quinta-feira, 10 de julho de 2014

Opinião do dia; Luiz Werneck Vianna

O sentimento de mudança agora em relação à seleção vai se espalhar para outras dimensões e poderá ser um impulso novo para aquele desejo de mudança na população, que apareceu forte nas últimas pesquisas.

Luiz Werneck Vianna, sociólogo, professor-pesquisador da PUC-Rio. Especialistas veem pouco impacto nas eleições, O Globo, 9 de julho de 2014.

Dilma tenta se descolar do fracasso da seleção brasileira na Copa

• Planalto procura estratégia para separar organização da Copa do fiasco em campo

• Após se associar à seleção brasileira com ação em rede social e foto imitando Neymar um dia antes da fragorosa derrota no Mundial, Dilma tenta agora emplacar clima de ‘volta por cima’

Vera Rosa e Tânia Monteiro - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Um dia após a humilhante derrota do Brasil para a Alemanha, a presidente Dilma Rousseff ajustou o discurso para neutralizar o “efeito Copa” sobre a campanha da reeleição. Com medo de que o mau humor com a seleção respingue na campanha, a presidente e sua equipe tentam separar o “joio do trigo”, concentrando as energias na defesa da “administração” do Mundial.

A ordem no Palácio do Planalto é “virar a página” do que Dilma definiu como “pesadelo” e baixar o tom do mote “Copa das Copas”, com o qual o governo pretendia bater o bumbo na campanha. No lugar do ufanismo, entra agora a retórica da “volta por cima” e da capacidade de superação do brasileiro nas adversidades, além da organização “impecável” do evento.

A equipe da reeleição dá como certo que Dilma será hostilizada na final da Copa, no domingo, quando a presidente entregará a taça ao campeão, no Maracanã. Ministros e coordenadores da campanha petista acreditam que o “efeito Copa” não dure até a eleição, em outubro. O temor, agora, é que o fim antecipado da catarse coletiva alimente novos protestos, que podem ser disseminados e atingir “tudo o que está aí”, mirando em Dilma e na alta dos preços - e consequentemente dos índices de inflação - por causa da Copa.

“Quem tentar transferir para o campo da política eleitoral uma derrota no futebol dará um tiro no pé”, disse o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, que assistiu à derrota do Brasil em Belo Horizonte. “A politização é simplesmente ridícula”. Para Cardozo, a derrota do Brasil “não muda em nada” o caráter da Copa, nem da segurança e da organização do evento, “que estão sendo aplaudidos pelo mundo inteiro”.

O chefe da Secretaria-Geral da Presidência, Gilberto Carvalho, que na terça-feira admitiu a preocupação do governo com a possibilidade de volta das ações violentas dos black blocs, ontem disse que “o desastre com a seleção brasileira não é o desastre com a Copa”. “Precisamos cuidar para que tudo continue dando certo.”

Na rede. A coordenação da campanha de Dilma identificou nas redes sociais “perfis falsos” de apoiadores dos candidatos Aécio Neves (PSDB) e Eduardo Campos (PSB) associando a presidente ao vexame do Brasil diante da Alemanha, para desconstruir a imagem de “gerente” que a petista tenta apresentar. Vinte e quatro horas antes do fracasso da seleção, Dilma deu estocadas nos adversários e disse, em conversa com internautas, que a Copa era uma “belezura”, para “azar dos urubus”.

“Do ponto de vista de organização, a Copa é um sucesso e isso é inegável”, afirmou o ministro de Relações Institucionais, Ricardo Berzoini. “O Brasil sofreu uma derrota absolutamente inesperada, que entristeceu todos nós, e quem quiser fazer proselitismo político com isso terá de enfrentar o julgamento do eleitor.”

Berzoini se reuniu nesta quarta com o presidente do PT, Rui Falcão, coordenador da campanha de Dilma. Mais tarde, Falcão conversou com o jornalista Franklin Martins, responsável pelo monitoramento das redes sociais. O governo e o comitê da reeleição estão atônitos com o fiasco da seleção e avaliam qual a melhor estratégia a seguir para blindar a presidente.

Uma das estratégias será apostar na agenda “positiva” dos próximos dias. Além de almoçar com chefes de Estado que estarão no Rio, no domingo, para a final da Copa, Dilma vai receber 21 presidentes na próxima semana. O comitê da reeleição quer aproveitar esses eventos para mostrar a presidente como “estadista”.

Palpite errado. Em conversa com o fundador da Amil Assistência Medica Internacional, Edson Bueno, ontem à tarde, Dilma não escondeu o abatimento com a derrota da seleção. “Mas ela foi para a guerra e é uma pessoa muito forte”, disse Bueno. “Ela falou para mim: ‘Temos de ir em frente, temos de motivar o País’.”

No encontro, Dilma achava que o Brasil poderia enfrentar a Argentina, na briga pelo terceiro lugar, o que não se concretizou - horas depois, a equipe de Messi se classificou para a final. “Nós discutimos o seguinte: se for contra a Argentina, o negócio é ganhar de uns 4 a 0, porque a gente pelo menos fica um pouco melhor”, afirmou Bueno.

Tucanos avaliam que derrota na Copa anula discurso de petista

• Comitê de Aécio acredita que Dilma não poderá mais explorar Mundial; ideia é que sucesso extracampo seja atribuído ao povo, não ao governo

Débora Bergamasco - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - A campanha do candidato do PSDB à Presidência, Aécio Neves, avalia que a derrota acachapante do Brasil deve anular as tentativas do governo Dilma Rousseff de explorar politicamente a realização do evento em solo nacional. O comitê tucano vai apenas esperar o "luto" em razão do fiasco em campo passar para retomar as críticas à política econômica.

A ideia agora é que, ao falar do campeonato, Aécio credite o sucesso extracampo ao povo brasileiro, e não ao governo. O tucano deve insistir que o legado da Copa poderia ter sido muito melhor se o governo tivesse entregado as dezenas de obras previstas. Os estrategistas tucanos, porém, não acreditam que as discussões sobre o tema sobrevivam até outubro, mês das eleições.

Cuidado. Enquanto não passar a euforia, os agentes políticos do PSDB estarão pisando em ovos nos próximos dias para não deixar escapar frases infelizes que possam ferir o fragilizado torcedor e serem exploradas nos programas eleitorais de TV pela situação, que já acusa seus opositores de serem "pessimistas".

Segundo assessores, Aécio tem dito nas reuniões internas que o torcedor não pode sentir "cheiro de oportunismo político" ou o tiro sai pela culatra.

Aécio foi pelo menos duas vezes a estádios durante esta Copa. A primeira no Maracanã, no Rio de Janeiro, onde viu a Alemanha se classificar para a semifinal contra a França.

O candidato tucano à Presidência não divulgou a agenda à imprensa. Horas depois do jogo, publicou em uma rede social foto com a filha Gabriela, que o acompanhou ao lado do empresário Alexandre Accioly.

Na terça-feira, Aécio foi ao Mineirão, em Minas, sua terra natal. Também não divulgou a agenda. Alguns assessores chegaram até a negar que ele estivesse no estádio. No fim, confirmaram que o tucano esteve na arquibancada ao lado de outros políticos mineiros, até porque o filho de um aliado publicou foto com Aécio no Mineirão em uma rede social.

Críticas. O candidato a vice-presidente na chapa de Aécio, o senador Aloysio Nunes (PSDB-SP), afirmou que Dilma "caiu no ridículo" ao tentar explorar o futebol desde o início dos jogos como se a gestão dela tivesse algo a ver com o que se passa no campo. Na véspera do fiasco do jogo contra a Alemanha, a presidente chegou a divulgar uma foto imitando gestos de Neymar. "A Dilma acabou caindo no ridículo fazendo aquele gesto do 'tóis' porque tentou explorar o sofrimento do Neymar (quando ele ficou de fora dos jogos ao quebrar uma vértebra) e também porque tentou pegar carona na esperança do povo brasileiro." Aloysio aposta que, diante da derrota da seleção anfitriã, "agora ela vai deixar morrer o assunto Copa, você vai ver", apostou. "Agora as pessoas vão voltar para suas vidas normalmente, para os seus problemas e voltaremos a discutir sobre inflação, obras inacabadas e novos projetos para o País."

Existe uma corrente dentro da equipe da campanha de Aécio defendendo deixar o assunto Copa morrer o mais rápido possível. Esse grupo diz que a agenda da Copa é de Dilma e só interessa a ela. Há outra corrente que defende uma posição mais agressiva de Aécio. Sem tratar do que aconteceu no gramado, pois isso todos concordam internamente que é um tema pertencente ao torcedor e não aos políticos, o candidato deveria aproveitar para criticar até o que deu certo na Copa. É preciso, segundo esse grupo, criticar a oportunidade perdida para que mais obras de infraestrutura fossem concretizadas no País. Nesse aspecto, dizem, não há sucesso na Copa, e sim fracasso. / Colaborou Pedro Venceslau

Dilma ensaia discurso para combater frustração na Copa

• 'Reagir à derrota é a marca de uma grande nação', diz presidente à rede CNN

• Para o governo, mau humor com a derrota da seleção será dividido com todos os políticos e não recairá só sobre ela

Tai Nalon, Valdo Cruz – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - Um dia depois da derrota histórica da seleção brasileira para a alemã, a presidente Dilma Rousseff disse compartilhar da dor dos torcedores, mas tentou dissipar o pessimismo resultante da partida.

Em entrevista à rede norte-americana CNN no Palácio do Planalto, nesta quarta-feira (9), Dilma afirmou que "reagir à derrota é a marca de uma grande nação", numa linha traçada pelo governo para se contrapor ao clima negativo gerado pelo desempenho brasileiro.

A presidente disse que "nem em seu pior pesadelo" imaginava que veria uma derrota como a sofrida pelo Brasil na última terça-feira, mas ponderou: "Sei que somos um país que tem uma característica bastante peculiar: nós crescemos na adversidade".

A conversa faz parte de uma ofensiva traçada antes da derrota da seleção, que amargou um placar de 7 a 1 contra os alemães no Mineirão, em Belo Horizonte.

Depois de iniciada a Copa e do aumento da aprovação popular ao torneio, a presidente passou a falar mais sobre o evento e a criticar os que previam um fracasso. Agora, Dilma e os estrategistas de sua campanha tentam avaliar o impacto, na campanha eleitoral, do vexame em campo. E discutem como reagir a ele.

Parte da entrevista exclusiva, concedida à correspondente-chefe da CNN para assuntos internacionais, Christiane Amanpour, foi ao ar nesta quarta à tarde. A outra parte, dedicada a assuntos internacionais e políticos, será transmitida nesta quinta, às 15h, na CNN International.

"As pessoas devem entender que, apesar de todas as adversidades, o fato é que o Brasil organizou e sediou uma Copa considerada por mim uma das melhores Copas. E isso é, sobretudo, por conta da habilidade do povo brasileiro de ser hospitaleiro", disse Dilma.

O governo sabe que a derrota humilhante da seleção brasileira criará um mau humor no país, mas avalia que ele não recairá somente sobre a presidente, mas será dividido com todos os políticos.

Maracanã
Para minimizar esse efeito negativo, Dilma e seus auxiliares buscaram, logo depois da derrota, fazer manifestações de apoio à equipe brasileira. "Não podemos ficar crucificando nossos jogadores", diz um assessor presidencial.

Além disso, a estratégia palaciana será seguir mostrando que a Copa, na visão do governo, foi, sim, um sucesso. O fracasso aventado pela oposição na logística da Copa não aconteceu. O evento ganhou apoio da população e dos torcedores estrangeiros.

A presidente já vinha insistindo nessa linha ao longo das últimas semanas, quando afirmou que "os pessimistas perderam".

Na última segunda, amparada pelo seu crescimento no Datafolha (em junho, ela foi de 34% para 38% nas intenções de voto) e na reprovação de eleitores às vaias dirigidas a ela no Itaquerão durante a abertura da Copa, Dilma anunciou que irá à final, no Maracanã, entregar a taça.

O plano, segundo assessores, está mantido, apesar do clima de decepção que tomou conta do país com a derrota de terça-feira.

Impacto da derrota nas urnas deve ser nulo

César Felício e Renata Batista

BRASÍLIA e RIO - A população brasileira se envolveu menos do que seria de se esperar na realização de uma Copa no próprio país e este é um dos fatores que pode levar a desclassificação para a Alemanha a não ter efeito político e eleitoral, segundo publicitários e cientistas políticos envolvidos com a eleição. "Ninguém vai acender velas no Maracanã", comentou André Torreta, que trabalha em campanhas em Sergipe e no Rio Grande do Sul. É uma alusão às romarias que alguns torcedores fizeram ao palco da derrota brasileira na Copa de 1950, mesmo tempos depois da vitória da seleção uruguaia.

"Não houve uma catarse porque, ao contrário da realidade de 64 anos atrás, o Brasil já encontrou diversas maneiras de autoafirmar-se, inclusive no futebol. Nossa relação com o torneio se aproximou da existente em outros países que sediaram a Copa nos últimos anos, como Itália, Alemanha e França", disse o sócio do Instituto Vox Populi, Marcos Coimbra. Para Torreta, o clima de descrédito em relação às obras de infraestrutura para receber a Copa, crescente entre as manifestações de junho do ano passado e o primeiro semestre deste ano, contribuiu para frear o entusiasmo popular.

Para Alberto Carlos Almeida, do Instituto Análise, a goleada de 7 a 1 de anteontem tende a não ter consequências até mesmo dentro dos gramados. "Não existe divisor de águas. E nem aprendizado. Em termos históricos, considerando o retrospecto brasileiro, isso não é nada. Haverá muita discussão e a repetição dos mesmos erros", comentou o cientista político.

Segundo Almeida, a ausência de problemas de impacto na organização da competição impede que a oposição consiga algum dividendo. "Foi gerado um clima de que haveria discursos, houve uma torcida pelo fracasso. Como não houve problemas relevantes em relação à infraestrutura, a politização da Copa se deteve. O impacto na conjuntura eleitoral foi anulado", disse.

Tanto Almeida quanto Coimbra e Torreta afirmaram que a correlação entre o desempenho esportivo e o resultado eleitoral tende a ser nulo. "A emoção não sobrevive a uma distância de 90 dias do pleito. Outubro será um momento completamente diferente", disse Coimbra. "Hoje este é o assunto de todas as rodas, mas dizer que há um clima de luto é exagero. Como era exagero dizer que havia uma euforia, também é demasiado falar em comoção", comentou Torreta.

Segundo um publicitário próximo ao governo federal, a presidente Dilma Rousseff chegou a capitalizar a realização do torneio em função de um episódio inesperado: o insulto que recebeu de parte da plateia na abertura da Copa do Mundo, em São Paulo. De acordo com este especialista, Dilma foi bem sucedida em vitimizar-se ao ser alvo de palavrões. Mas a presidente teria se exposto de maneira excessiva nos últimos dias, ao demonstrar solidariedade com o atacante Neymar, que ficou fora do último jogo.

Com este movimento, a presidente teria demonstrado interesse em fazer uso político do evento, o que é rejeitado pela população, conforme teria ficado evidente em pesquisas qualitativas conduzidas pelo núcleo próximo ao Planalto. Com a derrota para a Alemanha, o efeito inicial benéfico provocado pela solidariedade à presidente na abertura do evento tende a se perder.

Na contramão da maioria de seus colegas, o sociólogo Fabio Gomes, da empresa de pesquisa Informa, do Rio de Janeiro, acredita que a presidente Dilma Rousseff poderá arcar com prejuízo eleitoral em função do impacto do placar de anteontem. Uma vitória brasileira na Copa do Mundo não teria o mesmo efeito. "O futebol é muito usado como mecanismo didático. A derrota pode trazer algumas reflexões sobre como as coisas no Brasil precisam de mudanças, tema salientado nas manifestações de junho de 2013", diz. Para Gomes, "o problema foi a dimensão que a partida ganhou com os sete gols", completa.

No Congresso Nacional, pouco frequentado na tarde de ontem, as avaliações foram divergentes: o líder do governista PDT na Câmara, Felix Mendonça Júnior (BA), disse que a goleada pode ter impacto negativo na candidatura da presidente Dilma Rousseff. "O humor das pessoas sempre afeta a política, e hoje todo mundo acordou de mau humor", disse. Já o líder do oposicionista PSDB no Senado, Alvaro Dias (PR), foi na direção oposta: "Não creio que o povo brasileiro misture as bolas. Futebol é futebol. A vida de todos nós tem outros componentes", afirmou. "O povo brasileiro sabe que, acabou a Copa, vai pisar o chão da realidade do país e ter que viver seus problemas". (Colaboraram Raphael di Cunto e Vandson Lima)

Para Alckmin, goleada não influencia disputa

André Guilherme Vieira

SÃO PAULO - O governador de São Paulo e candidato à reeleição, Geraldo Alckmin (PSDB), afirmou ontem que a derrota vexatória sofrida na terça-feira pela seleção brasileira, abatida por 7 a 1 pela Alemanha no Mineirão, em Belo Horizonte, não influenciará a disputa eleitoral: "Não tem nada a ver com a eleição, nada, nada, nada. Claro que está todo mundo triste, mas o povo separa muito as coisas", disse ao deixar o velório do ex-deputado federal Plínio de Arruda Sampaio, realizado durante a manhã na paróquia São Domingos, no bairro das Perdizes, em São Paulo.

Perguntado sobre a possibilidade de a goleada alemã resgatar o clima de animosidade e pessimismo manifestado antes da Copa do Mundo, Alckmin disse que não acha que isso vá acontecer: "Quando é que o Brasil ganhou a última Copa? Em 2002. E o presidente quem era? O Fernando Henrique. E perdeu a eleição. Então o Brasil ganhou a Copa e [o PSDB] perdeu a eleição", afirmou. "O povo separa muito bem a questão política, eleitoral, da questão futebolística. Claro que você tem um momento de ressaca, de tristeza. Mas isso passa. Eleição é daqui a três meses", avaliou o governador paulista.

Já o candidato do PSDB ao Senado por São Paulo, José Serra, afirmou que é preciso aguardar para saber se a humilhante goleada sofrida pelo Brasil contra a Alemanha terá desdobramentos no campo político: "Sem dúvida [há um clima de luto]. Agora, qual é a tradução política disso? Não sei. Vamos ver nos próximos dias e semanas. É difícil prever", disse. "Você pode fazer hipóteses. Mas eu não vou ficar aqui fazendo hipóteses, porque fatalmente serão confundidas com desejos, né?", justificou.

Questionado se caberia uma comparação entre o criticado meio de campo da seleção brasileira e a política econômica do governo Dilma Rousseff, Serra opinou que a analogia não pode ser feita: "Olha, não dá, porque nem tem meio campo. E eu não posso dizer que não tem uma política econômica. Nós jogamos um campeonato mundial de futebol sem ter meio de campo. Que é um fenômeno incrível", considerou. "Agora, a Alemanha está muito bem, né? Quando você perde uma luta não é só por suas falhas. Tem também de levar em conta o adversário. Mas a nossa fraqueza foi exagerada", opinou o candidato tucano ao Senado, logo após deixar o velório de Plínio.

Para Serra, que já criticou duramente Luiz Felipe Scolari quando este dirigia o Palmeiras, não se pode culpar Felipão pela maior goleada sofrida pela seleção brasileira nos 100 anos de sua história: "É uma coisa que não deu certo. Garanto que não é pelas falhas do Felipão que perdemos de 7 a 1", ponderou.

O vexame da seleção do Brasil na Copa afeta a eleição presidencial?

- O Estado de S. Paulo

Sim
Como sociólogo, sei que tudo está relacionado com tudo - tudo o que ocorre na vida social, mental, na paisagem simbólica, está interligado - e não aceito o dogma estabelecido por alguns marqueteiros e políticos segundo o qual essas coisas não se misturam. Um ganhou, outro perdeu, há sempre muitas combinações possíveis. E o que aconteceu ontem foi um suicídio do time brasileiro, que simplesmente não jogou, e o impacto disso existirá.

O que acho que vai ser discutido na sociedade é, em suma, tirar o futebol da ilha da fantasia. Esse processo começou antes da Copa: vai se gastar dinheiro em estádio ou em hospital? Faremos na educação, na segurança, o mesmo esforço que fazemos na seleção? Cobraremos esses 7 a 1 que nos impôs a Alemanha na vida política, cobraremos dos políticos com a mesma veemência? Parece-me inevitável que as perguntas serão mais incisivas - mas é claro que temos de colocar isso nas nossas pautas. Com a pior derrota da história, o futebol coloca em foco, novamente, os outros temas. O País tem tudo pra fazer esse deslizamento - das exigências do futebol para o jogo real. Isso é crucial pro Brasil poder crescer.

A copa verdadeira, no mundo, é a copa da democracia, a da igualdade, da eficiência dos serviços, que nós não temos. Então esses 7 a 1, nesse sentido, são superbenéficos. Claro que essas cobranças têm de ser feitas na direção certa, e há um grande peso, nessa missão, para a mídia.

Um exemplo é quando o David Luiz afirma, no final, que queria muito dar essa alegria aos brasileiros. Ora, eu não quero alegria nenhuma dada por ele! Não quero o populismo do David Luiz, quero a alegria que eu mesmo posso me dar! Que existe uma predisposição como nunca existiu antes, pra terminar esse ciclo de futebol que aliena, não tenha dúvida. O momento é esse.

Roberto DaMatta é especialista em antropologia social

Não
Acredito que haverá um impacto imediato e provavelmente as pesquisas voltarão ao status de junho - pois as que vieram depois mostravam Dilma Rousseff melhor. Como a população está hoje mais pessimista, negativista, talvez o mau resultado da terça-feira aponte uma piora agora. Mas a médio prazo, e às vésperas da eleição, isso estará totalmente superado.

Já faz alguns meses que a perspectiva dos brasileiros anda muito negativa - só que ela não se construiu agora, em decorrência dos dramas do futebol. Percebe-se, desde o ano passado, um desgaste muito grande porque o eleitor mudou. Está mais exigente, não é mais o cidadão despido de uma avaliação, seja de consumidor ou de contribuinte. Ele quer fazer valer a ideia de que paga impostos e que pode cobrar por isso.

Esse fenômeno não tem relação específica com resultados de futebol, vem de mais longe e quando o eleitor usa uma metáfora futebolística, o "Padrão Fifa", ele se refere a hospitais que funcionem, a serviços de qualidade. Esse mal-estar pode ter qualquer metáfora, mas tem a ver com prestação de serviço. O patamar de demanda de mudanças na sociedade já está dado.

E mesmo que a seleção estivesse bem, e ganhasse a Copa, isso não muda o fato de que a campanha eleitoral será complicada - mas, por razões de outra ordem. Nada a ver com anti-Dilma ou anti-Aécio, mas com a realidade que o brasileiro está vendo, e que mostra tendência a piorar.
No curto prazo, partidos de oposição vão, sim, tirar algumas casquinhas. Mas isso não é estratégico, é tático. Estratégias para valer terão de ser mais profundas. E o esforço que a oposição terá de fazer para articular o desejo de mudança é o mesmo que a situação terá de fazer para justificar a continuidade.

Fátima Pacheco Jordão é socióloga, especialista em opinião pública e diretora da Fato, pesquisa e jornalismo

Discurso para convencer 47 milhões de indecisos

• Governo e oposição vão usar a derrota do Brasil como argumento na corrida eleitoral. Os petistas ressaltarão que, apesar do fracasso em campo, não houve problemas durante a Copa. Já os rivais destacarão os exorbitantes gastos com o torneio

Paulo de Tarso Lyra, João Valadares e Grasielle Castro – Correio Braziliense

Ainda sob o efeito da derrota do Brasil no Mundial, governo e oposição buscam o discurso para atrair 47 milhões de eleitores — um terço do eleitorado, que ainda não vestiu a camisa de um lado ou do outro para as eleições de outubro. Os oposicionistas defendem que o vexame perante a Alemanha apenas coroou um torneio que teve obras superfaturadas, entregues com atraso e resolvida pelo jeitinho brasileiro de decretar feriados nos dias dos jogos para não travar a mobilidade. Para os governistas, a "Copa das copas" foi um sucesso, os aeroportos funcionaram, os pessimistas foram calados e não se pode culpar a presidente Dilma Rousseff (PT) porque não foi ela quem entrou em campo ou escolheu Luiz Felipe Scolari para ser treinador da Seleção Brasileira.

"A partir de agora, viveremos a Copa das culpas", disse Carlos Melo, cientista político e professor do Insper Instituto de Ensino e Pesquisa. "Cada um dos lados vai tentar empurrar para o outro as razões desse fracasso. O eleitor indeciso será bombardeado por uma guerra infinita de versões", prosseguiu Melo. O especialista lembra que, nas redes sociais, a cada gol alemão, multiplicavam-se cobranças à presidente pela ausência de investimentos em saúde e em educação e a prioridade dada às obras para o Mundial. "Mas não podemos esquecer que São Paulo, governado pelo PSDB, lutou para sediar a abertura dos jogos", completou.

O cientista político da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) Fábio Wanderley avalia que o povo brasileiro sabe separar bola e voto. "A verdade é que ainda vai correr muita água até as eleições", afirma. Ele acredita, no entanto, que a derrota pode servir como adubo para o recrudescimento das manifestações de rua que sacudiram o Brasil em junho do ano passado.

O Planalto e a campanha do PT pela reeleição de Dilma Rousseff asseguram que, até o momento, não há qualquer razão para mudanças de planos. A presidente segue disposta a ir ao Maracanã no domingo para entregar a taça ao vencedor do Mundial. Há alguns dias, a decisão causou estresse entre a Secretaria de Comunicação da Presidência e o Ministério do Esporte, pois Aldo Rebelo confirmou a presença de Dilma à Fifa antes de comunicá-la do convite.

Ontem, a presidente foi entrevistada pela CNN e não escondeu que estava abalada pelo resultado do jogo. "Meus pesadelos nunca foram tão ruins. Como torcedora, claro, estou profundamente sentida porque eu compartilho da mesma tristeza dos outros torcedores. Mas também sei que somos um país com uma característica muito particular. Nós crescemos no desafio da adversidade. Nós somos capazes de superar", disse a presidente. A entrevista vai ao ar hoje.

Dilma também reforçou o discurso feito por estrategistas de campanha de que "o Brasil organizou e sediou a que eu acredito ser uma das melhores Copas do Mundo. E muito disso se deve à habilidade dos brasileiros de oferecerem hospitalidade e de dar boas-vindas a torcedores de todas as partes do mundo", elogiou, mostrando que o discurso de que "a parte do governo foi feita" será usado como combustível eleitoral. Na segunda-feira, a presidente participou de um cara a cara com internautas e chegou a fazer o "tóis", formando uma letra T com os antebraços, gesto usado por Neymar nos jogos do Brasil.

Corrupção
No campo da oposição, Eduardo Campos (PSB) cancelou a agenda de candidato em Fortaleza por acreditar que os eleitores interpretariam mal alguém pedindo votos em um momento de comoção nacional. "Nossa proposta foi, é, e sempre será, trabalhar a favor do Brasil. Queremos sempre que as coisas deem certo." Aliados do socialista, no entanto, afirmam que, se o tema da Copa for abordado na campanha, virão à tona os escândalos de corrupção e de superfaturamento nas obras para o Mundial.

Já o candidato do PSDB, Aécio Neves, que esteve no Mineirão, permaneceu em reuniões internas ao longo da quarta-feira. Mas o Instituto Teotônio Vilela, vinculado ao partido, divulgou uma nota dura. "A vitória alemã representa o triunfo da técnica, da disciplina, do método e do rigor sobre o improviso e o descompromisso. Quantas vezes, ao longo de sete anos, não ouvimos autoridades federais dizendo que o "jeito brasileiro" de fazer as coisas seria um sucesso, como se organização, planejamento e método fossem atributos indesejáveis para uma nação tão criativa quanto a nossa?", disseram os tucanos.

Deixem o Brasil fora disso: O Estado de S. Paulo – Editorial

Sob o impacto da estonteante goleada de 7 a 1 que a seleção alemã infligiu ao time nacional, não faltou quem se pusesse a atribuir o vexame às mazelas brasileiras, de que o resultado seria espelho fiel. Associou-se a catástrofe no Mineirão, por exemplo, ao "atraso civilizatório" do País, numa referência implícita aos padrões superlativos da Alemanha em praticamente todos os campos.

Chegou-se a lembrar que, no cômputo de Prêmios Nobel conquistados, a grande nação europeia esmaga o Brasil por 103 a 0. A reação é compreensível, mas nem por isso menos equivocada.

É da condição humana, desde sempre, encontrar um sentido para fatos e situações que desafiam a lógica, o senso comum e as expectativas baseadas em experiências recorrentes. Daí, entre inumeráveis outras consequências, nascem as teorias conspiratórias, que imputam ações e acontecimentos adversos ou desconcertantes a planos urdidos nas sombras por quem quer que deles pretenda tirar proveito. A isso se chama em ciência "relação espúria". Nela, eventos tidos como causas e efeitos ou não se conectam de forma alguma ou, quando sim, só depois de passar por um sem-fim de elos, como os de uma quilométrica corrente.

Uma de suas manifestações mais comuns é a chamada "sociologia de botequim" - a confecção de teorias tão fáceis quanto mambembes sobre fenômenos sociais incomuns ou perturbadores. No caso do baque de Belo Horizonte, o mais certo, talvez, seja falar em sociologia de velório. Enlutados e inconformados com a perda repentina, absurda, do parente ou amigo próximo, alguns dos presentes tentam aquietar o seu pesar dando ao passamento razões que a medicina teria mais razões ainda para recusar. Tamanha a envergadura do colapso da seleção que muitos não conseguem explicá-la pelo que se passou, ou deixou de se passar, no gramado.

Para esses, o futebol - nisso incluído não só o jogo tal qual se desenrolou, mas ainda a qualidade dos times, o preparo de cada um, as táticas adotadas pelos respectivos treinadores, o seu grau de competência e tudo o mais que transcorre nos bastidores dessa multimilionária atividade - não dá conta do ocorrido. É preciso, afirmam, olhar em volta. Simples assim: sendo o Brasil um poço de problemas, nada mais natural que neles tenha se afogado o escrete ao enfrentar a representação de um país que teria resolvido todos os seus. O corolário consolador é que o naufrágio, quem sabe, sirva de choque de realidade para a superação das nossas piores carências.

Há, porém, um "pequeno detalhe": não foi o Brasil quem tomou uma sova histórica anteontem, mas os 11 jogadores escalados por um técnico que, assim como eles, trabalha sob contrato para uma entidade privada, a CBF, que, por sua vez, existe para dar lucro tanto quanto as suas congêneres do mundo inteiro, reunidas todas na famigerada federação da famiglia Blatter, a Fifa. Além disso - e à parte a manifesta superioridade tática do adversário - o desfecho foi literalmente excepcional. A sua causa evidente foi outra raridade, pelo menos em jogos entre seleções da primeira liga mundial: os 4 gols alemães em 6 minutos que entorpeceram o time de Luiz Felipe Scolari.

A chance de isso se repetir, joguem os selecionados dos dois países quantas vezes possam até o fim dos tempos, é ínfima. No acumulado desde 1963, os canarinhos colecionaram 12 vitórias em 22 embates, ante 5 dos rubro-negros e igual número de empates. Isso posto, o que diriam os que culpam os males do País pelos aberrantes 7 a 1 se a esquadra de Joachim Loew não tivesse ido além de uma vitória por 2 ou 3 gols de diferença? Uma coisa, portanto, é a ilógica que torna o futebol fascinante, como observa o técnico argentino Alejandro Sabella. Outra, o Brasil. De mais a mais, em matéria de más notícias, o governo já se incumbe de atingir os brasileiros com uma sequência interminável.

Para a vida real da população, a derrota diante dos alemães, conquanto "humilhante", como a imprensa do mundo inteiro se apressou a qualificá-la, é de uma irrelevância atroz perto de outro resultado dessa funesta terça-feira. A inflação em 12 meses, medida pelo IPCA, chegou a 6,52%, arrebentando o teto da média estipulada pelo governo. Goleada é isso.

A necessária superação do vexame: O Globo - Editorial

• A derrota trágica no Mineirão precisa ser o marco zero de uma reforma profunda, como fez a Alemanha, passando pela revitalização dos clubes, com o seu enquadramento num modelo profissional de administração

O período de 64 anos, de 1950 a 2014, é delimitado por duas tragédias na história do futebol brasileiro. Numa ponta, a perda do que poderia ter sido o primeiro título mundial, no Maracanã, para o Uruguai, e, na outra, a vexaminosa derrota por humilhantes 7 a 1 diante da Alemanha, terça-feira, no Mineirão. Era o penúltimo passo antes de se voltar seis décadas depois ao Maracanã para, enfim, vingar 50.

Ora, o país lutou para sediar a Copa de 2014 com dois objetivos principais: exorcizar aquele fantasma e ser hexacampeão. Não será, e ainda permitiu nova mancha nos 100 anos de seleção brasileira: a mais acachapante derrota nestas dez décadas.

Será infindável a pendenga sobre se o Maracanazo foi ou não maior que o Mineirazo. Mas trata-se de uma discussão tão longa quanto inútil. Os argumentos de lado a lado são vários. Perder um jogo (2 a 1) de decisão de Copa em casa, contra o Uruguai, no qual abriu-se o placar e precisava-se apenas do empate, é difícil esquecer. De outro lado, o vexame do 7 a 1, no Mineirão — sendo que tudo foi resolvido no espaço de apenas seis minutos do primeiro tempo, quando três gols, com diferença média de dois minutos entre eles, liquidaram a partida —, também é um pesadelo para sempre.

A vantagem, hoje, é já se ter passado por tragédia do mesmo tamanho, e ressurgido dos escombros. Não importa se a derrota é igual, menor ou maior que a de 50. Está nas crônicas da época o registro do profundo silêncio de catedral que tomou conta do ainda inacabado Maracanã, enquanto Obdulio Varela e Ghigia comemoravam o bi uruguaio no gramado. De anteontem, nestes tempos de comunicação instantânea e planetária, das transmissões ao vivo por incontáveis ângulos, restaram registrados nos arquivos digitais o choro de crianças no Mineirão e a tristeza nas ruas, antes desertas, em todo o país, à espera da classificação para a concretização, enfim, da vingança de 50, no domingo, no mesmo Maracanã.

Consumada a tragédia de 50, em duas Copas o Brasil ganharia a sua primeira, em 58, seria bicampeão e chegaria a cinco títulos. E, seja qual for o campeão no domingo, a seleção continuará como a mais vitoriosa. Nada que não possa ser soterrado por uma sequência de derrotas nos próximos torneios, caso o futebol brasileiro aceite de forma passiva a visível tendência de decadência e desorganização em que entrou. Porém, depois de 50 ele soube reagir. E não foram poucos os reveses seguintes. Quando tinha times medíocres, e a derrota era esperada, e mesmo em surpresas também dolorosas como em 82, na Espanha, quando o Brasil reuniu uma das melhores seleções de todos os tempos, e perdeu. Ou na final de 98, em Paris, para a França, num apagão cuja centelha foi a mal explicada indisposição de Ronaldo.

É indiscutível que o 7 a 1 tem um peso específico não desprezível. Porém, de nada adiantará buscar culpados individuais, transformar o Fred num Barbosa, o goleiro de 50. Ou algo do tipo. Isso não significa deixar de reconhecer os erros, para não repeti-los. Mas é crucial chegar às raízes das falhas.

O comportamento do time na Copa e, em particular, na semifinal de terça, denuncia incontáveis problemas, derivados de mau planejamento e preparação deficiente, falta de treinamento, problemas táticos, de escalação, desequilíbrio emocional e qualidade discutível de jogador. O choro descontrolado do capitão Thiago Silva antes da disputa por pênaltis contra o Chile, a instabilidade da equipe no segundo tempo do jogo com a Colômbia e a própria incapacidade de reagir ao primeiro gol da Alemanha, marcado por um atacante, com o pé, livre, numa batida de escanteio, falha grave de qualquer defesa, são pontos que, ao serem unidos, compõem uma radiografia que precisa ser analisada, com cuidado, sem paixões.

É preciso aprender com a derrota. Ainda mais esta, trágica. Antes de tudo, entretanto, deve-se fazer a autocrítica de que bravatas, ufanismos, arrogância e autossuficiência sempre são a antessala de perdas sofridas, cedo ou tarde. Estes cacoetes foram observados na comissão técnica, em Felipão e Parreira, ao se declararem favoritos e se dizerem com “a mão na taça”, postura que pesou tanto sobre os jogadores que a psicóloga da delegação teve quase tanto trabalho quanto o médico e o massagista. Nos últimos dias, até a presidente Dilma ensaiou querer usar a Copa como arma político-eleitoral. Primeiro, devido ao êxito do evento em si. Depois, se viesse o hexa, o ataque aos “pessimistas” seria amplificado nos palanques.

O vexame de terça mostrou, também, que não há jeitinho e malandragem que consigam superar a organização e o trabalho duro, competente e de longo prazo. O Brasil tem o exemplo da própria Alemanha, capaz de somar a habilidade individual à disciplina. Para isso, fez profunda reformulação, a partir também de um fracasso: na Eurocopa de 2000, quando o time marcou apenas um gol e foi desclassificado na primeira fase. Como no Brasil, lá futebol também é questão de Estado. O governo fixou dez anos de prazo para a Alemanha voltar à elite mundial. A Federação Alemã construiu 360 centros de formação de jogadores, onde são atendidos 25 mil meninos e meninas, de 9 a 17 anos. Foi preciso, também, reformar a liga de futebol (Bundesliga) e o campeonato, com o enquadramento dos clubes em normas de administração austera, como deve ser. Clube endividado sai da liga e do campeonato.

Enquanto isso, os clubes brasileiros, quebrados, deixaram de formar jogadores. Os que surgem são logo vendidos ao exterior, e o Campeonato Brasileiro se esvai — 12.500 de média de público por jogo, contra 45 mil da Bundesliga, a mais elevada do mundo.

O Mineirazo precisa ser entendido como marco zero de uma reforma brasileira de igual dimensão, passando pela cúpula do esporte e pela recuperação dos clubes e seu enquadramento, enfim, num modelo profissional de administração. Deve-se, inclusive, aproveitar, com este objetivo, a tramitação no Congresso do projeto de renegociação de suas dívidas tributárias.

Ao mesmo tempo, deve-se sepultar a ilusão de que o Brasil tem o monopólio da habilidade e do brilhantismo no futebol. Mito. Nem Pelé deixou de treinar e trabalhar com afinco para desenvolver suas habilidades. Antes de tudo, é preciso reconhecer que fomos ultrapassados por outros países. Pois, sem admitir que existe o problema, ele nunca será resolvido.

Dilma e Aécio definem estratégia no Rio

Renata Batista – Valor Econômico

RIO - Os dois líderes das pesquisas na disputa para a Presidência da República terão campanhas independentes dos candidatos ao governo estadual no Rio de Janeiro. Enquanto a presidente Dilma Rousseff (PT) deve priorizar eventos fechados, Aécio Neves (PSDB) deverá buscar maior contato com os eleitores. É o que dizem o coordenador da campanha do PT no Estado, Adilson Pires, e o presidente do PMDB fluminense, Jorge Picciani, que lidera o movimento regional de apoio a Aécio.

Hoje, o tucano virá ao Rio para agenda no município de Queimados, na Baixada Fluminense. Deve caminhar pelo calçadão do centro comercial do município. Será acompanhado do prefeito, Max Lemos, do candidato da coligação ao Senado, Cesar Maia (DEM), e do senador Francisco Dornelles, que assumiu, no sábado, a vaga de vice na chapa do candidato do PMDB, o governador Luiz Fernando Pezão.

O governador - que declarou apoio à presidente Dilma - não participará do evento. Picciani, que pretende realizar de 10 a 15 ações como essa no Estado ao longo do primeiro turno, defende que essa seja a estratégia durante todo o período. "O Pezão vai tocando a vida dele. Nesse momento, a prioridade é duplicar as agendas", diz Picciani.

Na avaliação do presidente regional do PMDB, a divisão do palanque dos partidos da coligação em torno de Pezão, no Rio, não é ruim nem para Aécio nem para Pezão. Avalia que ambos têm objetivos semelhantes. "Eles têm o mesmo desafio: tornarem-se mais conhecidos. Quanto mais organizado for esse movimento, melhor para os dois", completa.

No PT, Adilson Pires participou na terça-feira, em Brasília, de reunião realizada com o presidente do partido, Ruy Falcão, e outros coordenadores estaduais. Pires defende que os esforços da presidente como candidata no Estado sejam concentrados em movimentos sociais organizados. Segundo ele, os candidatos ao governo estadual aliados poderão propor iniciativas conjuntas, mas dependerão da disponibilidade da presidente.

"Vamos levantar as datas disponíveis para o Rio, mas devemos apostar nas iniciativas como os movimentos da sociedade civil. As agendas com candidatos vão depender da capacidade de proposição deles", afirma.

No Rio, a presidente Dilma conta com quatro candidatos aliados. Dois partidos oferecem palanques exclusivos - o PR, de Anthony Garotinho, e o PRB, de Marcelo Crivella. No PMDB, existe o movimento de apoio a Aécio, o já batizado de Aezão (Aécio + Pezão). Já o PT, cujo candidato é o senador Lindbergh Farias, firmou coligação com o PSB, de Eduardo Campos, que terá como candidato a senador o deputado federal e ex-jogador de futebol Romário. Nesse cenário, Pires diz que não defenderá uma agenda forte de rua para a candidata-presidente. "Não vou propor aperto de mão. Teremos as mídias sociais, a TV e uma agenda forte com os movimentos sociais", diz.

Já na TV, ele acredita que Dilma deverá aparecer mais na propaganda do próprio partido, ao lado de Lindbergh. "Ter quatro palanques é um ativo. Nenhum outro Estado oferece isso. Não pode virar um problema", frisa.

No Rio, Aécio começa campanha pela Baixada Fluminense

• Tucano inicia campanha no Estado em região na qual sigla obteve desempenho fraco na última eleição

Luciana Nunes Leal - Agência Estado

O candidato do PSDB à Presidência da República, Aécio Neves, começa nesta quinta-feira, 10, a campanha no Rio de Janeiro pela Baixada Fluminense, região que concentra 22% do eleitorado do Estado e ponto franco do PSDB em eleições anteriores. Aécio fará uma caminhada no município de Queimados, sem a presença de seu candidato ao Palácio Guanabara, Luiz Fernando Pezão (PMDB), que promete apoio à reeleição da presidente Dilma Rousseff.

Estarão ao lado de Aécio o candidato a vice-governador, Francisco Dornelles (PP), e o candidato ao Senado, ex-prefeito Cesar Maia (DEM). Pezão tem três candidatos a presidente em seu palanque - além de Aécio e Dilma, o Pastor Everaldo, do PSC.

No primeiro turno da eleição presidencial de 2010, o tucano José Serra teve em Queimados, proporcionalmente, o segundo pior desempenho entre os municípios do Rio, com apenas 12,3% dos votos. Serra foi mal também em outras cidades da região. No extremo oposto, a Baixada deu as maiores votações para a então candidata Dilma. Em Belford Roxo, a petista chegou a 57% no primeiro turno e Serra teve apenas 12%, o pior resultado do tucano no Estado. Em Queimados, Dilma conquistou a 55,5% dos votos.

Os cicerones de Aécio em Queimados serão o presidente do PMDB-RJ, Jorge Picciani, líder do movimento "Aezão", que prega o voto conjunto em Pezão e Aécio, e o prefeito Max Lemos (PMDB). Em 2010, os dois estavam com Dilma.

Aécio reúne-se com FHC e fecha apoios para 2º turno

Luciana Nunes Leal - Agência Estado

O candidato do PSDB à Presidência da República, Aécio Neves, reuniu-se nesta quarta-feira, 9,com o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, um dos principais conselheiros do ex-governador mineiro na campanha, que será intensificada depois da Copa. Aécio recebeu também os integrantes da coligação PSDB-PP-PSB nas eleições de Santa Catarina. O senador tucano Paulo Bauer, candidato ao governo, e o deputado estadual Joares Ponticelli (PP), vice, farão campanha para Aécio. O deputado Paulo Bornhausen (PSB), que disputa o Senado, pedirá votos para o presidenciável socialista, Eduardo Campos.

"Cada um trabalhará para seu candidato no primeiro turno e temos um compromisso de apoio recíproco no segundo turno. Temos coerência na defesa da saída da presidente Dilma Rousseff", afirmou Bornhausen, filho do ex-senador e ex-governador Paulo Bornhausen, que fez carreira política no antigo PFL e no DEM.

O deputado disse que os candidatos também farão uma visita a Campos. Aécio posou para fotos e gravou depoimento para a campanha catarinense. "Temos uma coligação autoexplicativa, com 12 partidos, todos de oposição à presidente", afirmou Bauer.

Campos diz que não pretende explorar goleada na campanha

João Domingos - Agência Estado

O candidato do PSB à Presidência da República, Eduardo Campos, deixou claro nesta quarta-feira, 9, que não pretende explorar na campanha a goleada por 7 a 1 que o Brasil sofreu para a Alemanha, na terça-feira, 8, na semifinal da Copa da Fifa 2014. "Nossa proposta foi, é e sempre será trabalhar a favor do Brasil. Queremos sempre que as coisas no Brasil deem certo. Essa tem sido nossa atitude e continuará sendo", disse.

Campos diz entender que o vexame vivido pelo Brasil no Mineirão nesta terça deve ser tratado como um tabu, porque nada rende em termos de votos. Pelo contrário, insistir nele pode é aumentar a irritação do eleitor. Por causa da derrota sofrida pelo Brasil, o ex-governador cancelou a visita que faria a Fortaleza hoje, para dar prosseguimento à campanha. Ele avaliou que o eleitor não entenderia direito a atitude de um candidato pedindo votos no dia seguinte à comoção nacional causada pela derrota.

Antes da goleada, a campanha de Eduardo Campos já havia traçado algumas estratégias para o caso de a presidente Dilma Rousseff: tentar ganhar o eleitor com a boa receptividade do torneio pelo público, conforme apontam as pesquisas. A estratégia está mantida, mas só virá à tona se o tema Copa for colocado em pauta. Nesse sentido, a ideia é dizer que as denúncias de corrupção envolvendo a construção dos estádios não deveria ser esquecida, apesar do sucesso da Copa da Fifa. Os bilionários empréstimos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para a construção dos estádios deverão ser lembrados na campanha, mas sempre em relação à suspeita de irregularidades e sobre os limites entre o público e privado. Nunca haverá uma condenação aos estádios, que servirão à prática do futebol nos campeonatos do País daqui para a frente.

Campos vai reeditar projeto ‘As Casas de Marina’, de 2010

• Segundo o modelo da ex-senadora, residências poderão funcionar como comitês

O Globo

SÃO PAULO — A campanha de Eduardo Campos, candidato do PSB à Presidência da República, vai reeditar uma estratégia usada em 2010 pela ex-senadora Marina Silva, então do PV. Para economizar, serão reativadas as chamadas Casas de Marina, que agora receberão o nome de Casas de Eduardo e Marina 40.

O modelo permite que qualquer residência seja transformada em comitê de campanha para distribuição de material e espaço para encontro com eleitores e candidatos.

O secretário nacional do PSB, Carlos Siqueira, afirma que a medida foi adotada para popularizar a campanha.

— Uma campanha que não tem grandes estruturas precisa de criatividade e envolver mais o eleitor. Essa é uma forma de popularizar os comitês de campanha, de ter mais comitês pelo país, e também de economizar — explicou Siqueira.

Campos declarou previsão de gastos de R$ 150 milhões e afirmou que pretende gastar menos e “fazer a campanha mais barata” de todos os candidatos

O desafio dos presidenciáveis de conter a inflação brasileira

• Campos e Dilma tratam o tema de forma vaga; Aécio quer o índice no centro da meta

Martha Beck – O Globo

BRASÍLIA — Os programas de governo de dois dos três principais candidatos à Presidência abordam de forma vaga os temas mais espinhosos da economia: a inflação elevada, a deterioração da política fiscal e o baixo crescimento. Enquanto o plano da presidente Dilma Rousseff se limita a dizer que ela será “intransigente no combate à inflação”, o de Eduardo Campos (PSB) sequer toca no assunto. Já o do tucano Aécio Neves (PSDB) é um pouco mais detalhado e propõe uma redução tanto do centro da meta de inflação, hoje fixada em 4,5%, quanto da margem de tolerância, que é de dois pontos percentuais para baixo ou para cima.

Gastos públicos em xeque
Também na área fiscal, o programa de Aécio é o único que fala na realização de superávits primários (economia feita pelo governo para o pagamento de juros da dívida pública) e no controle dos gastos públicos. Já Dilma, cuja equipe econômica é acusada de realizar uma política fiscal expansionista que aumentou excessivamente os gastos públicos e ainda prejudicou o combate à inflação, não falou de que maneira vai reverter o quadro atual. Em maio, por exemplo, o setor público registrou um déficit primário de R$ 11 bilhões, o pior desde 2001.

A professora de Economia da UFRJ Margarida Gutierrez ressalta que as propostas dos candidatos na área fiscal tendem a ser mais rígidas durante a campanha do que acaba ocorrendo na prática:
— É muito difícil conter os gastos públicos. Se o futuro presidente conseguir ao menos fazer com que as despesas do governo cresçam abaixo da taxa de crescimento da economia, já será um grande avanço.

O programa da presidente se limita a dizer que o novo ciclo de crescimento proposto pelo PT tem como alicerce “o fortalecimento de uma política macroeconômica sólida” e o “rigor fiscal”. O texto ressalta que os governos petistas adotaram uma estratégia que permitiu a queda da dívida líquida do setor, que teve uma redução de 60,2% do Produto Interno Bruto (PIB, soma de bens e serviços produzidos no país) em 2002 para 34,6% em 2014.

“Sob qualquer ótica, os indicadores macroeconômicos mudaram de patamar”, afirma o programa de Dilma. No entanto, o texto não menciona o fato de a dívida bruta — um dos principais parâmetros observados pelo mercado na hora de avaliar a situação das contas públicas de um país — estar subindo e preocupando o mercado. No ranking do Fundo Monetário Internacional (FMI), por exemplo, o Brasil é uma das economias emergentes em pior situação. Os dados apontam que, no Brasil, a dívida bruta fechou 2013 em 66,3% do PIB e terminará 2014 em 66,7% do PIB. Já a China deve terminar este ano em 20,2% do PIB; a Índia, em 65,3%; e a Rússia, em 13% do PIB.

O plano de Campos na área fiscal diz apenas que “a condução da política econômica requer planejamento de médio e longo prazos” e ressalta a importância de implantar no Brasil um projeto de crescimento com sustentabilidade, uma plataforma de sua vice Marina Silva. Um dos coordenadores do plano de governo do presidenciável do PSB, o ex-deputado Maurício Rands, explicou que o programa será detalhado futuramente.

O programa de Aécio também defende a autonomia operacional do Banco Central para fixar a política de juros no país. Já Dilma e Campos não tocam no assunto. Em comum, os três programas de governo têm o discurso em favor do aumento dos investimentos em infraestrutura, com simplificação tributária e redução de burocracia.

Abreu e Lima: Auditorias apontam favorecimento a empreiteiras na obra da refinaria

• Relatório elaborado pela Petrobras aponta lucro indevido do Consórcio Alusa-CBM

Eduardo Bresciani e Vinicius Sassine – O Globo

BRASÍLIA — Auditorias internas da Petrobras revelam que a construção da refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco, contou com projeções de lucro acima do mercado por fornecedores, favorecimento em licitações, contratações sem concorrência e sem disputa e pagamentos a mais a empreiteiras. Os relatórios inéditos, obtidos pelo GLOBO, foram elaborados entre 2011 e 2014 e detalham supostas irregularidades num empreendimento cujo orçamento saltou de US$ 2,3 bilhões para mais de US$ 20 bilhões, valor do gasto total estimado até novembro deste ano, data prevista para o início do funcionamento da refinaria. O superfaturamento em Abreu e Lima, segundo as estimativas mais recentes do Tribunal de Contas da União (TCU), ultrapassa R$ 1,1 bilhão.

Um relatório de sete páginas, elaborado por três auditores da Petrobras, apontou um lucro indevido projetado pelo Consórcio Alusa-CBM, responsável por um contrato de R$ 651,7 milhões. Para implantar a unidade da carteira de enxofre da refinaria, o consórcio estimou um lucro de 12%, inclusive para a elaboração do projeto, delegada a outra empresa. Os auditores compararam, então, esses ganhos com o “ranking” das 14 maiores construtoras, cuja margem média de lucro era de 7%, “sendo que 60% dessas empresas apresentaram percentuais inferiores ou iguais a 6%”.

A unidade responsável justificou que as propostas se referem a contratos por preço global e não poderiam ser analisadas pontualmente. Os auditores discordaram: “O fato de o contrato ser por preço global não impede a análise da composição de seu valor, ainda na licitação, visando à negociação de condições mais vantajosas para a Petrobras, inclusive com possível enquadramento de suas parcelas ao praticado no mercado”. Não há informação se os lucros exacerbados foram pagos.

Outra equipe de três auditores lançou suspeita sobre um segundo contrato com a Alusa. A empresa foi contratada por R$ 921 milhões para realizar do projeto executivo à implementação da casa de força da refinaria. A Alusa, porém, não atendia aos requisitos expressos no edital de licitação. Na ocasião, em 2008, foram encaminhados convites a 12 empresas. A empreiteira só conseguiu participar após enviar e-mail a um gerente da área de engenharia demonstrando interesse em disputar.

A Petrobras justificou a inclusão como uma forma de aumentar a concorrência: “Apesar de a Alusa não atender integralmente aos critérios estabelecidos inicialmente para o convite, ela possuía capacitação, porte adequado e experiência na prestação de serviços semelhantes na Petrobras. Considerou-se, ainda, que a inclusão dela no processo poderia aumentar a competitividade no certame".

Os auditores não se deram por satisfeitos. O relatório destacou que 12 concorrentes já participavam e que a flexibilização dos critérios deveria ter sido estendida a outras empresas. “Uma vez aberta a excepcionalidade para essa empresa, outras que estavam nas mesmas condições deveriam ter sido convidadas não só para conferir isonomia ao processo, como, também, para aumentar a competitividade e evitar questionamentos”, argumentaram.

Questionamentos ao processo licitatório foram feitos também em um certame vencido pela Jaraguá Empreendimentos, citada na Operação Lava-Jato da Polícia Federal (PF) como uma das que repassaram recursos para uma empresa de fachada do doleiro Alberto Youssef. Os dois auditores que assinam este relatório observaram que a empresa venceu uma concorrência de R$ 13,3 milhões para o fornecimentos de equipamentos de energia na qual nenhum concorrente participou. A Petrobras convidou 16 empresas, mas só a Jaraguá apresentou proposta. A equipe observou que o TCU já determinou à Petrobras que devem existir pelo menos três propostas válidas para um processo licitatório ter continuidade.

Um contrato de R$ 2,7 bilhões com o Consórcio Ipojuca, formado pela Construtora Queiroz Galvão e pela Iesa Óleo e Gás, teve reajustes de preços antes do previsto na parceria com a Petrobras. As empreiteiras são responsáveis pela implantação de tubovias de interligação. Os auditores apontaram um “desembolso indevido” de R$ 6 milhões, e pediram a devolução do dinheiro.

Outra iniciativa criticada foi o aumento de itens e a manutenção do preço unitário, o que levou a um “acréscimo de R$ 245 milhões". “Considerando que os itens destacados representam os maiores volumes das medições, essa situação pode induzir à percepção de antecipação de recursos com vantagem financeira para a contratada”, citou o relatório. O consórcio deveria instalar um sistema de tratamento de efluentes, o que não foi feito e implicou custo adicional de R$ 15 milhões.

Relatórios apontaram ainda repasses de recursos a fornecedores contratados antes da prestação de serviços e sem atualização dos valores nos pagamentos, além de reajustes inadequados, que levaram a pagamentos a mais. Estes recursos só foram ressarcidos à Petrobras após o trabalho da fiscalização. A auditoria questionou o fato de a Petrobras ter deixado de cobrar multas previstas em contrato, de até 10% do valor total, por atrasos na obra e desmobilização de mão de obra. Isso ocorreu em dois contratos que ultrapassavam R$ 1,3 bilhão, mas a Petrobras preferiu apenas repactuar os prazos com os fornecedores.

A reportagem do GLOBO procurou a Petrobras na tarde de ontem, mas não houve retorno até o fechamento desta edição. O Consórcio Ipojuca também não respondeu aos questionamentos enviados. O jornal tentou contato com Alusa e Jaraguá, mas, devido ao feriado em São Paulo, não conseguiu contato com os respetivos escritórios.

Justiça manda Petrobrás entregar todos os contratos de Abreu e Lima

• Medida atende pedido da defesa de doleiro e de ex-diretor da estatal, investigados por suspeita de corrupção na refinaria.

Fausto Macedo – O Estado de S. Paulo

A Justiça Federal mandou intimar a Petrobrás para que apresente em 30 dias uma extensa relação de informações e documentos sobre a construção da refinaria Abreu e Lima, empreendimento que a Operação Lava Jato investiga por suposto superfaturamento e desvio de recursos públicos envolvendo o doleiro Alberto Youssef e o ex-diretor de Abastecimento da estatal petrolífera, Paulo Roberto Costa.

A Petrobrás terá de apresentar os dados, “preferivelmente em forma digital em CD ou DVD”, inclusive cópia de todos os contratos e aditivos existentes. As informações foram requeridas pelos defensores de Paulo Roberto Costa e Youssef. Ambos negam corrupção no âmbito da refinaria.

A Justiça também decidiu requisitar do Tribunal de Contas da União (TCU) cópia integral de todos os procedimentos de auditoria e fiscalização realizadas sobre as obras da Abreu e Lima.

Especificamente, o TCU terá de informar se o critério adotado com relação às obras de terraplanagem da refinaria Abreu e Lima foi o mesmo adotado em obras de pavimentação de rodovias realizadas pelo DNIT (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes).

A suspeita sobre a Abreu e Lima é um capítulo emblemático da Lava Jato, investigação da Polícia Federal sobre lavagem de R$ 10 bilhões. O Ministério Público Federal apontou lavagem de dinheiro, corrupção e organização criminosa e denunciou 10 investigados, entre eles Youssef e Paulo Roberto Costa.

A denúncia indica “desvios de numerário público” ocorridos na construção da Refinaria Abreu e Lima, no município de Ipojuca (PE), o que teria ocorrido através do pagamento de contratos superfaturados a empresas que prestaram serviços direta ou indiretamente à Petrobrás, no período de 2009 a 2014.

A obra, orçada inicialmente em R$ 2,5 bilhões, teria alcançado atualmente o valor global superior a R$ 20 bilhões.

A Procuradoria da República sustenta que Paulo Roberto Costa aparece nas duas pontas do esquema criminal, em uma como responsável pela construção da refinaria, tanto na condição de diretor de Abastecimento da Petrobrás como membro do Conselho de Administração da Abreu e Lima, e, na outra, como beneficiário de parcelas das ‘comissões’ ou ‘repasses’.
Paulo Roberto Costa, como diretor de Abastecimento da Petrobrás durante 2004 a 2012 e como conselheiro de administração da Abreu e Lima desde 2008, era responsável pelos projetos técnicos para construção de refinarias da estatal e pela fiscalização da execução dos aspectos técnicos.

Ao analisar os argumentos dos defensores do doleiro e do ex-diretor da Petrobrás, que estão presos, a Justiça Federal rechaçou tese de “inépcia da denúncia”. Segundo a Justiça, “em síntese, recursos públicos da Petrobrás teriam sido desviados na construção da Refinaria Abreu e Lima e lavados pelos acusados em fluxo de recursos que passa da Petrobrás para o Consórcio Nacional Camargo Correa (CNCC), controlado pela empresa Construções Camargo e Correa S/A, desta para as empresas Sanko Sider Ltda. e a Sanko Serviços de Pesquisa e Mapeamento, e destas para a MO Consultoria e Laudos Estatísticos”.

A MO Consultoria e Laudos Estatísticos, destaca a Justiça, embora em nome de Waldomiro Oliveira, é controlada por Alberto Youssef. “Posteriormente, os valores teriam sido transferidas a outras contas de empresas controladas por Youssef, como Labogen Química, Indústria Labogen, Piroquímica, RCI Softaware e Empreiteira Rigidez, e parte ainda remetida ao exterior mediante contratos de câmbio fraudulentos para pagamento de importações fictícias”.

A Justiça acolheu pedido dos defensores de Youssef e de Paulo Roberto Costa para que a Petrobrás repasses informações sobre a refinaria. A estatal terá de informar se a Abreu e Lima seria destinada ao refino de petróleo produzido no Brasil e na Venezuela e, em caso positivo, “se estes petróleos poderiam ser refinados em conjunto”.

A Justiça elencou 19 itens para os quais a Petrobrás terá de prestar informações, como, por exemplo, esclarecer, de modo detalhado, qual era o setor responsável e como era o processo de aprovação dos contratos e aditivos da obra de construção da Abreu e Lima; informar como se processavam os pedidos de reajustes dos contratos envolvendo a refinaria, isto é, quem tomava a iniciativa e quem deliberava sobre sua aprovação; e qual Diretoria era responsável por esclarecer ao Tribunal de Contas da União questionamentos relativos aos contratos e aditivos.

A Petrobrás deverá informar se o pagamento dos equipamentos utilizados nas obras da refinaria é quitado de acordo com a utilização ou se essa obrigação existe mesmo na hipótese de eles se encontrem inoperantes. Vai esclarecer se os contratos e aditivos celebrados eram submetidos a alguma espécie de auditoria interna – em caso positivo, terá que remeter à Justiça Federal cópia dos pareceres e conclusões das auditagens efetuadas.

Também vai informar, “de modo detalhado”, as etapas para a construção da refinaria, a data em que foi divulgado o orçamento inicial do empreendimento e esclarecer se, neste momento, já dispunha de um projeto aprovado – em caso negativo, vai informar qual foi o parâmetro utilizado para a estimativa inicial de custo.

A estatal tem que informar se o cronograma de obras da refinaria foi cumprido ou se sofreu atrasos – nesta hipótese, explicar quais os motivos que os determinaram.

A Justiça Federal também quer saber quais os critérios que levaram a Petrobrás a firmar pareceria com a PDVSA (Petróleos de Venezuela S/A) para construção da Abreu e Lima – e esclarecer os motivos pelos quais a parceria com a estatal venezuelana na construção da refinaria não se concretizou.

Outros dados para os quais a Justiça Federal quer explicações da Petrobrás.
1) Informar se houve necessidade de construção de infraestrutura no entorno da Refinaria Abreu e Lima. Em caso positivo, esclarecer se o custo de tais obras estava incluído no orçamento inicialmente divulgado pela Petrobrás.

2) Informar o setor responsável pela estimativa e divulgação do custo inicial da construção da refinaria.

3) Informar se o diretor da Área de Abastecimento da Petrobrás tem autonomia para aprovar contratos e aditivos de obras da refinaria Abreu e Lima, individualmente.

4) Informar se o ex-diretor de Abastecimento Paulo Roberto Costa autorizou, individualmente, realização de contratos e aditivos da refinaria Abreu e Lima.

5) O nome e o cargo dos integrantes do Conselho de Administração da Refinaria Abreu e Lima durante o período em que Paulo Roberto Costa exerceu o cargo de diretor de Abastecimento da Petrobrás;

6) Esclarecer qual a área responsável pelo projeto inicial da refinaria.

7) Entregar cópia da licitação ou das principais peças da licitação vencida pela CNCC referente à construção da obra de Abreu e Lima.

A Petrobrás informa que tem colaborado com as investigações.

Sobre a Refinaria Abreu e Lima, a Camargo Correa esclarece que é parte de um consórcio (CNCC), responsável por apenas 2 das 12 principais obras do empreendimento.

Segundo a Camargo Correa, o contrato firmado com o CNCC foi objeto de licitação pública (número 0629131.09-8, de 19 de março de 2009) pelo menor preço, processo coordenado e decidido por comissão de licitação da Petrobrás. O valor desse contrato (R$ 3,4 bilhões) representa aproximadamente 13% do valor total contratado pela Petrobrás para o conjunto dos contratos decorrentes das licitações realizadas ao longo de 2009.

Merval Pereira: Fichas-sujas

- O Globo

A judicialização da política trouxe nos últimos dias notícias nada alvissareiras, com a Justiça sendo usada de variadas maneiras para manter na vida pública políticos que a desonraram. Num dos casos, o do ex-governador do Distrito Federal José Roberto Arruda, há filmes comprovando o recebimento de propinas.

Ele foi condenado em segunda instância por improbidade administrativa pelo Tribunal de Justiça do DF, juntamente com a candidata a deputada Jaqueline Roriz, mas ambos podem escapar da Lei da Ficha Limpa, que proíbe a candidatura de políticos condenados por órgãos colegiados.

A interpretação da Justiça tem sido de que os políticos somente são impedidos de disputar uma eleição se a condenação ocorrer antes do registro da candidatura, cujo prazo final foi 5 de julho.

Outro caso também tem a ver com registro de candidaturas: o Tribunal de Justiça de São Paulo concedeu liminar anulando a convenção estadual do PT paulista, porque o partido recusou a candidatura do deputado estadual Luiz Moura, acusado de ligação com facções criminosas em São Paulo.

Ele participou de uma reunião com membros do PCC no sindicato dos rodoviários, e não conseguiu explicar o que fazia lá. O passado de Luiz Moura o condena: preso por assalto à mão armada, fugiu da prisão e ficou foragido por 10 anos.

No retorno, conseguiu uma anistia dos crimes e entrou para a política. Hoje, possui postos de gasolina e participação em empresas de ônibus.

O efeito colateral da medida por si só demonstra sua total falta de realidade: a anulação invalida todas as candidaturas do PT no estado de São Paulo, não apenas dos deputados estaduais e federais, mas, sobretudo, a de governador, do ex-ministro da Saúde Alexandre Padilha.

Poderia ser uma solução para o PT, que já começa a “cristianizar” seu candidato antes mesmo de a campanha começar, mas privaria o estado economicamente mais forte do país e seu maior colégio eleitoral de ter uma representação do PT no Congresso, o que é inaceitável por uma decisão fora das urnas.

No caso de Brasília, a situação é mais surreal do que parece. Embora condenado, ele teve o voto do desembargador Mário-Zam Belmiro Rosa que entendeu que as provas não eram suficientes para ligar Arruda ao esquema, mesmo com o depoimento do delator e com os filmes comprobatórios, inclusive um mostrando o próprio ex-governador com maços de dinheiro, e outro a deputada Jaqueline Roriz recebendo a suposta propina.

Além do mais, o julgamento só ocorreu porque o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) Joaquim Barbosa determinou que a Justiça do DF julgasse o processo, derrubando uma liminar no STJ (Superior Tribunal de Justiça) que o suspendera.

O Ministério Público vai tentar derrotar a jurisprudência que permite a candidatos fichas-sujas disputarem uma eleição, destruindo completamente o espírito da legislação moralizante. Além do mais, ainda está vigendo o prazo para os registros de candidaturas serem impugnados, o que reforça a tese do Ministério Público.

A Copa das Copas
Há uma conspiração dos astros contra a presidente Dilma. Na análise de seus conselheiros, o melhor resultado para sua candidatura, depois da tragédia do Mineirazo, seria a derrota ontem da seleção da Argentina e uma vitória da seleção brasileira contra os “hermanos” no sábado, na disputa pelo terceiro lugar.

Pois os argentinos venceram a Holanda e disputarão a final contra a Alemanha. Corre o risco de a presidente Dilma ter que entregar a Copa das Copas a Messi, o capitão da seleção argentina.

Pior desfecho não poderia haver. Só falta alguém sugerir à presidente Dilma que ela deve ir sábado ao estádio em Brasília para dar uma força à seleção brasileira. É o que dá misturar futebol e política.

João Bosco Rabello: A vida real de volta mais cedo

- O Estado de S. Paulo

Se a tragédia futebolística afetará as eleições, ainda é uma incógnita, mas desde já abrevia a trégua que a Copa representou para o governo e acelera a retorno à realidade da população, que voltará ao cotidiano de dificuldades após a final do próximo domingo.

Com a seleção fora da Copa, de forma humilhante, a semana que antecede a final serve para que a ficha caia aos poucos, antes que transportes, segurança, saúde e inflação voltem ao dia a dia na mesma proporção em que os turistas e atletas retornem aos seus países.

Foi bom enquanto durou, o congraçamento dos povos e a esperança de um resultado melhor para a seleção. Mas a festa acabou e vale lembrar que o mau humor do contribuinte antecede o evento esportivo em, pelo menos, um ano, quando houve a primeira manifestação nas ruas pelo chamado padrão Fifa.

Padrão que acaba também junto com o torneio. A segurança exaltada pelos estrangeiros que vieram ao país para a Copa é tão atípica quanto a goleada alemã. Sem Copa, o exército deixa as ruas, um jogo do campeonato brasileiro não mobilizará dois mil policiais, nem haverá feriados que perenizem o bom desenvolvimento do trânsito.

Certamente oposição e governo não acreditam na influência do futebol nas eleições, mas é certo que o êxito do evento representou para o governo um ganho por ter sido precedido de legítima expectativa em sentido contrário.

Serviu para interromper o clima de insatisfação, com o país em festa. Da mesma forma, a goleada alemã foi um anticlímax, menos pela derrota e mais pelo diagnóstico que o placar significa para o futebol brasileiro, cuja gestão recebeu seu atestado de óbito.

Para a presidente Dilma, foi-se a oportunidade de prolongar os efeitos da má avaliação da gestão de seu governo, que chegou a experimentar uma tolerância maior, registrada na pesquisa mais recente, que a mostrou com mais três pontos.

De qualquer forma, dificilmente mesmo um resultado positivo da seleção revogaria o quadro de dificuldades que cerca o projeto de reeleição do PT. Além da percepção aguda dos problemas econômicos pela população, há um cenário de alianças desfavoráveis à presidente em estados estratégicos.

O desfecho dramático no plano do futebol, porém, ajuda a repor as coisas no lugar. O governo vinha manipulando o êxito da festa com críticas aos que cobravam padrão Fifa para os serviços públicos aos que afirmaram que não haveria a Copa e aos que tentaram boicotá-la, atribuindo essas manifestações à oposição e à imprensa.

Nem uma, nem outra, no entanto, está entre esses “pessimistas impatrióticos”, como os classifica o governo. O padrão Fifa era nada mais que o desejo de que o que funcionou na Copa funcione todo dia – e esse sentimento perdura. Aqui o governo corre o risco de ampliar seu desgaste, pois não tem como sustentar o padrão que funcionou na Copa após seu término.

O movimento que ameaçava boicotar a Copa jamais correu o risco de dar certo, pois dependia da violência de militantes que expulsaram das ruas os manifestantes ordeiros, mas que não se dispuseram a enfrentar o policiamento especial montado para o evento.

Desde o primeiro momento, os governos jogaram duro com manifestantes para arrefecer o ânimo de ações durante a Copa. O governo de São Paulo chega ao final do evento com legislação aprovada proibindo máscaras em manifestações, avançando o passo que o governo federal ensaiou e refugou.

O país retoma mais cedo sua rotina com os velhos problemas de volta à pauta. O governo segue desgastado pela economia, inflação fora da meta, corrupção em evidência e estagnação nas pesquisas.
O futebol, se influir, será no contexto de uma percepção geral de que nem na última trincheira da autoestima nacional o país se viu blindado dos problemas de gestão que não poupam nem mais o futebol dentro de campo.

Eliane Cantanhêde: "Padrão Felipão"

- Folha de S. Paulo

Da presidente e candidata Dilma Rousseff, tentando cutucar a Fifa depois dos 3 a 0 do Brasil sobre a Espanha e a vitória na Copa das Confederações: "Meu governo é padrão Felipão".

E agora, depois dos 7 e o fim do sonho do hexa em pleno solo brasileiro? Dilma continua dando entrevistas sobre a Copa e, se já não comparava o padrão do seu governo à malfalada Fifa, não pode mais compará-lo ao do Felipão. Mas não vai faltar quem faça a comparação...

Política é curiosa, vai e vem, vem e vai, sempre sujeita aos humores da grande e difusa massa de eleitores. Dilma ganhou quatro pontos com a Copa, mas tende a estacionar agora.

O que ocorreria com a candidata Dilma se o Brasil fosse campeão e a presidente Dilma entregasse a taça para o capitão Thiago Silva? Imagem fortíssima, de imensa simbologia.

Mas o que ocorrerá com a candidata Dilma se a Argentina for campeã e a presidente Dilma for obrigada a entregar a taça para o capitão Messi em pleno Maracanã? Imagem igualmente fortíssima, de imensa simbologia, mas em sentido oposto.

Já que foi a própria Dilma quem fez o casamento entre o seu governo e o "padrão Felipão", estão unidos na alegria e na tristeza. Já que ela certamente tiraria louros político-eleitorais se a taça fosse nossa, a premissa contrária é igualmente verdadeira: tem agora de dividir os prejuízos da derrota vexaminosa.

Com crescimento medíocre e indicadores destrambelhados, é óbvio que a oposição, em algum momento, mais ou menos subliminarmente, vai colar a tática, a estratégia e a preparação do governo ao "padrão Felipão". Sobretudo na economia.

Eleição, porém, não é campeonato de futebol entre PT e PSDB. Se FHC dizia que a vitória do Brasil não impediria derrota de Dilma, a premissa contrária vale igualmente para ele: a derrota do Brasil também não impedirá a vitória da petista.

A Copa acabou para o Brasil, mas a eleição está apenas começando.

Dora Kramer: Apropriação indébita

- O Estado de S. Paulo

O melhor que os políticos teriam a fazer de agora em diante seria deixar de lado o assunto Copa do Mundo. Pelo menos no que diz respeito ao futebol.

Isso na teoria, com base na premissa de que a oposição não deve sair comemorando a derrota horripilante e a situação não tem como captar dividendos nem pode ser responsabilizada pela surpresa que a "caixinha" desta vez nos reservou.

Aliás, não deixa de ser uma cruel ironia que a lavada da Alemanha sobre o Brasil tenha contribuído significativamente para aumentar o saldo de gols dessa Copa tão festejada também pela quantidade de bolas no fundo das redes.

A desconexão entre esporte e política é uma tese confirmada em eleições anteriores. Agora, porém, tornou-se uma hipótese a ser submetida a teste. Por diversos fatores, sendo o principal deles a nítida tentativa do governo de se apropriar do sucesso caso a seleção tivesse conseguido ir até o fim e conquistado o hexa.

A outra razão é a enrustida torcida da oposição para que algo desse errado. Se antes tudo parecia conspirar contra, quando o campeonato começou os ares ficaram favoráveis e os políticos seguiram o rumo dos ventos. Sempre, claro, dizendo que estavam todos unidos em um só coração.

Ninguém poderia, contudo, prever uma surra daquela proporção. Uma coisa horrorosa que pode levar as pessoas a reavaliarem a posição predominantemente favorável à realização da Copa no Brasil enquanto tudo era festa, e voltarem a querer discutir a oportunidade, a necessidade, os gastos, os atrasos, as promessas não cumpridas e os falsos legados do Mundial.

Considerando que os problemas, assim como os aeroportos, não serão levados de volta nas malas dos turistas - para usar uma imagem da presidente Dilma - já seria de esperar o retorno do azedume. Agora, no entanto, acentuado por um fato inimaginável e altamente negativo.

A oposição naturalmente não vai se recusar a esse tipo de debate. E é neste aspecto que agora possa haver, sim, uma conexão entre o futebol e as eleições. Não uma ligação direta entre a derrota em campo e a vitória nas urnas ou vice-versa. Há muitos fatores envolvidos, todos eles devidamente expostos naquele clima de exasperação que há um ano se instalou no País.

Junte-se a Copa realizada no Brasil com eleição disputada e os ânimos profundamente alterados, tudo fica superlativo. Não foi apenas a seleção que se perdeu em campo diante do profissionalismo dos alemães.

O departamento de propaganda do governo também dá sinais de atabalhoamento, pois age no improviso, a cada momento reagindo de uma forma diferente. Antes, quando temia que se concretizassem as previsões de falhas graves de organização e infraestrutura, procurou distanciar-se do campeonato em si para se concentrar no "legado".

Depois, à medida que ia saindo tudo melhor que a encomenda, a equipe do marketing houve por bem aconselhar a presidente a pegar uma carona na amabilidade do brasileiro - contrariando a personalidade irascível de Dilma, a inflexível - a fim de construir às pressas uma identificação.

A presidente foi às redes sociais falar contra o "uso indevido do pessimismo", imitar gestos de Neymar, atacar os "urubus" e misturar condenações à política econômica com críticas à organização da Copa ou mesmo à atuação do time de Luiz Felipe Scolari.

Tal salada governista revelou-se precipitada no uso indevido do otimismo. A suposição era a de que, tendo chegado até as semifinais, o Brasil poderia conseguir o título, ou pelo menos uma colocação razoável. Farejou aí a possibilidade de dividir as honras e apressou-se em abraçar a Taça.

Uma vez consumada a tragédia no campo, o Planalto volta a dizer que a Copa é uma coisa e a política é outra coisa. Mas foi o governo, na palavra da presidente, quem insinuou que era a mesma coisa.

Luiz Carlos Azedo: O colapso da Seleção

- Correio Braziliense

Ninguém imaginava o que aconteceu no Mineirão, nem há explicação satisfatória para o vexame da Seleção Brasileira na semifinal contra a Alemanha. A derrota deprimente por 7 x 1 será estudada nos mínimos detalhes por técnicos de futebol pelos próximos 50 anos, pelo menos aqui no Brasil, como já aconteceu com a derrota na Copa de 1950, para o Uruguai. A diferença é que não dependeu de uma jogada fortuita, como a de Ghiggia no Maracanazo, que virou o placar para 2 x 1 contra nós. Foi uma goleada definida em seis minutos mágicos de futebol, nos quais foram marcados quatro dos cinco gols alemães do primeiro tempo. O de honra do Brasil só saiu nos minutos finais, quando o placar já estava praticamente definido por mais dois gols alemães, num lampejo individual e isolado de Oscar.

O jogo ainda não havia terminado, porém, já circulava na internet uma piada infame: um gaiato dizia que nem na Segunda Guerra Mundial (1939-1945) um povo sofrera tanto como os brasileiros, o que é uma rematada tolice, diante do morticínio que houve. Basta lembrar apenas os 6 milhões de judeus mortos no Holocausto, 10% do total. Mas essa comparação sem sentido vem a calhar porque o esquema tático armado pelo técnico Luiz Felipe Scolari — para substituir Neymar e Thiago Silva — parecia uma espécie de Linha Maginot, o sistema de fortificações construído pelos franceses para barrar a invasão alemã.

André Maginot, um ex-combatente da Primeira Guerra Mundial (1914-1918), era o ministro da Guerra em 1927 e tinha certeza de que a Alemanha e a Itália, por causa do Tratado de Versalhes, entrariam em confronto com a França. Ele morreu de uma overdose de ostras estragadas, em 1932, sem ver seu plano executado. Ao preço de 5 bilhões de francos, porém, foi construída uma espécie de muralha da China subterrânea, entre 1930 e 1936, com 100km de extensão, paralela à fronteira franco-germânica. Com suprimentos próprios de energia, munição e alimentos, tinha 108 edificações principais (fortes), a 15km de distância umas das outras, mais construções menores e casamatas interligadas por ferrovia.

Virou um case militar de erro de conceito: os franceses se prepararam para uma "guerra de posições", nas quais a infantaria e a artilharia combateriam entrincheiradas, como na Primeira Guerra Mundial. Mas a invasão alemã, em 1940, apesar de previsível, surpreendeu o Exército francês porque as divisões blindadas contornaram as fortificações pela extremidade oeste, na fronteira com a Bélgica, que declarara neutralidade, e na região de Sedan, próxima a Luxemburgo, onde as fortificações não foram concluídas por falta de recursos. O Exército francês foi cortado ao meio e se rendeu. O mundo assistiu com espanto à queda de Paris e à dramática retirada de ingleses, belgas e franceses encurralados nas praias de Dunquerque.

Ataques-relâmpago
A comparação com o que aconteceu no Mineirão, porém, faz mais sentido por causa dos mortíferos ataques alemães no primeiro tempo, uma blitzkrieg na grande área brasileira, executada aos 10, aos 22, aos 23, aos 24 e aos 29 minutos de jogo. No conceito de "guerra de movimento", a palavra alemã significa guerra relâmpago, para evitar que as forças inimigas tenham tempo de organizar a defesa. Os elementos essenciais são o efeito surpresa, a rapidez das manobras e a brutalidade do ataque, com objetivo de desmoralizar o inimigo e desorganizar suas forças, paralisando os centros de controle. O criador dessa tática militar foi o marechal alemão Eric von Manstein, que foi condenado em Nuremberg por crimes de guerra, mas teve a pena reduzida durante a Guerra Fria e ajudou a Alemanha Ocidental a reorganizar o seu Exército.

Parece que Luiz Felipe Scolari adotou a tática da "guerra de posições", como os franceses. Escalou o time e disse onde cada jogador deveria jogar contra a seleção alemã, como se fosse possível, num jogo de Copa do Mundo, decidir na prancheta como impor o medíocre padrão de jogo da nossa Seleção. Faltou combinar com Müller, Klose (2), Kroos, Khedira e Schürrle (2), como diria Mané Garrincha. Felipão ficou perplexo diante da ofensiva alemã, sem entender o que estava acontecendo. A defesa brasileira, desorientada, perdeu qualquer capacidade de reação. Era o ponto forte do Brasil até a saída de Thiago Silva. O ataque brasileiro, que já era fraco, simplesmente havia deixado de existir, antes mesmo do jogo começar, com a saída de Neymar.

Ao explicar o que aconteceu, Luiz Felipe Scolari preferiu dar destaque ao fato de a Seleção ter chegado a uma semifinal de Mundial pela primeira vez desde 2002. Em 2006 e em 2010, fomos eliminados pela França e, depois, para a Holanda, respectivamente, nas quartas de final. Minimizou a derrota: "O normal era vitória nossa ou deles. São duas grandes equipes. Pelo resultado ser por esse número de gols, ficará para a história", disse. "Tivemos seis minutos em que deu pane geral. Isso não é o que imaginávamos. Vamos trabalhar para montar o time do jogo de sábado, que passa a ser importante e um outro sonho." Que venha a seleção da Holanda!