domingo, 23 de novembro de 2014

Opinião da semana – Aécio Neves.

 “Agora que reconhece, ainda que tardiamente, a existência de corrupção, faço novamente o mesmo convite: presidente, a senhora não acha que está na hora de pedir desculpas ao país pelo que o seu governo permitiu que ocorresse com a Petrobras?"


Aécio Neves, senador (MG) e presidente nacional do PSDB, O Globo, 23 de novembro de 2014.

Ex-diretor da Petrobrás diz que líder do PT no Senado recebeu R$ 1 milhão

• Em delação premiada, Paulo Roberto Costa afirma que Humberto Costa foi destinatário, em 2010, de parte das 'comissões' pagas por empreiteiras a partir de contratos da estatal

Fausto Macedo, Ricardo Brandt - O Estado de S. Paulo

O líder do PT no Senado, Humberto Costa (PT-PE), recebeu R$ 1 milhão do esquema de propinas e corrupção na Petrobrás para sua campanha em 2010, segundo afirmativa do ex-diretor de Abastecimento da estatal Paulo Roberto Costa em um dos seus depoimentos da delação premiada.

O petista integra uma extensa lista de políticos acusados pelo ex-diretor da Petrobrás na delação por meio da qual espera ter sua pena reduzida. Dos depoimentos sigilosos, já vieram à tona outros nomes de supostos beneficiários de dinheiro de propina dos contratos da Petrobrás, como o da ex-ministra da Casa Civil Gleisi Hoffmann, também do PT, o do ex-senador, já morto, Sérgio Guerra, do PSDB, e o do ex-governador de Pernambuco Eduardo Campos, do PSB, que também já morreu.

Gleisi e Campos teriam recebido o dinheiro, por meio de intermediários, para campanhas políticas. No caso de Guerra teria sido para abafar as investigações de uma CPI sobre a Petrobrás instalada no Congresso Nacional no ano de 2009. Gleisi, o PSDB e o PSB negam ter recebido propinas, assim como o líder do PT no Senado.

Empresário. No caso de Humberto Costa, o ex-diretor da estatal disse que o dinheiro foi solicitado pelo empresário Mário Barbosa Beltrão, amigo de infância do petista e presidente da Associação das Empresas do Estado de Pernambuco (Assimpra).

Paulo Roberto Costa disse que o dinheiro saiu da cota de 1% do PP (Partido Progressista),que tinha o controle político da diretoria de Abastecimento da estatal.

Ainda segundo o ex-diretor, outras unidades da companhia foram loteadas para o PT (Serviços) e o PMDB (Internacional). Cada diretoria arrecadava 1% de cada grande contrato.

A Diretoria de Serviços, sob o comando político do PT, realizava todas as licitações das demais unidades e, por isso, o partido recebia outros 2% sobre os contratos da estatal, segundo o ex-diretor de Abastecimento.

Paulo Roberto Costa assumiu o cargo em 2004, por indicação pessoal do então deputado José Janene (PP-PR), que integrava a base aliada do Palácio do Planalto na gestão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Janene, que foi réu no processo do mensalão, morreu em 2010.

Segundo o delator, o PP decidiu ajudar a candidatura de Humberto Costa, razão pela qual teria cedido parte de sua comissão. Paulo Roberto Costa afirmou ainda que, se não ajudasse, seria demitido.

Humberto Costa, o primeiro senador pelo PT de Pernambuco, foi eleito em 2010. Havia exercido antes o cargo de secretário das Cidades de Pernambuco (2007 a 2010) no governo Eduardo Campos e foi ministro da Saúde no primeiro mandato de Lula, de janeiro de 2003 a julho de 2005.

O ex-diretor de Abastecimento da Petrobrás relatou que conheceu Humberto Costa quando ele chefiava o Ministério da Saúde. Em sua delação, disse que “um amigo” de Humberto Costa, o empresário Mário Beltrão, lhe pediu colaboração de R$ 1 milhão para a campanha do petista ao Senado, em 2010.

Ele não soube informar como ocorreu o repasse do dinheiro, mas declarou que o empresário lhe confirmou o pagamento. Disse também que o seu contato era sempre com Mário Barbosa Beltrão, que dirige a Associação das Empresas do Estado de Pernambuco, “entidade sem fins lucrativos” e que anuncia como meta “a prestação de serviços aos seus associados e a defesa dos seus interesses legítimos junto aos órgãos governamentais”.

A associação criou o “Grupo de Trabalho pelo Desenvolvimento de Pernambuco” que promove reuniões mensais “com a participação de empresários, políticos, formadores de opinião, com a finalidade de discutir os problemas de Pernambuco e apontar soluções”.

Parlamentares. A lista de parlamentares que teriam sido beneficiados pelo esquema da Petrobrás, segundo a delação de Paulo Roberto Costa, tem 32 nomes, entre deputados e senadores. Parte das revelações do ex-diretor da estatal petrolífera foi confirmada pelo doleiro Alberto Youssef, antigo parceiro de José Janene – ambos apontados como mentores da Lava Jato. O doleiro está preso na sede da Polícia Federal em Curitiba, base da Lava Jato, desde 17 de março. Paulo Roberto Costa está em regime de prisão domiciliar, em seu apartamento, no Rio.

Caso de políticos está no Supremo. Após cumprir 7 fases, nas quais mirou em doleiros, lobistas, agentes públicos, ex-diretores da Petrobrás e empreiteiros envolvidos na trama de propinas e corrupção na estatal petrolífera, a Operação Lava Jato passará a lidar com políticos citados por dois delatores do caso. Paulo Roberto Costa, ex-diretor de Abastecimento da Petrobrás, por exemplo, apontou 32 parlamentares, entre deputados e senadores, como beneficiários de dinheiro ilícito arrecadado por meio de fraudes em contratos.

O doleiro Alberto Youssef confirmou parte das revelações de Costa. Como os políticos têm foro privilegiado, as denúncias contra eles foram enviadas ao Supremo. Ao homologar o acordo de delação de Costa, o relator da Lava Jato na Corte, ministro Teori Zavascki, anotou: “Há elementos indicativos, a partir dos termos do depoimento, de possível envolvimento de várias autoridades, inclusive de parlamentares federais”.

De: Paulo Roberto Para: Dilma Rousseff

• O doleiro Alberto Youssef disse à Justiça que Lula e Dilma sabiam do esquema de corrupção na Petrobras. Agora, e-mails encontrados pela Polícia Federal em computadores do Planalto mostram que eles poderiam ter interrompido o propinoduto, mas, por ação ou omissão, impediram a investigação sobre os desvios

Robson Bonin e Hugo Marques – Veja

Antes de se revelar o pivô do petrolão, o maior escândalo de corrupção da história contemporânea brasileira, o engenheiro Paulo Roberto Costa era conhecido por uma característica marcante. Ele era controlador e centralizador compulsivo. À frente da diretoria de Abastecimento e Refino da Petrobras, nenhum negócio prosperava sem seu aval e supervisão direta. Como diz o ditado popular, ele parecia ser o dono dos bois, tamanha a dedicação. De certa forma, era o dono — ou, mais exatamente, um dos donos —, pois já se comprometeu a devolver aos cofres públicos 23 milhões de dólares dos não se sabe quantos milhões que enfiou no próprio bolso como o operador da rede de crimes que está sendo desvendada pela Operação Lava-Jato.

Foi com a atenção aguçada de quem cuida dos próprios interesses e dos seus sócios que, em 29 de setembro de 2009, Paulo Roberto Costa decidiu agir para impedir que secassem as principais fontes de dinheiro do esquema que ele comandava na Petrobras. Costa sentou-se diante de seu computador no 19º andar da sede da Petrobras. no Rio de Janeiro, abriu o programa de e-mail e pôs-se a compor uma mensagem que começava assim:

"Senhora ministra Dilma Vana Rousseff...".

O que se segue não teria nenhum significado mais profundo caso fosse rotina um diretor da Petrobras se reportar à ministra-chefe da Casa Civil sobre assuntos da empresa. Não é rotina. Foi uma atitude inusitada. Uma ousadia.

Paulo Roberto Costa tomou a liberdade de passar por cima de toda a hierarquia da Petrobras para advertir o Palácio do Planalto que. por ter encontrado irregularidades pelo terceiro ano consecutivo, o Tribunal de Contas da União (TCU) havia recomendado ao Congresso a imediata paralisação de três grandes obras da estatal — a construção e a modernização das refinarias Abreu e Lima, em Pernambuco, e Getúlio Vargas, no Paraná, e do terminal do Porto de Barra do Riacho, no Espírito Santo. Assim, como quem não quer nada. mas querendo. Paulo Roberto Costa, na mensagem à senhora ministra Dilma Vana Rousseff. lembra que no ano de 2007 houve solução política para contornar as decisões do TCU e da Comissão Mista de Orçamento do Congresso Nacional.

Também não haveria por que levantar suspeitas se o ousado diretor da Petrobras que mandou mensagem para a então ministra Dilma Rousseff fosse um daqueles barnabés convictos, um "caxias"". como se dizia antes nas escolas e no Exército de alguém disposto a arriscar a própria pele em benefício da pátria. Em absoluto, não foi o caso. Paulo Roberto Costa, conforme ele mesmo confessou à Justiça, foi colocado na Petrobras em 2004. portanto cinco anos antes de mandar a mensagem para Dilma. com o objetivo de montar um esquema de desvio de dinheiro para políticos dos partidos de sustentação do governo do PT. Ele estava ansioso e preocupado com a possibilidade de o dinheiro sujo parar de jorrar. É crivei imaginar que em 29 de setembro de 2009 Paulo Roberto Costa, em uma transformação kaíkiana às avessas, acordou um servidor impecável disposto a impedir a paralisação de obras cruciais para o progresso da nação brasileira? É verdade que às vezes a vida imita a arte, mas também não estamos diante de um caso de conversão de um corrupto em um homem honesto da noite para o dia.

O que se tem até aqui, então, pelo encadeamento lógico dos fatos e pelo que já foi revelado pela Operação Lava-Jato. pode ser resumido em quatro pontos principais, sem ser preciso recorrer a nenhuma ilação:

1. Um corrupto foi colocado na Petrobras para montar um esquema de desvio de dinheiro para partidos aliados do governo Lula.

2. O corrupto se mostra muito empenhado em seu ofício, que lhe permite conseguir propinas para os políticos e, ao mesmo tempo, enriquecer.

3. O corrupto se preocupa com a decisão do TCU e do Congresso de mandar cortar os repasses de recursos para as obras das quais ele, o corrupto, tirava o dinheiro para manter de pé o esquema.

4. O corrupto acha melhor alertar as altas autoridades do Palácio do Planalto sobre a iminência da interrupção do dinheiro público que alimentava o propinoduto sob sua responsabilidade direta na Petrobras.

Como se viu. não é disparatado o ditado popular que diz: "Para viver fora da lei, é preciso ser honesto". Portanto, enquanto diretor comprometido com um esquema de propinas, Paulo Roberto Costa foi honesto em dar o alerta geral de que ia faltar dinheiro público na engrenagem da corrupção.

VEJA relatou esses fatos e a interpretação que faz deles a assessores de Dilma no Palácio do Planalto e pediu uma resposta. Ela veio por e-mail: "Em 2009, a Casa Civil era responsável pela coordenação do PAC. Assim, os relatórios e acórdãos do TCU relativos às obras deste programa eram sistematicamente enviados pelo próprio tribunal para conhecimento da Casa Civil. Após receber do Congresso Nacional (em agosto de 2009), do TCU (em 29 de setembro de 2009) e da Petrobras (em 29 de setembro de 2009) as informações sobre eventuais problemas nas obras da Refinaria Abreu e Lima, a Casa Civil tomou as seguintes medidas: encaminhamento da matéria à CGU, em setembro de 2009, para as providências cabíveis; determinacão para que o grupo de acompanhamento do PAC procedesse ao exame do relatório, em conjunto com o Ministério de Minas e Energia e a Petrobras: e a participação em reunião de trabalho entre representantes do TCU, da Comissão Mista de Orçamento, da Petrobras e do MME. após a inclusão da determinação de suspensão das obras da Refinaria Abreu e Lima no Orçamento de 2010. aprovado pelo Congresso. Houve consenso sobre a viabilidade da regularização das pendências identificadas pelo TCU nas obras da Refinaria Abreu e Lima".

Dilma ignorou as perguntas de VEJA sobre o tema principal: a mensagem de Paulo Roberto Costa para ela. Não deu nenhuma explicação. Apreendida pela Polícia Federal nos computadores do Palácio do Planalto em uma operação de corrupção, a mensagem não pode ser varrida para debaixo do tapete. Paulo Roberto se dirige a Dilma Rousseff. na ocasião também presidente do conselho de administração da Petrobras. Ele, o corrupto atualmente preso e depondo em regime de delação premiada, relata problemas e propõe solução política. E qual é a solução política? Qualquer uma que fizesse o dinheiro público continuar jorrando para as obras e, consequentemente, para o esquema de corrupção sem que a Petrobras tivesse de explicar ao TCU e ao Congresso a origem das irregularidades. Ou seja, qualquer uma capaz de impedir a abertura da caixa-preta dos negócios que Paulo Roberto Costa tocava.

A luz de tudo o que se sabe hoje sobre a corrupção na Petrobras no governo Lula, os fatos narrados até aqui pintam um quadro de extrema gravidade. Do ponto de vista da lógica mais básica, a única saída para Lula e Dilma é a mais clássica de todas as desculpas: o desconhecimento total do esquema de Paulo Roberto Costa na Petrobras. onde ele atuou honestamente fora da lei por oito anos — com Lula ou Dilma na Presidência da República. Essa saída tem problemas. Primeiro, o doleiro Alberto Youssef, o caixa do petrolão, disse à Justiça que Lula e Dilma sabiam de tudo. O depoimento do doleiro foi dado no regime de delação premiada, o que coloca sobre os ombros dele o ônus da prova. Se mentir, ele se complica e não terá acesso aos benefícios previstos em lei para os acusados que colaboram com a Justiça. No caso de Youssef, a delação premiada, se homologada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), é essencial. Sem ela. só pelos crimes já capitulados, ele pode ser condenado a 300 anos de prisão. Youssef pode ter mentido mesmo assim? Pode. mas é altamente improvável que ele se tenha colocado voluntariamente em situação de tão alto risco. Segundo. Lula e Dilma teriam de ser os mais mal informados personagens da República para não saberem das atividades paralelas de Paulo Roberto Costa.

Lula o chamava carinhosamente de "Paulinho". No dia em que Paulinho mandou a mensagem para a ministra Dilma, Lula estava embarcando para Copenhague, na Dinamarca, para acompanhar a escolha do Rio de Janeiro como sede olímpica de 2016. Quando voltou, o presidente encontrou ainda sem "solução política" o caso da interrupção das obras da Petrobras. Deu-se então o desfecho que. como toda essa história. é suspeito à luz do que se sabe hoje. mas inócuo antes de estourar o esquema do petrolão. Lula se encheu de coragem e. pela primeira vez em uma questão orçamentária, usou seu poder de veto para passar por cima do TCU e do Congresso Nacional, reabrindo os cofres para as obras. Paulinho, claro, deve ter ficado felicíssimo com a solução dada pelo presidente. A Petrobras deu uma banana para os órgãos que pretendiam fiscalizá-la mais a fundo ou, pelo menos, receber uma mísera explicação sobre as irregularidades encontradas e como a empresa pretendia corrigi-las e impedir que viessem a ocorrer novamente no futuro.

O veto presidencial pôs uma pedra sobre o problema e ainda deu ensejo a uma mudança na lei restringindo os poderes da Comissão de Orçamento do Congresso, que só pode agora paralisar obras suspeitas caso isso não provoque "impactos sociais, econômicos e ambientais". Os corruptos do petrolão agradeceram a iniciativa, pois, e isso é incrível, a mudança na lei feita por Lula os favoreceu diretamente. Pode ser apenas mais um caso da implacável sina dos efeitos indesejáveis e imprevistos. É ótimo que obras públicas bilionárias não mais sejam paralisadas por pequenas irregularidades flagradas pelo TCU — mas, obviamente, é totalmente inaceitável que a nova lei não embuta salvaguardas para evitar o favorecimento de corruptos. Castigo mesmo para os desonestos seria obrigá-los a fazer as obras, sem prejuízo das punições a que se sujeitem por desvio de dinheiro e outros crimes.

Durante oito meses, a equipe do ministro Aroldo Cedraz, que assume a presidência da corte em dezembro, se debruçou sobre os custos de Abreu e Lima. A construção da refinaria estava ainda na fase de terraplenagem, mas os indícios de superfaturamento já chegavam aos 100 milhões de reais. A Petrobras, porém, se recusava a esclarecer as dúvidas. O ministro chegou a convocar o então presidente da companhia, Sergio Gabrielli, para explicar o motivo do boicote. Depois de lembrado que poderia sofrer sanções se continuasse a se recusar a prestar esclarecimentos, Gabrielli entregou 10 000 folhas de planilhas ao tribunal. Para a surpresa dos técnicos, as informações não passavam de dados sem nenhuma relevância.

Em uma derradeira tentativa, os técnicos do tribunal realizaram uma diligência na Petrobras. Descobriram algo ainda mais inacreditável sobre os parâmetros praticados para calcular o preço das obras: na maior estatal brasileira, não havia parâmetro algum. Os valores dos serviços eram fixados aleatoriamente por um grupo restrito de pessoas que se reunia numa sala secreta, no 19e andar do edifício-sede da empresa, no Rio de Janeiro. O procedimento normal seria a Petrobras realizar um levantamento prévio no mercado para ter um referencial de custos. Mas nem os servidores da área de licitação tinham acesso ao que era decidido pela diretoria. Diante desse enigma, os técnicos anotaram no relatório: "Nenhum dirigente da Petrobras ou qualquer outra pessoa que não trabalhe naquele andar tem informações sobre a estimativa secreta (...) É uma completa despreocupação com custos". Não restava ao TCU outra alternativa senão recomendar à Comissão Mista de Orçamento do Congresso a paralisação imediata das obras. Quem despachava na sala secreta do 199 andar era o diretor Paulo Roberto Costa. Foi de um dos computadores daquele andar que partiu a mensagem de alerta para a ministra Dilma. A conclusão a que esses fatos conduzem é de assustadora simplicidade. Por razões que precisam ser diligentemente apuradas, Lula e Dilma usaram seu poder — ou deixaram de usá-lo — de uma maneira que, ao fim e ao cabo, favoreceu o grupo que extraía propinas de obras da Petrobras. É grave se o fizeram por desinformação sobre o que se passava nas entranhas da Petrobras. É indesculpável se delegaram a outros a apuração das denúncias — e nunca cobraram os resultados. Qualquer outra hipótese pode levar a consequências impensáveis.

Os comprometidos e os inconfiáveis
O advogado Claudismar Zupiroli era encarregado da defesa dos gestores da Petrobras quando o Tribunal de Contas da União começou a detectar as primeiras irregularidades na obra da Refinaria Abreu e Lima. Na mensagem apreendida nos computadores do Planalto, ele apresenta a Gilberto Carvalho, então chefe de gabinete do presidente Lula. uma extraordinária solução para os problemas do governo: indicar para o TCU pessoas "comprometidas" ideologicamente com o governo - e recomenda Erenice Guerra, então braço-direito de Dilma Rousseff na Casa Civil. Erenice Guerra seria hoje ministra de Contas se não fosse a descoberta de que ela usava o cargo no Palácio do Planalto para facilitar negócios que beneficiavam sua família. Os ministros Augusto Nardes, Aroldo Cedraz. Raimundo Carreiro e José Jorge, segundo ele, não se identificavam com as "práticas ousadas de aplicação de recursos que marcam este governo"". Nomear aliados poderia evitar uma futura "inelegibilidade de companheiros(as) em face da rejeição de contas"

A corrupção institucionalizada

O crime
Em acordo de delação com a Justiça, Paulo Roberto Costa confessa seu envolvimento e revela que assumiu cargo na Petrobras, em 2004, já com o objetivo de operar o esquema de corrupção envolvendo políticos aliados ao governo Lula.

O alerta
Em setembro de 2009, o Tribunal de Contas da União detectou irregularidades na Refinaria Abreu e Lima, alertou sobre indícios de superfaturamento e manipulação de preços e pediu a paralisação da obra.

A omissão
No mesmo dia, Paulo Roberto Costa envia uma mensagem a Dilma Rousseff, no Planalto, preocupado com a decisão do Tribunal de Contas. Recomenda, incluindo parecer jurídico, uma solução política para o problema. A única ação concreta da ministra foi pedir à CGU que investigasse as denúncias

A ação
0 presidente Lula vetou a decisão do Congresso de paralisar as obras com suspeita de irregularidades e, assim, permitiu que o esquema continuasse operando e desviando dinheiro aos partidos do governo

A "investigação"
Em 2012, três anos depois, a CGU anuncia o resultado da investigação iniciada em 2009 a pedido de Dilma: não investigou nada devido às divergências de procedimento do TCU

A revelação
Em acordo de delação, o doleiro Alberto Youssef confessa seus crimes e diz à Polícia Federal e ao Ministério Público que Lula e Dilma sabiam de tudo

Dinheiro desviado abasteceu "caixa 1" das campanhas de PT, PMDB, PP e PTB

• Delegados e procuradores da operação Lava Jato concluem que os partidos foram usados como lavanderias do esquema de corrupção instalado na Petrobras e farão uma devassa na prestação de contas da campanha eleitoral.

Claudio Dantas Sequeira e Mário Simas Filho - IstoÉ

CURITIBA (PR) - Não é novidade que recursos públicos surrupiados por intermédio de obras superfaturadas, empresas de fachada e outras modalidades de corrupção acabem abastecendo o chamado caixa 2 das campanhas políticas. Essa é uma prática condenável e recorrente no Brasil. Agora, o que a Operação Lava Jato descobriu é que PT, PMDB, PP e PTB usaram a contabilidade oficial, o caixa 1 das campanhas eleitorais, para receber milhões de reais desviados da Petrobras. Para chegar a essa conclusão, os delegados e procuradores que participam das investigações tomaram conhecimento de centenas de movimentações bancárias no Brasil e no exterior, analisaram documentos que veem sendo apreendidos desde março e ouviram os depoimentos de empreiteiros, ex-diretores e ex-funcionários da estatal.

"Estamos diante de um crime gravíssimo, que transforma os partidos políticos em autênticas lavanderias de dinheiro ilegal", disse à ISTOÉ, na tarde da terça-feira 18, uma das autoridades com acesso a toda investigação. "A situação (investigação) coloca em xeque inclusive as doações eleitorais legalmente registradas, que podem indicar uma forma estruturada de lavagem de dinheiro", atesta um relatório analítico da Polícia Federal, elaborado pela Delegacia de Repressão a Crimes Financeiros ao qual ISTOÉ teve acesso. Com essa descoberta, a Operação Lava Jato irá abrir mais uma frente de investigação e promover uma devassa nos cofres dos partidos envolvidos. É essa futura investigação a responsável por elevar às alturas a temperatura no Palácio do Planalto e no comando dos partidos aliados na última semana.

A força-tarefa montada pela Lava Jato tem como fazer uma apuração nas contas de campanhas muito mais aprofundada do que rotineiramente é feito pelo Tribunal Superior Eleitoral. De acordo com os delegados e procuradores, a estratégia de usar o cofre oficial dos partidos para colocar nas campanhas o dinheiro desviado de estatais teve início depois de revelado o escândalo do mensalão e ganhou força nas disputas eleitorais de 2010 e 2014. Os relatos feitos por diretores de empreiteiras presos na semana passada indicaram que as doações para as campanhas eram feitas diretamente pelos tesoureiros ou operadores dos partidos, que tinham acesso ao doleiro Alberto Youssef e a contas mantidas no exterior, particularmente na Suíça e na Holanda. Os recursos eram sempre remetidos às legendas e nunca para candidatos pré-estabelecidos. Dessa forma fica mais difícil o rastreamento desse dinheiro. Às empreiteiras apenas era informado o valor que deveriam declarar como doação oficial a ser registrada no TSE. "O dinheiro do sobrepreço pago pela Petrobras já estava depositado em contas indicadas pelos operadores dos partidos e não tínhamos acesso a esses recursos. Eles apenas diziam quanto teríamos que declarar à Justiça Eleitoral", disse aos delegados o diretor da divisão de engenharia da Galvão Engenharia, Erton Medeiros Fonseca, na tarde da segunda-feira 17. Discurso semelhante foi feito por Idelfonso Colares Filho, ex-diretor da Queiroz Galvão. No mesmo dia, Othon Zanoide de Morais, diretor da Vital Engenharia – empresa do grupo Queiroz Galvão –, repetiu a versão apresentada por Fonseca e Medeiros. Os três também confirmaram doações feitas para o PT, PMDB e PP, através de João Vaccari Neto, o tesoureiro petista; Fernando Soares, que falava em nome do PMDB, e Youseff, que depois da morte do deputado José Janene passou a atuar pelo PP. Sobre o PTB, dois delegados afirmaram à ISTOÉ que a operação é semelhante, mas os nomes denunciados ainda são mantidos sob sigilo. Na quarta-feira 19, Ricardo Ribeiro Pessoa, presidente da UTC, também admitiu ter assumido o repasse oficial de recursos para PMDB, PP e PT.

Os depoimentos colhidos na última semana reforçam, segundo a PF, o que já fora dito em delação premiada pelo ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa e descrito em um relatório de análise da Delegacia Regional de Combate ao Crime Organizado a respeito das investigações promovidas sobre empresas do grupo OAS e suas relações com o doleiro Alberto Youssef. "A empresa abriga em seus quadros funcionários envolvidos com o desvio de recursos para enriquecimento ilícito próprio e pagamento de despesas com campanhas eleitorais de partidos políticos", diz o documento. Há, ainda, documentos apreendidos pela Operação Lava Jato que, segundo os relatórios produzidos pela Polícia Federal, confirmam o uso do dinheiro desviado da Petrobras para alimentar o caixa oficial das campanhas. Na casa de Costa, a Polícia apreendeu uma agenda contendo uma planilha que relaciona o nome de empreiteiras, o contato dentro da empresa e, em uma terceira coluna, a situação da empresa. No relatório redigido pela Delegacia de Repressão a Crimes Financeiros, que investigou a agenda do ex-diretor da Petrobras, os delegados concluem que: "Embora não seja possível precisar a qual campanha se refira o documento, é possível estabelecer que o grupo atuasse também ocultando repasse de valores por meio de doações legais de campanha". Essa semana, parte dos policiais envolvidos na Operação começaram a fazer o confronto de rastreamentos bancários recebidos do exterior com as doações oficiais feitas para as campanhas políticas. É muito dinheiro para ser seguido (leia quadro na pág. 37). Desde o início da Operação, a PF e o Ministério Público têm monitorado as doações feitas por Camargo Corrêa, UTC e Mendes Júnior, dentre outras.

Se a devassa a ser promovida nos cofres partidários confirmarem as conclusões a que já chegaram os delegados e procuradores que comandam a Operação Lava Jato, legendas gigantes como PT e PMDB poderão, dentre outras coisas, perder o acesso aos milionários recursos do Fundo Partidário. Mais que isso, se as investigações forem concluídas até o fim do ano – o que delegados e procuradores consideram praticamente impossível – não se pode descartar a possibilidade de o TSE vir a impedir a diplomação da presidente reeleita. Por essa razão, o Palácio do Planalto não esconde a insatisfação com o ministro Dias Toffoli, presidente do TSE. Os principais líderes petistas sustentam que Toffoli nada fez para impedir que as contas da campanha da presidente Dilma Rousseff fossem examinadas pelo ministro Gilmar Mendes, tido como desafeto do PT.

O receio fez com que o Planalto estimulasse o Ministério Público Eleitoral para questionar a permanência de Mendes na fiscalização das finanças eleitorais do PT. A movimentação no TSE que tanto preocupa o Planalto teve início na quinta-feira 13, com o fim do mandato do ministro Henrique Neves. Era ele o relator do processo sobre as contas da campanha de Dilma Rousseff deste ano, mas deixou a Corte antes de iniciar a análise do caso. No mesmo dia, houve um novo sorteio de relator e Gilmar Mendes assumiu o processo. Horas depois de assumir como relator, o ministro determinou que sua assessoria examinasse as contas apresentadas pela campanha. A disposição de Mendes inicia uma nova fase da Justiça Eleitoral. Em anos anteriores, as contas dos candidatos eleitos eram analisadas por amostragem e em tempo curto demais, que duravam, no máximo, uma semana.

Pela lei, as contas devem ser analisadas até o dia 17 de dezembro do ano da eleição. Se irregularidades graves forem encontradas, os ministros podem impedir a diplomação do eleito no dia 18. Segundo técnicos da Corte ouvidos por ISTOÉ, tradicionalmente a análise da prestação de contas da campanha presidencial é feita tão rapidamente que inviabiliza a consolidação de provas sobre irregularidades que venham a ser encontradas. Em 2010, apesar do prazo curto, os técnicos detectaram irregularidades na prestação de contas da então candidata eleita Dilma Rousseff, como empresas doadoras abertas no ano eleitoral e pessoas físicas doando acima do limite permitido. Na época, o ministro Marco Aurélio Mello ressaltou a falta de tempo para analisar as notas fiscais da campanha e sugeriu o adiamento da votação sobre as contas. Os ministros alegaram que poderia ocorrer instabilidade jurídica e decidiram aprová-las, apesar das ressalvas sobre as irregularidades. Agora, o temor dos petistas é que Mendes faça uma parceria com os delegados e procuradores da Operação Lava Jato e possa, assim, rapidamente esquadrinhar as entranhas da contabilidade eleitoral do partido. Na quinta-feira 20, o ministro pediu ajuda de técnicos do TCU, da Receita Federal e do Banco Central para analisar as contas de campanha de Dilma.

Este ano, Gilmar Mendes pretende evitar que a votação ocorra sem tempo para a devida análise pelos ministros do teor das prestações de contas. Por isso, colocou a própria equipe do gabinete para analisar quem são os doadores da campanha da presidente. De acordo com técnicos, a orientação do ministro é para que qualquer irregularidade seja detalhada e comprovada em pareceres consistentes, distribuídos aos ministros dias antes da votação em plenário. O ministro já admitiu que sua equipe vai se debruçar especialmente nas doações realizadas por empreiteiras envolvidas na Operação Lava Jato, que abasteceram as campanhas eleitorais. As empresas investigadas doaram R$ 60,4 milhões aos candidatos presidenciáveis na última eleição, sendo que R$ 47,8 milhões foram entregues para a campanha de Dilma. A arrecadação da campanha da petista registra ainda que 20% do total recebido partiu diretamente das empreiteiras OAS e UTC Engenharia, que doaram R$ 20 milhões e R$ 5 milhões, respectivamente, e cujos dirigentes que autorizaram os repasses estão na cadeia. Independentemente de qualquer parceria com a Operação Lava Jato, a equipe de Gilmar Mendes se dedica a levantar os números das doações e os detalhes dos contratos que essas empresas ainda mantêm com o governo. Somente neste ano, R$ 2,3 bilhões estão previstos para serem repassados a essas construtoras. Em contrapartida, as doações realizadas pelas nove empresas investigadas somaram mais de R$ 218 milhões somente nesta eleição.

Fundos de Pensão também têm clube para negócios suspeitos

• Lava-jato levanta suspeita sobre articulação política de fundos de pensão

Alexandre Rodrigues e Daniel Biasetto - O Globo

Escândalos em série

O clube do amém

O "clube" de empreiteiras descrito por investigados nos processos decorrentes da Operação Lava-Jato não é a única consequência do aparelhamento político de estatais como a Petrobras. Os fundos de pensão de funcionários de estatais e servidores públicos, que administram juntos um patrimônio de mais de R$ 450 bilhões, são descritos como integrantes do chamado "Clube do Amém", apelido dado por participantes e funcionários dessas entidades que encaminharam denúncias de má gestão à Polícia Federal, ao Ministério Público Federal e à Superintendência Nacional de Previdência Complementar (Previc), órgão regulador do setor. As denúncias apontam o direcionamento de investimentos dessas entidades fechadas de previdência complementar para negócios suspeitos, em que geralmente dividem com outras fundações do setor público prejuízos milionários.

Investigadores da Lava-Jato já encontraram indícios de ramificações do esquema do doleiro Alberto Youssef em fundos de pensão. Em outubro, o advogado Carlos Alberto Pereira Costa, um dos principais auxiliares de Youssef, disse em depoimento que o tesoureiro do PT, João Vaccari Neto, frequentou uma empresa em São Paulo entre 2005 e 2006 para tratar de negócios com fundos de pensão com um operador do doleiro. Carlos Alberto Costa menciona, ainda, um suposto pagamento de propina a dirigentes da Petros, fundo de pensão dos funcionários da Petrobras. A PF também encontrou e-mails em computadores de pessoas ligadas a Youssef atribuindo à influência de Vaccari a aplicação, em 2012, de R$ 73 milhões das fundações Petros e Postalis, este último dos funcionários dos Correios, na empresa Trendbank, que administra fundos de investimentos, causando prejuízos às fundações. Vaccari negou as acusações. Também em 2012, o Postalis teve prejuízo ao aplicar R$ 40 milhões num fundo no banco BNY Mellon, por meio de uma gestora de investimentos indicada a dirigentes da fundação por operadores de Youssef.

No início deste mês, em novo depoimento à Justiça, Alberto Youssef afirmou que Carlos Habib Chater, dono de postos de combustíveis em Brasília que distribuiu propinas a políticos em nome dele, também opera com outro doleiro, Fayed Traboulsi. Uma das vertentes da Lava-Jato apura possíveis relações financeiras e societárias entre Youssef e Traboulsi, investigado na Operação Miqueias, em 2013. Essa investigação da PF desvendou um esquema de lavagem de dinheiro e má gestão de recursos de entidades previdenciárias públicas envolvendo principalmente investimentos em papéis relacionados ao banco BVA, que sofreu intervenção do Banco Central em 2012 e teve a falência decretada este ano. Traboulsi foi apontado como o dono da Invista Investimentos Inteligentes, que intermediou aplicações de vários fundos de pensão, principalmente de prefeituras, no BVA.

BVA atraiu muitos fundos
A quebra do BVA é um dos exemplos mais recorrentes nas denúncias de participantes dos fundos de pensão sobre o direcionamento de investimentos da entidade por personagens como Traboulsi e Youssef por meio de conexões políticas. Cerca de 70 fundos de pensão investiram R$ 2,7 bilhões no BVA e perderam pelo menos R$ 500 milhões com a derrocada do banco, cujo crescimento exponencial em pouco tempo estava justamente na capacidade de atrair investimentos das entidades de previdência do setor público. A concentração de recursos dos fundos de pensão não era tão visível porque se desdobrava numa enorme teia de operações indiretas, que terminavam até em aplicações deles no capital do próprio banco.

É o caso da aplicação das fundações Serpros, dos funcionários do Serviço Federal de Processamentos de Dados, e Refer, dos empregados da Rede Ferroviária Federal no Fundo de Investimento em Participações (FIP) Patriarca - que, por sua vez, detinha 24% das ações do BVA. Após a liquidação do banco, o Serpros teve uma perda de 97% das cotas de R$ 50 milhões que havia aplicado nesse fundo. Já a Refer perdeu aproximadamente R$ 40 milhões.

Uma denúncia enviada pela Associação dos Aposentados e Pensionistas do Serpros (Aspas) e pela Associação Nacional dos Participantes de Fundos de Pensão (Anapar) à Previc no ano passado sobre o caso BVA aponta "uma possível articulação entre os fundos para a realização de aplicações nem sempre de acordo com o interesse dos participantes". As entidades estimaram que, dos R$ 146 milhões aplicados pelo Serpros no Patriarca e em outros fundos do BVA, sobraram cerca de R$ 20 milhões. E estranharam semelhanças dos investimentos como os da Refer.

O secretário de Finanças do Sindicato dos Empregados de Previdência Privada do Rio (Sindepperj), Aristótelis Arueira, coleciona outros casos de FIPs ligados ao BVA que deram prejuízos a vários fundos de pensão. Ele relacionou pelo menos sete numa denúncia que encaminhou para a Delegacia de Repressão a Crimes Financeiros (Delefin) da PF no Rio, que abriu um inquérito para investigar a Refer. Segundo ele, a Refer integra um grupo de fundos que têm seus investimentos direcionados pelos partidos que controlam as estatais que os patrocinam. No caso da Refer, os gestores são indicados por PR e PT:

- O caso BVA mostra uma lista de fundos idêntica àquela que também foi investigada no escândalo do mensalão. De lá para cá, nada mudou. O aparelhamento continua o mesmo: políticos indicam dirigentes e ficam de Brasília indicando em que operações os fundos devem entrar. E os gestores dizem "Amém". Se o fundo perde, alguém ganha na outra ponta.

Participantes formam grupo para combater aparelhamento

• Representantes dos funcionários das estatais se queixam da previc por fiscalização lenta e ineficaz

As suspeitas de uma articulação política para direcionar fundos de pensão levantadas pela Lava-Jato coincidem com as denúncias de funcionários de estatais que contribuem para essas entidades. Um grupo de participantes de Petros (Petrobras), Postalis (Correios), Funcef (Caixa Econômica Federal) e Previ (Banco do Brasil) realizou um encontro em São Paulo no último dia 12 para trocar informações e reforçar a participação nos órgãos de fiscalização das fundações para combater a ingerência política. Eles pretendem realizar um fórum com participantes de vários fundos no início de 2015.

Uma das integrantes do grupo, a presidente da Associação de Funcionários dos Correios (Adcap), Maria Inês Capelli, reclama da lentidão da Previc, reguladora do setor, à qual entregou um pedido de intervenção no Postalis. Ela denunciou como causa de prejuízos o aparelhamento político da fundação, dominada por PT e PMDB. A fundação coleciona operações controversas, como a perda de R$ 190 milhões com papéis lastreados em títulos de dívida da Argentina e a compra de notas relacionadas à dívida externa da Venezuela. Segundo Maria Inês, o Postalis acumula déficit atuarial de R$ 2,7 bilhões desde 2013:

- É como perder R$ 10 milhões por dia. Os trabalhadores dos Correios estão apavorados com as aposentadorias em risco. É preciso acabar com o aparelhamento político que toma conta dos Correios e do Postalis.

A presidente da Associação dos Participantes de Fundos de Pensão, Cláudia Ricaldoni, discorda:

- A Previc tem tomado bastante cuidado com todas as denúncias. Não concordo com os que acham que o órgão é lento e irregular em suas fiscalizações.

A Previc informou que, "como autarquia de supervisão, não trata publicamente de situações específicas, em face da necessária preservação de fatos e dados".

Para Silvio Sinedino, presidente da Associação dos Engenheiros da Petrobras e um dos conselheiros eleitos da Petros, tudo indica que os interessados em lesar os fundos preferem pequenas operações divididas entre várias entidades, que são mais difíceis de rastrear e chamam pouca atenção. Ele explica que, em vários fundos, gestores podem movimentar até 5% do patrimônio sem autorização do conselho deliberativo.

- Essa regra dá uma liberdade enorme, principalmente em fundos grandes. O equivalente a 5% num patrimônio como o da Petros é R$ 4 bilhões. Conseguimos aprovar mudança no estatuto e baixar isso para 0,5%, mas mesmo assim isso significa R$ 400 milhões. É muito dinheiro - diz.
Para Sinedino, só uma orientação externa explica o investimento de R$ 100 milhões de Postalis e Petros em debêntures lastreadas em matrículas da Universidade Gama Filho, no Rio, que fechou as portas em 2013 descredenciada pelo MEC. A universidade já estava mergulhada em dívidas e havia sido recusada por dois grandes grupos educacionais.

O currículo de alguns gestores dos fundos alimenta as denúncias de aparelhamento. Vários já passaram por outras fundações com indicações políticas ou de sindicatos ligados à Central Única dos Trabalhadores (CUT). Desde o início do governo Lula, em 2003, ex-integrantes do sindicato dos bancários de São Paulo dominam os principais fundos: Previ, Petros, Funcef e Postalis. João Vaccari Neto, o tesoureiro do PT, é originário desse grupo, assim como Wagner Pinheiro, ex-presidente da Petros e atual presidente dos Correios, que indicou o presidente do Postalis, Antonio Carlos Conquista. Este, por sua vez, já foi gestor da Petros e da Fundação Geap (de servidores federais).

Fundos negam coordenação
Procurados pelo GLOBO, Petros, Postalis, Funcef, Refer e Serpros negaram ter negócios ligados aos doleiros Alberto Youssef e Fayed Traboulsi ou participar de qualquer grupo coordenado de entidades para fazer investimentos parecidos. A Refer disse ter sido informada da abertura de inquérito pela PF, ainda em fase inicial, mas atribuiu as denúncias do Sindepperj a uma "guerrilha" que seus integrantes estariam promovendo em busca de cargos na fundação e em outros fundos de pensão. A Refer afirmou que move processos judiciais contra dirigentes do sindicato. O Serpros informou que aguarda na Justiça a chance de reaver os investimentos no Fundo Patriarca e argumenta que não havia "nenhum indicativo que desaconselhasse a operação" quando da análise do investimento. Ainda segundo o Serpros, foram investidos no BVA apenas 2% do patrimônio da fundação, dentro do limite interno estabelecido.

A Petros negou operações relacionadas a Alberto Youssef e afirmou que todos os seus investimentos passam por análises técnicas internas e, no caso de títulos de crédito, exigem avaliações externas e garantias. De qualquer forma, está reavaliando processos. A entidade argumenta que, por se tratarem de grandes investidores de longo prazo, é comum que fundos de pensão privados e estatais participem de um mesmo investimento. Argumento parecido foi usado pelo Postalis, que também negou aparelhamento político. Segundo a fundação, a indicação de seus gestores é feita pelos Correios com base em critérios técnicos. A Funcef afirmou que possui "um modelo de governança exemplar no setor previdenciário" e que não tem atualmente entre seus gestores oriundos de outros fundos.

Denúncias alimentam protestos contra PT

• Grupos que organizam atos pedirão queda da diretoria da Petrobras. Manifestações ocorreram em 11 capitais

- O Globo

RIO - Grupos que têm organizado manifestações contra o governo Dilma planejam focar a crítica dos próximos atos nos escândalos envolvendo a maior estatal brasileira, a Petrobras, alvo da Operação Lava-Jato, da Polícia Federal. A próxima manifestação está prevista para 29 deste mês, e manifestantes pedirão que a direção da empresa seja substituída. No sábado da semana passada foram registrados pequenos atos contra o governo em dez capitais, além do DF. A maior mobilização ocorreu em São Paulo, onde cerca de 10 mil pessoas com diferentes demandas protestaram contra o governo, segundo a PM.

Nas duas semanas que antecederam o segundo turno das eleições presidenciais, o PSDB articulou dezenas de atos a favor de Aécio e contra o governo pelo país, em estratégia para tentar reaver o clima das manifestações de junho de 2013, que atraiu milhares às ruas. A estratégia não foi suficiente para virar a disputa presidencial. Ainda assim, parte desta “nova militância” continuou protestando contra Dilma.

Embora o PSDB não participe mais diretamente da organização dos eventos, alguns de seus dirigentes os apoiam na crítica ao governo, mas não no pedido de retorno de militares ao poder. O partido divulgou, inclusive, nota explicitando esta posição. O candidato derrotado a vice-presidente, o senador Aloysio Nunes (PSDB-SP), foi um dos presentes no último ato de São Paulo.

Contra o ‘bolivarianismo’
No Rio Grande do Sul, o grupo que defende o impeachment da presidente Dilma Rousseff é coordenado por parlamentares do PP. Com rostos pintados de verde e amarelo e cartazes pretos em que pediam o impeachment da presidente, os manifestantes criticaram uma suposta tentativa de “bolivarianismo” por parte do governo federal - uma referência a alguns governos de esquerda na América do Sul — e pediam o fim da corrupção.

De acordo com um dos organizadores da manifestação, Marcel Van Haten, suplente de deputado estadual pelo PP, o movimento não tem caráter partidário.

- Faz parte da democracia. Pretendemos mostrar para o governo que existe oposição na sociedade, e não apenas no Congresso, e que a população está indignada com as notícias sobre a corrupção - disse.

O ato contou também com a presença da vereadora Mônica Leal (PP) e da filha da ex-governadora Yeda Crusius (PSDB), Tarsila Crusius.

O perfil e a quantidade de pessoas atraída às ruas hoje é semelhante ao do movimento “Basta”, que, em 2006, protestou contra o então presidente Lula, em ambiente ainda impactado pela descoberta do mensalão.

Em São Paulo, um dos organizadores dos atos atuais contra o governo é Marcello Reis, do “Revoltados on line”. Na última semana, o grupo divulgou o número de uma conta bancária para pedir apoio. A ideia é abrir um site para receber assinaturas de pessoas que desejam o impeachment de Dilma, com cópia de título de eleitor.

- Estamos nos reunindo para ganhar mais corpo. Queremos o impeachment da presidente, acreditamos que a eleição pode ter sido fraudada - afirma o militante.

Em Belo Horizonte, os participantes de atos têm trocado mensagens por celular e se reunido para traçar estratégias. As manifestações têm sido pacíficas, e a intenção dos organizadores é que continue assim.

- Não há mascarado ou caso de violência. Aparecem famílias, casais, casais com filhos pequenos - afirma um dos engajados do movimento, o estudante de Direito da PUC Caio Marczuk, que protesta contra as denúncias de corrupção envolvendo o governo federal, a falta de comprovação impressa do voto na urna eletrônica e o apoio do Brasil aos governos de Cuba e Venezuela.

- Essas são manifestações espontâneas, não são conduzidas por líderes ou sindicatos. Terminada a eleição, constata-se que muita gente passou a gostar de política - diz o mineiro Gabriel Azevedo, que atualmente não participa dos atos, mas foi um dos principais organizadores dos atos pró-Aécio.

- Os eventos são promovidos por redes distribuídas. A desorganização possibilita a entrada de estranhos, que não são muito afeitos à democracia. Mas isso não quer dizer que todos aqueles que estão ali pensam dessa forma - continua Azevedo, referindo-se a alguns manifestantes que defenderam a volta do regime militar durante os atos.

No Rio, militantes descontentes com o atual governo têm se reunido na Praça Tiradentes, no Centro da cidade. Integrantes também pedem a deposição da presidente e falam em eventos de “caras pintadas versão 2014”. A mobilização se dá principalmente pelo Facebook. Eles esperam reunir gente para gritar contra Dilma em 1º de janeiro, data da posse da presidente reeleita.

A hora de a onça beber água - O Estado de S. Paulo - Editorial

Dias atrás o presidente da República interino, Michel Temer, questionado pelos jornalistas sobre a última fase então deflagrada da Operação Lava Jato, da Polícia Federal (PF), respondeu o que lhe cumpria dizer: "O governo está tranquilíssimo". Puro despiste. A prisão de vários presidentes e executivos de grandes empreiteiras, bem como do ex-diretor da Petrobrás Renato Duque, ligado ao PT, no âmbito das investigações sobre a corrupção na maior empresa estatal brasileira, abre caminho para o que poderá ser a fase final das investigações, aquela que envolve no escândalo a participação de figurões da República: políticos e autoridades governamentais. É mais fácil de acreditar que hoje em Brasília haja muito mais gente perdendo o sono do que "tranquilíssima". A razão é óbvia.

A Operação Lava Jato indiciou e prendeu, inicialmente, operadores do esquema de corrupção, aqueles que fazem a intermediação entre quem fornece e quem recebe o dinheiro sujo. Em seguida foram indiciados, e presos - com a estrondosa repercussão que era de esperar -, dirigentes das empreiteiras suspeitas de participarem do esquema. Está faltando agora colocar em cena os integrantes da outra ponta do processo de corrupção: aqueles que embolsaram a propina, em benefício próprio ou de quem representam, ou seja, os partidos políticos. Será certamente mais um importante teste para a solidez das nossas instituições democráticas.

Considerando que é improvável que petistas de alto coturno - e gente importante de outros partidos da "base aliada" e até mesmo da oposição - não estejam envolvidos no escândalo, a expectativa de reações exacerbadas justifica-se pelos precedentes. Antes de o STF condenar José Dirceu & Cia. à prisão no processo do mensalão, Lula, ainda presidente da República, anunciou que quando deixasse o poder se dedicaria a "desmontar a farsa do mensalão". Nunca se desdisse. Depois da condenação, estimulado pelos dirigentes, o PT saiu às ruas e às redes sociais com a faca nos dentes para enaltecer o heroísmo dos "guerreiros do povo brasileiro" que estavam sendo injustamente punidos por um tribunal "de exceção" comprometido com a elite e exigir a "imediata anulação" do julgamento.

Quando o partido no poder entende que seus militantes estão sempre acima de qualquer suspeita e tudo o que fazem, por mais condenável que seja pelos padrões "burgueses", é feito sempre "em nome do povo", sobram motivos para temer pelas instituições democráticas. Principalmente no momento em que, por ter saído vencedor de um pleito presidencial por estreita margem de votos, os petistas têm todas as razões para temer pela continuidade de seu projeto de poder.

No escândalo da Petrobrás os políticos mais importantes estão até agora relativamente preservados porque parlamentares ou ministros de Estado se beneficiam de foro privilegiado. Até mesmo para que esses políticos possam ser investigados pela PF é necessário que a autoridade policial protocole o pedido de autorização no STF e aguarde que o ministro designado para o caso analise e, se assim o entender, libere a investigação. Foi por essa razão que, quando nos depoimentos colhidos nos inquéritos da Lava Jato começaram a surgir nomes de parlamentares, a PF teve de solicitar autorização do STF para prosseguir nas investigações, o que foi concedido pelo ministro Teori Zavascki.

O instituto do foro especial por prerrogativa de função é consagrado nas sociedades modernas e democráticas como recurso para garantir à autoridade pública o exercício de suas responsabilidades a salvo de armadilhas eventualmente tramadas por adversários políticos. É claro que a medida da confiança da sociedade nesse instituto está condicionada pela credibilidade que, mais até do que a Justiça, os próprios políticos inspiram.

De qualquer modo, a Justiça brasileira, com todas as deficiências de que padece, tem um enorme crédito depois que decretou o fim da impunidade dos poderosos com o julgamento do mensalão. Não há razão, portanto, para temer que não cumpra seu papel no julgamento deste que é, sem dúvida, o maior escândalo político da história deste país

Ajuste nas contas públicas e Lava Jato devem travar obras de infraestrutura

• Com o caixa apertado do governo para investimentos e a possível dificuldade das empreiteiras envolvidas nas investigações de corrupção na Petrobrás para obter financiamentos, setor de obras públicas deve viver mais um ano complicado em 2015

Renée Pereira - O Estado de S. Paulo

A combinação entre a situação fiscal do Brasil, com caixa apertado para investimentos, e a participação de grandes empreiteiras no esquema de corrupção da Petrobrás pode paralisar o setor de infraestrutura em 2015. Mesmo sem saber quais punições as empresas sofrerão (se multas, cancelamento de contrato ou devolução de recursos), a expectativa é que elas tenham menos dinheiro para entrar em novos projetos em 2015.

A sétima fase da operação Lava Jato, desencadeada no primeira quinzena de novembro, prendeu executivos das construtoras Odebrecht, Camargo Corrêa, OAS, Mendes Júnior, UTC, Engevix, Iesa, Galvão Engenharia e Queiroz Galvão. Juntas essas empresas, responsáveis pelas principais obras do País, devem no mercado mais de R$ 75 bilhões, sendo cerca de R$ 60 bilhões só da Odebrecht.

Nos últimos dias, no entanto, a nota de crédito dessas empreiteiras foi rebaixada ou colocada em observação negativa para uma possível revisão pelas agências de classificação de risco. A consequência da medida é que as construtoras terão mais dificuldade para encontrar financiamento a um custo mais baixo. Hoje, uma das principais fontes de crédito das empresas, além do BNDES, é a emissão de debêntures no mercado nacional.

Parte desses papéis tem vencimento no curto prazo. Isso significa que, se quiserem rolar essa dívida, vão ter de oferecer uma taxa de juros mais alta para os investidores. Caso contrário, a solução será tirar o dinheiro do caixa para pagar os títulos. O problema é que, com a freada do governo para reduzir despesas, a receita das empreiteiras deve minguar, já que parte significativa do faturamento vem de órgãos públicos, segundo ranking da revista O Empreiteiro.

Na UTC, por exemplo, 85% dos contratos eram públicos no ano passado; na Mendes Júnior, 75%; na Galvão Engenharia, 69%; e na Queiroz Galvão, 53% - na Odebrecht, OAS e Camargo, boa parte das receitas vem da iniciativa privada. "Junta-se a isso a possibilidade de perderem - ou reduzirem - algum contrato por causa da Lava Jato, o que poderá piorar a situação de caixa de muitas empresas. Os problemas de agora vão se resumir em falta de dinheiro lá na frente", afirma o sócio da consultoria RGF & Associados, Riccardo Gambarotto.

Na opinião dele, a capacidade de investimentos das empreiteiras ficará mais apertada. Isso sem considerar a possibilidade de alguma construtora ser considerada inidônea, o que excluiria a empresa das licitações públicas. Essa tem sido uma das principais preocupações das agências de ratings, que dão nota para os papéis das empresas.

No comunicado da agência Fitch, que rebaixou a nota da Mendes Júnior e colocou a classificação de todas as construtoras em observação negativa, ela alerta para possíveis reflexos nos demais negócios das empresas. Além da área de construção, essas companhias administram concessões de portos, aeroportos, rodovias e energia.

Para o presidente da Associação Paulista dos Empresários de Obras Públicas (Apeop), Luciano Amadio, é preciso separar os executivos das empresas. "Elas terão de devolver o que tiverem de devolver, mas têm de continuar tocando as obras", diz ele. "As investigações na Petrobrás vão atingir umas dez empresas, enquanto que o problema fiscal vai afetar centenas de companhias do setor com a redução de obras."

Para o setor de infraestrutura, que já recebe menos investimento do que o necessário, isso significará defasagem na oferta de serviços. O setor deve fechar o ano com investimentos de 2,54% do PIB, bem abaixo dos 4% necessários, segundo a Consultoria InterB.

Opção será entre corte e meta modesta

• Buraco equivale a quatro anos de gastos com Bolsa Família; saneamento fiscal é crucial para resgatar credibilidade

• Receitas para 2015 foram superestimadas contando com expansão de 2% no PIB; previsão realista é de só 0,8%

Gustavo Patu – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - A nova equipe econômica do governo Dilma Rousseff terá como primeiro desafio equacionar um rombo no Orçamento de 2015 que, a partir das mais recentes estimativas oficiais, ronda a casa dos R$ 100 bilhões.

Equivalente a quatro anos de Bolsa Família, o montante resulta de receitas potencialmente superestimadas pelo Executivo e pelo Congresso no projeto orçamentário para o próximo ano.

A previsão de arrecadação terá de ser revista para baixo, o que forçará cortes de despesas ou uma meta fiscal mais realista --ou, dadas as dimensões da revisão necessária, uma combinação das duas providências.

Tradicionalmente, a receita do ano seguinte é calculada a partir da estimativa da receita do ano corrente, além da inflação e do crescimento econômico esperados.

Na sexta-feira (21), a área econômica admitiu, na prática, que as expectativas para 2014 estavam exageradas: a projeção para o ano foi reduzida em R$ 38,4 bilhões, para R$ 1,046 trilhão, já descontadas as transferências para Estados e municípios.

Numa conta simples, considerando uma inflação de 6,5% e a expansão econômica de 0,8% projetada pelos analistas de mercado, a receita do próximo ano chegaria a algo como R$ 1,123 trilhão.

Receita superestimada
O projeto de Orçamento, porém, conta com R$ 1,217 trilhão --e, para acomodar despesas de interesse de deputados e senadores, o Congresso já recalculou o montante para R$ 1,236 trilhão.

É evidente que os cálculos são sujeitos a imprecisões, assim como as hipóteses para o comportamento dos preços e da economia.

Mas a discrepância entre os montantes é grande o bastante para inviabilizar a meta fiscal de 2015, que é poupar pelo menos R$ 86 bilhões para o abatimento da dívida pública.

O objetivo é modesto se comparado a resultados dos governos Lula e FHC, mas trata-se de um salto em relação a este ano, quando a poupança deverá ficar próxima ou até abaixo de zero.

No mesmo documento em que reduziu a previsão de receita deste ano, a administração petista já deu os primeiros passos para a revisão do próximo Orçamento.

A expectativa de crescimento econômico do ano que vem caiu de 3% para ainda otimistas 2%.

Credibilidade
Ao buscar nomes de perfil mais ortodoxo para sua equipe, o governo Dilma indica que pretende recuperar a credibilidade da política fiscal, que desde 2012 descumpre as metas prometidas --ou cumpre à base de manobras contábeis e brechas legais.

A superestimação do crescimento da economia e da arrecadação tem sido usual nesse período, assim como a subestimação de despesas obrigatórias. No projeto de Orçamento de 2015 também há gastos que podem ser revistos para cima.

Segundo estudo elaborado pela consultoria orçamentária da Câmara dos Deputados, isso deve acontecer nos benefícios previdenciários, no seguro-desemprego e no abono salarial.

A previsão de desembolso com esses programas neste ano foi elevada em R$ 16,8 bilhões sexta-feira. Logo, as projeções para 2015 foram feitas a partir de uma base subestimada. Nesse caso, o corte de outras despesas, como investimentos em infraestrutura, terão de ser ampliados.

Dilma tenta lidar com resistência de petistas

• Partido da presidente é contra indicação de Joaquim Levy para o comando da Fazenda; anúncio deverá ser feito até quinta-feira

João Domingos - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Assessores de Dilma Rousseff dizem que, apesar de já escolhido o nome do ex-secretário do Tesouro Joaquim Levy para a vaga de Guido Mantega no Ministério da Fazenda, a presidente deixou o anúncio para esta semana, entre outros motivos, porque quer lidar com a resistência dos petistas em relação à indicação. O anúncio será feito até quinta-feira.

Além de apaziguar as resistências internas no PT - alguns dirigentes chegam a chamar Levy de "mãos de tesoura" em razão de sua ortodoxia econômica - há ainda outra preocupação: o governo quer aprovar antes do anúncio o projeto que flexibiliza a meta de superávit primário, medida que é vista com ressalvas por parte dos economistas.

A escolha de Levy para a Fazenda, do ex-secretário executivo da Pasta Nelson Barbosa para o Planejamento e da manutenção do presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, para compor o triunvirato da equipe econômica, foi vazada por integrantes da equipe de Dilma na sexta-feira. Extraoficialmente, os repórteres foram informados de que o anúncio seria feito naquele dia. Depois o Planalto divulgou, oficialmente, que nada seria anunciado.

Dilma passou o dia de ontem no Palácio da Alvorada, onde mora. Ao contrário dos finais de semana anteriores, quando começou a tratar da escolha da nova equipe, não houve entra e sai de políticos e de auxiliares da presidente no Alvorada.

O ministro da Casa Civil, Aloizio Mercadante, permaneceu em Brasília, à disposição da presidente, mas não foi chamado. Circularam informações de que Dilma fez algumas ligações, uma delas para Giles Azevedo, seu chefe de gabinete, que poderá ser escolhido ministro de Minas e Energia, no lugar do senador Edison Lobão, que é da cota do PMDB.

Entre os peemedebistas já existe a certeza de que o Ministério de Minas e Energia sairá do controle do partido.

Conformados, eles esperam ser recompensados com o Ministério de Cidades, hoje com o PP. Um dos candidatos para a pasta é o atual ministro da Aviação Civil, Moreira Franco. Outro é o deputado Elizeu Padilha (RS), que abriu em favor de Dilma uma dissidência no PMDB gaúcho, que apoiou o tucano Aécio Neves na disputa eleitoral.

O presidente do PP, senador Ciro Nogueira (PI), informou ontem que o partido ainda não tratou da ocupação da Esplanada dos Ministérios com Dilma.

Ele está conformado com a perda das Cidades. Acredita que será contemplado com uma outra pasta forte, pois o partido manteve-se fiel ao governo tanto nas votações quanto na aliança que apoiou Dilma na sucessão presidencial.

O PTB, cuja cúpula apoiou a candidatura de Aécio Neves, e viu a base defender a petista, ocupará um ministério pela primeira vez na administração de Dilma. Ela convidou o senador Armando Monteiro (PE) para o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior. Monteiro foi presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI) e será o canal de negociação com os empresários do setor.

A senadora Kátia Abreu (PMDB-TO), presidente da Confederação Nacional da Agricultura (CNA), foi convidada para o Ministério da Agricultura. A ruralista deverá fazer a ponte com o agronegócio.

Representantes dos movimentos sociais já tentam demover Dilma do convite. Os recados transmitidos à presidente carregam apelos do tipo "quem foi pra rua lutar por sua eleição não foi Kátia Abreu".

Oriunda do DEM, quando fez forte oposição ao governo do PT, Kátia Abreu se transferiu para o PSD de Gilberto Kassab e, depois, para o PMDB. Mas entre os peemedebistas ela ainda é vista como uma estranha no partido e os principais dirigentes da legenda não apoiam a sua indicação. Segundo os peemedebistas, o partido não ficará nem um pouco chateado se Dilma desistir do convite à senadora. / Colaborou Ricardo Della Coletta

Marco Aurélio Nogueira - Corrupção exige que governo se posicione e tenha iniciativa

- O Estado de S. Paulo

Aceitemos então, de uma vez por todas, a voz do povo: a corrupção é “cultural” no Brasil, todos são chegados, os políticos sempre “levam algum” em suas tratativas e transações, os servidores são suscetíveis a “agrados” e sempre houve elos fortíssimos ligando negócios públicos e interesses privados, especialmente envolvendo grandes empreiteiras e grandes fornecedores de produtos e serviços ao Estado. Isto para não falar daquela propensão inata que o brasileiro teria a sonegar, subornar, tirar vantagem, superfaturar e ganha logo, de uma só vez, tudo o que acha justo ou calcula como certo.

O que sobra deste cenário – que foi traçado de modo mais refinado pelo ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, em evento nesta semana – é uma sociedade de corruptos e corruptores, pouco republicana, corroída pela desfaçatez e pela irregularidade, produto de uma longa história de privatização da vida pública que teria começado com a chegada das caravelas de Cabral em 1500.

É um cenário de horror. Exagerado, mas não desprovido de fundamento. Afinal, sempre somos filhos de uma história e os comportamentos humanos não são somente pulsões: são social e culturalmente determinados. Afirmar, portanto, que a corrupção é cultural não significa, a rigor, absolutamente nada. Assim como seus congêneres: “ah, isto sempre ocorreu” ou “está no DNA do brasileiro” ou “todos têm telhado de vidro” ou “não é de hoje que há corrupção na Petrobrás” ou “antes se roubava até mais”.

Nada disto ajuda a que se compreenda ou se freie a corrupção. Na melhor das hipóteses, pode servir para que se justifiquem ou se aliviem eventuais culpas. Se todos roubam, por que eu deveria me conter? O impulso à corrupção seria mais forte do que cada um de nós. Algo atávico. Corromper e ser corrompido seria como fazer a parte que nos cabe neste imenso latifúndio.

Há dois enormes problemas nesta formulação. Um é o de rebaixar a sociedade inteira. Outro é de convidar à passividade: já que é assim, nada pode ser feito para alterar o curso das coisas, a não ser eventuais punições seletivas e uma aposta genérica na educação.

A corrupção acompanha os humanos desde as cavernas. Não há época ou sociedade imune a ela. Nem vale a pena dar exemplos. A corrupção é uma espécie de segunda pele da civilização. No Brasil, tornou-se algo sistêmico, entranhado na estrutura do Estado, uma espécie de segredo compartilhado por todos e que todos fingem desconhecer.

Mas tão evidente quanto ela tem sido o esforço para combatê-la e isolá-la. O fato de à corrupção se associarem formas (manifestas ou dissimuladas) de violência, de injustiça, de desigualdade e de exploração provoca repugnância e rejeição social. O que tem ajudado a que não sejam esparsas ou ocasionais as tentativas de denunciá-la e cerceá-la, inclusive no Brasil. O capítulo dos “controles públicos” é riquíssimo a este respeito, parte de um verdadeiro arsenal que se tem mobilizado contra a corrupção.

Se a corrupção é sistêmica – ou seja, integra um universo com regras próprias, operadores, uma ética especial, fios que o amarram às instituições estatais e ao mundo dos interesses particulares –, também tem sido sistêmico o combate a ela.

Com a vida e os sistemas ficando mais complexos e mais “fora de controle” – mais submetidos a redes, mercados, concorrências selvagens e disputas de espaço – mais este arsenal foi se mostrando insuficiente. E mais a corrupção foi-se disseminando. No caso do Brasil, acrescente-se que houve também a incidência da modernização institucional e da democratização do Estado. A Constituição de 1988, a Polícia Federal, o Ministério Público, a própria cidadania fiscalizadora, os meios de comunicação, o jornalismo investigativo, tudo melhorou e passou a fazer com que a corrupção se tornasse mais visível, ainda que não necessariamente menos intensa. Ainda há muito o que melhorar. Mas já tivemos políticos graúdos e empresários graudíssimos presos e processados. Há um ineditismo aí, uma oportunidade para se ir mais longe.

Em vez, portanto, de ficarmos descobrindo a natureza “cultural” da corrupção, temos é de saudar a democracia brasileira, que está revisitando seus mortos e tirando esqueletos do armário. A ampliação da percepção social do problema não é “golpismo de direita” nem manobra para criar um “terceiro turno” na política. Ao contrário, é uma demonstração de que mais democracia e mais disputa democrática são fundamentais para que se tenha mais transparência e mais sucesso no combate à corrupção.

O tema da hora é a Petrobrás. Décadas de esquemas inidôneos, mil e um tentáculos. Mas também um período de governo, 12 anos seguidos de malfeitos, com provas, cheques e contracheques, confissões, acareações, tudo revelando um mega-esquema que, de um modo ou de outro, envolve e responsabiliza um conjunto de partidos e operadores ligados a um governo que se quer de esquerda. Esquema que, em 2005, já havia mostrado as garras no mensalão: um modelo de financiamento eleitoral e de compra de apoios políticos. Com o aumento dos custos das operações políticas e eleitorais e com o desejo sempre crescente que os grandes partidos têm de ficar no poder, alguns governos deram rédea solta à corrupção.

Diante disto, pouco adianta o governo dizer que o mecanismo começou antes dele. Não é honesto falar que por trás de tudo há a mão suja das oposições e que jamais houve um governo que tanto combate deu à corrupção. Também não dá para atribuir a solução à reforma política, que teria o dom de acabar com a promiscuidade política. Menos ainda é correto ameaçar com o risco de que a economia seja atingida para relativizar a gravidade da situação e amenizar a marcha das investigações. Um governo que governe precisa se posicionar com clareza e ter iniciativa.

O único procedimento adequado é aprofundar as apurações, reconhecer responsabilidades e tomar decisões, cortando a própria carne se necessário for. Entregar os anéis e eventualmente alguns dedos. Para continuar respirando e permitir que a sociedade inteira respire.

Não basta descobrir os frutos podres e sanear o cesto. Um governo forte, democrático e com um mandato popular recém-consagrado, como é o de Dilma Rousseff, pode e deve fazer muito mais. Antes que se perca a oportunidade.

Professor titular de Teoria Política e diretor do Instituto de Políticas Públicas e Relações Internacionais da UNESP

Luiz Sérgio Henriques - A inflação brasileira

- O Estado de S. Paulo

Que há no horizonte turbulências na economia só um desinformado ignora: de fato, parece ter-se esgotado o modelo de crescimento baseado no consumo, escorado nos bons ventos da economia global até 2008 e na valorização das commodities. Distante da superinflação dos anos 1990, a alta do custo de vida ronda o chamado teto da meta, tornando o caso brasileiro bastante singular, com o baixo crescimento e a inflação persistente a empanar o brilho (relativo) de um desempenho que nos transformou em país da moda há alguns anos.

Tudo isso é certo e a disputa entre economistas e suas receitas estará aberta pelos próximos meses. Menos bem diagnosticado é o florescimento do que em outros contextos já se chamou de "inflação ideológica", tão típica dos anos 60 do século passado, lançando sua sombra sobre o debate contemporâneo e nos impedindo de ver as reais possibilidades de uma ação reformista nos diferentes âmbitos do cotidiano, para enfrentar a vida infernal nas cidades, a precariedade dos serviços públicos e as agruras da população.

A "inflação ideológica" é tão ou mais perigosa quanto a monetária. Numa, a moeda perde o valor numa espiral que constitui, segundo a experiência comum, poderoso fator de concentração de renda. Noutra, o que se desvaloriza são as palavras, a capacidade argumentativa, a consciência de que só se vence - provisoriamente! - um debate quando se assimila, de algum modo, o raciocínio do oponente em suas formulações mais expressivas. O jargão substitui o pensamento, o anátema toma o lugar do diálogo e a esfera pública se empobrece até um nível perigosamente crítico.

Fantasmas da guerra fria encontram condições para se mover desengonçadamente. Para alguns, o País desliza para o "comunismo" ou, no mínimo, algum tipo de revolução bolivariana, o que justificaria o apelo aos militares e a seu velho papel de fiadores da lei e da ordem em última instância. Outros, ao contrário, veem situações pré-revolucionárias, no estilo "inflacionado" dos anos 60, ao primeiro sinal de manifestações normais em democracia, como as de junho de 2013, com toda a sua carga de contradições e até mesmo com sua sequência problemática, ao serem capturadas e esvaziadas pela tática violenta dos black blocs, voltada, de modo abstrato e infantil (o esquerdismo ainda será doença infantil?), contra os símbolos imediatos do "capital".

Por certo, como adverte Habermas, agudo intérprete das democracias e suas disfunções, essa banalização das palavras e do circuito argumentativo se potencializa com a algaravia das redes. Estas, por si mesmas, não geram uma esfera pública democrática, infensa à apropriação pelo Estado e, ao mesmo tempo, capaz de incidir nos processos decisórios. Construir uma opinião pública informada e ativa, plural e arejada, requer atores - intelectuais, dirigentes políticos, partidos, organizações - que "concentrem" a atenção da cidadania sobre os temas politicamente relevantes e as escolhas cruciais que estão diante de sociedades complexas, como a brasileira.

Do ponto de vista da esquerda, não é certo que esse papel venha sendo exercido a contento pelo partido hegemônico - e o conceito de "hegemonia", aqui, deverá ser tomado em seu sentido mais limitado e até grosseiro. Mesmo verbalmente, ainda prevalece nesse partido uma cultura política que privilegia o "social" contra o "institucional", a "estatização" dos movimentos segundo parâmetros de "participação" controlada, para não falar de estratégias aventurosas sistematicamente reiteradas, como o tal plebiscito para a reforma política e a decorrente "constituinte exclusiva".

A cobrança tem de ser dura, uma vez que se dirige não a um partido qualquer, mas àquele que tem sido o protagonista da administração federal há três mandatos sucessivos. Por essas propostas e outras do mesmo teor se pode identificar um traço bizarro na situação brasileira: a existência de um partido de governo que, longe de se afirmar como dirigente legítimo de reformas avançadas, valendo-se exclusivamente dos métodos da democracia, volta e meia se enreda naquilo que um grande pensador da política do século 20, considerando a formação tardia de certos Estados nacionais, chamou de "subversivismo elementar" das camadas subalternas, estas, sim, com escassa compreensão do Estado e das possibilidades de sua ampliação democratizadora. Um partido, em suma, que domina e não dirige; que propõe rupturas "radicais" na vigência da legalidade constitucional em cujo âmbito conquistou consensos e chegou ao governo nos diferentes níveis da Federação.

Não deve ter outra origem a ideia de ocupação e loteamento do poder, a cooptação da direita tradicional e praticamente todos os seus representantes, bem como a criação artificiosa de uma "direita" com os pesados atributos de neoliberal, machista, racista e nostálgica do regime militar. Numa circunstância, como a brasileira, instável e sujeita a surtos de populismo, como de resto pode ocorrer a todas as democracias do nosso tempo, chega a ser irresponsável chamar de "direita" todo aquele que diverge ou critica, mesmo pertencendo evidentemente ao campo democrático.

No regime ideológico inflacionado, palavras e gestos se desgastam e se usam de modo instrumental. O punho cerrado, símbolo do comunismo histórico, pode ser erguido, no Parlamento, só para afrontar o chefe de um outro poder. Não há nenhuma ação verdadeira que ajude a formar a opinião pública: discute-se, em vez disso, a desinência gramatical da palavra "presidente". Estes e outros exemplos seriam apenas bizarrices, não viessem de um partido poderoso, com altas responsabilidades na República, e não denunciassem um gosto por operar à beira do abismo em que, à moda de Drummond, o diabo joga damas com o destino.

Tradutor e ensaísta, é um dos organizadores das 'Obras' de Gramsci no Brasil

Ferreira Gullar - Nonsense

• Como já se previa, Dilma, depois de reeleita, arcaria com a herança maldita que ela própria criou

Folha de S. Paulo / Ilustrada

Tenho escrito muito sobre política, aqui, neste meu espaço, quando poderia estar falando de outros assuntos mais agradáveis. Sucede, no entanto, que são tantos os fatos ocorridos ultimamente, envolvendo os interesses dos cidadãos, que me sinto obrigado a comentá-los. Como já se previa, Dilma, depois de reeleita, arcaria com a herança maldita que ela própria criou.

Durante a campanha eleitoral, essa questão foi levantada durante os debates, mas ela negava que houvesse qualquer problema maior a ser enfrentado, pois tudo o que diziam era mera invenção. Todos, sobretudo ela, sabiam que não era, e a prova disso é que ainda não começou o seu segundo mandato, e a encrenca já está aí escancarada.

Na crônica anterior, me referi à derrota que ela sofreu na Câmara ao propor a criação de conselhos populares e ao aumento da taxa Selic que, durante a campanha, ela afirmava que não aumentaria. Houve aumento da gasolina e do óleo diesel, da energia elétrica e outros virão inevitavelmente, contrariando tudo o que ela prometeu.

A verdade, porém, é que a encrenca recrudesceu mais cedo do que se esperava, com o avanço da Operação Lava Jato, que já mandou prender 23 implicados no escândalo da Petrobras, quase todos eles executivos de grandes empreiteiras que prestam serviços a essa empresa. O montante das propinas ultrapassa os R$ 59 bilhões. E os propineiros estavam tão à vontade que chegaram a criar um clube para assaltar a empresa. Um dos integrantes desse clube era Renato Duque, diretor de Serviços da Petrobras, indicado para o cargo pelo então ministro da Casa Civil, José Dirceu. Ao Duque cabia de 2 a 3 % do montante da propina, que ele passava para o PT e partidos aliados. Como se trata de uma empresa de porte internacional, tem a Petrobras ações em bolsas de países, como os Estados Unidos, de modo que esse escândalo tende a ganhar escala internacional, comprometendo gravemente o prestígio da nossa maior empresa.

Diante disso o governo, no início, se fez de surdo e não respondeu aos jornalistas. Mas não dá para fazer de conta que não tem nada com isso, como, aliás, é o jeito dos petistas de sair pela tangente.

Numa entrevista a Miriam Leitão, o ministro Mercadante adotou o mesmo procedimento que Dilma durante a campanha eleitoral: quando lhe perguntavam alguma coisa inconveniente, ela respondia outra, e quase sempre aludindo ao governo de Fernando Henrique Cardoso. Aécio, diante daquilo, pedia que ela deixasse de lado o passado e falasse do presente e do futuro. Pois bem, lembrei-me dela ao ouvir as respostas de Mercadante.

À pergunta sobre a situação atual da economia brasileira, que não cresce, o ministro respondeu: "A China também reduziu o crescimento". Não adiantou a Miriam dizer que não queria saber sua opinião sobre a China e, sim, sobre o Brasil. Claro, a China reduziu seu crescimento de 14 para 7,5 %, enquanto o Brasil caiu de 2 para 0,2 %.

Parece piada. Mas não é. Esse é o truque de que se valem os petistas para fugir às perguntas inconvenientes.

No dia seguinte, quem apareceu falando na televisão foi o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo.

No caso dele, não se tratava de responder a perguntas de jornalistas, mas de tentar convencer a opinião pública de que esses escândalos todos não têm maior importância, uma vez que o governo está dando todo apoio à apuração da verdade.

Já a oposição, que perdeu as eleições --disse ele-- está querendo reabrir a campanha eleitoral, como se houvesse um terceiro turno. E acrescentou: "Quem perdeu perdeu; quem ganhou ganhou. E quem ganhou governa". E quem perdeu, faz o quê? pergunto eu. Fica caladinho, porque, se falar, está querendo um terceiro turno, ou seja, dar um golpe?

Um ministro da Justiça não pode dizer uma coisa dessas, porque dá a entender que não deve haver oposição a quem ganhou. Ou seja, só quem ganhou tem o direito de falar, opinar, mentir à vontade. Já os derrotados, uma vez que perderam, não podem criticar o governo porque, se o fizerem, estarão querendo derrubá-lo. É bem o PT, que sempre fez feroz oposição a governos adversários. De minha parte, defendo a legitimidade do mandato de Dilma Rousseff.
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