O Globo
As pesquisas de intenção de voto mostram
que parte do eleitorado de Jair Bolsonaro mudou de ideia e não pretende repetir
a escolha em 2022. Sempre que um bolsonarista arrependido justifica a mudança
com o argumento de que não era possível prever, em 2018, como seria o governo,
a oposição de esquerda reage com indignação. São imediatamente lembrados
episódios em que o deputado Jair Bolsonaro já defendia teses incivilizadas ou
preconceituosas e expunha seu desapreço pelas instituições e pela democracia.
Várias das piores facetas do governo eram
previsíveis — e foram mesmo previstas por quem já se opunha ao presidente. Não
se pode alegar surpresa com o incentivo ao desmatamento da Amazônia ou com o
isolacionismo na política externa. Os ataques antidemocráticos e o desmonte do
aparelho estatal em várias áreas também não podem ser tidos como inesperados.
Apesar da gravidade, não são esses traços autoritários que fazem o presidente entrar no ano eleitoral como uma espécie de “favorito à derrota”. Bolsonaro já estimulava e fazia vista grossa às queimadas, já carbonizava o filme da diplomacia brasileira e já ameaçava romper com o sistema democrático quando ainda estava fortemente competitivo para se reeleger. No fim de 2020, mesmo um ano depois de encampar o negacionismo e combater o isolamento que previne a Covid-19, seus índices de aprovação eram satisfatórios. Naquele dezembro, o Datafolha mostrava que 37% dos brasileiros consideravam o governo “ótimo ou bom”, ante 32% de “ruim ou péssimo”.