segunda-feira, 21 de novembro de 2022

Paulo Fábio Dantas Neto* - Sentido e limites da transição e da transigência

Os olhos da sociedade organizada e dos eleitores, individualmente, precisam estar mais do que nunca postos no que ocorrerá no Congresso Nacional durante as próximas quatro semanas. Ali estará se dando, ou não, a partida para uma nova etapa de nossa história política recente. Há possibilidades de instalação de novos softwares políticos na relação entre Executivo e Legislativo, seu uso na discussão da chamada “PEC da transição” e, a seguir, na revisão do projeto de Lei orçamentária (LOA) para 2023. É expectativa do país, especialmente de quem apostou eleitoralmente na oposição ao atual governo, que  se faça mudanças para preservar nosso hardware constitucional, minado por práticas transgressoras que ultrapassaram em muito os limites da razoabilidade e mesmo da legalidade. São possibilidades reais, assim como são reais os riscos de que mesmo as modestas esperanças saídas, há pouco, das urnas, esbarrem, ou num impasse prolongador de um conflito político estéril que o país pode superar, ou numa embromação conservadora, não das regras, mas da política de baixo nível ético, que ganhou mais asas desde que se fez o casamento entre um presidente autocrático e facções políticas varejistas.

Miguel de Almeida - Sai, Carcará, sai

O Globo

Derrotados acabam vítimas de suas próprias armadilhas

Vivandeiras das estradas do meu Brasil, eu sei o que é a dor. Já senti muita dor. Rompi o tornozelo direito (jogando tênis), outra vez o esquerdo (no futebol; fui razoável ponta) e meu nariz foi quebrado, no recreio, por um grandalhão albino. Mas nunca imaginei que erisipela na perna levasse alguém a calar a boca. Por si só, desde o histórico 30 de outubro, se trata de um fato científico a figurar no decálogo político do baixo clero dos últimos dias, ao lado da isenção de imposto de importação de jet skis (planadores também) e do que é visto (à boca pequena!) como o Capitólio bolsonarista — o ataque cego do navio à ponte Rio-Niterói.

Como poderia dizer Mourão, a erisipela pós-derrota é um case de estudo a ser apresentado no próximo Congresso de Sinapses do Partido Liberal, sob os auspícios de empresários bolsonaristas. Outra comunicação de cunho alquímico talvez seja o pontapé inicial na série sobre a vida na terra (e na Lua) de Damares Alves. Protagonizada por Regina Duarte, com texto anônimo do sertanejo Sérgio Reis, o docudrama se passa em meio ao intenso brainstorm da criação de palavras de ordem dos golpistas estacionados à frente dos quartéis.

Fernando Gabeira - O estranho lugar da Copa

O Globo

Do ponto de vista da tradição do esporte, o Catar é pouco importante. Sua seleção está fora da lista das cem melhores do mundo

A Copa do Mundo começou ontem. Já estamos pintando ruas, discutindo a convocação de Daniel Alves, palpitando sobre a escalação, debatendo o potencial dos rivais.

De um modo geral, a resposta é não. O jornal alemão Bild cunhou a a manchete “Catástrofe” para definir a escolha da Fifa.

Do ponto de vista da tradição do esporte, o Catar é pouco importante. Sua seleção está fora da lista das cem melhores do mundo.

O clima do país é bastante duro para a prática do esporte. No verão, seria impraticável, sobretudo para seleções que vêm dos países frios: 50 graus. Foi preciso adiar para o inverno para conseguir uma temperatura menos cruel para os atletas.

Não será uma Copa barata. Os investimentos devem ser superiores a US$ 220 bilhões, mais que R$ 1 trilhão, 20 vezes acima dos gastos da Copa de 2018 na Rússia.

Bruno Carazza* - Lula na mão de Lira

Valor Econômico

PEC da Transição reforça poder do líder do Centrão

Lula é o personagem central da política brasileira nas últimas quatro décadas. Desde 1989, esteve presente em seis eleições presidenciais (tendo vencido três) e foi muito influente nas outras três, como “padrinho” de Dilma Rousseff em 2010 e 2014 e sendo substituído por Fernando Haddad em 2018.

O carisma de Lula junto a parcela importante do eleitorado e sua capacidade de articulação, atraindo apoios que vão além do PT e da esquerda, levaram o cientista político André Singer a cunhar a expressão “lulismo”, fenômeno que seria mais forte até do que o petismo.

Todavia, o poder de Lula, expresso mais uma vez na vitória (ainda que apertada) da última eleição e nos acenos que o ex e futuro presidente tem recebido de lideranças de todo o espectro político, mascara graves erros de estratégia cometidos pelo ícone petista nas últimas décadas.

Alex Ribeiro - Fiscal está no radar do Copom de dezembro

Valor Econômico

Promessa é agir se projeção de inflação subir ou risco piorar

O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, disse em um evento na sexta-feira que a política fiscal do futuro governo Lula já está no radar da reunião de dezembro do Comitê de Política Monetária (Copom). O que poderia levar à retomada dos ciclo de alta de juros?

Conforme o próprio Campos Neto explicou, o aperto adicional aconteceria se, diante dos passos adotados pelo novo presidente da República, o Copom entender que a convergência da inflação para a meta não vai acontecer da forma planejada. “Então, nós vamos reagir”, advertiu.

Ele também ressaltou que é cedo para uma conclusão sobre o assunto porque não se sabe o que o Congresso vai aprovar ou modificar da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que estoura o teto de gastos em quase R$ 200 bilhões.

O cenário de convergência da inflação para a meta, em tese, pode ser ameaçado de duas formas pela política fiscal de Lula. Primeiro se, de forma mais direta, levar a um aumento das projeções de inflação do Banco Central - que já vinham sendo colocadas em questão pelos especialistas, porque parecem muito otimistas, quando comparadas com a previsão do mercado. Segundo, se o fiscal voltar a pesar mais forte no chamando balanço de riscos, ou seja, se fizer o Copom achar que as chances de a inflação superar os valores projetados são maiores do que as de ficar abaixo deles.

Celso Rocha de Barros - Governo Lula vai ganhando cara

Folha de S. Paulo

Equipe de transição começa debate propositivo com bons quadros e desafios após Bolsonaro

Aos poucos, os contornos do terceiro governo Lula vão ficando mais claros. O clima de frente ampla do segundo turno parece ter reunido gente bem boa em torno do novo presidente. Tudo ainda pode dar errado, mas os sinais são bons.

Na COP27, Lula pode ter feito o melhor discurso de sua vida, o que mais impacto pode ter na vida das gerações futuras. Tudo ali está certo. Fazer aquilo não vai ser fácil, mas a equipe de transição de meio ambiente se destacaria em qualquer país do mundo.

A equipe de transição para a educação também é muito boa. Já passou da hora de alguém generalizar para o Brasil a experiência de sucesso da educação básica cearense, e a escolha dos nomes até agora dá a impressão de que o plano é esse.

Isso já poderia ter acontecido: em 2015, Dilma Rousseff nomeou Cid Gomes, ex-prefeito de Sobral, para o MEC. Eduardo Cunha derrubou os dois.

Marcus André Melo* - (In) felicidade Política

Folha de S. Paulo

A formação de coalizões governativas sem densidade programática gera cinismo cívico

Votar no candidato perdedor diminui a felicidade das pessoas. Essa é a conclusão do estudo Presidential Elections, Divided Politics and Happiness in the US (eleições presidenciais, política dividida e felicidade nos EUA), de 2019, de Sergio Pinto e colegas. O efeito é brutal. Nas eleições presidenciais de 2016, nos EUA, na qual Hillary Clinton foi derrotada, equivalia a ficar desempregado(a).

A felicidade é medida por métricas que capturam o nível subjetivo de satisfação com a vida e por atitudes que lhes são correlatas. A fonte é a pesquisa diária do Gallup com 11 mil eleitores, de 2012 a 2016.

Felipe Moura Brasil - 2026 já começou

O Estado de S. Paulo

Se houver fibra para ocupar o lugar de Bolsonaro, campo derrotado pode formar novas lideranças

As declarações de Romeu Zema de que Jair Bolsonaro perdeu para si mesmo e de Ratinho Jr. de que uma centro-direita pode ocupar esse espaço, além da resistência de Tarcísio de Freitas a nomear bolsonaristas, condizem com o comentário que fiz três semanas antes da eleição: “Até 2026, haverá tempo para formação de novas lideranças no campo perdedor, se houver fibra para ocupar o lugar do populista derrotado. A derrota vai abrir a melhor oportunidade de saneamento. A vitória vai legitimar a pilantragem”.

A promiscuidade entre autoridades públicas e empresários foi revivida por Lula já na transição, ao voar para o Egito no jatinho do fundador da Qualicorp e dono da QSaúde, José Seripieri Jr., e almoçar em Portugal com ele, Fernando Haddad e Gilmar Mendes, um dos responsáveis pela impunidade do presidente eleito.

Antes, o ministro do STF havia suspendido a tramitação de um inquérito que apura repasses da Odebrecht à campanha de 2010 de seu amigo Aécio Neves, bem como a operação da Polícia Federal que apurava esquema de corrupção, fraude e lavagem de dinheiro na Fundação Getúlio Vargas, defendida por seu amigo Rodrigo Mudrovitsch.

Denis Lerrer Rosenfield* - O velho PT

O Estado de S. Paulo

Discursos demagógicos de nada adiantam. O período eleitoral foi encerrado e começa o de governar, não admitindo teatros e tergiversações

O maior eleitor de Lula foi Jair Bolsonaro. O novo presidente não foi eleito por suas ideias – aliás, inexistentes –, mas por reação ao atual presidente e ao bolsonarismo em geral. Suas propostas se reduziram aos velhos chavões petistas e a uma curiosa seleção de suas administrações passadas, dosadas com cuidado de modo que o governo Dilma desaparecesse dessa sua apresentação. Ele seria, constrói-se a lenda, a “solução” por sua mera presença. Parafraseando Lenin, não se colocou uma questão central: O que fazer?

Luís Eduardo Assis* - O grande chilique e a falsa escolha

O Estado de S. Paulo

Como o próximo governo quer crescimento e preços sob controle, convém moderar a incontinência verbal

O Brasil é mesmo curioso. O maior faniquito no mercado financeiro com a eleição presidencial de 2022 se deu vários dias após a proclamação do vencedor. Foi quando o presidente eleito questionou “a tal da estabilidade fiscal”, em discurso a parlamentares feito em 10 de novembro.

O abalo sísmico foi grande. E continua sendo com as notícias da tramitação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Transição, que diz muito pouco sobre para onde vamos transitar.

O mercado é assim mesmo. Tratá-lo como se fosse uma instância que emite opiniões políticas é grande equívoco. Ele não tem ideologia, mas cultiva um punhado de convicções, em geral corruptelas de conceitos mais complexos de algum “economista defunto”, como dizia John Maynard Keynes.

O mercado não julga nem pune, apenas faz preço. Tudo o que se discute no mercado deve ser filtrado, mastigado e resumido para uma decisão que é essencialmente binária: comprar ou vender. Não há espaço para nuances, qualificações ou raciocínios sofisticados. O ambiente é o de um jogo de espelhos.

Ana Cristina Rosa - Tornar-se negro é libertador

Folha de S. Paulo

Neste mês da consciência negra, convido todos à reflexão sobre o que é ser negro no Brasil contemporâneo

Sempre me surpreendo quando uma pessoa negra afirma que nunca sofreu preconceito ou discriminação racial no Brasil. Não foi diferente quando soube do relato de uma mulher preta —a primeira a ocupar um alto posto numa instituição hierarquizada e historicamente comandada por homens brancos— que disse nunca ter enfrentado barreiras de raça ou de gênero para chegar aonde está.

Gostaria de poder acreditar. Mas, por mais que me esforce para respeitar a perspectiva do outro, esse me parece um feito impossível.

Especialmente diante das fartas e escandalosas evidências de racismo estruturalinstitucional sistêmico cada vez mais corriqueiras no nosso cotidiano.

José Vicente* - O combate ao racismo no ambiente corporativo

O Estado de S. Paulo

Empresas e presidentes podem moldar e garantir a equidade racial e ajudar a consolidar um ambiente antirracista

A desigualdade racial no mercado de trabalho e no ambiente corporativo brasileiro tem se constituído num daqueles extraordinários desafios que historicamente limitam o alcance da isonomia entre negros e brancos e impedem a realização da igualdade de oportunidades, sem distinção de cor ou de raça, como preconizado nos mais diversos documentos e tratados internacionais, na Constituição cidadã da nossa República e nos fundamentos que estruturam a modernidade. Sob todos os aspectos, a desigualdade racial e sua causa próxima, o racismo sistêmico que embala as relações sociais e laborais, continuam produzindo distinção e prejuízos incomensuráveis na construção e no alcance de um ambiente social em que tão somente as competências, habilidades e talentos devessem ser definitivamente os grandes medidores e condicionantes do alcance do sucesso e da realização pessoal e profissional dos indivíduos.

Irapuã Santana - Somos diversos

O Globo

Dizer que ‘tá no sangue’ ou que negros são naturalmente atléticos e vocacionados para as artes é racismo

O Brasil conta com mais ou menos 118 milhões de pessoas negras. Isso quer dizer, na prática, que existe um número infinito de estilos de vida e modos de enxergar o mundo, o que deveria gerar algumas reflexões e conclusões.

A primeira delas é que recorrer a estereótipos é também reforçar uma faceta do racismo, que acaba coletivizando algumas características e elimina a ideia de indivíduo. Em outras palavras, dizer que “tá no sangue” ou que negros devem saber jogar bola e sambar é racismo. Afirmar que negros são naturalmente atléticos e vocacionados para as artes, idem. Na verdade, quando se toma esse tipo de entendimento como verdade, vemos a base do trabalho braçal (escravo) para negros e trabalho intelectual para brancos, dividindo a sociedade entre uma comunidade domesticada, útil ao entretenimento e à servidão, e uma outra que gera luz, desenvolvimento e progresso para todos.

Hebe de Bonafini, histórica líder das Mães da Praça de Maio, morre aos 93 anos na Argentina

Associação foi criada na última ditadura militar do país para descobrir o paradeiro de filhos e outras pessoas desaparecidas

Por O Globo, com agências internacionais

BUENOS AIRES - Hebe de Bonafini, a histórica presidente da associação argentina Mães da Praça de Maio, criada durante a última ditadura (1976-1983) no país para descobrir o paradeiro de seus filhos e outras pessoas presas pelo regime militar e depois desaparecidas, faleceu neste domingo aos 93 anos, confirmou a vice-presidente Cristina Kirchner. O governo decretou três dias de luto nacional.

"Queridíssima Hebe, Mãe da Praça de Maio, símbolo mundial da luta pelos Direitos Humanos, orgulho da Argentina. Deus te chamou no dia da Soberania Nacional... não deve ser coincidência. Simplesmente obrigado e até sempre", escreveu Cristina no Twitter.

Bonafini morreu na manhã deste domingo em um hospital da cidade de La Plata, na província de Buenos Aires, onde estava internada desde o dia 12. No mês passado, ela ficou internada três dias para exames, mas teve alta.

Através de um comunicado divulgado nas redes sociais, o governo argentino anunciou que “decreta três dias de luto nacional e presta homenagem a Hebe, à sua memória e à sua luta, que estará sempre presente como guia nos momentos difíceis”. A Secretaria de Direitos Humanos também homenageou a militante de direitos humanos em mensagem no Twitter: "Hebe compartilhou junto com as Mães um destino que as uniu na luta contra a impunidade dos crimes do terrorismo de Estado, resistindo frente ao silêncio e ao esquecimento."

O que a mídia pensa - Editoriais / Opiniões

Pressão de estados por recursos deverá agravar crise fiscal

O Globo

Prejudicados com o corte eleitoreiro do ICMS sob Bolsonaro, governadores eleitos tentarão ir à forra com Lula

Quando assumir, o presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva receberá governadores em romaria de pires na mão. Além dos “investimentos sociais” que levam o novo governo a tentar excluir despesas de quase R$ 200 bilhões do teto de gastos, além das promessas de reajuste real do salário mínimo, correção na tabela do Imposto de Renda e tantas outras, haverá pressão por mais despesas estaduais. Os governadores foram vítimas da sanha eleitoreira do presidente Jair Bolsonaro, que cortou para 17% o ICMS cobrado sobre combustíveis, energia elétrica, comunicações e transportes. Com a receita combalida e as finanças em andrajos, eles tentarão ir à forra diante do novo governo.

Poesia | Antonio Machado Ruiz - Caminhante não há caminho

 

Música | Va pensiero Nabucco G Verdi version Trio Amadeus

 "Va, pensiero", também conhecido como o "Coro dos Escravos Hebreus", é um coro do terceiro ato da ópera Nabucco (1842) de Giuseppe Verdi, com libreto de Temistocle Solera, inspirado no Salmo 137. 


Considerado a obra de arte "judia" de Verdi, o coro relembra a história dos exilados judeus na Babilônia, após a perda do Primeiro Templo em Jerusalém. 

A ópera, com seu poderoso refrão, notabilizou G. Verdi como um dos maiores compositores italianos do século XIX. O incipit diz "Va, pensiero, sull'ali dorate", que significa "Vá, pensamento, sobre as asas dourada