sábado, 5 de março de 2016

Opinião do dia - José Álvaro Moisés

Nós vimos que está aumentando a polarização. As pessoas que são a favor ou contra o PT e o ex-presidente Lula estão progressivamente se mobilizando mais e, às vezes, se confrontando. É preciso olhar isso com muito cuidado. Por um lado, tem uma coisa que é positiva: as pessoas quererem mais participação e querem se posicionar. Mas alguns segmentos estão estimulando setores da opinião pública a se comportarem com “nós contra eles”, “as elites contra nós”. Não é um discurso bom para a democracia, que tem como um dos principais princípios reconhecer a legitimidade da diversidade.
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José Álvaro Moisés, cientista político, da Universidade de São Paulo (USP) , em entrevista. O Estado de S. Paulo, 5.3.2016

Lava Jato obriga Lula a depor; ex-presidente ataca ‘elites’

*Ordem foi expedida pelo juiz Sérgio Moro, que viu ‘fundada suspeita’ de recebimento de benefício material * Grupos pró e contra o petista se enfrentaram nas ruasl *Em pronunciamento no Diretório Nacional do PT, Lula diz que se sentiu ‘prisioneiro’

O ex-presidente Lula foi obrigado a prestar depoimento à Polícia Federal no inquérito da Lava Jato que investiga desvios e corrupção na Petrobrás. Policiais chegaram ao apartamento de São Bernardo por volta de 6 horas da manhã. Lula foi ouvido por autoridades da força-tarefa durante quase três horas, em uma sala do Aeroporto de Congonhas. As ações da Operação Aletheia–que em grego significa “em busca da verdade” – provocaram reações nas ruas – houve confrontos entre apoiadores e manifestantes contrários ao ex-presidente –, no mercado financeiro e no ambiente político. De acordo como despacho do juiz Sérgio Moro, há “fundada suspeita ”de que o principal líder petista “teria recebido benefícios materiais, de forma sub-reptícia, de empreiteiras envolvidas na Operação Lava Jato, especificamente em reformas e benfeitorias de imóveis de sua propriedade”. Foram cumpridos mandados de busca e apreensão em diversos locais, entre eles o apartamento de Lula e o Instituto Lula. Em pronunciamento no Diretório Nacional do PT, Lula convocou a militância a defender o partido, atacou Sérgio Moro, a imprensa e as “elites”. “Me senti um prisioneiro. Fiquei magoado, ofendido”, disse. À noite, em discurso a militantes, Lula comparou a condução coercitiva a um “sequestro”

- O Estado de S. Paulo 

• Policiais federais levaram Luiz Inácio Lula da Silva de São Bernardo do Campo até o Aeroporto de Congonhas, onde ele foi ouvido pela força-tarefa da operação, sob suspeita de ter se beneficiado do esquema de desvios de verbas e de corrupção na Petrobrás; ele negou

Moro obriga Lula a depor na Lava Jato; ex-presidente ataca Justiça e ‘elites’

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi obrigado pela Polícia Federal, ontem de manhã, em São Paulo, a prestar depoimento no inquérito da Operação Lava Jato que investiga desvios e corrupção na Petrobrás. A medida, autorizada pelo juiz Sérgio Moro, da 13.ª Vara Federal de Curitiba, provocou reações imediatas nas ruas, no mercado e no conturbado ambiente da política brasileira. De acordo com o despacho do magistrado, há “fundada suspeita” de que o principal líder petista “teria recebido benefícios materiais, de forma sub-reptícia, de empreiteiras envolvidas na Operação Lava Jato, especificamente em reformas e benfeitorias de imóveis de sua propriedade”

A Lava Jato investiga a relação de Lula com o sítio Santa Bárbara, em Atibaia (SP), utilizado pelo ex-presidente e sua família e reformado por uma espécie de consórcio de empreiteiras. Outro alvo é um tríplex no Guarujá (SP), cuja opção de compra foi oferecida ao ex-presidente pela OAS, uma das envolvidas no esquema na Petrobrás. Essa mais recente fase da operação foi denominada Aletheia (que significa “em busca da verdade”, em grego).Foram realizadas buscas e apreensões na casa do ex-presidente, de quatro de seus filhos (Luis Cláudio, Marcos Cláudio, Fábio Luis e Sandro Luis).

Os policiais chegaram ao apartamento de Lula, em São Bernardo do Campo, por volta das 6h. Após ter sido ouvido por autoridades da força-tarefa da operação por quase três horas em uma sala reservada da Polícia Federal no Aeroporto de Congonhas, Lula afirmou, em pronunciamento no Diretório Nacional do PT, ter se sentido um “prisioneiro”, convocou a militância a defender o partido, atacou o juiz, a imprensa e as “elites”.

“Moro não precisava ter mandado uma coerção na minha casa de manhã, na casa do Delcídio (Amaral, senador do PT), do Paulo Okamotto (presidente do Instituto Lula), não precisava. Era só ter convidado. Eu iria em Curitiba, iria a Brasília, era só ter chamado.” Lula negou as acusações e disse não ser proprietário dos imóveis.

A condução coercitiva (na qual o investigado é obrigado a depor) foi justificada por Moro como uma medida de segurança imposta por ele para evitar conflitos entre grupos pró e contra Lula. Segundo ele, a tentativa frustrada do Ministério Público de São Paulo de ouvir Lula no mês passado, em São Paulo, serviu de base para a decisão. Na ocasião, houve briga de manifestantes e a polícia teve de intervir. “Colhendo o depoimento mediante condução coercitiva, são menores as probabilidades de que algo semelhante ocorra.”

Militantes do PT e simpatizantes de Lula foram até o aeroporto e até as imediações da cobertura onde o petista mora em São Bernardo para prestar solidariedade a ele. Houve confronto com outros grupos que protestavam contra Lula e o PT nesses mesmos locais. O Ministério Público Federal havia pedido ainda a condução coercitiva da ex-primeira-dama Marisa Letícia. Moro negou. O juiz também deu recomendação expressa para que Lula não fosse algemado. “Consigne-se no mandado que não deve ser utilizada algema e não deve, em hipótese alguma, ser filmado.”

O ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal, criticou a medida. “Me preocupa um ex-presidente da República ser conduzido debaixo de vara”, disse. “Ninguém está imune à investigação”, afirmou o procurador da República Carlos Fernando dos Santos Lima. No fim da tarde, o STF negou pedido da defesa de Lula para suspender a mais recente fase da operação.

Ministra do Supremo nega pedido de Lula para suspender fase da Lava Jato

• Rosa Weber negou solicitação da defesa do ex-presidente, por reconhecer que o recurso 'desborda dos limites fáticos ensejadores do conflito invocado'

Gustavo Aguiar - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - A ministra Rosa Weber, do Supremo Tribunal Federal (STF), negou nesta sexta-feira, 4, o pedido de liminar do ex-presidente Luís Inácio Lula da Silva para suspender a nova fase da Operação Lava Jato que teve ele como alvo principal. Também foi negado o pedido de suspensão dos dois processos investigatórios contra o ex-presidente conduzidos pelo Ministério Público Federal e pelo Ministério Público de São Paulo.

Lula protocolou o pedido na sexta-feira da semana passada, dia 26, alegando haver "conflito de competência" entre os dois processos investigatórios. Segundo ele, os processos tratavam do mesmo objeto, o que é contra a lei. "Não é o que se verifica, na hipótese", defende a ministra Rosa Weber no despacho publicado no início desta noite.

Ainda nesta sexta, a defesa do ex-presidente pediu a suspensão da 24ª fase da Operação Lava Jato, que culminou na condução coercitiva do presidente para prestar depoimento à Polícia Federal. A ministra negou também este pedido, por reconhecer que ele "desborda dos limites fáticos ensejadores do conflito invocado".

Os advogados do ex-presidente alegam ter havido "desafio à autoridade" da ministra Rosa Weber nas diligências realizadas na manhã desta quinta-feira. As investigações contra ele se referem à obtenção de vantagens ilícitas por Lula que teriam se materializado nos imóveis de Atibaia e do Guarujá, em São Paulo.

A defesa do ex-presidente no Supremo pedia que as investigações do MPF fossem transferidas ao MP-SP. A força-tarefa da Lava Jato, no entanto, enviou à ministra Rosa esclarecimentos afirmando que as investigações do MPF são diferentes das conduzidas pelo MP-SP e, por isso, não haveria motivo para que ambas fossem juntadas.

Lula foi conduzido para depor na manhã de hoje porque, segundo o MPF, há "evidências" de que ele recebeu valores desviados da Petrobras. De acordo com os procuradores, são pelo menos R$ 4,5 milhões em lavagem de dinheiro por meio do Sítio Santa Bárbara, em Atibaia, e do tríplex 164-A, no Guarujá.

Procuradoria diz haver ‘evidências de que Lula recebeu valores’

• Suspeita da força-tarefa da Lava Jato é de que reformas em sítio e no tríplex foram usadas para repasse de recursos

Ricardo Brandt, Fausto Macedo, Mateus Coutinho e Julia Affonso – O Estado de S. Paulo

O Ministério Público Federal afirmou, em nota ontem, que “há evidências de que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva recebeu valores oriundos do esquema na Petrobrás por meio da destinação e reforma de um apartamento triplex e de um sítio em Atibaia, da entrega de móveis de luxo nos dois imóveis e da armazenagem de bens por transportadora. Também são apurados pagamentos ao ex-presidente feitos por empresas alvo da Lava Jato, a título de supostas doações e palestras”.

O procurador da República Carlos Fernando dos Santos Lima afirmou que o ex-presidente é suspeito de ser o principal responsável pelo esquema de cartel, desvios verbas e de corrupção na Petrobrás. Segundo ele, o esquema beneficiou o “chefe do governo”. A gestão Lula na Presidência foi de janeiro de 2003 a dezembro de 2009. “Estamos apurando essa hipótese (de Lula ser o líder). Certamente, o governo dele foi um dos grandes beneficiários pela compra desse apoio político partidário. Investigamos se houve alguma vantagem ao senhor Luiz Inácio”, afirmou o procurador, durante entrevista na sede da PF, em Curitiba.

Imóveis. O ponto central da Operação Aletheia, ápice da Lava Jato, é o patrimônio supostamente oculto de Lula. A força tarefa da Procuradoria revela que o petista, ainda no exercício da Presidência, em 2010, adquiriu dois sítios em Atibaia, interior de São Paulo, “mediante interpostas pessoas”, pelo valor de R$ 1.539.200.

Os investigadores apontam “fortes indícios” de que, entre 2010 e 2014, Lula recebeu pelo menos R$ 770 mil “sem justificativa econômica lícita” do pecuarista e amigo José Carlos Bumlai – preso desde 24 de novembro na Operação Passe Livre, desdobramento da Lava Jato que apontou para o suposto envolvimento do ex-presidente no esquema de corrupção instalado na Petrobrás.

Parte de valores sob suspeita teria sido repassada a Lula pela Odebrecht e pela OAS, empreiteiras que teriam sido beneficiadas no esquema na Petrobrás. A força-tarefa constatou que, em Atibaia, dois sítios contíguos, um colocado em nome de Jonas Suassuna e outro em nome de Fernando Bittar, foram adquiridos na mesma data, em 29 de outubro de 2010.

A investigação aponta para os sócios do filho mais velho de Lula e para o advogado Roberto Teixeira, compadre do ex-presidente. “Tanto Jonas como Fernando são sócios de Fábio Luís Lula da Silva como foram representados na compra por Roberto Teixeira, notoriamente vinculado ao ex-presidente Lula e responsável por minutar as escrituras e recolher as assinaturas”, afirma a Procuradoria.

Os investigadores afirmam que mensagem eletrônica interceptada “aponta o uso dos adquirentes nominais (dos sítios) como interpostas pessoas”

Os investigadores destacam que Lula determinou que parte de sua própria mudança, “quando do fim do exercício da presidência, fosse entregue na sede dos sítios, para onde foi, com expressiva frequência, ao longo dos últimos anos”.

“Para além da suspeita sobre a ocultação de propriedade em nome de terceiros, há fortes indícios, consistentes na palavra de diversas testemunhas e notas fiscais de compras de produtos, de que reformas e móveis no valor de pelo menos R$ 770 mil foram pagos, sem razão econômica lícita, por Bumlai e pelas empreiteiras Odebrecht e OAS, todos favorecidos no esquema Petrobrás”, diz a Procuradoria. Bumlai e Odebrecht se encarregaram da reforma.

A OAS adquiriu móveis no valor de R$ 170 mil para a cozinha do sítio comprados no mesmo estabelecimento em que a OAS adquiriu móveis para o tríplex 164-A – apartamento no condomínio Solaris, no Guarujá (SP).

O dia em que o mundo caiu em Brasília

• Presidente Dilma foi obrigada a ter 'demonstração de força'

Vera Rosa - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - A reação da presidente Dilma Rousseff diante da operação montada pela Polícia Federal para ouvir o depoimento do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi decidida na hora do almoço e tomou forma quando ministros do PT se reuniram na sede do partido, em Brasília.

Foi ali, longe dos holofotes, que todos destacaram a urgência de uma demonstração de força do Palácio do Planalto contra o que chamaram de “arbitrariedade” cometida pela Polícia Federal e pelo Ministério Público contra Lula.

“Eu penso que foi um exagero essa condução coercitiva”, disse o ministro da Secretaria de Comunicação Social, Edinho Silva, antes de se dirigir para o encontro.

A portas fechadas, auxiliares de Dilma mostraram muita preocupação com o agravamento da crise e o distanciamento entre o PT e o Planalto. Dali, alguns telefonaram para o próprio Lula, que a esta altura já estava na sede do PT, em São Paulo.

Dilma, que antes das 7 horas andou de bicicleta nas imediações do Palácio da Alvorada, também ligou à tarde para o padrinho político, manifestando solidariedade. Quem estava ao lado do ex-presidente disse que ele ficou com a voz embargada.

Pela manhã, quando Lula foi levado para depor, o ministro da Casa Civil, Jaques Wagner, recebeu de pesos-pesados do PT o aviso de que, se não houvesse forte reação do governo, os movimentos sociais iriam para a rua em defesa de Lula, mas contra Dilma. Com a ajuda do ministro da Advocacia Geral da União, José Eduardo Cardozo, Dilma redigiu uma nota manifestando “integral inconformismo” com a condução coercitiva de Lula e, uma hora depois, fez um pronunciamento.

Lula nunca foi transparente com notícias incômodas

• Ex-presidente chegou a afirmar, em solenidade no Palácio no Planalto, ainda em 2003, que 'notícia de verdade é aquilo que a gente não quer falar'

Luiz Maklouf Carvalho* - O Estado de S. Paulo

Em seu nono mês na Presidência da República – setembro de 2003, já se vão quase 13 anos – o presidente Luiz Inácio Lula da Silva fez uma declaração incomum: “Notícia de verdade é aquilo que a gente não quer falar. Aquilo que a gente está doidinho para falar não é notícia, é publicidade”, disse ele no dia 10 daquele mês, durante a inauguração do site de Secretaria de Imprensa do Palácio do Planalto. A par da sinceridade, ou do sincericídio, Lula nunca deu maior contribuição para incômodas notícias que o envolviam diretamente.

O primeiro caso que o pôs à prova foi a revelação de que tinha uma filha fora do casamento com Marisa Letícia – Lurian Lula da Silva. Desde o primeiro momento em que soube que a informação seria publicada pelo Jornal do Brasil – 25 de abril de 1989 –, Lula reagiu com manifesta indignação. Não contra a informação, de resto indesmentível, mas contra os que a vazaram. Nem sabia quem era – nunca soube –, mas nem por isso deixou de insultar e praguejar os “traidores”, como os chamou. Lula disse, então, que a imprensa não deveria de preocupar com a vida pessoal dos candidatos. “Minha família não é candidata a nada e faço tudo para preservá-la”, afirmou.

Foi o começo de uma postura de muita reserva – e às vezes de tergiversação – quando questões desagradáveis questionavam o comportamento ético seu e/ou do PT. Ela se repetiu, com variações, na primeira denúncia de corrupção contra um deputado federal do partido, Ricardo Moraes, do Amazonas, noticiada pelo Estado em 10 de maio de 1993. Um mês antes, o diretório municipal de Manaus expulsara Moraes pela prática confessa de corrupção, escuta clandestina de telefones e invasão do Sindicato dos Metalúrgicos de Manaus com um pé de cabra. Moraes recorreu da decisão ao Diretório Nacional – e foi expulso do partido em agosto de 93. Lula disse, primeiro, que não tinha conhecimento do caso, quando ficou provado que tinha. Meses mais tarde, o expulso Moraes, já no PSB, estava com Lula na Caravana da Cidadania que visitava Manaus.

O Estado também noticiou, no mesmo maio de 93, que Moraes e quatro outros deputados federais do partido – José Genoíno, Paulo Rocha, Valdir Ganzer e Lourival Freitas – haviam pedido um empréstimo ao Sindicato dos Metalúrgicos de Manaus, e continuavam inadimplentes, passados alguns meses. Lula também disse, inicialmente, que não sabia do empréstimo, e que os deputados deveriam, se o fato fosse verdade, como era, “ser responsabilizados criminalmente e politicamente pelo ato”. Na ocasião, o presidente do diretório municipal do PT de Manaus, Jonas Araújo, afirmou que Lula sabia do empréstimo, informado que fora por ele próprio.

No caso CPEM – o primeiro grande escândalo envolvendo o partido – a postura de Lula foi mais de irritação com as notícias do que com o esclarecimento cabal e transparente dos fatos. Isso, ressalte-se, quando o economista Paulo de Tarso Venceslau, denunciante do escândalo, passou meses e meses tentando falar com o próprio Lula e com outros dirigentes do partido antes de contar o que contou. Lula fechou-se em copas. Também não quis falar para o Jornal da Tarde, que publicou a denúncia de Venceslau.

Imóveis. Tem sido assim, também, ontem como hoje, quando há denúncias de irregularidades sobre imóveis em que morou, e ainda mora, ou frequenta. Em vez de luz, detergente e palha de aço – como se entende da retórica do PT – obscuridades, retraimento, ensimesmados silêncios, teorias conspiratórias, pau na mídia (algumas vezes com razão), complacência com os pares, exercícios de autopiedade e a arrogância de se achar imune à comezinha obrigação de dar explicações ao que não está efetivamente esclarecido.

Quem já ouviu, por exemplo, o ex-presidente Lula responder ao questionamento “por que o sr. não disse ‘não quero, alto lá’ quando as empreiteiras que recebem dos cofres do Estado ofereceram dinheiro para o Instituto Lula – ou até para as tais palestras?, ou, ainda, para obras em sítio e apartamento?”. Por que não disse aos amigos que supostamente o obsequiaram com favores dessas mesmas empreiteiras que simplesmente declinava ou não aceitava benesses do gênero? Deveria responder – e são dezenas de questões –, até para eventualmente dizer que não é verdade, ou que não é bem assim, que tem todo o direito, ou, ainda, como também do jogo, que foi um erro, desculpa aí, autocrítica feita, prejuízos ressarcidos, vida que segue e vamo que vamo companheirada.

É também para não responder a essas perguntas que Lula, tão bom de conversa, já não pode dar entrevistas com pauta aberta e livre também para “aquilo que a gente não quer falar”. Se tivesse escolhido o caminho inverso – contribuir com a verdade da notícia, doa a quem doer, até mesmo em si próprio, e sem demérito das qualidades e dos méritos que efetivamente tem – o filme talvez fosse outro.

Sendo o que se vê, já conseguiu que até históricos simpatizantes, como o teólogo Leonardo Boff, levassem a divergência para o papel. No artigo “Os equívocos do Partido dos Trabalhadores e o sonho de Lula”, publicado em seu blog, em 6 de fevereiro, Boff escreveu: “O ‘petrolão’, pelos números altíssimos da corrupção, inegável, condenável e vergonhosa, desmoralizou parte do PT e parte das lideranças, atingindo o coração do partido. O PT deve ao povo brasileiro uma autocrítica nunca feita integralmente”.
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*Luiz Maklouf Carvalho é jornalista.

Lava- Jato força Lula a depor, e ex-presidente apela à militância

• MP diz ter indícios de que petista se beneficiou de desvios da Petrobras

Justiça quebra sigilo e faz busca em imóveis ligados a Lula. Ele chamou a operação de ‘espetáculo midiático’ e disse estar disposto a percorrer o país em sua defesa: ‘Eu merecia um pouco mais de respeito’

Prestes a completar dois anos, a Lava-Jato chegou à porta do ex-presidente Lula. Por força de um mandado de condução coercitiva, ele foi obrigado a depor, durante três horas, numa sala do Aeroporto de Congonhas (SP). Os procuradores investigam se o ex-presidente foi beneficiado com desvios da Petrobras, em pagamentos de palestras e doações a seu instituto, que somam R$ 30 milhões, feitos entre 2011 e 2014 por empresas investigadas. A operação cumpriu 33 mandados de busca e apreensão, inclusive em imóveis ligados a Lula. Segundo a PF, o Instituto Lula, que tem isenção fiscal, teria repassado R$ 1 milhão à G4, empresa de um dos filhos do ex-presidente. O procurador Carlos Fernando afirmou que “não há ninguém isento de investigação neste país”. Lula reagiu afirmando que se sentiu prisioneiro e convocou militantes às ruas.

Lava-Jato encontra Lula

• Investigado sob suspeita de obter vantagens pessoais de empreiteiras, ex-presidente é forçado a depor por Sérgio Moro, sofre buscas da PF e convoca movimentos sociais para defendê-lo; novo capítulo escancara dúvidas sobre passado e presente do petista

Alan Gripp - O Globo

Operação reforça o lado obscuro do líder popular
Aconteceu. Muita gente ainda duvidava, mas a Lava-Jato bateu à porta de Lula. O ex-presidente não foi preso, mas conduzido por ordem judicial para prestar depoimento, no ponto mais extremo dos quase dois anos de Lava-Jato, a maior operação de combate à corrupção já realizada no país.

No capítulo de ontem, os procuradores de Curitiba revelaram um pouco mais do lado obscuro do líder popular. Descobriuse, por exemplo, que o instituto que leva seu nome repassou mais de R$ 1 milhão a empresas dos filhos do petista. A Lava-Jato suspeita que a entidade, que tem isenção de impostos, tenha sido usada para receber vantagens de empreiteiras investigadas por desviar dinheiro da Petrobras.

Vantagens que os procuradores já não têm mais dúvidas quando se trata do sítio de Atibaia e do tríplex do Guarujá, ambos equipados para a família do ex-presidente por gigantes da construção, notadamente OAS e Odebrecht.

Ontem, a Lava-Jato revelou que a OAS também gastou R$ 1,3 milhão para armazenar por cinco anos itens da mudança de Lula, após sua saída da Presidência, em 2011. Entre eles, até um “trono africano”, como ressaltou o próprio Lula ao ironizar a revelação vinda de Curitiba. Agora, a investigação se concentrará em estabelecer uma relação entre pagamentos como esse e o feirão de contratos de empreiteiras com a Petrobras. Lula sabia? É a volta da surrada pergunta do mensalão.

Na já tradicional entrevista coletiva dada depois de cada fase da Lava-Jato, os procuradores fizeram questão de dizer que “qualquer um no Brasil está sujeito a ser investigado”. Ao mesmo tempo, foram cuidadosos ao falar do ex-presidente, que naquela altura já era defendido por militantes nas ruas de São Paulo. Não há qualquer motivo para pedir a prisão de Lula, disse o procurador Carlos Fernando Lima.

A Lava-Jato também faz seus cálculos políticos. Dará os próximos passos com cautela, diante do risco de radicalização do ambiente político. Mas, depois de tudo o que se viu, alguém é capaz de arriscar o que pode acontecer?

O animal político apela às ruas e passará por teste
Tão logo deixou a sala da Polícia Federal no aeroporto de Congonhas, onde depôs aos investigadores da Lava-Jato, Lula seguiu para a sede do PT, no Centro de São Paulo. Era esperado por cerca de 200 militantes do partido e da CUT. A fisionomia abatida deu lugar ao comportamento inflamado, num discurso em que fez uma defesa seletiva das investigações contra si e apelou para que movimentos sociais o defendam. A Lava-Jato despertou o animal político.

— O que eles (a Lava-Jato) fizeram com esse ato de hoje, é que, a partir da próxima semana, CUT, PT, sem-terra, PC do B, me convidem, que eu vou andar esse país — conclamou, pedindo para ser chamado. Entre tapas na mesa, o ex-presidente atacou duramente a Lava-Jato. Concentrou-se, principalmente, em afirmar que a condução coercitiva (quando o investigado é levado à força para depor) era desnecessária. E repetiu o discurso abraçado pelo partido de que é atacado por ter promovido justiça social. Orador hábil, abusou da ironia, arrancando gargalhadas da audiência, mesmo com o ambiente tenso.

— ‘ Sr. Luiz Inácio, o senhor poderia prestar depoimento em Curitiba?’. Eu gosto de Curitiba, eu poderia ir lá e me facilitava o PT pagar uma passagem — disse.

O discurso também foi marcado por algumas omissões. Lula não deu explicações sobre os pagamentos feitos por empreiteiras de benfeitorias no sítio de Atibaia e no tríplex do Guarujá. Também disse que não havia motivo para que os agentes fizessem buscas nas casas de seus filhos, embora eles sejam investigados.

Mais tarde, no sindicato dos bancários, chorou ao relatar a história de um catador de papel que entrou pela primeira vez no Palácio do Planalto. E radicalizou:

— Fico ofendido quando hoje sou sequestrado na minha casa.

A convocação de Lula é um teste para a capacidade de mobilização do petista, que já arrastou multidões à frente do movimento sindical e no auge de sua carreira política mas agora amarga baixas taxas de popularidade. Ontem, ao menos dez capitais atenderam ao primeiro chamado, mas os atos foram tímidos. Também há preocupação com a possibilidade de radicalização entre manifestantes pró e contra Lula. Dois confrontos aconteceram ontem, na porta da casa de Lula e em Congonhas. Jornalistas foram hostilizados e agredidos, criando um clima pesado para o próximo inevitável encontro: os protestos contra o PT e o governo, no dia 13.

Para Lava-Jato, propina irrigava Instituto Lula

• Doações de empreiteiras e pagamentos por palestras somam R$ 30,7 milhões. Moro vê ‘generosidade’ suspeita

A Lava-Jato suspeita que dinheiro do esquema de corrupção da Petrobras possa ter irrigado os cofres do Instituto Lula e da LILS Palestras, empresa do ex-presidente Lula. Entre 2011 e 2014, Camargo Correa, OAS, Odebrecht, Andrade Gutierrez, UTC e Queiroz Galvão doaram R$ 20,7 milhões ao instituto e pagaram R$ 9,920 milhões por palestras, num total de R$ 30,7 milhões. Para a força-tarefa, o petista pode ter sido diretamente beneficiado pelo esquema. Documentos apreendidos mostram que a Odebrecht pagou R$ 449,5 mil líquidos (livre de impostos) por palestra de Lula. No caso da OAS, foram US$ 200 mil (cerca de R$ 740 mil).

O juiz Sérgio Moro afirmou em despacho que os vultosos valores chamam atenção e geram dúvidas sobre a “generosidade” das empreiteiras. Para a força-tarefa da Lava-Jato, Lula teria sido beneficiado pelo esquema criminoso instalado no governo federal, que usou recursos da Petrobras.

— Se ele conhecia o esquema e se recebeu vantagens indevidas, estamos investigando nesta operação — disse o procurador Carlos Fernando Lima.

Envolvimento de filhos de Lula
A quebra de sigilos fiscal e bancário do Instituto Lula e da LILS também revelou pagamentos a empresas dos filhos do ex-presidente e a pessoas vinculadas ao PT. A LILS tem como endereço a residência de Lula e não possui qualquer empregado.

O MPF informou ainda ter localizado minutas de contratos firmados entre a OAS e LILS Palestras. Porém, três executivos do alto escalão da OAS, que atuaram entre 2006 e 2014, disseram não se recordar de Lula ter feito palestra na empresa ou custeada por ela.

O Instituto Lula pagou R$ 1,349 milhão à G4 Entretenimento, que pertence à Fábio Luís, filho de Lula, Kalil Bittar e Fernando Bittar — um dos sócios do sítio de Atibaia. Outros R$ 114 mil foram pagos à Flexbr Tecnologia, de Marcos Cláudio Lula da Silva e Sandro Luís Lula da Silva. Luís Cláudio Lula da Silva, por sua vez, recebeu R$ 227.138,85. Em nota, o Instituto Lula afirmou que a G4 presta serviços à instituição há cinco anos e que a suspeita de desvio de dinheiro é “ilação” do MPF.

Lula também teria recebido benefícios indiretos. A Lava-Jato descobriu que a OAS pagou, entre janeiro de 2011 e janeiro de 2016, R$ 1,3 milhão pela armazenagem de parte da mudança retirada do Palácio do Planalto.

Os procuradores dizem que o contrato, em nome da OAS, foi falsificado para omitir o conteúdo armazenado, descrito como material de escritório e mobiliário da construtora. A Granero informou ter armazenado o acervo museológico de Lula, retirado em janeiro passado por Paulo Okamotto, presidente do Instituto Lula. “O Sr. Paulo Okamotto informou que a armazenagem do acervo museológico seria feita por um curto período de tempo e contratada pela apoiadora do Instituto Lula, a empresa OAS”.

Para Moro, Lula é real dono de sítio
Para Moro, há provas de que Lula é o real proprietário do sítio em Atibaia, que teve reformas custeadas pelo empresário José Carlos Bumlai e pela Odebrecht. Segundo o juiz, uma mensagem eletrônica do advogado de Lula, Roberto Teixeira, indica que os atuais donos do sítio, Jonas Suassuna e Fernando Bittar, são “pessoas interpostas": “Conforme solicitado, segue minuta das escrituras de ambas as áreas. Falei ontem com o Adalton e a área maior está sendo posta em nome do sócio do Fernando Bittar. Qualquer dúvida, favor retornar", diz a mensagem.

O sítio foi adquirido em 2010 por R$ 1,539 milhão. As reformas feitas entre 2010 e 2014 custaram R$ 770 mil. A cozinha de R$ 170 mil foi paga pela OAS.

É no nome da empreiteira que está o tríplex do Guarujá, do qual Lula nega ser dono. A Lava-Jato descobriu no celular do ex-presidente da construtora, Léo Pinheiro, mensagens que mostram que o ex-presidente e sua mulher, Marisa Letícia, foram os beneficiários da cozinha instalada no apartamento.

Para os investigadores, embora Lula diga que o apartamento não é dele, há várias provas em contrário, como os depoimentos de dois engenheiros da OAS, do zelador, do porteiro e do síndico do Solaris, além de informações prestadas por sócios e empregados da empresa Talento, que reformou o tríplex. Os gastos com o apartamento somaram R$ 1 milhão.

PT endurece discurso e convoca militância

• Manifestação a favor de ex-presidente será antecipada. Aliados reclamam de ‘golpe’

Sérgio Roxo, Leticia Ffernandes e Isabel Braga - O Globo

Aliados de Lula acreditam que a ação de ontem servirá para mobilizar a militância para atos contra o impeachment de Dilma e em defesa do ex-presidente. Uma manifestação, marcada para o dia 31, deve ser antecipada. Atos pelo Dia Internacional da Mulher, na terça- feira, serão reforçados. Parlamentares de vários estados foram a São Paulo para se solidarizar com Lula, entre eles o líder do governo no Senado, Humberto Costa (PT-PE).

Em publicação no Twitter, o líder do governo na Câmara, deputado José Guimarães (CE), fez sua defesa: “Aos companheiros e companheiras de jornada, o que foi feito hoje com Lula é um espetáculo arbitrário e uma ameaça à ordem democrática”. Ele conclamou a militância para todos irem às ruas defender Lula, e postou uma imagem do expresidente no meio do povo, com a hashtag # ForçaLula. “Vamos pra luta! Todos defendem a ordem democrática! Ruas!”, disse Guimarães.

O senador Lindberg Farias (PT-RJ) foi à sede do partido, em São Paulo, em apoio a Lula:
— Nossa militância agora está com a faca nos dentes.

Para o deputado federal Wadih Damous (PT-RJ), há “golpe” em curso:

— Há um golpe de Estado articulado por setores do Poder Judiciário, do Ministério Público e da Polícia Federal, localizados na República de Curitiba, junto com os grandes meios de comunicação.

Políticos pedem reação
Parlamentares do PC do B que estavam em São Paulo para reunião do partido foram à unidade da PF prestar solidariedade. A deputada federal Jandira Feghali (RJ) anunciou uma reação política para denunciar o que considera ser um “golpe de novo tipo” no país. Jandira usou o Twitter para descrever o que acontecia em Congonhas:

— O povo vai para as ruas. Tem um estado de exceção em curso. Precisamos enfrentar juridicamente e politicamente, não podemos ficar calados. É um golpe de novo tipo, não são os militares, mas parte do Judiciário, alguns procuradores, agentes da polícia e parte da mídia. Mas o comando é do Judiciário. O problema maior é o que parte do Judiciário está fazendo — criticou Jandira, acrescentando: — Vamos ter que reagir politicamente, não tem conversa. Tem que ter comoção nacional.

Jandira classificou a ação de Moro e dos agentes da Lava-Jato de “ilegalidade travestida de legalidade”:

— O Moro quer comandar o Brasil, acuar todo mundo.

Dilma sai em defesa de Lula e rebate suposta delação

• Presidente fez reuniões com ministros, manteve agenda para mostrar 'que governo seguia trabalhando' e externou 'indignação'

Tânia Monteiro e Carla Araújo - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - A presidente Dilma Rousseff articulou desde cedo no Palácio do Planalto para alinhar seu posicionamento e dar resposta em relação à condução coercitiva de seu antecessor e padrinho político, Luiz Inácio Lula da Silva. Comandou uma série de reuniões com ministros, manteve a agenda para mostrar “que o governo seguia trabalhando”, até decidir no fim do dia externar sua “indignação” ao fazer um pronunciamento em defesa do ex-presidente.

“Quero manifestar o meu mais absoluto inconformismo com o fato de o ex-presidente Lula que, por várias vezes, compareceu de forma voluntária para prestar esclarecimentos, seja agora submetido a uma desnecessária condução coercitiva para prestar depoimento”, discursou Dilma, que foi acompanhada pelos ministros Jaques Wagner (Casa Civil), Tereza Campello (Desenvolvimento Social), Patrus Ananias (Desenvolvimento Agrário), Mauro Vieira (Relações Exteriores), Wellington Silva (Justiça), José Roberto Cardozo (AGU), Juca Ferreira (Cultura), Nilma Lino Gomes (Mulheres, Igualdade Racial e Direitos Humanos).

Antes de sua declaração à imprensa, a presidente já havia soltado uma nota oficial.

“O respeito aos direitos individuais passa, nas investigações, pela adoção de medidas proporcionais que jamais impliquem providências mais gravosas do que as necessárias para o esclarecimento de fatos”, disse a presidente, no texto.

A presidente frisou que seu governo garantiu a autonomia dos órgãos responsáveis por investigações de atos de improbidade e de corrupção, mas que sempre exigiu “respeito à lei e aos direitos de todos os investigados”.

Mais cedo, durante reunião com prefeitos, no Palácio do Planalto, Dilma já havia “protestado” contra a ação da Polícia Federal e classificado como “um exagero” a condução coercitiva de Lula. “A presidente protestou porque ela acha que as coisas estão fugindo da normalidade do estado democrático de direito e lamentou que isso esteja acontecendo”, contou o prefeito de Porto Alegre, José Fortunati, do PDT.

Quando Lula já havia decidido se manifestar publicamente em São Paulo, a presidente Dilma decidiu telefonar ao antecessor como manifestação de solidariedade e apoio. A relação dos dois, que já vinha estremecida, ficou mais delicada com a nova ação da PF contra Lula e sua família. O fato ampliou ainda mais a dificuldade de sustentação do governo Dilma. Apesar do abalo, há a possibilidade de que os dois se encontrem hoje na capital paulista para afinar o discurso e traçar estratégias de defesa do seu mandato, do ex-presidente e do PT.

Defesa própria. Apesar de iniciar seu pronunciamento com a fala em defesa de Lula, Dilma usou a maior parte do tempo para rebater acusações do senador e ex-líder do governo Delcídio Amaral e defender a compra da Refinaria de Pasadena, episódio que faz Dilma demonstrar bastante irritação. A presidente destacou pontos da nota que o governo enviou à Procuradoria-Geral da República para justificar o negócio e rebateu quase todos os pontos revelados na delação divulgada na quinta-feira pela revista “IstoÉ”.

“Quero também manifestar não só o meu inconformismo com o vazamento ilegal dos termos de uma hipotética delação premiada feita pelo senador Delcídio do Amaral. Manifesto a minha indignação com os termos das denúncias que teriam sido firmados nesta delação”, disse a presidente.

Dilma acusou o ex-líder do governo de tentar atingi-la por sentimento de “vingança”. “Acredito que seja lamentável que ocorra o vazamento da hipotética delação premiada que, se chegou a ser feita, teve como motivo único a tentativa de atingir a minha pessoa e o meu governo e provavelmente pelo desejo de vingança, imoral e mesquinho desejo de vingança, e de retaliação, de quem não defendeu quem não poderia ser defendido pelos atos”, destacou.

A presidente voltou a criticar vazamentos ilegais de informações e prejulgamentos.

“Vazamentos ilegais, prejulgamentos antes do exercício do contraditório e da ampla defesa, não contribuem para a busca da verdade, mas apenas servem para animar a intolerância e retóricas antidemocráticas”, afirmou Dilma, em pronunciamento na tarde desta sexta-feira.

Dúvida. Pela manhã, no Palácio da Alvorada, a “perplexidade” tomou conta dos integrantes do governo, que não conseguiam decidir o que fazer. Assessores presidenciais relatavam que todos estavam em “estado de choque”. Em um primeiro momento, depois de relatarem a “estranheza” da operação ocorrer um dia depois da delação de Delcídio, interlocutores da presidente tentavam dar um ar de normalidade ao tumultuado dia, informando a presidente estava cumprindo normalmente sua agenda.

O governo não sabia se defendia Lula com veemência ou que postura adotava. Após inúmeras avaliações, reuniões e ponderações, a presidente Dilma decidiu se pronunciar por meio de nota, defendendo o antecessor e padrinho político. Não satisfeita, resolveu que iria fazer um pronunciamento, sem direito a perguntas, para mostrar sua “indignação” e “inconformidade” com o tratamento dispensado pela PF ao ex-presidente. A presidente ainda se reuniu com governadores de estado, para defender a aprovação da CPMF./Colaborou RacheL Gamarski

‘Não há ninguém isento de investigação’, diz procurador

• Frase foi para justificar condução coercitiva do ex-presidente até a PF

Renato Onofre e Cleide Carvalho - O Globo

“Esse é um momento de sermos republicanos. Não há ninguém isento de investigação nesse país”. Foi assim que o procurador da República Carlos Fernando dos Santos Lima justificou a condução coercitiva do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ontem, no início da coletiva sobre a 24 ª fase da Operação Lava-Jato, batizada de Aletheia. Lula, que até então era investigado por ocultação de patrimônio nas denúncias sobre o sítio em Atibaia e o tríplex no Guarujá, agora é suspeito de lavagem de dinheiro e corrupção.

Além do ex-presidente, 11 pessoas ligadas à investigação contra o petista foram obrigadas a prestar depoimento ontem, à Polícia Federal. Agentes fizeram ainda busca e apreensão em 33 endereços de São Paulo, Rio e Bahia.

— Investigamos apenas pessoas sem foro privilegiado — afirmou Lima, completando: — Nós procuramos fazer isso da forma mais silenciosa possível. Entretanto, nós sabemos dos vazamentos.

No início da manhã de ontem, por volta das 5h, os agentes da Polícia Federal já estavam na porta do prédio de Lula, na cidade de São Bernardo do Campo, onde ele mora e construiu sua carreira sindical e política. Os investigadores chegaram em carros descaracterizados para evitar aglomerações. Os veículos foram estacionados na garagem do edifício.

Carro descaracterizado
Assim que vazaram as primeiras informações sobre Lula como alvo da operação, um grande número de manifestantes pró e contra o ex-presidente se dirigiu ao edifício. Para evitar confusão, ele foi retirado pela PF em um carro descaracterizado e levado ao aeroporto de Congonhas. Na unidade da Polícia Federal, ficou em uma área reservada a autoridades. O líder petista é apontado pelo Ministério Público Federal (MPF) como um dos principais beneficiários do esquema de corrupção da Petrobras.

Segundo documento assinado por todos os procuradores da força-tarefa da Lava-Jato em Curitiba, “de fato surgiram evidências de que os crimes o enriqueceram e financiaram campanhas eleitorais e o caixa de sua agremiação política (PT). Mais recentemente, ainda, surgiram, na investigação, referências ao nome do ex-presidente Lula como pessoa cuja atuação foi relevante para o sucesso da atividade criminosa”.

Entre 2011 e 2014, segundo as investigações, 60% das doações (R$ 20 milhões) realizadas em favor do Instituto Lula foram realizadas pelas cinco maiores empreiteiras envolvidas na Lava-Jato, entre elas a OAS e a Odebrecht. As duas empresas estão envolvidas em 47% (R$ 10 milhões) dos pagamentos dos contratos de palestras realizadas pela empresa LILS, entre 2011 e 2014.

Lula depôs por três horas e meia aos agentes da PF e procuradores federais, que vieram de Curitiba para interrogá-lo. Apesar de ter o direito de ficar em silêncio, já que pela primeira vez ele é ouvido como investigado, o ex-presidente respondeu às perguntas e se irritou.

De acordo com o deputado federal Paulo Teixeira (PT-SP), o ex-presidente se mostrou incomodado pelo menos três vezes. O momento de maior irritação ocorreu ao ser questionado sobre os pedalinhos mantidos pela família no sítio de Atibaia, que têm os nomes de dois dos seus netos. Os equipamentos foram comprados pelo militar Rogério Pimentel, assessor especial da Presidência da República, que estava entre as 11 pessoas ouvidas pela PF.

Amizade questionada
Os agentes perguntaram ao ex-presidente se ele era o dono do sítio e do tríplex em Guarujá, no litoral paulista. Lula disse que a “resposta estava nos documentos”. O petista também foi questionado sobre sua proximidade com o ex-presidente da OAS, José Aldemário Pinheiro Filho, conhecido como Léo Pinheiro. O empreiteiro, condenado a 16 anos de prisão por sua participação no esquema de corrupção da Petrobras, teve mensagens interceptadas pela PF, nas quais combina a entrega das reformas das duas propriedades à “madame”. O codinome é usado pelo empreiteiro ao referir-se à mulher do ex-presidente, Marisa Letícia.

Parentes de Lula também foram alvo da ação da PF. O juiz Sérgio Moro autorizou busca e apreensão nas residências de Fábio Luís e Luiz Cláudio, filhos do ex-presidente. A casa do petista em São Bernardo também foi revistada, assim como um outro apartamento do casal, no mesmo prédio.

Além do depoimento de Lula, os investigadores levaram coercitivamente para a sede da PF, em São Paulo, seu braço-direito Paulo Okamotto, presidente do Instituto Lula. Antes da deflagração da operação, o MPF chegou a pedir a prisão de Okamotto, mas Moro negou. Também estiveram no prédio da PF José de Filippi, tesoureiro das campanhas de Lula, em 2006, e de Dilma, em 2010, acusado de receber ao menos R$ 3,6 milhões ilegalmente.

Além dos dois, foram ouvidos João Henrique Worn, taxista que teria levado dinheiro da construtora UTC para Filippi, e Antônio Pazine e Paulo Marcelino Coelho, que teriam auxiliado no transporte do acervo de Lula para Atibaia.

Cerca de 200 policiais federais e 300 auditores cumpriram os 33 mandatos. Foram cinco de busca e apreensão em São Bernardo do Campo; dois em Atibaia, onde Lula frequenta um sítio; um no Guarujá, onde seria beneficiário de um apartamento. Houve mandados nas cidades paulistas de Diadema, Santo André e Manduri, e em prédios ligados à OAS e à Odebrecht. (Colaboraram Tiago Dantas e Sérgio Roxo).

'Lula não pode usar de subterfúgios para fugir à lei', diz Alckmin

• Governador de São Paulo, que encontrou-se com Dilma nesta sexta, afirma, ainda, que é preciso acelerar a discussão sobre o processo de impeachment da presidente

Eduardo Rodrigues, Rachel Gamarski, Carla Araújo e Lorenna Rodrigues - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Após reunir-se com a presidente Dilma Rousseff e governadores nesta sexta-feira, 4, para tratar da renegociãção da dívidas dos entes federativos, o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB) c0mentou a condução coercitiva do ex-presidente Lula nesta sexta para depor à Polícia Federal, Alckmin repetiu outros governadores e disse que ninguém está acima da lei. "O Lula sempre se vangloriou de que, pela primeira vez na história do País, a Polícia Federal teria independência. O ex-presidente tem todo o direito de defesa, mas não pode usar de subterfúgios para fugir à lei", disse.

O governador relatou que a presidente explicou aos chefes de Executivo estaduais a sua participação na questão da refinaria de Pasadena e entregou um documento com explicações a cada um deles. Em tratativa de delação premiada, o senador Delcídio Amaral afirmou que a presidente conhecia todos os detalhes da compra da refinaria.

Ainda assim, Alckmin reforçou que é preciso acelerar a discussão sobre o processo de impeachment da presidente. "É preciso acelerar as discussões, inclusive no âmbito do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), valorizar a Justiça e cumprir a Constituição. O Brasil não pode continuar nesse impasse, o Brasil precisa continuar funcionando. Não se pode parar ainda mais o País, agravando o quadro econômico", comentou.

Dívida. Alckmin avaliou ainda que a questão da dívida dos Estados é extremamente relevante e considerou "inacreditável" a evolução do endividamento paulista após a última renegociação com a União. Segundo ele, em 1997, o governo estadual renegociou uma dívida de R$ 46,5 bilhões, desde então, pagou R$ 146 bilhões e hoje ainda deve R$ 222 bilhões.

"É inacreditável você pagar R$ 140 bilhões e ainda dever R$ 220 bilhões. O alongamento é necessário e importante", disse o governador, após reunião com a presidente Dilma Rousseff e o ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, no Palácio do Planalto.

De acordo com ele, apesar da discussão sobre os juros da dívida dos Estados estar judicializada, é preciso avançar nas discussões mesmo sem uma decisão final do Supremo Tribunal Federal (STF). "O Brasil não pode virar um país de rentistas. O Brasil é um país de empreendedores", acrescentou.

O governador evitou comentar sua posição em relação à volta da CPMF, mas disse que o governo federal precisa equacionar a sua situação fiscal que passaria também pelo corte ainda maior de gastos. "Mas sou favorável ao veto da repatriação de recursos do exterior. Achamos que o veto está correto e vamos defender a sua manutenção no Congresso. Esses recursos devem ser usados para a reforma estruturante da questão tributária", disse.

Aécio diz que caso de Lula será resolvido 'nos tribunais'

• 'Essa questão não será resolvida no braço, nem nas ruas, será resolvida nos tribunais', afirmou o presidente do PSDB

Isabela Bonfim, Daiene Cardoso e Daniel Carvalho - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - O presidente do PSDB, Aécio Neves (PSDB-MG) pediu que a população encare o atual momento com serenidade e defendeu que as questões relativas ao ex-presidente Lula devem ser resolvidas na Justiça, sem insuflar a sociedade ao confronto.

"Essa questão não será resolvida no braço, nem nas ruas, será resolvida nos tribunais", afirmou o senador tucano. Ele considerou um ato de "pouca sensibilidade" a convocação dos dirigentes petistas à população.

"Me preocupou a convocação feita pelo próprio presidente do PT sem nenhuma palavra de apelo a serenidade, de apelo ao bom senso, à tranquilidade. A palavra que quero transmitir aos milhões de brasileiros é de absoluta tranquilidade e que não aceitem provocações."

Aécio reiterou o convite aos movimentos sociais, para que compareçam às manifestações que pedem o afastamento da presidente Dilma Rousseff, agendadas para o próximo dia 13 de março. O senador, entretanto, defendeu manifestações pacíficas.

"Espero que no dia 13 possamos ter os brasileiros demonstrando sua insatisfação com o Brasil, contra a corrupção, o desemprego e ausência de governo. Da nossa parte, as manifestações serão, como sempre foram, absolutamente pacíficas."

Temer diz que momento do Brasil é de ‘refluxo institucional’

• Vice-presidente diz que situação de crise, como em outros momentos da História, demanda 'novas providências do povo'

Igor Gadelha - O Estado de S. Paulo

O vice-presidente Michel Temer disse nesa sexta-feira que o Brasil vive mais um período de crise que, como em outras situações da História, demanda “novas providências do povo brasileiro”. A declaração foi feita durante participação do peemedebistas no 106º Encontro do Conselho de Tribunais de Justiça, em Campo Grande (MS).

Ele afirmou que, no Brasil, o Poder Executivo tem historicamente uma “vocação centralizadora muito forte” e que essa característica ficou evidente em vários períodos entre 1930 e 1991. Segundo Temer, essa vocação foi, inclusive, uma das responsáveis por desencadear o Golpe de 1964, que levou ao País novamente a uma concentração de poder que seguiu até a Constituição de 1988.

“A cada 25, 30 anos, há um refluxo, quase um fatalismo histórico, um fluxo e refluxo institucional, começam a aparecer crises que demandam novas providências do povo brasileiro”, afirmou Temer, primeiro da linha sucessória caso a presidente Dilma Rousseff seja impedida de continuar no cargo.

De acordo com Temer, atualmente o Brasil vive um desses momentos. “Estou dizendo que temos hoje problemas políticos, econômicos etc., que podem gerar a ideia de uma crise institucional, o que é ruim para todos nós, porque você não consegue romper esse ciclo histórico. Ou seja, a cada 25, 30 anos você tem que mudar as instituições”, disse.

O peemedebista afirmou que, nessa cultura de centralização do Executivo, o Judiciário é o responsável por dar estabilidade e harmonia ao sistema político. “O poder Judiciário, se diz, tem que ter uma tranquilidade absoluta, uma moderação, um equilíbrio, que tem sido a marca, aliás, dos judiciários de todo o País e das cortes superiores.” Segundo ele, o Legislativo não tem como dar essa estabilidade, pois é um poder em que há muitos conflitos.

Gilmar considera que momento é ‘delicado’

• Ministro do Supremo diz que situação está desgastada

Carmen Pompeu - O Estado de S. Paulo

“Antes batiam à nossa porta e a gente sabia que era o leiteiro, não a polícia. Mas, hoje, a situação está tão desgastada que a polícia tem batido em muitas portas, mas com ordem judicial, claro”, comentou o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, nesta sexta-feira, durante palestra para estudantes de Direito em Fortaleza sobre o tema Perspectivas atuais da Justiça Eleitoral”.

A declaração, feita em tom de brincadeira, foi uma referência à condução coercitiva do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para depoimento na Polícia Federal, dentro da 24ª fase da Operação Lava Jato.

Sem querer se aprofundar mais no assunto, Gilmar Mendes avaliou o momento como “muito delicado” e que agrava a crise a atual crise política do País.

“Não tenho elementos para avaliar a decisão do juiz Sérgio Moro, mas certamente ele deve ter tomado todas as cautelas. É uma decisão com grande repercussão no plano social, econômico e político”, analisou.

Acuado, Lula 'dribla' denúncias e lembra estratégia no mensalão

Eduardo Scolese – Folha de S. Paulo

A situação era atípica. Lula estava diante de um microfone e ao vivo para todo o país, duas horas após ter sido obrigado pela Polícia Federal a prestardepoimento como investigado em uma operação sobre corrupção.

Mas Lula foi o Lula de sempre. Na sede do PT, agiu como se estivesse em um comício de campanha ou em um discurso dos tempos de Planalto.

Sob pressão, não tocou diretamente em nenhuma das suspeitas que pesam contra ele. Se apegou a pontos laterais, como o pedalinho do sítio, fez piadas, atacou as elites e a imprensa, ficou com a voz embargada e lembrou da origem pobre no agreste pernambucano. Foi o velho Lula.

A fala de cerca de 30 minutos na tarde desta sexta-feira (4) no centro de São Paulo lembrou um discurso inflamado de 50 minutos feito por ele em Luziânia, no interior goiano, no dia 21 de junho de 2005. Uma fala lembra a outra pelas circunstâncias, pelo entorno e pela estratégia.

PF faz operação na casa do ex-presidente Lula, na Grande SP
A atual ocorre com Lula no centro do furacão da Lava Jato. A de 11 anos atrás aconteceu só duas semanas após Roberto Jefferson ter denunciado à Folha oesquema do mensalão –foi a primeira defesa enfática que fez naquela ocasião.

Em ambas as falas, a plateia era formada por simpatizantes, que riam das piadinhas e interrompiam a fala com aplausos. Na atual, estava cercado de militantes petistas. Na de 2005, 800 trabalhadores rurais superlotaram um auditório para ouvi-lo.

Mas o que chama mesmo a atenção é a semelhança dos argumentos de 2005 e 2016 e a habilidade oral para passar uma imagem de pobre vítima e de perseguido político.

Para o Lula de Luziânia, sob a pressão do mensalão, e o Lula desta sexta, sob a pressão do petrolão, parece que nada aconteceu no Brasil antes de sua passagem pelo Palácio do Planalto. Lula se acha beneficiado por milagres e se autodeclara o maior presidente do país.

O Lula ético de 2005 é o mesmo de 2016. Em Luziânia, desabafou: "Ninguém neste país tem mais autoridade moral e ética do que eu para fazer o que precisa ser feito neste país". Na sede nacional do PT, nesta sexta, emendou: "Se a Polícia Federal ou o Ministério Público encontrarem um real de desvio na minha conduta, eu não mereço ser desse partido".

Sobre denúncias, o Lula de 2005 chamou de "bobagens" e "vazias" as do mensalão. O de 2016 ironiza os questionamentos sobre o apartamento de Guarujá, o sítio de Atibaia e suas palestras pelo mundo.

As ironias também se encaixam. Em 2005, adotou o sarcasmo diante de um dirigente dos Correios flagrado ao receber propina. "E vejam que tudo isso que nós estamos vivendo [crise política] é por conta de um cidadão que diz que pegou R$ 3.000."

Agora, a ironia é com o barco comprado por sua mulher, Marisa Letícia, e que indica a ligação da família com o sítio de Atibaia reformado por empreiteiras investigadas na Lava Jato. "Se eu pudesse, eu dava era um iate para ela, não um barco de R$ 4.000."

Lula pode estar em baixa, mas as campanhas eleitorais não saem de sua cabeça. Parece viciado num palanque, num tête-à-tête com os eleitores e nas brigas políticas. Em 2005, dizia que seus adversários estavam "com medo" da sua reeleição. Agora, a ameaça é com 2018: "Se quiseram matar a jararaca, não bateram na cabeça, bateram no rabo, e a jararaca está viva como sempre esteve".

Polícia Federal faz operação na casa do ex-presidente Lula, na Grande SP

Bruno Fávero, Renan Marra, Bela Megale, Flávio Ferreira, Mônica Bergamo, Natuza Nery – Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - A Polícia Federal realizou na manhã desta sexta-feira (4) a 24ª fase da Operação Lava Jato no prédio do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e de seu filho Fábio Luís Lula da Silva –também conhecido como Lulinha.

Essa fase da operação, batizada de Aletheia, apura se empreiteiras e o pecuarista José Carlos Bumlai favoreceram Lula por meio do sítio em Atibaia e o tríplex no Guarujá. O ex-presidente nega as acusações.

Em sua manifestação mais contundente desde o início da Lava Jato, a força-tarefa do Ministério Público Federal afirmou em nota que Lula é "um dos principais beneficiários" de crimes cometidos no âmbito da Petrobras.

Lula foi levado para o aeroporto de Congonhas (zona sul), onde prestou depoimento à Polícia Federal.

O ex-presidente foi alvo de mandado de busca e apreensão e de condução coercitiva (quando o investigado é obrigado a depor). Os advogados dele tinham entrado com habeas corpus para evitar a medida, mas ele valia só para São Paulo, e não para Curitiba, de onde despacha o juiz federal Sergio Moro, conforme informações dadas à Folha. Lula reagiu bem quando a PF bateu à sua porta. Segundo relatos, o petista estava "tranquilo" dos momentos iniciais até a condução coercitiva.

Operação na casa de Lula e Lulinha
Os carros da PF chegaram às 6h à sua casa, em São Bernardo. Quatro carros entraram na garagem do prédio e cerca de dez agentes ficaram na portaria. A mulher de Lula, dona Marisa, não está na condução coercitiva.

Cerca de 200 agentes da PF e 30 auditores da Receita Federal cumprem, ao todo, 44 mandados judiciais, sendo 33 mandados de busca e apreensão e 11 de condução coercitiva no Rio de Janeiro, em São Paulo e na Bahia. São investigados crimes de corrupção e lavagem de dinheiro, entre outros, relacionados à Petrobras. A determinação da busca e apreensão é do juiz Moro, de Curitiba.

Na casa de Lulinha, em Moema, dois carros da PF e um da Receita Federal foram usados na diligência. Os agentes chegaram ao prédio dele às 6h e não falaram com a imprensa. Moradores relatam movimentação intensa da PF no interior do prédio.

A Polícia Federal também realizou uma operação de busca e apreensão no tríplex no Guarujá. Quatro agentes chegaram ao Condomínio Solaris Astúrias por volta das 6h e ficaram lá até 11h15. Eles também ouviram funcionários e moradores do prédio. A chegada dos policiais despertou grande curiosidade entre moradores turistas. "Chama bastante atenção, a gente que mora próximo fica sempre de olho pois sabe que algo pode acontecer", afirmou Vivian Camargo, moradora de um prédio vizinho.

Há também agentes da PF no Instituto Lula e na Odebrecht. E mandados para Atibaia, onde está o sítio, além de Santo André e Manduri. A PF realiza busca e apreensão na casa e na empresa do outro dono do sítio no papel, Jonas Leite Suassuna Filho, que também é sócio de Lulinha.

Sindicalistas protestaram em frente à casa de Lula. Os movimentos sociais organizam ato para a tarde desta sexta-feira (4) em resposta à condução coercitiva do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Coordenador dos Movimentos Populares, Raimundo Bonfim avisa que haverá reação: "No início da tarde faremos uma reunião de emergência da Frente Brasil Popular. Vamos organizar a resistência."

Houve confusão mais cedo em São Bernardo (SP), onde manifestantes favoráveis e contrários a Lula se aglomeraram após a notícia da ação da PF. Houve confronto físico e policiais da tropa de choque intervieram para apartar os grupos.

Alvos
Além de Lula, entre os alvos dessa fase da Lava Jato estão a mulher dele, Marisa, os filhos Marcos Cláudio, Fábio Luis e Sandro Luis, e a nora Marlene Araújo. Na lista de alvos também estão os empresários Fernando Bittar e Jonas Leite Suassuna Filho, assim como Paulo Okamotto, presidente do Instituto Lula. Entre as empresas há a empreiteira OAS e a Gamecorp –do filho de Lula, Fabio Luis.

Na capital paulista, são 18 mandados de busca e apreensão e seis de condução coercitiva; em São Bernardo, cinco de busca e apreensão e dois de condução coercitiva; Atibaia, duas buscas e apreensões e uma condução coercitiva; Guarujá, uma busca e apreensão; Diadema, uma busca e apreensão e uma condução coercitiva; em Santo André, uma busca e apreensão, assim como em Manduri.

No Rio de Janeiro (RJ) estão sendo cumpridos dois mandados de busca e apreensão. Já em Salvador, na Bahia, são duas buscas e apreensões e uma condução coercitiva.

Outro lado
Diante das acusações de Delcídio, o Instituto Lula divulgou nota, nesta quinta, afirmando que o "ex-presidente Lula jamais participou, direta ou indiretamente, de qualquer ilegalidade, seja nos fatos investigados pela operação Lava Jato, ou em qualquer outro, antes, durante ou depois de seu governo".

Aletheia
Aletheia é uma palavra grega que significa "verdade" e, também, "realidade", "não-oculto", "revelado", entre outras asserções. Na filosofia, notadamente nos escritos do alemão Martin Heidegger (1889-1976), o sentido original de "revelação" é recuperado: para o pensador, aletheia é a verdade objetiva, desvelada, contrapondo-se à verdade descrita convencional.

O termo é comumente usado na psicologia também, quando se trata da busca por uma verdade além das aparências. Heidegger, um dos mais influentes filósofos do século 20, teve a reputação tisnada por colaborar com o nazismo, mas sua obra permaneceu.

Delcídio
A ação é realizada um dia após ser revelado um acordo de delação premiadado senador Delcídio do Amaral (PT-MS). O parlamentar revelou que Lula mandou comprar o silêncio de Nestor Cerveró e de outras testemunhas.

Detalhes do acordo foram veiculados pelo site da revista "IstoÉ", que publicou reportagem com trechos dos termos de delação. A informação de que Delcídio fechou acordo de delação premiada foi confirmada à Folha por pessoas próximas às investigações da Lava Jato.

O senador também diz que Dilma Rousseff usou sua influência para evitar a punição de empreiteiros, ao nomear o ministro Marcelo Navarro para o STJ. O ministro Teori Zavascki, do STF, decidirá se homologa ou não a delação.

‘Tradição de impunidade é desafiada’, diz cientista político

• Cientista político da USP afirma que rivalidade entre grupos pró e contra Lula e o PT não ajuda a democracia brasileira

Gabriela Caesar – O Estado de S. Paulo

O cientista político José Álvaro Moisés, da Universidade de São Paulo (USP), aponta o depoimento do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva ontem como uma síntese do atual momento do País. Para ele, “há um processo com emergência de integridade que enfrenta a tradição de impunidade que sempre existiu no Brasil”. A seguir, os principais trechos da entrevista ao Estado

Qual é a importância histórica dos episódios de ontem para o País?

A resposta vai depender do desdobramento do que aconteceu. Há acusações muito graves na apresentação que os promotores fizeram e que estão na dependência dos esclarecimentos do ex-presidente.

Há semelhanças entre esses episódios e outros momentos importantes da vida política nacional?

Eu acho que esse episódio é bem típico do momento que estamos vivendo. A minha interpretação é que estamos tendo uma espécie de situação em que várias camadas da crise se sobrepõem. A crise econômica se sobrepõe à crise política. Por baixo disso tem um processo das instituições de fiscaliza- ção e controle aumentarem a capacidade de perceber e, ao mesmo tempo, punir situações de abuso de poder. É um processo com a emergência de integridade que passa, pela primeira vez, a enfrentar a tradi- ção de impunidade que sempre persistiu no Brasil.

Qual é o impacto disso nos movimentos de rua que vêm ocorrendo desde o ano passado?

Nós vimos que está aumentando a polarização. As pessoas que são a favor ou contra o PT e o ex-presidente Lula estão progressivamente se mobilizando mais e, às vezes, se confrontando. É preciso olhar isso com muito cuidado. Por um lado, tem uma coisa que é positiva: as pessoas quererem mais participação e querem se posicionar. Mas alguns segmentos estão estimulando setores da opinião pública a se comportarem com “nós contra eles”, “as elites contra nós”. Não é um discurso bom para a democracia, que tem como um dos principais princípios reconhecer a legitimidade da diversidade.

O que sr. achou da condução coercitiva?

Tenho dúvidas se teria sido necessária a condução coercitiva nos termos em que ela ocorreu.

Segundo as palavras de Lula, a ação da PF foi ‘o que precisava para o PT levantar a cabeça". O sr. concorda?

Faz sentido para o ex-presidente e para o PT tentar recuperar a imagem diante da opinião pública. Você estabelece uma solidariedade com quem é considerada uma vítima. Da maneira como foi feita, abriu-se a possibilidade de o ex-presidente Lula e o PT explorarem essa imagem de vitimização.

Entidades jurídicas defendem Moro e a PF

• Associações de juízes e outros magistrados consideraram normal a condução coercitiva utilizada ontem

André de Souza - O Globo

Associações de classe do mundo jurídico — juízes, advogados e procuradores da República — saíram em defesa da 24ª fase da Operação Lava-Jato, que tem como alvo o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. As entidades destacam que, numa República, ninguém está imune à investigação ou acima da lei. Algumas entidades também fizeram uma defesa da autorização dada pelo juiz federal Sérgio Moro para que a Polícia Federal (PF) realizasse a condução coercitiva do ex-presidente. Esse foi um dos pontos da decisão mais criticados por Lula e seus aliados.

Em nota, a Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) rechaçou os ataques à Operação Aletheia. De acordo com a associação, foram respeitados “os direitos de ampla defesa e do devido processo legal, sem nenhuma espécie de abuso ou excesso”. Também negou que a operação seja um espetáculo midiático ou tenha enfoque político. E criticou quem estimula reações violentas à operação. “As incitações para retaliações e violências, inclusive pelas redes sociais, não são compatíveis com os valores democráticos e constitucionais”, diz trecho da nota.

“A Ajufe e as associações regionais e seccionais que legitimamente representam os magistrados federais do Brasil não se intimidarão com qualquer tipo de ameaça e reforçam o apoio e a confiança nos agentes públicos, em especial aos juízes e servidores da Justiça Federal, para continuarem a agir nos termos legais e constitucionais, sem se afastar do seu destino maior de servir à sociedade e distribuir justiça”, informou a Ajufe.

A entidade que representa os juízes federais também destacou que “os fatos apurados na investigação estão alinhados e são coerentes com todos os desdobramentos já ocorridos na Operação Lava-Jato, cuja lisura tem sido continuamente reafirmada pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região, Superior Tribunal de Justiça e pelo próprio Supremo Tribunal Federal”.

A Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) também soltou nota elogiando a atuação do Judiciário brasileiro na Lava Jato. “Para a entidade, a Justiça tem demonstrado eficiência e independência diante do alcance das investigações, da gravidade dos atos de corrupção e das pressões políticas enfrentadas. A firme atuação do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem sido exemplo de independência e seriedade, correspondendo aos anseios da sociedade e aos valores republicanos dispostos na Constituição da República”, diz trecho da nota assinada pelo presidente da AMB, João Ricardo Costa.

A Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR) defendeu a atuação do MPF e de outros órgãos públicos, dizendo que seguiram “a mais rígida e cuidadosa observância dos preceitos legais, sem violência ou desrespeito aos investigados”. Também não viu problemas na autorização para a condução coercitiva de Lula, definida como “instrumento de investigação previsto no ordenamento, autorizada no caso do ex-presidente Lula de forma justificada e absolutamente proporcional, para ser aplicada apenas se o investigado eventualmente se recusasse a acompanhar a autoridade policial para depoimento penal. A condução coercitiva somente ocorre enquanto as providências urgentes de produção de provas estão em cumprimento. Em momento algum as garantias constitucionais do investigado foram ou podem ser desrespeitadas”, diz um trecho da nota assinada pelo presidente da ANPR, o procurador regional da República José Robalinho Cavalcanti.

OAB defende a Constituição
O presidente da Ordem dos Advogados do Brasil ( OAB), Claudio Lamachia, disse ontem que não poderia fazer juízo de valor sobre eventuais ilegalidades na operação, uma vez que não tinha conhecimentos suficientes.

— Eu posso dizer que estou, seguramente como todos os brasileiros, também estarrecido com esse fato que hoje nós estamos vivenciando — disse Lamachia,
acrescentando:

— Seja o ex-presidente Lula, seja qualquer cidadão brasileiro, nós vivemos no Estado democrático de direito. E as nossas normas devem ser cumpridas com qualquer pessoa. A Constituição não exclui ninguém. Ela aponta foro de prerrogativa de função, mas para agentes públicos. Mas nenhum cidadão brasileiro deve estar isento de responder, se cometeu alguma ilicitude, pelos seus atos.

Partidos com ex-petistas defendem a Lava-Jato

• Mas reclamam do que chamam de ‘seletividade das investigações’

Isabel Braga - O Globo

Partidos mais à esquerda e que têm em seus quadros ex-petistas que se desligaram da legenda por discordarem dos rumos do PT, a Rede Sustentabilidade e o PSOL divulgaram notas sobre a nova fase da Operação Lava-Jato. Os dois partidos defendem a investigação dos fatos, mas com ressalvas à seletividade das apurações, no caso do PSOL, e a conclusões precipitadas, no caso da Rede.

A nota do PSOL faz referência direta a Lula, diz que a condução coercitiva e a prisão de pessoas próximas a ele não são fatos corriqueiros e representam "um declínio acelerado do PT e de seus governo". Além de criticar a seletividade das apurações, o PSOL repete o discurso do PT e do PC do B, de "pirotecnia" das ações.

A nota da Rede prega a reunificação do Brasil em defesa da Justiça e da estabilidade institucional, critica a incitação de confronto de rua e diz que a gravidade dos fatos requer todo apoio à investigação profunda e rigorosa de todos os envolvidos: "A incitação ao confronto nas ruas é motivo de grave preocupação e exige responsabilidade e serenidade de todas as lideranças comprometidas com o Brasil e com a democracia. Não é hora de incitar os ânimos para a guerra”.

Enrascadas! - Miguel Reale Júnior*

- O Estado de S. Paulo

Duas são as desculpas mais comumente apresentadas por Lula e pelo PT por estarem no centro de investigações criminais ao lado de empreiteiras privilegiadas com sobrepreços em contratos com a Petrobrás: a criminalização do PT pela grande imprensa e o despeito das elites, inconformadas com a ascensão das classes pobres. O discurso da vitimização só aumenta de volume, com o PT e Lula choramingando no meio do lodaçal em que se meteram e no qual imaginavam que se iriam fartar, escondidos no fato de terem trazido, graças ao programa Bolsa Família, melhoria a milhões de pessoas. Que enrascada!

A imprensa apenas tem levado ao conhecimento de leitores, ouvintes ou telespectadores fatos trazidos à tona pelas diversas operações da Polícia Federal e pelos processos instaurados, em especial na 13.ª Vara da Justiça Federal, cujo titular é o juiz Sergio Moro. A curiosidade geral justifica-se, pois todos querem estar a par de como, quando, quem, onde se surrupiou o dinheiro público em benefício final de políticos e de partidos.

Como a imprensa poderia tratar, senão com grande interesse, o fato de as três maiores empreiteiras do País promoverem benesses no sítio e no apartamento em nome de terceiros, mas cuidados e frequentados por Lula e sua mulher? Como noticiar a delação de Delcídio Amaral, que revela Lula e Dilma promovendo medidas em favor dos réus do petrolão, em grave interferência no curso do processo criminal? Apenas com nota de rodapé, fato que, se verdade, transforma o governo em organização criminosa? Silenciar acerca de uma enrascada dessas?

A imprensa deveria crer nos comunicados do Instituto Lula no sentido de não ser o ex-presidente dono do tríplex no Guarujá ou do sítio em Atibaia? Cumpriria nada perquirir acerca das razões por que três grandes empreiteiras se preocuparam com o andamento das reformas e melhorias no sítio de Fernando Bittar? Por que o presidente de uma empreiteira autorizou a compra, com dinheiro vivo, de cozinhas da Kitchens para o tríplex, do qual o cotista desistira, ou o sítio de um zé-ninguém, o filho de Jacó Bittar? Deveria a imprensa admitir, como diz Lula em petição ao STF, ter sido a reforma do sítio um presente de Bumlai, apesar de este negar e indicar uma empreiteira como a autora da obra? Deveria a imprensa não avaliar a recusa de Lula a depor ao Ministério Público, unilateralmente adotando a prerrogativa apenas própria de presidente em exercício de enviar declaração por escrito?

Dever-se-ia impedir a veiculação da prisão do marqueteiro do PT e de sua mulher, por contas ilícitas no exterior alimentadas por empreiteira? Caberia omitir a denúncia de Delcídio Amaral acerca da participação de Lula e Dilma visando a “melar” o processo do petrolão? Ora, não é a imprensa que cria os fatos, estes é que pautam a imprensa pelo interesse que suscitam.

Quanto ao ressentimento da elite inconformada com a elevação do nível de vida dos pobres, cabe indagar: quem constitui essa elite raivosa? Por que ter ódio de se haver promovido o bem de muitos pobres, que redundou, na verdade, sob o aspecto econômico, no bem geral, pois promoveu o consumo e animou a atividade do mercado? Seriam os malvados com a melhoria dos miseráveis os 50 milhões de eleitores de Aécio? Seria o PSDB a fonte da revolta com a ascensão dos pobres?

O PSDB foi formado por líderes de centro-esquerda, com larga preocupação social que se expressou em programas sociais nos governos estaduais e no federal. O Bolsa Família, Lei n.º 10.836/2.004, nasceu da junção do Fome Zero com programas instituídos no governo Fernando Henrique: o Programa Nacional de Renda Mínima vinculado à educação-Bolsa Escola, o Programa Nacional de Renda Mínima vinculada à saúde-Bolsa Alimentação e o Programa Auxílio Gás. Ruth Cardoso, esposa de Fernando Henrique, dirigiu no governo dele trabalho de capacitação solidária, visando à profissionalização dos mais pobres.

Portanto, as esfarrapadas desculpas do PT e de Lula confirmam os fatos e ofendem a inteligência. Por essa razão, a cada dia a ladainha petista só faz crescer a revolta diante da corrupção e das tramas em favor da impunidade. De outra parte, a direção errática da economia, que levou ao artifício das pedaladas, causou o desastre do desemprego, da inflação, terrível para os mais pobres, bem como o medo perante o futuro com descrença total em Dilma e na classe política. Como sair dessa enrascada?

A revolta diante da corrupção, potencializada pelas explicações bisonhas, não levará ao caminho trágico da guerra civil ou da intervenção militar. O julgamento do processo no TSE demorará. Vem de começar a instrução e, apesar do escândalo revelado pela Operação Acarajé, o julgamento só ocorrerá no segundo semestre e é passível de recurso ao STF.

O impeachment, após a intromissão abusiva do Supremo, contrariando o decidido no caso Collor (basta ver o acórdão do MS n. 21.564-DF), depende para prosseguir de esclarecimentos cobrados em embargos de declaração. Depois poderá recomeçar, até com novos fatos, não se sabendo ainda de que forma e com quais forças políticas em ação. Se Dilma for afastada, resta o processo no TSE, que poderá no futuro atingir Michel Temer, ou seja, mais um presidente na berlinda.

O Brasil merece que as lideranças políticas busquem um caminho. Os brasileiros, com medo do desemprego e desespero diante doimpasse político, vão às ruas novamente dia 13 deste mês. O povo nas ruas muito fragiliza o governo, mas não anuncia soluções.

A única estrada possível é novo sistema de governo, o semipresidencialismo, com primeiro-ministro confiável, fruto de grande acordo nacional. Dilma, afastada pelas infrações cometidas, cabe ser substituída pelo vice, mas com reduzidas atribuições, pois caberá ao primeiro-ministro governar.

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*Miguel Reale Júnior é advogado, professor titular senior da Faculdade de Direito da USP, membro da Academia Paulista de Letras e foi Ministro da Justiça