Acabar o loteamento político e botar gente séria, punir as infrações devidamente... Tem que botar gente bem escolhida, profissional, para fazer a gestão da empresa. Como os caras que estão lá no mar, buscando petróleo a cinco mil metros, os caras do bureau tem que fazer o trabalho direito. Agora, isso é um problema de moralidade pública. Nos remete ao Stanislaw Ponte Preta: "Ou se restabelece a moralidade, ou nos locupletemos todos". Tem que restabelecer a moralidade.

O sr. acha que a presidente da empresa ainda tem condições de continuar?

Eu não vi nada contra ela. Nada do que eu li na mídia é contra ela. Agora, a sustentação dela vai depender da Dilma. Ela tem uma relação com a Dilma. Acho que há uma probabilidade não nula de ela continuar. Você pode dizer: "Ah, mas o princípio do domínio do fato, que foi usado no mensalão...", essas frases jurídicas que não fazem sentido... Mas tudo isso que está sendo investigado vinha de antes.

O sr. deixou a presidência da Eletrobrás sob o argumento deque não garantia votos no Congresso...

Primeiro, houve um entusiasmo no início do governo Lula, um governo de esquerda, que tinha expectativa de mudança grande. Mas, depois, tinha que governar, tinha a realidade de lidar com o Congresso, essas coisas... Quando começou essa conversa eu falei: "Não. Tchau." Cargos desses são provisórios mesmo. E se o problema é uma composição política, eu saio. Nem podia ser de outro modo, porque o cargo é do presidente. E antes que ele viesse dizer se essa frase atribuída a ele era real, pedi para sair.

Neste cenário, de necessidade de composição política, o sr. acha que é possível ter uma administração eminentemente técnica nessas áreas de governo?

Acho. É possível. Se vão fazer isso, não sei. Fica no terreno da política. Setores da Petrobras funcionaram perfeitamente bem, enquanto estava essa bagunça toda se desdobrando. A parte de produção de petróleo estava funcionando em condições adversas, com profundidades enormes. Isso mostra que há um lado sadio. E, se há um lado sadio, porque o todo não é sadio? Por hipótese, pode ser. Acho que isso deverá ser feito. Até por decisão política, para limpar um pouco essa imagem horrível que se criou. Acho que a Petrobras deverá ser passada a limpo.

O sr. fica espantado com essa realidade?

Espantadíssimo, claro. O gerente dos R$ 100 milhões me deixou perplexo, porque R$ 100 milhões é muito dinheiro. Fiquei espantado com a naturalidade. Isso é muito ruim para a imagem da empresa. E acho que falta um pouco, não sei se por falta de informação, uma reação à altura do próprio sindicalismo. Não se diferenciou, não se indignou. Isso exige indignação. Tem que fazer um movimento, imprimir panfleto...

Talvez por uma percepção de que estariam atacando um governo de esquerda...

Não acho que é um problema de atacar o governo, mas de atacar os problemas revelados. Repito: se pegar a denúncia do Paulo Francis, foi durante o governo Fernando Henrique, sendo ele um simpatizante do Fernando Henrique. Não provou nada, mas devia ter alguma razão, porque não era um doido varrido. Então acho que esse germe existe há muito tempo. E esse germe precisa ser esterilizado. Para os jovens que vão trabalhar na Petrobras, a Petrobras era uma empresa preferencial. Agora, se alguém fala que vai trabalhar na Petrobras: "Mas que horror!". Uma empresa vive também desse imaginário e a Petrobras tem que recuperar isso. E tem que fazer isso logo.

Há uma linha de defesa dos acusados que diz que as empresas foram achacadas e não tiveram opção...

Na verdade, não dou muito crédito a isso, que um lado era bonzinho e o outro, mau. É natural que a defesa vá alegar essas coisas, isso faz parte do jogo. Mas nessa escala que está aí demonstrada, acho que é um processo viciado. A surpresa é ter chegado a tal ponto. Essa é a surpresa. Acho que é possível agir com mão forte, botar pingos nos is, afastar os caras, evitar essa protelação brasileira, de que tudo vai sempre sendo empurrado adiante e tal.

Um pouco antes da posse de Lula no primeiro mandato, havia um grupo muito identificado coma formulação de políticas energéticas, que era a própria presidenta Dilma, o sr., Maurício Tolmasquim (hoje presidente da Empresa e Pesquisa Energética) e Ildo Sauer (que ocupou a Diretoria de Gás e Energia da Petrobras). Desses, apenas Dilma e Tolmasquim permanecem. O sr. e o Ildo saíram e adotaram uma postura crítica ao governo. O que provocou esse racha?

Bom, eu saí antes do Ildo. Saí porque... Não atribuo à Dilma, como alguns fazem. Saí por essa coisa política. Havia uma idéia de composição mais partidária e eu não me identificava com isso. A saída do Ildo foi no fim do mandato do Lula. Também creio que foi mais ou menos a mesma coisa. Mas ele centrou um pouco a discussão com a Dilma, coisa que eu não fiz. Eu discuti com a Dilma, mas não acho que saí por causa disso. Poderia ter ficado discutindo a vida toda.

Mas aquele modelo, que vocês tinham pensado lá em 2002, foi colocado em prática?

Não. Não digo que está tudo errado, mas acho que não foi feito o necessário. Ficou em débito, não era bem isso o que a gente queria. Agora tem que deixar claro que a minha posição era mais à esquerda do que a da Dilma. Mais estatizante. A Eletrobras seria muito mais forte, iria levar adiante uma política de construção de usinas hidrelétricas e iria operar essas usinas. A Eletrobras seria a Petrobras do setor elétrico, para usar uma expressão que foi dita por mim e por outras pessoas na época. Uma empresa forte, executando projetos. Ela até fez um pouco, a Eletrobras não é um zero à esquerda. De uma maneira ou de outra está envolvida nos empreendimentos de Jirau, Santo Antonio, Belo Monte, nós ampliamos Tucuruí. O que foi a razão de uma briga minha com o Joaquim Levy (novo ministro da Fazenda, indicado na semana passada), porque ele não queria liberar o investimento. Não era preciso dinheiro do governo, era dinheiro da Eletrobras, mas ele não queria deixar a gente gastar o dinheiro da empresa, por causa do superávit primário. A Eletrobras fez, mas deveria fazer mais, ter mais controle. Ela é sócia minoritária. Ela entra em tudo e não manda em nada. Isso pra mim não faz sentido, uma empresa grande não pode ser assim.

O que o sr. avalia que está errado no modelo?

A Eletrobras entrar sempre como minoritária. Se somar na obra de Jirau e Santo Antonio, as participações de todas as empresas do grupo Eletrobras, ela controlaria os empreendimentos. Mas ela é minoritária em tudo.

Por que?
Porque pode manter a Lei 8.666(a Lei das Licitações), uma das maiores imbecilidades brasileiras. É uma lei da roubalheira. Essa lei não é do bem. E como mantém-se a lei, se a Eletrobras é minoritária, o empreendimento pode operar como uma empresa privada e não precisa ficar pedindo para o Joaquim Levy para comprar lápis. Isso é uma debilidade mental. Ninguém consegue operar uma empresa desse jeito. A moralidade não se estabelece por aí, catando canhoto de viagem etc.

Mas a Petrobras não tinha instrumentos de controle para evitar a corrupção?

Pelo que entendo, a coisa funcionava assim: eu faço uma obra, contrato uma empresa que vai fazer a obra pra mim. Nesse contrato, já se admite um valor superior ao que vai custar a obra. E esse valor vai para o contratado e depois é distribuído. Como controlar isso? Provavelmente, pode haver um sistema de controle dos custos de uma obra. Agora, uma obra como essas que estamos falando, não é fácil. Porque não se faz todo dia, são ímpares. A Abreu e Lima, um troço daquele tamanho, o Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro... São coisas difíceis. Tem que lidar com gente honesta e o controle tem que estar disseminado, todo mundo controlando todo mundo, uma cultura de controle. Vocês lembram do discurso do (Dwight) Eisenhower, quando deixou a Casa Branca e falou nos parafusos de mil dólares? Eram parafusos de mil dólares porque eram para a Defesa. Era o mesmo parafuso da loja de ferragem, mas quando era para a Defesa, valia mil dólares.

Temos aqui o parafuso de refinaria e o parafuso de hidrelétrica...

É, começaram a inventar que isso é especial ou aquilo é especial. Tem que ter essa cultura de disseminar o controle, tem que ser um pouco idealista nisso, no sentido de carregar a tropa e tal.

Fala-se que no setor elétrico pode ser a mesma coisa. Afinal, são as mesmas empreiteiras. O sr. acha que é?

Não vou dizer que sim, nem que não, até que haja uma denúncia concreta. No meu caso, eu tinha um diretor financeiro que era uma fera, um cara ultrarrigoroso, que me arrumava uma porção de brigas, não recebia políticos e isso me deixou até hoje tranquilo. O Alexandre Magalhães da Figueira, um cara que era daqui da universidade, se aposentou e foi trabalhar no mercado financeiro. O Lula conhecia o Alexandre, lá do tempo do movimento sindical, o Alexandre tinha sido, comigo e com o Mercadante, dirigente da Associação Nacional dos Docentes. E o convenci a ir a Eletrobras, foi para lá, sentou lá como um buldogue e eu acho que fiquei muito protegido.

E o nó do setor elétrico?

Tem jeito, mas é outro nó. O nível dos reservatórios... (faz um gráfico mostrando a curva da energia armazenada nas regiões Sudeste e Centro-Oeste). Se pegar este ano o negócio andou assim, abaixo da curva de 2001, o ano que criou problema para o Fernando Henrique. Nós estamos bem mal. Agora, você imagina, vai começar o ano de 2015 baixo demais. Então, nós certamente vamos ter problemas no próximo ano, porque está começando muito baixo. Anão ser que venha uma chuva excepcional.

Mesmo com parque térmico instalado?

Numa situação normal, nossa composição da geração é aproximadamente 80% hídrico e 20% térmico e outros. Mas é basicamente hídrico. Este ano, foi 60% hídrico e 40% térmico e outros. Nós provavelmente vamos repetir a dose no ano que vem. Tem térmica, mas elas são caríssimas. Nossas térmicas são altamente ineficientes, porque são feitas para não funcionar. Então a lógica do empreendimento é baixo investimento e alto custo do combustível, que paga quando precisa. Mas nós estamos precisando e provavelmente vamos repetir a dose no ano que vem.

Isso tem solução?

A solução é ter mais usinas. Até agora, a solução foi dada, nós não ficamos sem luz. Mas o preço foi absurdo. A cultura do setor elétrico brasileiro é hídrica, tem lá seus modelos matemáticos, mas é tudo hídrico. E a gente tem que mudar a cabeça para um sistema, no mínimo, hidrotérmico. Como a gente tem reservatórios grandes ainda, a eólica, que está crescendo muito, pode ter um papel. Porque toda vez que tiver vento, gera eólica e segura as turbinas para encher o reservatório. Eu acho, neste ano de 2014, talvez eles tenham errado. Se tivessem antecipado um pouco as térmicas, estaríamos em uma situação mais confortável. Porque chegou a ponto deter que cortar algumas turbinas porque o nível das águas está crítico. Se antecipasse um pouco, talvez isso não tivesse acontecido. Acho que aí houve um erro.

Ficamos esperando a chuva...

É, rezando para chover. Mas este ano foi um ano ruim.

Quando o sr. fala em planejamento hidrotérmico, a ideia é que alguma coisa gere na base?

A gente vai ter que ter um programa de expansão no qual o critério da térmica não seja como é hoje, que o que interessa é o baixo investimento. Vamos ter que ter uma operação maior delas. E ter térmica de maior qualidade. Primeiro, o gás natural é melhor. Segundo, sendo gás natural, que seja ciclo combinado, uma turbina a vapor e uma a gás, fechando o ciclo.

Por que se fala tão pouco em microgeração e eficiência, como, por exemplo, na Europa?

Na Europa, é mais fácil porque estão com a população mais estagnada. Aqui, o crescimento populacional ainda pressiona. Mas o smart grid, botar coletores solares, aproveitar energia quando sobra de uma casa e jogar na rede é uma boa ideia, que o mundo está entrando agora. Precisamos olhar para isso. Nós não usamos solar para nada. Devia ter uma política voltada para solar. Coletores nos edifícios, montar uma indústria de coletores no Brasil, ao invés de comprar dos chineses. Falta uma política industrial.

O sr. citou uma discussão com o Joaquim Levy sobre investimentos. Acha que, com ele na Fazenda, teremos menos investimentos?

Ele vai ser obrigado a ceder. Senão ele para o Brasil, porque o Brasil já está quase parando. A não ser que haja um boom econômico e o setor privado volte a um dinamismo muito grande, que é o que todo mundo quer. Mas aí, temos outro problema, porque vai precisar de mais energia elétrica. Este ano de 2014 foi de baixíssimo consumo industrial. Se houver atividade econômica mais intensa, a curva de energia armazenada se altera também, porque a água vai ser mais usada.

E aí teremos racionamento?

Ou mais termelétrica.

Mas corremos o risco de racionamento?

Corremos. Nós corremos este ano. Houve um momento em que o pessoal ficou preocupado. Mas eu acho que aí também houve um erro. Poderia ter sido feito um racionamento programado, discutido, não a imposição, como em 2001, de corte para quem não reduzisse em 20% seu consumo. Tinha que ser feito um programa de conscientização. E outra coisa: estabelecer limites no uso do ar condicionado. Ele é usado em temperaturas absolutamente abomináveis, você entra e fica com frio. É uma cultura do desperdício. E isso é fácil de fiscalizar. Nas residências privadas, é impossível, mas no comércio e nos serviços, onde está a maior parte do consumo, é possível fiscalizar. Estou falando uma maluquice? Não, o Japão faz isso. É proibido botar o ar condicionado em uma temperatura muito baixa.

Distribuição de ministérios opõe partidos da base

• PSD e PP travam disputa por Secretaria da Micro e Pequena Empresa; PMDB quer Cidades

Simone Iglesias e Júnia Gama – O Globo

BRASÍLIA - Não bastassem as críticas do PT e do PMDB às primeiras escolhas feitas para seu Ministério, a presidente Dilma Rousseff tem pela frente rodadas de conversas com os partidos que a apoiaram na campanha à reeleição para definir o espaço de cada um no segundo mandato. Há, no entanto, um congestionamento de pedidos e disputas que vem colocando uns contra os outros entre os partidos aliados. Há até ameaças de abandono da base governista.

A principal batalha travada entre aliados hoje é pelo Ministério das Cidades. O PSD, de Gilberto Kassab, além de querer manter Afif Domingos na Secretaria da Micro e Pequena Empresa, tem certeza de que o ex-prefeito de São Paulo será escolhido por Dilma para a pasta ocupada hoje pelo PP, que por sua vez reage com fúria à certeza dos kassabistas:

- Se ela tirar a gente de lá, saímos do governo - disse um dirigente do PP, no auge da irritação com os movimentos no tabuleiro ministerial.

O partido parece ter desistido da ideia de transformar em ministro o senador Ciro Nogueira (PI). O PP cogita levar a Dilma dois nomes: o do atual ministro, Gilberto Occhi, e o do anterior, deputado Aguinaldo Ribeiro (PB), que saiu do cargo em abril para disputar nova vaga na Câmara. A maioria do partido acha que Dilma optará por Ribeiro e, com isso, quer que Occhi retome o cargo de vice-presidente da Caixa Econômica Federal.

Além da guerra entre PSD e PP, o PMDB também sonha com as Cidades, especialmente se Dilma tirar dos peemedebistas a pasta de Minas e Energia. Dilma e o vice-presidente, Michel Temer, acertaram que o PMDB terá, a princípio, seis ministérios. Agricultura, com Kátia Abreu, e Aviação Civil, com Moreira Franco, são apontados como certos. As demais pastas, por enquanto, são apostas. Dilma gostaria de indicar Henrique Eduardo Alves para Previdência, mas os deputados o querem na Integração Nacional. Outro que pode ficar com a cadeira é Eliseu Padilha, num acerto entre a bancada e Temer. O vice trabalha para que Padilha seja ministro.

'Perdi para organização criminosa', diz Aécio

• Tucano relaciona escândalos de corrupção à ação do PT para reeleger Dilma

Isabel Braga e Carolina Brígido – O Globo

BRASÍLIA - O senador Aécio Neves (PSDB-MG), candidato à Presidência derrotado nas eleições de outubro, afirmou que não perdeu nas urnas para um partido político, mas para uma "organização criminosa" existente em empresas apoiadas pelo governo da presidente Dilma Rousseff (PT). A declaração foi dada em entrevista ao jornalista Roberto D"Ávila, da GloboNews, que foi ao ar na noite de sábado.

- Na verdade, eu não perdi a eleição para um partido político. Eu perdi a eleição para uma organização criminosa que se instalou no seio de algumas empresas brasileiras patrocinadas por esse grupo político que aí está - disse o tucano.

Na entrevista, Aécio fez várias outras críticas a Dilma, sua adversária nas eleições de outubro. Ele afirmou que Dilma se mantém no poder às custas do que classificou como "sordidez" investida contra os oponentes, em especial durante a campanha eleitoral.

- Essa campanha passará para a História. A sordidez, as calúnias, as ofensas, o aparelhamento da máquina pública, a chantagem com os mais pobres, dizendo que nós terminaríamos com todos os programas sociais. Não só eu fui vítima disso. O Eduardo (Campos) foi vítima disso, a Marina (Silva) foi vítima disso e eu também. Essa sordidez para se manter no poder é uma marca perversa que essa eleição deixará - disse Aécio a Roberto D"Ávila.

Embates duros com Dilma
Para o tucano, um ataque em campanha eleitoral, com respeito a determinados limites, "faz parte do jogo". Ele ressaltou que a disputa entre candidatos deve ser de ideias, não de caráter pessoal. O senador lembrou que os embates com a presidente durante a campanha foram duros:

- Eu tinha que ser firme, mas sempre busquei ser respeitoso. Mas, nesses embates, eu representava o sentimento que eu colhia no dia anterior, ou no mesmo dia de manhã, de uma viagem que eu tinha feito por alguma região do Brasil. Eu passei a ser porta-voz de um sentimento de mudança e também de indignação com tudo isso que aconteceu no Brasil.

A comparação do PT com uma organização criminosa feita por Aécio não caiu bem no partido da presidente. O secretário nacional de Comunicação do partido, José Américo, considerou a declaração irresponsável e típica de quem não sabe se conformar com a derrota na eleição.

José Américo disse que não viu a entrevista toda, mas vai pedir ao departamento jurídico do PT para analisar se é o caso de buscar alguma ação na Justiça contra o tucano.

- É desagradável. Aécio mostra que não sabe perder. Não é só um problema político, ele está abalado psicologicamente. A derrota em Minas abalou Aécio porque, ao perder no seu estado, perdeu também a corrida dentro do próprio PSDB. Está em desvantagem na sociedade e no PSDB. E aí faz uma acusação irresponsável desse tipo.

Na mesma entrevista, Aécio alertou para o risco de o Judiciário brasileiro ser politizado pelas indicações que a presidente Dilma fará para tribunais superiores. Ao longo do novo mandato, a petista indicará pelo menos seis dos onze ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). Isso porque, até 2018, cinco dos atuais ocupantes das cadeiras completarão 70 anos, limite para a aposentadoria compulsória. A outra vaga foi aberta em julho, quando o ministro Joaquim Barbosa pediu aposentadoria.

Atenção às indicações para tribunais
A presidente Dilma também fará seis nomeações para o Superior Tribunal de Justiça (STJ) nos próximos quatro anos. O STJ é composto de 33 ministros. Antes de tomar posse, o ministro escolhido precisa passar por sabatina no Senado. Aécio pediu atenção aos parlamentares.

- É preciso que o Congresso esteja muito atento às novas indicações, seja para o STJ, seja para o STF. Não podemos permitir que haja qualquer tipo de alinhamento político do Judiciário brasileiro. A sociedade está mais atenta do que nunca para que as nossas instituições sejam preservadas - disse.

Cargos de chefia da Pesca alavancam carreira política

Fábio Brandt - O Estado de S. Paulo

Pouco relevante na política de Brasília, o Ministério da Pesca e Aquicultura controla um terreno com alto potencial eleitoral nos rincões do País. O Maranhão, onde autoridades investigam fraudes no seguro-defeso, oferece exemplo claro do poder alcançado por quem comanda instituições ligadas à pesca.

O presidente do PRB maranhense, o deputado federal Cléber Verde, conseguiu se reeleger neste ano e vai para seu terceiro mandato tendo a defesa dos pescadores e o pagamento do seguro-defeso como bandeiras. No Congresso Nacional, ele preside a Frente Parlamentar Mista da Pesca e Aquicultura.

Em 2011, Cléber emplacou o irmão, Júnior Verde, na chefia da Superintendência Federal da Pesca no Maranhão - órgão responsável pelas atividades do ministério no Estado. Uma das incumbências da superintendência é emitir as carteiras de pescador, documento necessário para pescadores receberem o seguro-defeso. Em 2014, Júnior saiu da superintendência e se elegeu deputado estadual.
Próximos à cúpula do Ministério da Pesca, dirigido pelo PRB, os irmãos Verde conseguiram manter o controle do órgão indicando um aliado para ser superintendente: Alysson Penha Silva, também filiado ao PRB.

O deputado federal Cléber Verde afirmou não ter responsabilidades sobre as atividades do ministério e que defende o pagamento do seguro apenas para verdadeiros pescadores. Ele disse que a irregularidade é cometida por quem assina documentos atestando ser pescador sem sê-lo e que caberia ao governo federal encontrar meios de coibir a fraude.

Júnior Verde não respondeu aos contatos da reportagem. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

PRB loteia chefias da Pesca nos Estados

• Das 27 superintendências estaduais, 17 são ocupadas por filiados ao partido; na lista há dirigentes da sigla, piloto de avião e diretor de TV

Andreza Matais, Fábio Brandt e Leonencio Nossa - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Um piloto de avião, um diretor de TV, advogados, políticos derrotados em eleições e dirigentes do PRB foram nomeados pelo partido como superintendentes do Ministério da Pesca nos Estados. A sigla comanda a pasta desde 2012, com a indicação do senador Marcelo Crivella (RJ), depois substituído por seu suplente no Senado, pastor Eduardo Lopes (PRB).

Das 27 superintendências da Pesca, 17 são ocupadas por filiados do PRB, partido controlado pela Igreja Universal do Reino de Deus. Um raio x do perfil dos escolhidos para comandar os órgãos mostra que a filiação é o principal critério na escolha. Há superintendências também ocupadas por filiados do PP, PTN, PTC e PT.

Há cerca de uma semana, o Estado revelou que superintendências loteadas pelo PRB estão sob investigação da Polícia Federal e do Ministério Público por suspeitas de uso eleitoral das carteiras de pescador, que garantem o pagamento de um salário mínimo nos meses em que a pesca de algumas espécies fica proibida (seguro defeso) e outros benefícios, como aposentadoria especial.

Na sexta-feira, o Ministério Público Eleitoral no Acre pediu à PF abertura de um terceiro inquérito, para apurar compra de voto pela ex-superintendente no Estado Juliana Rodrigues de Oliveira, a Doutora Juliana, eleita deputada estadual pelo PRB. Um mês antes do período eleitoral, a pasta editou uma instrução normativa em que autoriza as superintendências a confeccionar os documentos, antes feitos com selo da Casa da Moeda, em papel comum. A denúncia é de que a nova regra facilitou um derramamento de carteiras no Acre trocadas por votos.

Currículo. Em Alagoas, o superintendente da Pesca também saiu do cargo para se eleger deputado federal. Galba Novais foi eleito pelo PRB. Antes de assumir a Pesca, tinha presidido a Câmara de Vereadores de Maceió. No lugar dele, foi nomeado o aliado Paulo Valter Gondim, também ligado ao partido.

Em Mato Grosso do Sul, o superintendente Luiz David Figueiró é tesoureiro do diretório estadual do PRB, piloto de avião desde 1978 e consultor de companhias aéreas. Figueiró já trabalhou no governo sul-mato-grossense como piloto e foi assessor no Ministério dos Transportes no governo Lula.

No Ceará, Estado de tradição pesqueira, o superintendente é o pastor Emanuel Robson Oliveira, que tem um currículo de dedicação à Universal. Ele foi diretor de programação da Record, emissora de televisão da igreja, em Cuiabá e Fortaleza. Oliveira presidiu o PRB no município cearense de Maracanaú.

Na lista de indicados pelo PRB para as superintendências há também advogados, como Fábio da Silva Muniz (Amapá) e Nádia Hellen Gaia de Almeida (Pará).
Em breve, o PRB vai ganhar mais um superintendente. Raimundo Nonato Sousa Pereira Costa disse ao Estado que vai se filiar pela primeira vez a um partido. “A gente, como superintendente, já faz parte da política.” E explicou por que escolheu o PRB: “É o partido do ministro”.

Procurados, o Ministério da Pesca e Crivella não responderam aos questionamentos do Estado sobre as nomeações nos Estados. Em outra ocasião, a pasta informou que abriria sindicância para apurar as irregularidades no pagamento do seguro defeso e na emissão das carteiras. Na semana passada, o PRB emitiu nota dizendo que espera receber um “ministério maior que o da Pesca” no segundo governo Dilma. Justificou a reivindicação dizendo que ampliou sua bancada na Câmara dos Deputados de 8 para 28 deputados.

Dilma busca apoio para mudar LDO

• Rebelião na base impôs derrota em votação sobre mudança na LDO

Isabel Braga, Cristiane Jungblut – O Globo

BRASÍLIA - Numa tentativa de reabrir o diálogo com o Legislativo, a presidente Dilma Rousseff se reúne hoje com líderes aliados na Câmara e no Senado. A presidente fará um apelo para a votação do projeto de lei que altera a meta de resultado fiscal deste ano, da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2015 e do orçamento para o próximo ano. Será a primeira reunião com os líderes este ano e acontece em meio a problemas políticos enfrentados por Dilma no Congresso. Segundo interlocutores do Palácio do Planalto, a presidente quer falar e ouvir seus líderes, retomando o diálogo com o Congresso como prometeu após ser reeleita.

Na semana passada, o governo tentou votar o projeto que altera a meta fiscal, abrindo espaço para o governo registrar até déficit, e permite o descumprimento da LDO de 2014, mas enfrentou rebelião na base aliada, que se ausentou e derrubou a sessão do Congresso Nacional. Líderes aliados afirmam que a sinalização de Dilma para a retomada do diálogo poderá ajudar na votação da proposta esta semana. O líder do PMDB na Câmara, Eduardo Cunha (RJ), destacou que esta será a primeira reunião da presidente com a base este ano e lembrou que, em 2013, quando Dilma chamou os partidos aliados, as votações fluíram.

- Claro que pode ajudar. É o retorno ao modelo que ela adotou em 2013 e facilitou as votações. Provavelmente ajudará agora - disse Cunha.

Relator do projeto que muda a meta, alterando a LDO de 2014, o senador Romero Jucá (PMDB-RR) afirmou que o problema é político e que a abertura do diálogo é fundamental:

- Pacifica o clima com a base. O silêncio dela cria esse tipo de situação. Esta semana é para juntar os partidos, uniformizar o discurso, dar segurança para que os partidos se insiram no projeto do governo reeleito. A presidente estava distante.

Emendas parlamentares
O parecer de Jucá, que será novamente pautado na sessão do Congresso Nacional marcada para amanhã, abre espaço para o governo ter até mesmo um déficit fiscal este ano, permitindo o abatimento de todos os gastos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e das desonerações da meta. O governo já disse que vai abater R$ 106 bilhões, fazendo um superávit de R$ 10,1 bilhões, contra os R$ 116,1 bilhões fixados na LDO de 2014.

Outros líderes aliados também criticam a falta de diálogo de Dilma com sua base aliada.

- A presidente chamou, vamos ver o que ela quer. Se me pedirem para falar, vou dizer que o governo tem que ser mais político, conversar com os políticos, não só dar tarefas aos políticos - afirmou o líder do PTB na Câmara, Jovair Arantes (GO).

Além das votações nesta reta final da legislatura, Dilma deverá tratar também sobre o empenho de emendas parlamentares do orçamento impositivo. Outro tema que pode ser abordado é a tramitação do Orçamento da União de 2015, proposta inflada dentro da Comissão Mista de Orçamento (CMO) em R$ 21,7 bilhões, na nova previsão de receitas.

Petistas querem Integração Nacional

Andrea Jubé – Valor Econômico

FORTALEZA- O PT abre a semana com a expectativa de que a presidente Dilma Rousseff deflagre a próxima etapa da reforma ministerial com a definição do espaço da sigla no segundo governo, antes de iniciar as conversas com os demais aliados. O partido - ao qual Dilma prometeu protagonismo no próximo mandato - quer manter as pastas da área social, reivindica a Integração Nacional para o governador Jaques Wagner, da Bahia, e busca ampliar sua participação no segundo escalão. Dilma embarca para Quito nesta quinta-feira, para a reunião da Unasul, mas antes de viajar, deve se reunir com o presidente do PT, Rui Falcão, para tratar da pauta ministerial.

A presença de Dilma no encontro do diretório nacional do PT no último fim de semana, em Fortaleza - com o palco armado, nos bastidores, pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva - selou a reconciliação dela com a legenda, embora ainda haja desconfiança de setores do partido com a Dilma mais política e simpática. As relações estavam estremecidas desde a reeleição. Primeiro, porque a presidente não reconhecia, publicamente, o papel dos petistas na campanha. O partido convocou militantes e movimentos sociais a sair em peso às ruas, principalmente no segundo turno, quando a derrota parecia iminente.

Esse sentimento agravou-se, quando Dilma fez o primeiro aceno do novo governo aos setores conservadores, com as indicações do economista Joaquim Levy, de perfil ortodoxo, para o Ministério da Fazenda, e da senadora Kátia Abreu (PMDB-TO) para a Agricultura.

Nos bastidores, lideranças petistas pontuavam que, com um pouco mais de tato, Dilma poderia ter acrescentado ao menos um nome do partido ao primeiro lote de anúncios, a título de contraponto, como Miguel Rossetto e Jaques Wagner. Ambos são considerados pule de dez no novo ministério.

Ausente no encontro do diretório petista, Lula fez o meio de campo para o comparecimento de Dilma. Convidado, ele preferiu não ir e pavimentar o caminho para a reaproximação dela com a legenda. Ele disparou telefonemas para lideranças nacionais e estaduais, recomendando que interviessem para acalmar os ânimos partidários. O resultado dessa operação foi o discurso mais "habilidoso e político" de Dilma nos últimos tempos, na avaliação de um importante dirigente. Para essa fonte, Dilma não demonstraria tanta desenvoltura se o seu antecessor - líder máximo da sigla - estivesse presente, porque ele poderia intimidá-la. "Tem horas em que a ausência de Lula ajuda", disse.

Pela primeira vez, Dilma agradeceu, explicitamente, o PT, os dirigentes partidários e a "militância guerreira", e foi aplaudida várias vezes. Num momento em que brasileiros insatisfeitos com a derrota do PSDB saem às ruas pedindo o impeachment da petista, pelas suspeitas de ligações do PT com a corrupção na Petrobras, e até mesmo intervenção militar, Dilma pediu que o partido esteja ao seu lado. "Conto com vocês para que juntos encaremos com serenidade os golpistas de sempre".

A presidente confirmou que seu partido terá papel central "no protagonismo dos aliados e dos movimentos sociais", mas lembrou que como se trata de um governo de coalizão, ela terá de reservar espaço aos demais coligados.

Dilma também surpreendeu ao comparecer ao jantar oferecido a ela pelo governador eleito do Ceará, Camilo Santana, já que não havia confirmado presença. No restaurante, de frente à Praia do Futuro, ladeada pelo governador e pelo presidente Rui Falcão, ela saboreou ostras frescas, distribuiu sorrisos, confraternizou e fez selfies. Depois que foi embora, um deputado federal reeleito confidenciou ao Valor: "Quero ver quanto tempo dura isso", referindo-se à fartura de simpatia da presidente.

É nesse clima de reconciliação que o PT espera iniciar a discussão sobre seu espaço no ministério e no segundo escalão. Reivindica a Integração, invocando a eleição de um terço dos governadores do Nordeste - Rui Costa, da Bahia, Wellington Dias, do Piauí, além de Camilo Santana, que a escoltaram em Fortaleza. O argumento é de que a pasta dialoga diretamente com o Nordeste, região que votou em peso na petista. Mas esse pleito implica em uma queda de braço com o PMDB, que cobiça as pastas da Integração e da Educação.

O PT também pleiteia uma fração maior da rede de cargos federais nos Estados, em superintendências e delegacias regionais de órgãos como Sudene, Incra, Docas e o Banco do Nordeste. Nesse caso, os pedidos se justificam pelo fato de serem esses postos estaduais que materializam as políticas dos ministérios e refletem a força partidária no plano federal. Petistas queixam-se da perda de espaço para aliados do Planalto em suas bases eleitorais, por causa da distribuição desses cargos.

Plano prevê taxar mais importados e cosméticos

• Entre as medidas em estudo para reequilibrar contas públicas, também estão o corte no abono salarial e a volta da Cide

• Aumento de tributos geraria R$ 5 bilhões em 2015, e mudança em benefícios sociais, mais R$ 8 bilhões

Valdo Cruz - Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - Além da volta da Cide (contribuição que regula preço dos combustíveis), a nova equipe econômica avalia outros propostas de aumento de tributos para reequilibrar as contas públicas em 2015.

Entre elas, elevar a alíquota de PIS/Cofins sobre produtos importados e o aumento da tributação sobre cosméticos. As duas medidas podem render, em 2015, R$ 5 bilhões.

O governo vai mudar também a concessão do abono salarial e do seguro-desemprego. No abono, a ideia é transformar em proporcional o pagamento do benefício, o que pode gerar economia de até R$ 8 bilhões para a União.

As propostas fazem parte do pacote elaborado pela equipe de Guido Mantega, entregue a Dilma Rousseff na semana passada e repassado aos futuros ministros Joaquim Levy (Fazenda) e Nelson Barbosa (Planejamento).

Os dois nossos auxiliares da presidente avaliam as medidas e devem finalizar o formato do pacote fiscal ainda neste ano. Eles já anunciaram que farão um ajuste suficiente para gerar um superavit primário (economia de gastos a fim de reduzir a dívida pública) de 1,2% do PIB em 2015.

Segundo a Folha apurou, a nova equipe vai optar por aumento de tributos para fechar as contas públicas, que até outubro registravam deficit de R$ 11,5 bilhões no ano, a fim de preservar áreas como educação e saúde.

Levy e Barbosa preparam, porém, um corte "significativo" de despesas no Orçamento de 2015, ainda não aprovado pelo Congresso, para "encorpar" o pacote elaborado pela equipe de Mantega.

A alta da alíquota de PIS/Cofins sobre importados e o aumento da tributação sobre cosméticos foram analisados no início do ano, mas foram descartados porque Dilma não queria elevar a carga tributária em ano eleitoral.

Diante da necessidade de reequilibrar as contas, as medidas voltaram a ser incluídas no pacote elaborado pelo time de Mantega.

Na época, a indústria de cosméticos reuniu-se com a equipe do ministro e questionou as mudanças em estudo, em que se passaria a cobrar IPI não só de fabricantes mas também de distribuidores. Recebeu a promessa de que a indústria seria ouvida quando o tema voltasse à discussão.

Tratamento igual
No caso do aumento de PIS/Cofins sobre importados, a medida, além de gerar caixa, visa dar tratamento tributário igual ao produto nacional, que tem uma tributação maior. Isso porque o STF (Supremo Tribunal Federal) considerou inconstitucional incluir ICMS na base de cálculo de importados.

Hoje, a alíquota do PIS é de 1,65%, e a da Cofins, de 7,6%.

A volta da cobrança da Cide também está em estudo. A contribuição, que foi reduzida ao longo dos últimos anos e zerada em 2012 para segurar os preços dos combustíveis, pode gerar R$ 14 bilhões de receita por ano se cobrada em seu maior valor.

A proposta, contudo, era fazer uma recomposição parcial do valor. No caso da gasolina, o governo usava como valor de referência a cobrança de R$ 0,28 por litro.

Jucá defende PMDB desatrelado do PT

Raquel Ulhôa – Valor Econômico

BRASÍLIA - Relator do projeto de lei que permite ao governo abandonar o superávit primário de 2014, o senador Romero Jucá (PMDB-RR) considera "pedagógica" a crise provocada pelo não cumprimento da meta - que forçou a presidente Dilma Rousseff a propor ao Congresso a mudança da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e ser acusada pela oposição de "estelionato eleitoral". Além de ajustar a meta de 2014, o governo está projetando 2015 "com mais realidade", com metas macroeconômicas "factíveis".

Para ele, Joaquim Levy no Ministério da Fazenda e Nelson Barbosa no Planejamento formam a "dupla corte e costura". Uma escolha "tecnicamente perfeita", na sua opinião. Mas prevê um 2015 de mais dificuldades para Dilma e a necessidade de "esforço fiscal diário".

"Levy vai cortar e Nelson vai costurar economicamente, tentando induzir crescimento onde é mais factível. Conhece bem isso", diz. "É uma guinada da orientação econômica do governo. Eu defendi superávit de 1% do PIB para 2015 e Joaquim Levy [ministro da Fazenda anunciado] colocou 1,2%. Está na margem. A meta de inflação para o ano (6%) e a taxa de juros (11,5%) também são factíveis. Eu diria que foi um bom início."

Operador frequente de projetos de interesse do governo no Congresso, principalmente de temas econômicos, Jucá defende que seu partido abandone a "posição subalterna" em relação ao PT e não participe do governo no segundo mandato de Dilma se não tiver maior protagonismo na gestão e na definição das políticas. O senador integra a corrente do PMDB que prega maior independência da sigla e a busca de um "caminho próprio".

"O PMDB pode não participar do governo, dependendo do tipo de relação que se crie. O que o partido não pode é ficar numa posição subalterna e ser o mordomo, que é culpado de tudo. A relação com o PT tem sido politicamente desvantajosa para o PMDB. No confronto, tem sobrado estilhaço para a gente."

Economista, sempre designado pelo PMDB para negociar - tanto com o governo quanto com a oposição- projetos estratégicos ao Palácio do Planalto, pela habilidade na operação política e trânsito nas outras legendas, Jucá defende que o partido tenha participação efetiva na gestão e na definição política, econômica e de políticas públicas. Ele integra a corrente do PMDB que prega independência cada vez maior em relação ao PT.

"Não é indicar o nome de um ministro. O PMDB não pode estar atrás de emprego de ministro. Participação não é ter cinco pessoas com DAS 7 [remuneração mais alta do funcionalismo público]. Não é essa a discussão que o PMDB tem que ter", diz o ex-líder do governo nas gestões de Fernando Henrique Cardoso, Luiz Inácio Lula da Silva e da própria Dilma.

Com o cuidado de deixar claro que não fala pelo PMDB, embora seja um dos vice-presidentes da sigla, o segundo vice-presidente do Senado Federal e um dos senadores mais próximos do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), Jucá diz que, antes de levar nomes à presidente, o PMDB deve "discutir a relação com o PT e com a Dilma".

"Discutir a relação é definir, preto no branco, qual é o papel de cada um e o que cada um espera do outro. Tem que ter clareza nisso. A clareza que a gente cobra na questão econômica também tem que ter na questão política", afirma o senador. Para ele, seu partido "tem que vislumbrar o futuro e não pode ficar só agarrado ao presente". Jucá acha que o PMDB pode "apoiar o país no Congresso e ficar mais independente na questão administrativa", se não ficar definido um papel "preponderante" no governo.

Ainda trabalhando para tentar aprovar o polêmico projeto de lei do Executivo que muda a LDO para permitir que o governo descumpra a meta de superávit primário deste ano, Jucá acredita na capacidade da nova equipe econômica de realizar ajustes fiscais necessários e recuperar a credibilidade do país.

Jucá votou no senador Aécio Neves (PSDB-MG) para a Presidência da República, assim como parte expressiva das lideranças do partido no país. No caso do vice-presidente do Senado, o argumento principal para não seguir a orientação da cúpula - a favor da reeleição de Dilma e seu vice-presidente, Michel Temer, presidente nacional do PMDB - era a crítica à política econômica, considerada "equivocada" por ele.

Renan marcou para amanhã nova sessão do Congresso para votar o projeto que muda a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), para permitir o descumprimento do superávit. Nas duas tentativas feitas, a oposição lançou mão de manobras regimentais para atrasar, e faltou mobilização da base governista para dar quórum. Para ele, embora haja prazo, já que o governo tem até 30 de dezembro para "fechar as contas", a aprovação deve ser rápida para acabar com a "celeuma" do superávit.

Ricardo Noblat - Dilma vai às compras

Acho que nenhum outro país viveu tamanha roubalheira - Felix Fischer, ministro do Superior Tribunal de Justiça, sobre o escândalo na Petrobras.

Quem disse a maior bobagem da semana passada? Gilberto Carvalho, ministro-chefe da Secretaria-Geral da presidência da República, ao comentar a escolha de Joaquim Levy para futuro ministro da Fazenda? Aécio Neves, senador do PSDB, pelo mesmo motivo? Ou o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso que parece não ter assimilado a reeleição da presidente Dilma Rousseff e mais uma derrota do seu partido?

Gilberto disse : "Joaquim Levy aderiu ao programa histórico do PT, à filosofia econômica do projeto". Aécio disse: "O da presidente Dilma é um governo que não sabe a direção que vai tomar". Disse Fernando Henrique: "[Dilma] ganhou, é legal. Mas sem uma parte do dinamismo do país. E por outro lado com um sistema de apoios que não se expressa no atual nem no futuro Congresso".

O PT foi quem aderiu ao modelo econômico que Joaquim sempre defendeu desde sua formatura na ultraortodoxa Universidade de Chicago. Com a indicação dele para xerife da economia, Dilma deixou claro a direção que dará ao seu governo. Não faltou apoio do atual Congresso para que ela se reelegesse. Não faltará apoio do próximo para que governe. Pode acreditar.

Dilma mandou às favas todos os escrúpulos e saiu às compras. Em Fortaleza, aproveitou uma reunião do Diretório Nacional para garantir que governará com todos os partidos. Não poderia ter sido mais direta: "O governo não é um governo meu. É do PT, dos partidos de nossa aliança". Prometeu que os partidos participarão do governo com cargos e discussão de políticas públicas.

Aos partidos bastam os cargos. Mas se o preço a pagar por eles for a discussão de políticas públicas... Vai longe o tempo em que o PT era um partido ideológico. Hoje, o que o orienta é apenas um projeto de poder. Lula abriu mão de tentar voltar à Presidência este ano por que Dilma se recusou a deixá-la mais cedo. Espera, agora, que ela cumpra direito com o seu dever.

Até aqui pelo menos, Dilma dá a impressão de que concorda em trocar o Dilma 2 pelo Lula 3. Ela engoliu Joaquim sem fazer cara feia. E está disposta a engolir as exigências dos partidos por diretorias que furam poços. Foi Severino Cavalcanti, ex-presidente da Câmara no primeiro governo Lula, que cobrou para o PP, seu partido, uma diretoria da Petrobras que furasse poço.

Diretoria que fura poço movimenta mais dinheiro. O PMDB, por exemplo, quer trocar o Ministério da Previdência pelo dos Transportes. O da Previdência tem um orçamento gigante, mas quase todo comprometido com despesas obrigatórias. O Ministério dos Transportes tem mais dinheiro cuja aplicação depende só da vontade do ministro. É um manjar! Compreende? Pois é...

A oposição de fraque teima em subestimar o PT de macacão estilizado. Pior para ela. Dilma fez com a economia o que achou necessário para se eleger. Deu certo. PIB? Onde o povão se preocupa com o crescimento do PIB se por enquanto emprego e renda vão muito bem, obrigado? Dilma fará com a economia o que for necessário para eleger Lula. Melhor os dois primeiros anos de governo sob dieta severa do que os dois últimos.

O PSDB ficará rouco de repetir que Joaquim é cria dele, e que o PT se apropria descaradamente de sua receita de governo. Quem se interessa por isso? O PT é especialista em deixar o PSDB sem discurso e, com frequência, sem bandeiras. Foi o que fez em 2002 ao eleger Lula. É o que está fazendo outra vez para bater novo recorde de permanência no poder e eleger Lula.

Valdo Cruz - Causa própria

- Folha de S. Paulo

No ano da eleição mais cara do país, a cada dia tomamos ciência de nova conta milionária no exterior recheada de dinheiro surrupiado da Petrobras. Tudo sob comando de diretores mancomunados com partidos políticos.

Em cenário tão escandaloso, nossos deputados e senadores deveriam estar preocupados em dar uma resposta ao eleitorado, dedicando seu precioso tempo a aprovar uma reforma política que reduza esta roubalheira de dinheiro público.

Pois bem, ficamos sabendo que eles estão ocupados é com outros afazeres. Em tempo de corte de gastos, nossos congressistas planejam aumentar seus salários, as verbas para suas bases eleitorais e o dinheiro que financia seus partidos.

Continha salgada, coisa de R$ 1,15 bi por ano, bancada com nosso dinheiro. Eles querem elevar, por exemplo, o salário de R$ 26,7 mil para R$ 33,7 mil. Não fosse o descrédito do mundo político e sua improdutividade, seria até uma soma justa.

Afinal, teoricamente, deveriam representar seus eleitores. Ganhando um salário razoável, estariam livres da tentação de servir a outros senhores. Mas não é o que tem acontecido com todos congressistas --tem parlamentar que não resiste a uma oportunidade tentadora.

É bom lembrar ainda que nossos parlamentares têm direito a médico, dentista, moradia, telefone celular e combustível de graça.

Pior é saber que, nesta farra, querem aumentar o dinheiro que sai dos cofres públicos para bancar a vida dos partidos políticos. Uma total falta de sintonia com o eleitorado.

Além de pensar em seus bolsos, nossos congressistas deveriam é estar perguntando aos eleitores se concordam que seu dinheiro financie campanhas eleitorais e o funcionamento de partidos políticos.

Como a resposta hoje, com certeza, seria negativa, o Congresso prefere legislar, no apagar das luzes de 2014, em causa própria. E deixar de lado o interesse do prezado eleitor.

Fausto Matto Grosso: "Esquerda e direita"

Correio do Estado (MS)

Nas eleições deste ano, principalmente nos debates nas redes sociais, toda e qualquer crítica ao PT e à sua candidata Dilma Rousseff era acusada de “coisa da direita”. Chegaram assim a acusar, com tais, Marina Silva e Aécio Neves e todos os seus partidos de apoio. A primeira questão que se coloca é da validade dos conceitos de esquerda e direita na atualidade. Esse tipo de questão tornou-se mais comum após a crise do socialismo real, quando muitos começaram a acreditar que o capitalismo triunfante seria o ponto final da civilização e a história teria, então, acabado.

Uma das mais consagradas análises a respeito da questão é a do pensador italiano Norberto Bobbio. Para o autor tais termos, que fazem parte do imaginário da sociedade e da identidade dos atores políticos, são absolutamente pertinentes. Ressalta ainda que esses termos são “antitéticos”, ou seja, não se pode ser ao mesmo tempo de esquerda e de direita.

Esquerda é aquele que assume que a ideia de que a igualdade é condição para a liberdade e a direita pressupõe que a liberdade é a condição da igualdade. Bobbio, considerando esse parâmetro reparte o espectro político dos partidos, em quatro posições: extrema esquerda (simultaneamente igualitários e autoritários); centro-esquerda (simultaneamente igualitários e libertários); centro direita (simultaneamente libertários e inigualitários) e extrema-direita (simultaneamente antiliberais e antigualitários).

Ressalta ainda o autor que os termos direita e esquerda podem representar diversos conteúdos conforme o tempos. Assim, na Revolução Francesa a burguesia e a pequena-burguesia, na luta pela igualdade, contra o feudalismo, eram forças de esquerda, que se assentavam no lado esquerdo da Assembleia Nacional, dai a origem das designações esquerda e direita. Quanto ao aspecto histórico, uma boa referência para a análise é a Segunda Internacional ou Internacional Socialista (1889-1916) uma organização dos partidos socialistas e trabalhistas, criada por influência de Friedrich Engels.

Entre seus membros estava o Partido Operário Social-Democrata Russo (POSDR). Cabe informar aos amigos petistas, “radicais, porém sinceros”, que Lenin liderou a Revolução Russa exatemente com o POSDRb, só depois, isolado no contexto pós-Segunda Guerra Mundial, surgiu a Terceira Internacional e o poderoso Partido Comunista da União Soviética.

Trinta e cinco anos depois, em 1951, resurge a Internacional Socialista (IS) que busca a divulgação e implementação do socialismo democrático através da união de partidos políticos social-democratas, socialistas e trabalhistas. A IS é uma das maiores organizações partidárias em atividade. Entre seus mais notórios dirigentes, figurou Willy Brandt (1976-1992) que através da sua “ostpolitik” buscou a aproximação com o bloco comunista. Esse processo resultou no degelo político leste-oeste e teve como consequência o reconhecimento de Gorbatchov, de que, comunistas e sociais-democratas eram partidos do mesmo tronco histórico, portanto partidos irmãos.

Da Internacional Socialista, como membro pleno, participa hoje apenas o PDT. O PT flerta com ela, na condição de observador e o PSDB, ao buscar sua filiação, foi vetado por influencia sectária de Brizola, não por conta da sua doutrina, mas por conta de sua aliança com o PFL.

Resumindo a história, feliz o país que teve, desde a redemocratização, à execção da aventura Collor, apenas candidatos competitivos de centro-esquerda, o PSDB, o PT, o PSB e o PPS. A direita foi escorraçada, pelo processo democrático, só tem figurado, como mero coadjuvante em todas, e em cada uma, das candidaturas presidenciais. O resto é ranço autoritário, estreiteza de projetos hegemonistas de poder, críticas de quem tem, ainda, um pé na visão de partido único da esquerda.

Engenheiro e professor da UFMS

Renato Janine Ribeiro - Os principais ministérios: Cultura

• A cultura é a educação livre e bagunçada

- Valor Econômico

Qualquer um sabe responder quais são os principais ministérios do governo federal - aliás, de qualquer governo no mundo atual. São os da área econômica.
Só que não.

Os ministérios que definem o futuro de um país, que deverão ser decisivos nos próximos anos, e em poucas décadas serão reconhecidos como os principais, são três: Cultura, Atividade Física (como eu chamaria a atual pasta dos Esportes) e Meio Ambiente.

Essa tese parece tão insensata que precisa ser justificada. Começo pela Cultura; nas próximas colunas falarei das outras duas áreas. Mas um artigo de Antonio Callado pode ilustrar esta questão inteira: em abril de 1994, quando Rubens Ricupero deixou o Ministério do Meio Ambiente e da Amazônia Legal para assumir a Fazenda, Callado lamentou o que ele, só ele, chamou de rebaixamento: Ricupero deixava uma pasta que portava o futuro do mundo, para cuidar de algo sem a mesma relevância estratégica. É nesta linha que vamos argumentar.

É claro que a economia é decisiva para um país, um governo. Mas ela geralmente trata de meios, mais que de fins. O próprio nome de "infraestrutura", usado para agrupar algumas de suas pastas, já indica isso: infra, não super. O solo que pisamos, não o espaço entre zero e dois metros de altura em que nos movemos. Temos também ministérios para lidar com nossos déficits sociais, como saúde, direitos humanos, igualdade das mulheres e dos negros. Um dia que não deve demorar muito, a igualdade de direitos estará alcançada. Mas, desde já, há setores da administração que devem apontar fins - não de forma autoritária, vertical, mas fazendo a riqueza criativa da sociedade impactar a administração.

A cultura tem a ver com a educação. As duas pressupõem que o ser humano não nasce pronto, mas é continuamente construído pela descoberta dos segredos do mundo e pela invenção do novo. Na educação como na cultura, não há limite: sempre se pode descobrir ou inventar mais. Nada é tão crucial quanto elas para uma sociedade em mudança rápida, como a nossa.

A educação e a cultura, nas suas várias formas, fazem crescer a liberdade das pessoas. A cultura, já afirmei aqui, é a educação fora de ordem, livre e bagunçada. Para cursos, há currículos. Para a cultura, não. Um curso sobre a abolição da escravatura é educação, o filme "Lincoln" é cultura. Cada vez mais, a educação deverá se culturalizar: um, deixando de seguir currículos rígidos; dois, tornando-se prazerosa; três, criativa.

A Cultura deixará de ser o sobrinho menor da Educação. O próprio caráter imprevisível da ação cultural e a dificuldade de planejá-la fazem dela um dos modelos para o que deve ser a educação numa sociedade criativa. Deve-se conservar na educação um currículo norteador, que leve da infância à idade adulta. Mas para entender o mundo que hoje desponta é bom ter claro o seguinte: a educação não termina no último dia do ensino profissional ou do curso superior - nem nunca.

Alguns diplomas, como o de médico, até poderão ser concedidos com exigência de atualização, a cada tantos anos. Essa atualização será dada por cursos avaliados e fará parte da área da Educação. Mas além das atualizações obrigatórias, previstas em lei, será necessário - e demandado - um crescente leque de cursos abertos, sem definição profissional, que aumentarão incrivelmente a qualidade da vida dos alunos. Já temos iniciativas neste sentido, inclusive uma empresarial (a Casa do Saber), que têm dado certo. Enfatizo: esses cursos serão mais culturais, não estritamente educacionais. Para cada curso de atualização em genoma para profissionais de saúde, haverá dezenas sobre filmes de conflitos entre pais e filhos, de aprendizado com religiões distantes, de arte em videogames, destinados a cidadãos em geral, de qualquer profissão - e a lista não acaba.

A cultura é indutora de liberdade. Romances, filmes e mesmo novelas nos abrem para experiências com as quais, no mundinho em que cada um nasceu e cresce, nunca pudemos sonhar. (É inquietante como estamos voltando a viver em guetos; a própria dificuldade de tantos aceitarem que houve gente que votou diferente deles, na recente eleição, é sinal desse fechamento de cada grupo sobre si - o que pode limitar a capacidade de cada um se enriquecer com a compreensão do outro, do diferente).

Quem cresceu num meio limitado pode descobrir que o sentido de sua vida é a fotografia (como o jovem favelado que é o narrador do filme "Cidade de Deus"): um artista se revela. Ou um menino sensível, alvo de "bullying" na escola, descobre que é homossexual e que não está sozinho no mundo: um ser humano se liberta da ignorância que o prendia. Assim, a cultura aumenta seu próprio contingente - com a descoberta de novos artistas - mas, acima de tudo, amplia a liberdade humana.

Hoje, pela primeira vez na história mundial, cada um de nós pode efetuar a sintonia mais fina possível de sua vocação. Antigamente, cada pessoa vivia num pacote identitário: por exemplo, homem branco abonado, casado, filhos, advogado ou médico ou engenheiro. Tudo isso vinha junto. Hoje, as possibilidades se ampliaram muitíssimo. Há milhares de profissões. No limite, cada um cria a sua. Profissão, emprego, orientação sexual, estado civil, crenças políticas e religiosas, tudo isso se combina como um arco-íris felizmente enlouquecido. Ninguém é mais obrigado a se moldar a um pacote. Mas isso não é fácil, exige uma interminável descoberta de si e, por que não dizer, coragem pessoal. A cultura ajuda aqui, porque nenhum setor da aventura humana nos capacita tanto para, cada um de nós, descobrir sua diversidade única.

Renato Janine Ribeiro é professor titular de ética e filosofia política na Universidade de São Paulo.