segunda-feira, 17 de maio de 2010

Reflexão do dia – Alfredo Bosi

O livro revela certa antipatia pela sociologia – definida como “filha dileta do positivismo” - e simpatia pelo inconformismo dos filósofos. O mundo contemporâneo estaria carente de bons pensadores, sufocado de “ideologias” e tabelas criadas por sociólogos? O senhor tenderia mais para o lado dos utopistas e menos para o dos ideólogos?


Sigo de perto as considerações críticas feitas por Gramsci sobre a sociologia norte-americana que, na sua época, mapeava a “realidade” mediante tabelas estatísticas que tendiam a imobilizar o rosto do processo social.

A teoria crítica de Horkheimer e Adorno chegou, com outra linguagem, a igual consciência em relação à sociologia acadêmica ocidental.

Gramsci, porém, dava importância ao estudo sociológico que permite detectar algumas tendências de comportamento no interior das classes sociais.

(Alfredo Bosi, entrevista no suplemento sabático, em O Estado de S. Paulo, sábado,15/5/2010)

Pequenas grandes mudanças:: Luiz Werneck Vianna

DEU NO VALOR ECONÔMICO

A iniciativa popular conhecida pela designação de lei dos "Ficha Suja", ora em tramitação no Congresso Nacional, já aprovada com votação altamente expressiva na Câmara dos Deputados, além do seu valor intrínseco como um meio capaz de produzir efeitos benfazejos na nossa representação política, é mais um sinal positivo no processo de aperfeiçoamento das nossas instituições. Ela significa que a transição política do regime autoritário para a democracia, longe da interpretação de alguns, importou mudanças de fundo, algumas percebidas imediatamente, outras, somente com o transcurso do tempo.

Dessa última natureza estão aquelas dependentes da ação de atores externos à esfera pública institucionalizada, como a do simples cidadão singular, bem o caso dessa iniciativa contra os "Ficha Suja". Isso se deve ao fato, também negligenciado, de que se não houve uma ruptura de tipo clássico contra o sistema da ordem do nosso antigo regime, a Constituição, filha da resistência democrática à ditadura e da forte mobilização popular que a sustentou, instituiu um conjunto de instrumentos postos à disposição da sociedade para agir em nome próprio em busca dos seus diferentes fins. A decantação da sua obra na vida civil, especialmente na consciência popular, tem sido, como inevitável, lenta e desigual entre as diferentes camadas sociais. No entanto, é de se registrar - um exemplo entre tantos - que o Estatuto da Cidade, nascido na esteira da filosofia política da Carta de 1988, tem sido apropriado pela linguagem de moradores de favelas cariocas nas suas reivindicações por direitos.

Tal decantação, a valerem os abundantes dados estatísticos, tem no Judiciário um dos seus principais lugares de realização. E não à toa, uma vez que é para aí que convergem as demandas de massa, como nos casos do direito à saúde, do consumidor e do que diz respeito ao meio ambiente, mobilizando, com frequência cada vez maior, os valores e os princípios consagrados constitucionalmente. Mas, esse movimento, tal como se verifica na ação dos que se opõem, em nome do princípio de moralidade pública, a que a via eleitoral seja facultada a pessoas condenadas por faltas graves contra a pessoa, o patrimônio e a administração pública, não se tem limitado a essa esfera institucional. Já atinge, portanto, o coração da matéria nas repúblicas - o Poder Legislativo.

Na raiz desse processo, o comando constitucional que admite a iniciativa popular das leis, mas ele está de tal forma regulado que pareceria ter sido criado apenas para viver no papel, dado que requer a sua subscrição por, no mínimo, um por cento do eleitorado nacional, distribuído pelo menos por cinco estados, com não menos de três décimos por cento dos eleitores de cada um deles. O fato dessa criação, com tais restrições draconianas, ter encontrado realização, envolvendo centenas de milhares de cidadãos, demonstra a efetividade da decantação acima mencionada. Anterior a essa iniciativa, também tendo como objeto impedir a corrupção nas disputas eleitorais - a compra de votos, em particular -, a lei 9.840, de 28 de setembro de 1999, foi filha de idêntico movimento, e já são conhecidos seus êxitos na vida republicana, especialmente nas pequenas comarcas do hinterland.

A esperada conversão em lei da iniciativa contra os Ficha Suja, cercada por inédita cobertura da mídia e amparada pela opinião pública, deve pavimentar o caminho para futuras intervenções desse tipo. Vale dizer, o acesso ao Legislativo pela cidadania por via direta, sem a necessidade de intermediação dos partidos políticos. Manifesta-se, então, uma tendência a que se realize nesse Poder um movimento semelhante ao que, com outros fins, tem como cenário o Judiciário - a apropriação por parte da cidadania das regras, valores e princípios da sua Constituição a fim de impor sua presença no processo de elaboração das leis.

É preciso olhar para a Lua e não para o dedo que a aponta. A presença emergente dos cidadãos na criação de direitos e no aprimoramento da República, dando vida aos novos instrumentos e processos que a sua Carta política pôs à sua disposição, já começa a indicar transformações de fundo nas relações entre a sociedade civil e as instituições jurídico-políticas. No Judiciário já vingam as políticas que estimulam uma via extrajudicial para a resolução de conflitos por meio da conciliação e da mediação, e já se cogita do estabelecimento de uma parceria com entidades da sociedade civil a fim de ampliar o alcance desse caminho alternativo ao judicial. Mas é no Legislativo que esse caminho parece ser mais promissor, tanto pela envergadura de cada iniciativa popular, necessariamente de escala massiva, como pelo seu objeto, sempre um bem público de interesse geral. Há vida, pois, fora das questões de câmbio e de superávit primário.


Luiz Werneck Vianna é professor-pesquisador titular do Iuperj e ex-presidente da Anpocs. Escreve às segundas-feiras

CHARGE - PARA PRESIDENTE


DEU NA FOLHA DE S. PAULO

As teses de Lula:: Fernando Rodrigues

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

O resultado da pesquisa Vox Populi anunciado neste fim de semana deixou os petistas eufóricos.

Dilma Rousseff aparece com 38%. Pela primeira vez está numericamente à frente do tucano José Serra, com 35%.

A margem de erro é de 2,2 pontos percentuais. Apesar do empate técnico, a elite do PT enxergou no resultado a confirmação das teses defendidas por Lula há meses.

Primeiro, a polarização está cada vez mais consolidada. Marina Silva (PV) não consegue romper a barreira dos 10% das intenções de voto (pontuou 8% no Vox Populi).Em segundo lugar, a julgar pelo resultado de momento, a saída de Ciro Gomes (PSB) da disputa beneficiou mais Dilma do que Serra. Exatamente como Lula pregava desde o final do ano passado.

Por fim, há a teoria da transferência dos votos. Lula faz um vaticínio: quando entrar de vez na campanha, Dilma dispara e ganha no primeiro turno. A pesquisa Vox Populi foi realizada exatamente na semana em que comerciais petistas inundaram a mídia reforçando a simbiose da dupla Lula-Dilma.

Mas a avaliação mais interessante é o juízo lulista sobre a atual estratégia do PSDB -que poupa o presidente e concentra sua artilharia em Dilma. No PT, muitos consideraram acertado Serra usar essa abordagem. Lula discorda.

O raciocínio do presidente é mais ou menos assim: "Eles estão criando uma unanimidade a meu respeito. Se eu já tenho 80% de aprovação e a oposição agora fica falando bem de mim, como poderão contestar publicamente no momento em que eu pedir votos para a Dilma?".

Como o pedido de votos já se dá de maneira indireta e Dilma demonstra resiliência nas pesquisas, os teoremas de Lula vão se tornando realidade. O petistas comemoram. Nem poderia ser diferente. Só que a eleição é em outubro. É difícil e um grande risco fazer prognóstico político com tanta antecedência.

O bem amado:: Ricardo Noblat

DEU EM O GLOBO

Escapa à nossa vã filosofia o tanto de coisas que aproximam o prefeito Odorico Paraguaçu, personagem da novela de Dias Gomes O Bem Amado, de Manoel Santana (PT), prefeito de Juazeiro do Norte, Ceará, onde José Serra (PSDB), hoje, rezará aos pés da estátua do Padre Cícero, a figura messiânica mais poderosa no imaginário dos nordestinos.

Odorico era um espertalhão simpático e bom de lábia? Então o que dizer de Santana ou melhor: Dr. Santana, 49 anos, médico sanitarista, o primeiro vereador do PT na história de Juazeiro? Para se eleger prefeito do terceiro maior colégio eleitoral do Estado, ele apenasmente derrotou dois ex-prefeitos e um deputado federal. Obteve 58% dos votos válidos quase o dobro do que alcançou o segundo colocado.

Regada por doses de licor de jenipapo, Odorico mantinha uma relação pouco casta com três mulheres ao mesmo tempo as irmãs Cajazeiras. Há pelo menos três mulheres na vida do Dr. Santana, e as três empregadas por ele na prefeitura. A subsecretária de Governo, de nome Tânia Paiva, é mãe dos três primeiros filhos do prefeito. Atende aos pedidos dos vereadores. Não se deixa intimidar por eles.

Oficialmente, a primeira-dama do município é Cristiane Pereira, presidente da Fundação da Criança e Adolescência. Ela foi casada com o vereador Tarso Magno (PSL), o melhor amigo de Dr. Santana. A amizade entre os dois foi pelo ralo quando Magno descobriu que estava sendo traído. Para lavar sua honra, ofereceu ao Tribunal de Contas dos Municípios 42 denúncias de corrupção contra o prefeito.

A terceira mulher é a ouvidora da prefeitura, Luciana Matos. Licenciou-se do cargo. Saiu para dar à luz a Júlia, filha do prefeito e alvo de mensagem carinhosa postada por ele em seu Twitter. Corre em Juazeiro que Dr. Santana teve mais um filho com outra funcionária graduada da prefeitura. Mas isso talvez não passe de maledicência capaz de afogar o coração do prefeito em desgosto e deceptude.

Não é por falta de companhia, pois, que Dr. Santana mora sozinho. Prefere assim. O exercício do cargo tem-lhe sido penoso. Eleito com o apoio do ex-prefeito Raimundo Macedo (PSDB), também médico e conhecido como Raimundinho Gente Fina, Dr. Santana logo rompeu com ele. Acusou-o de ter quebrado a prefeitura. O troco foi rápido e pesado para quem se dizia um homem de poucas posses.

Raimundinho Gente Fina mostrou a amigos comuns recibos no valor de R$ 7 milhões assinados por Dr. Santana enquanto era candidato a prefeito. Dr. Santana nunca mais falou da herança maldita legada por seu antecessor. Proibiu-o, contudo, de trabalhar no hospital do município. Raimundinho Gente Fina atende seus pacientes debaixo de uma frondosa árvore do Hospital e Maternidade São Lucas.

Como quem faz aqui paga aqui... A prefeitura também quebrou nas mãos de Dr. Santana. O balanço do ano passado revela um rombo de R$ 37,4 milhões de restos a pagar. O prefeito esqueceu o que disse em comícios e privatizou oito mercados, um frigorífico e o Hotel Municipal. Em breve será a vez do estádio Romeirão. Só tem um probleminha: tudo está sendo vendido a um único comprador.

O felizardo é o empresário Sílvio Rui, vinculado ao PSDB local, dono de uma empresa de ônibus. É a melhor privatização do mundo, escarnece o vereador Magno sim, aquele que perdeu a mulher para Dr. Santana. Se dependesse de Magno, o prefeito já teria sido cassado. Magno conseguiu a assinatura de sete colegas e abriu uma CPI contra ele. Dr. Santana tomou os providenciamentos devidos e sustou a CPI.

O Ministério Público quer reabri-la. Quer apurar também o desvio de R$ 3 milhões enviados pelo Ministério da Educação para reformar 18 escolas. Foi para não ser vista ao lado do prefeito que Dilma Rousseff cancelou em abril último a visita à estátua de Padre Cícero. A primazia caberá a Serra. Dr. Santana entrou na sucessão de Lula pelas portas do fundo.

Khrystal canta João do Vale

Serra propõe levar Virada Cultural a todo o país

DEU EM O GLOBO

Pré-candidato foi ao evento em São Paulo

Adauri Antunes Barbosa

SÃO PAULO. O pré-candidato do PSDB à Presidência, José Serra, participou no início da madrugada de ontem da Virada Cultural, em São Paulo, e disse que pretende, se for eleito, levar a todo o país a experiência do evento artístico-cultural. Um dos bons exemplos, segundo o tucano, é a Virada Cultural do Rio - criada, segundo ele, com base na experiência paulistana.

- Espero um dia levar para o Brasil inteiro. O Rio já fez a Virada, baseado na de São Paulo. E deu muito certo. Minha expectativa é a de que a gente possa disseminar no Brasil inteiro a tecnologia de como se faz uma Virada, e dar apoio, inclusive material, do governo federal e dos governos estaduais - disse Serra.

A Virada Cultural reuniu cerca de quatro milhões de pessoas das 18h de sábado até as 21h de ontem. O evento é promovido pela Prefeitura de São Paulo há seis anos.

Acompanhado pelos aliados políticos Gilberto Kassab (DEM), prefeito de São Paulo, e Roberto Freire, presidente do PPS, Serra chegou pouco antes da meia-noite do sábado ao palco em frente à Estação da Luz. Ele não conseguiu chegar a tempo de assistir à ópera "Carmina Burana", do alemão Carl Orff, uma de suas favoritas. Kassab e Serra participaram de um jantar para convidados na Sala São Paulo.

De acordo com reportagem publicada pelo jornal "Folha de S. Paulo" ontem, 40 dias depois de deixar oficialmente o governo de São Paulo Serra tem usado a estrutura de segurança pessoal mantida pelo estado em seus deslocamentos de pré-campanha. O ex-governador, que deixou o cargo em 6 de abril, utiliza policiais militares na sua segurança pessoal. Em São Paulo, ele e seu staff têm ido a eventos em carros oficiais, cujo combustível também é pago pelo estado. Além disso, o governo arca com as contas dos telefones celulares usados pela equipe de segurança.

O governo do estado explicou, em nota oficial, que não há ilegalidade nas ações de Serra, já que a infraestrutura para os ex-governadores está prevista em decreto estadual de março de 2004. A resolução prevê "a prestação de serviços de atendimento funcional e, complementarmente, de segurança" a ex-governadores durante todo o mandato do sucessor.

Gabeira expõe divergência no PV do Rio

DEU EM O GLOBO
Chico Otavio e Ludmilla de Lima

"As pessoas estão delirando", disse ele sobre a pré-candidatura de Aspásia ao Senado

O clima de guerra dentro do PV do Rio ficou claro durante o evento de lançamento da pré-candidatura de Marina Silva, ontem, em Nova Iguaçu. A insistência do presidente regional do partido, Alfredo Sirkis, em ter a vereadora Aspásia Camargo como candidata ao Senado parece ter esgotado a paciência de Fernando Gabeira, pré-candidato ao governo pelo PV. Gabeira, que vinha evitando críticas ao grupo de Sirkis - responsável por sucessivos impasses na coligação PV, PSDB, PPS e DEM -, mudou ontem o tom do discurso.

O pré-candidato disse que "as pessoas estão delirando" ao se referir às tentativas de retirar da chapa a pré-candidatura a senador de Marcelo Cerqueira, do PPS, em favor de Aspásia. Gabeira também chamou de contrassenso a reação de setores do PV com a decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) de não permitir mais de dois nomes ao Senado em uma mesma coligação.

- Conclamo todos a respeitar essa decisão unânime (do TSE). Acho um contrassenso o PV se insurgir contra uma decisão unânime do tribunal no princípio de uma campanha eleitoral - disse Gabeira, que prosseguiu na estratégia de tentar preservar a coligação da polêmica. - Para mim, não existe impasse. Existem situações imaginárias de pessoas que estão fora da realidade. A coligação está formada, tem dois candidatos (ao Senado), e não tem outro caminho.

Segundo Gabeira, a maioria no PV quer que a coligação seja mantida como prevê o acordo - com as candidaturas a senador do PPS e de Cesar Maia, pelo DEM.

- Nós temos a maioria absoluta do partido. As pessoas estão delirando - criticou ele.

Fotos de Gabeira, Aspásia e Sirkis, estampadas em banners gigantes, decoravam o salão do RioSampa. Tanto Aspásia quanto Sirkis continuaram ontem a defender a pré-candidatura ao Senado. A vereadora chegou a comentar com um assessor que vive "uma guerra de guerrilha".

- Nós temos um candidato que tem dois candidatos a presidente. E como fica o Senado? A Marina fica manca, sem apoio nenhum? Como vai ser a candidatura dela no Rio sem um senador candidato e com os senadores do Gabeira trabalhando paro o Serra? - questionou Aspásia.

- Cabe uma última consulta para clarificar essa situação definitivamente junto ao TSE - afirmou Sirkis, que não quis comentar as declarações de Gabeira.

'Era o escolhido para matar o embaixador'

DEU EM O GLOBO

Marta defende Dilma e lembra que Gabeira sequestrou na ditadura

SÃO PAULO. Para defender a pré-candidata do PT, Dilma Rousseff, citada como "terrorista" em ataques pela internet, a ex-prefeita Marta Suplicy, candidata ao Senado em São Paulo, questionou ontem a atuação Fernando Gabeira (PV), pré-candidato ao governo do Rio, durante o regime militar. Marta citou a participação de Gabeira no sequestro do embaixador americano Charles Elbrick, em 1969:

- Todo mundo já ouviu falar do Gabeira? A maioria. Pois é. Vocês notaram que do Gabeira ninguém fala? Esse sim sequestrou. Ele era o escolhido para matar o embaixador (que foi libertado). Ninguém fala, porque Gabeira é candidato ao governo do Rio e aliado do PSDB.

No discurso para militantes do PT em São Paulo, Marta assumiu a defesa de Dilma:

- Dilma pertenceu a uma organização na ditadura. E isso, gente, não merece desqualificação. Merece respeito! Alguém, com 20 anos, que põe sua vida em risco para defender a liberdade do país, que é presa e torturada durante três anos, merece nosso respeito.

Gabeira respondeu pelo Twitter:

"Daqui a alguns anos a Marta vai me pedir desculpas e eu certamente vou aceitar".

Para defender Dilma, Marta ataca Gabeira e cita sequestro

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Para amenizar críticas à ação de Dilma Rousseff na luta armada, a ex-prefeita Marta Suplicy (PT) disse que o deputado Fernando Gabeira (PV) estava escalado para matar o embaixador americano Charles Elbrick, sequestrado em 1969. "Ninguém fala porque o Gabeira é candidato ao governo do Rio e se aliou com o PSDB", disse. "Ela inventa coisas", reagiu Gabeira.

Gabeira sequestrou na ditadura, afirma Marta

Para amenizar ação de Dilma na luta armada, petista diz que deputado era escolhido para matar embaixador; "Ela está inventando coisas", reagiu ele

Malu Delgado / SÃO PAULO e Alfredo Junqueira / RIO

Em meio à estratégia do PT de abordar a participação da pré-candidata à Presidência, Dilma Rousseff, na luta à ditadura, a ex-prefeita Marta Suplicy introduziu ontem ao debate político a atuação do deputado Fernando Gabeira (PV-RJ) contra os militares e afirmou que "ele sim sequestrou".

Num discurso a militantes petistas da zona leste de São Paulo, acompanhada do pré-candidato ao governo, Aloizio Mercadante, Marta surpreendeu ao comparar a atuação de Gabeira com a de Dilma ao criticar ataques à petista feitos na internet: "Vocês notaram, Aloizio, que do Gabeira ninguém fala? Esse sim sequestrou. Eu não estou desrespeitando ele, ao contrário, mas ele sequestrou. Ele era o escolhido para matar o embaixador. Ninguém fala porque o Gabeira é candidato ao governo do Rio e se aliou com o PSDB".

O discurso da petista provocou reação imediata no comando do PT e entre coordenadores da pré-campanha de Dilma. Dirigentes do partido afirmaram na noite de ontem que a opinião de Marta não é avalizada pela legenda e nem se trata de uma estratégia eleitoral. "Não vamos adotar isso como estratégia de campanha. Todas as pessoas que atuaram contra a ditadura merecem nosso respeito. Foi uma declaração muito infeliz da Marta", afirmou o presidente do PT, José Eduardo Dutra.

Marta referiu-se à atuação de Gabeira no MR-8 e à participação dele no sequestro do embaixador norte-americano Charles Elbrick em 1969. O ministro Franklin Martins (Comunicação) também fez parte do grupo que sequestrou o embaixador.

No Rio, Gabeira reagiu com indignação: "Ela está equivocada, está inventando coisas, está mentindo". O deputado rechaçou a informação de que poderia ter se tornado o assassino do embaixador. "Não havia escala para isso (para um assassinato). Lamento que ela use esse tipo de coisa na campanha, até porque tem muita gente dentro do PT que sabe bem dessa história", disse. O pré-candidato, que fez coligação com PSDB, DEM e PPS, disse, contudo, que não pretende processar a petista: "Vou ignorá-la."

Marta "explicou" a militantes as razões pelas quais o presidente Lula comparou Dilma a Nelson Mandela em programa partidário dia 13: "O que Lula quis dizer com isso? Que pessoas que vão para uma cadeia por ideologia são pessoas de luta, dignas".


PARA ENTENDER

Sequestro durou 4 dias

Fernando Gabeira foi protagonista da luta armada contra o regime militar (1964-1985) no Brasil. Ele participou do sequestro do embaixador norte-americano Charles Elbrick, em setembro de 1969, juntamente com integrantes do Movimento Revolucionário 8 de Outubro (MR-8), que tentava instaurar o comunismo no País. O objetivo do sequestro era pressionar a liberação de políticos esquerdistas presos pelo regime. O embaixador foi liberado quatro dias depois e alguns integrantes do grupo foram presos, inclusive Gabeira.

Marta afirma que Gabeira foi sequestrador

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

DA REPORTAGEM LOCAL

A pré-candidata ao Senado por São Paulo Marta Suplicy (PT) disse ontem em encontro com militantes petistas na zona leste paulistana que a mídia tem dois pesos e duas medidas ao tratar do passado guerrilheiro de Dilma Rousseff (PT).

Para a ex-prefeita, o pré-candidato ao governo do Rio Fernando Gabeira (PV) teve atuação mais efetiva contra a ditadura no sequestro do embaixador norte-americano Charles Elbrick, em 1969, mas não é cobrado porque fechou aliança com o PSDB. O embaixador foi solto em troca de reféns.

"Vocês notaram, Aloizio [Mercadante], que do Gabeira ninguém fala? Esse sim sequestrou. Eu não estou desrespeitando ele, ao contrário, mas ele sequestrou. Ele era o escolhido para matar o embaixador. Ninguém fala porque o Gabeira é candidato ao governo do Rio e se aliou com o PSDB. Então, ninguém fala." A declaração foi divulgada pela Agência Estado.

No Rio, Gabeira disse: "Vou ignorar essa acusação porque já faz muitos anos que ignoro as coisas que a Marta diz". Afirmou que "não é verdade" que tenha sido escalado para matar Elbrick. "Tenho uma visão bastante clara do sequestro. Hoje o condeno como forma de luta."

À noite, a pré-candidata disse, via assessoria: "Foi um discurso político feito para a militância do PT para mostrar o tratamento diferenciado da mídia sobre dois jovens que lutaram contra a ditadura".

Serra vai ao CE de olho em votos de Ciro

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Ao lado de Tasso Jereissati, pré-candidato do PSDB vai atrás do espólio do deputado do PSB

Angela Lacerda, ENVIADA ESPECIAL, JUAZEIRO DO NORTE

O pré-candidato à Presidência pelo PSDB, José Serra, desembarca hoje à tarde em Juazeiro do Norte, no sertão do Ceará, para uma visita de dois dias ao Estado, em busca do eleitorado deixado por Ciro Gomes (PSB). O deputado foi frustrado na sua intenção de disputar a Presidência e o PSB formalizou apoio à pré-candidata petista Dilma Rousseff.

Sem candidato tucano ao governo no Ceará, o palanque de Serra será o do senador Tasso Jereissati (PSDB), amigo pessoal de Ciro, que tenta a reeleição. A expectativa é a de que, diante da saída de Ciro da disputa presidencial, o PSB do governador Cid Gomes, irmão de Ciro, poderá liberar os insatisfeitos que quiserem apoiar Serra.

Em Juazeiro do Norte, terra do político e santo milagreiro padre Cícero Romão Batista, Serra cumpre um ritual que foi seguido pelo ex-presidente FHC nas campanhas eleitorais em que foi vitorioso: o de "pedir a bênção" do "padim Ciço", como é conhecido o religioso.

Depois de visitar a estátua e o túmulo de padre Cícero - que morreu em 1934 e é alvo da devoção de milhões de fiéis, especialmente no Nordeste - Serra deve visitar a irmã Edeltralt Lerch, ex-diretora e benfeitora do Hospital e Maternidade São Vicente de Paula, na vizinha cidade de Barbalha. No Crato, outra cidade da região, no sertão do Cariri, comanda pelo tucano Samuel Araripe, Serra tem um encontro político com lideranças regionais do PSDB e de partidos aliados.
À noite, o pré-candidato segue para Fortaleza, para participar do seminário Ceará em Debate, realizado pelo Instituto Teotônio Vilela. Serra é um dos palestrantes do evento.


Jarbas e José Serra vão adotar campanha casada

DEU NO JORNAL DO COMMERCIO (PE)

Senador e pré-candidato da oposição ao governo do Estado afirma que terá o mesmo estrategista do presidenciável tucano, o publicitário Luiz Gonzáles. Objetivo, segundo Jarbas, é afinar as campanhas

Cecília Ramos

O senador Jarbas Vasconcelos (PMDB) terá o mesmo estrategista para sua campanha ao governo do Estado que o pré-candidato do PSDB a presidente da República, José Serra (PSDB). Jarbas disse ao JC, sábado, que uma pessoa do publicitário paulistano Luiz Gonzáles virá para Pernambuco comandar o marketing. O objetivo é reforçar a estratégia da campanha casada. O senador, cujo comitê eleitoral será conjunto com o de Serra, conversou com o presidenciável sobre marketing político, na semana passada, no Recife, e eles voltarão a tratar do tema nos próximos dias, juntamente com o senador Sérgio Guerra, coordenador nacional da campanha de Serra.

Continuarão no time de Jarbas, nesta eleição, dois produtores locais: o jornalista Ricardo Carvalho, da RTV, amigo pessoal do senador, e o publicitário, músico e compositor Lula Queiroga, da Luni. Os dois atuam em campanhas do peemedebista e da antiga aliança jarbista União por Pernambuco há mais de uma década. Um prévia do que acontecerá durante a eleição poderá ser visto no próximo dia 28, quando ocorrerá o lançamento da pré-candidatura de Jarbas ao governo, em um evento no Chevrolet Hall, a maior casa de shows do Recife. A previsão é que seja um ato diurno, com a presença de José Serra e de lideranças do DEM, PSDB, PPS e PMN.

A tendência é que, assim como Serra, Jarbas adote a linha paz e amor e deixe, no mínimo em banho maria, as críticas ao presidente Lula (PT). Em entrevistas, González tem defendido que criticar é legítimo, bater é discutível e mesmo perigoso. Ele acredita que é preciso distinguir entre crítica administrativa e ataque abaixo da linha de cintura. Gonzáles é o marqueteiro do PSDB há 16 anos, desde a campanha de Mário Covas ao governo de São Paulo, em 1994. No mesmo ano, trabalhou para Serra, que concorreu ao Senado. Em 98, o publicitário ajudou Covas a se reeleger. Em 2000, perdeu com Geraldo Alckmin na Prefeitura de São Paulo. Mas, dois anos depois, o ajudou a eleger-se governador. Em 2004, voltou a trabalhar para Serra na campanha para prefeito. Em 2006, comandou o marketing da campanha de Alckmin a presidente da República e ajudou a levar a disputa contra o presidente Lula ao segundo turno.

Esta será a primeira disputa de Jarbas sem a presença do marqueteiro Antônio Lavareda, 58 anos, que comandou todas as campanhas do peemedebista desde 1992 e da antiga União.

Lavareda já participou ativamente de 76 campanhas. A última em que esteve ao lado de Jarbas foi ao Senado, em 2006. No mesmo ano, ele cuidou da campanha de Mendonça Filho (DEM) ao governo. O estremecimento de Lavareda com o grupo de Jarbas ocorreu nessa última eleição, quando o então governador Mendonça perdeu para o atual governador Eduardo Campos (PSB). Jarbas diz que não houve rompimento, mas afastamento. A MCI de Lavareda comandou a estratégia de marketing nos oito anos da gestão Jarbas/Mendonça.

O marketing da campanha à reeleição de Eduardo Campos deverá ficar sob o comando do jornalista baiano Edson Barbosa, da Link, a mesma que assinou a campanha do socialista em 2006. A Link também cuida da propaganda institucional do governo.

Venezuela expropria duas metalúrgicas

DEU NO VALOR ECONÔMICO

Agências internacionais

O presidente venezuelano, Hugo Chávez, ordenou no fim de semana a expropriação da metalúrgica Matesi, com participação do grupo ítalo-argentino Techint, e da produtora de bauxita Norpro da Venezuela, com capital francês. Chávez também anunciou a nacionalização das empresas de transporte da matéria-prima que operam no Estado de Guayana, onde se estão a Matesi e a Norpro.

O presidente havia anunciado a nacionalização da Matesi e de outras quatro empresas metalúrgicas de capital japonês, mexicano, europeu e australiano que operam na região de Guayana, enquanto negociava o preço a pagar. "Como não pudemos chegar a um acordo amigável e razoável com seus proprietários, então vamos expropriar a Matesi, não houve forma de nos acertar com eles", declarou.

"Eles (os donos da Matesi) dizem que vão nos processar não sei onde, na corte celestial. Que vão, terão todo o direito, mas nós não podemos continuar aqui brincando de gato e rato. Vamos expropriar, eu espero o decreto para expropriar e tomar o controle da Matesi completamente", disse.

Chávez também ordenou e a nacionalização da Norpro da Venezuela, uma empresa produtora de bauxita. A Norpro da Venezuela é filial da empresa Norpro, com sede nos EUA e na qual tem participação o grupo francês Saint Gobain.

As lições da crise do euro:: Luiz Carlos Mendonça de Barros

DEU NO VALOR ECONÔMICO

"O princípio da independência dos Bancos Centrais, o pilar da ortodoxia econômica por duas décadas, recebeu um duro golpe na última semana. Os investidores devem ficar atentos."

E ste desabafo de um articulista em função dos últimos acontecimentos na Europa mostra a gravidade da crise porque está passando o Velho Continente. O nome de seu artigo - Os Bancos Centrais devem ficar livre da influência política - recoloca o conflito entre a política e a gestão monetária de forma explícita e nos obriga a refletir sobre ele, mesmo estando o Brasil fora da confusão europeia.

O articulista citado demonstrava sua amargura ao ver o BCE - paradigma do Banco Central independente - obrigado a comprar títulos emitidos por vários governos e que estão sendo rejeitados pelos investidores. "Como pode o BCE, de forma equilibrada, garantir a estabilidade financeira e a de preços", pergunta ele em algum momento de suas reflexões.

Mais adiante abre sua alma para o leitor ao dizer que a decisão de comprar títulos dos chamados PIIGS "pode aumentar os riscos de moral hazard, diminuindo os estímulos dos governos endividados de ajustar suas contas fiscais." Esse é o discurso padrão dos que defendem a independência absoluta do Banco Central na busca de um único objetivo que é o de manter a estabilidade de preços.

Mas os acontecimentos recentes nos Estados Unidos e que levaram à quebra do banco Lehman Brothers mostram a limitação desta postura rígida em relação à independência do Banco Central, principalmente em momentos de descontinuidade. A decisão de deixar quebrar essa instituição para não criar o que se chama de moral hazard levou a maior economia do mundo à beira do precipício. Somente o fato de ter o FED um duplo mandato em seus estatutos - e de seu presidente ser um acadêmico com conhecimentos profundos da depressão dos anos 30 do século passado - permitiu ao governo Obama a coordenação de políticas fiscal e monetária para lutar contra o pânico e trazer de volta o que nosso articulista chama de estabilidade financeira.

Uma primeira observação que gostaria de fazer ao leitor do Valor é que a situação do BCE é especial. Ele é o Banco Central de um grupo heterogêneo de países que dividem uma mesma moeda. Apesar disto, a dinâmica fiscal de cada um é nacional e, por isto, segue objetivos que podem ser divergentes. Em função desse conflito que a falta de uma política fiscal comum pode criar precisamos ter cuidado em usá-lo como referência de nossas reflexões. O BCE enfrenta dificuldades extremas derivadas desse arranjo institucional único e que somente agora está sendo testado de fato.

Mas a questão de que o BCE deve manter-se limitado ao seu mandato único de estabilidade monetária é comum a outros Bancos Centrais. E o que está acontecendo agora com o BCE pode servir de referência para nós. Mesmo no Brasil do real já testamos esse conflito no caso do Proer. E a decisão do governo FHC foi a de autorizar o Banco Central do Brasil a agir no sentido de restabelecer a confiança em nosso sistema bancário.

Mas o teste mais importante para a tese do mandato único de um Banco Central ocorre hoje nos Estados Unidos. Tivesse o FED um mandato único de estabilidade de preços e fosse ele presidido por um burocrata linha dura, o que teria acontecido com todos nós?

Sempre entendi que a independência dos Bancos Centrais precisa ser qualificada, colocando em algum grau a questão da estabilidade financeira e do crescimento econômico. Esta qualificação é importante inclusive para defender sua autonomia no controle da inflação. Nas condições limites de crises financeiras e de crescimento o poder político de qualquer sociedade democrática vai prevalecer e criar mecanismos de intervenção na Autoridade Monetária com amplo apoio da opinião pública.

Os defensores do modelo puro de independência dos BCs, para justificar seu radicalismo, dizem que não é possível servir a mais de um senhor. Isto não é verdade e espero que o sucesso do presidente atual do FED em sua missão de reparar os danos causados pela tese do moral hazard no governo Bush e ao mesmo tempo recolocar a economia em uma trajetória de crescimento sem inflação mostre isso. Por isso sempre defendi a tese de que um mandato de Banco Central deve - como no caso do FED - permitir alguma flexibilidade na execução da política monetária.

A utilização ou não deste maior grau de liberdade deve ficar a critério dos diretores da autoridade monetária e do julgamento dos mercados financeiros. Em um arranjo institucional como existe hoje - mercados futuros de cambio e juros - é muito fácil ler o julgamento médio de profissionais da economia sobre a condução da política monetária. Por isso, a margem de erro da autoridade monetária é muito menor do que a que ocorria no passado ou nas economias que não tem mercados futuros eficientes.

A Europa hoje é uma prova de que vale a pena uma rigidez menor no mandato de um banco central para evitar uma intervenção política externa.

Luiz Carlos Mendonça de Barros, engenheiro e economista, é diretor-estrategista da Quest Investimentos. Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações. Escreve mensalmente às segundas.

Lei de Responsabilidade Fiscal para a Europa:: Luiz Carlos Bresser-Pereira

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

A crise mostra que também é preciso enfrentar o problema dos "países grandes demais para quebrar"

A CRISE Global de 2008 tornou claro que existem bancos "grandes demais para quebrar". Esse é o problema central que a nova regulamentação dos mercados financeiros terá que resolver. A Crise Europeia de 2010 tornou igualmente claro que os governos são grandes demais para quebrar.

Uma Lei de Responsabilidade Fiscal semelhante àquela existente no Brasil desde 2000 pode ser a solução para esse problema. O pacote de 750 bilhões anunciado pelos governos europeus na semana passada surpreendeu a todos pelo volume e deixou clara a determinação de defender sua moeda. Desde que os países mais ameaçados tomem as medidas fiscais duras, mas necessárias, para reequilibrar suas contas fiscais, é possível a partir de agora esperar a superação da crise no decorrer dos próximos anos (e desde que o problema do desequilíbrio das contas-correntes seja também solucionado).

A crise fiscal foi consequência da política fiscal expansionista que a Crise Global de 2008 impôs a todos os países. Mas uma política fiscal desse tipo não criaria maiores problemas se a relação entre a dívida pública e o PIB nesses países fosse saudável, se fosse um nível de dívida que não dependesse da disposição dos credores de rolá-la indefinidamente. Não era esse o caso. Em vários deles, estava em torno de 100% do PIB, quando a metade desse número já é demais. Esse alto índice de endividamento parecia "sob controle" porque a taxa de juros era muito baixa. No momento, porém, que surgiu a desconfiança em relação à Grécia e a taxa de juros começou a subir, o peso do serviço da dívida cresceu e o país de uma hora para a outra se tornou insolvente.

Essa crise demonstra a insustentabilidade de altas taxas de endividamento público e a frouxidão da União Europeia e dos mercados financeiros em relação ao problema. Enquanto se exige das empresas uma relação elevada entre sua geração de caixa e os vencimentos de suas dívidas, aceita-se uma relação substancialmente menor entre o superavit primário de cada país (sua geração de caixa) e seus compromissos com juros e amortizações.

As repetidas crises de balanço de pagamentos dos países em desenvolvimento mostraram que era falso o pressuposto em que se baseava o mercado financeiro -a crença de que "governos soberanos não quebram". Em relação aos países ricos ou quase ricos, porém, mercado financeiro e autoridades governamentais continuaram a acreditar na história e aceitaram taxas de endividamento público superiores a 100%.

Agora, a crise mostra que não basta resolver o problema dos "bancos grandes demais para quebrar"; é preciso também enfrentar o problema dos "países grandes demais para quebrar". No Tratado de Maastricht, a União Europeia limitou o deficit público a 3% do PIB; deveria ter também estabelecido limites claros para a relação dívida pública/PIB. Ao não fazê-lo, tornou o euro vulnerável. Isso, além de incentivar os ataques especulativos, levou os detratores do euro a decretar a moratória inevitável da Grécia e a falência do projeto euro.

É muito cedo para essa conclusão. Mas é também cedo para declarar a crise resolvida. Será preciso equacionar definitivamente o problema fiscal dos países-membros. E o caminho para isso é algo semelhante ao que fizemos no Brasil com a Lei de Responsabilidade Fiscal de 2000. Enquanto essa lei estabelecia limites claros para os deficit e o endividamento dos Estados e municípios, procedeu-se à reestruturação da sua dívida. Dessa forma todos tiveram condições, a partir desse ponto, de obedecer à nova lei.


Luiz Carlos Bresser-Pereira, 75, professor emérito da Fundação Getulio Vargas, ex-ministro da Fazenda (governo Sarney), da Administração e Reforma do Estado (primeiro governo FHC) e da Ciência e Tecnologia (segundo governo FHC), é autor de "Globalização e Competição".

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EMBRIAGUEM-SE :: Charles Baudelaire


É preciso estar sempre embriagado. Aí está: eis a única questão.
Para não sentirem o fardo horrível
do Tempo que verga e inclina para a terra, é
preciso que se embriaguem sem descanso.


Com quê? Com vinho, poesia ou virtude, a
escolher. Mas embriaguem-se.


E se, porventura, nos degraus de um palácio,
sobre a relva verde de um fosso, na solidão
morna do quarto, a embriaguez diminuir ou
desaparecer quando você acordar, pergunte ao
vento, à vaga, à estrela, ao pássaro, ao relógio, a
tudo que flui, a tudo que geme, a tudo que gira, a
tudo que canta, a tudo que fala, pergunte que
horas são; e o vento, a vaga, a estrela, o
pássaro, o relógio responderão: "É hora de
embriagar-se! Para não serem os escravos
martirizados do Tempo, embriaguem-se; embriaguem-se
sem descanso". Com vinho, poesia ou virtude, a escolher.




Poesia do livro "As flores do mal"