"Gramsci é hoje parte da cultura latino-americana a tal ponto que suas categorias de análise atravessam os discursos teóricos das ciências sociais, dos historiadores, dos críticos e dos intelectuais em geral, e estão (via de regra de modo abusivo) presentes na linguagem cotidiana das forças políticas de esquerda ou democráticas. Quem poderia refletir sobre os grandes ou pequenos problemas de nossos países sem se utilizar de termos como hegemonia, bloco histórico, intelectuais orgânicos, crise orgânica, revolução passiva, guerra de posição e de movimento, sociedade civil e política, Estado ampliado, transformismo, etc? Com isso, não pretendo avalizar a idéia banal de que o pensamento de Gramsci foi assumido plenamente e de modo crítico. Busco simplesmente esboçar o alcance de um fenômeno cultural que vai muito além do campo restrito dos setores acadêmicos e faz parte das linguagens da política. Torna-se assim clara a razão pela qual é difícil traçar um quadro satisfatório sem dispor de trabalhos preliminares, que recolham e organizem as informações relativas ao nosso tema.
Não creio que minhas recordações me traiam se digo que, entre nós, a primeira tentativa orgânica de inserção do pensamento de Gramsci na cultura política da esquerda ocorreu no interior do Partido Comunista Argentino. Ela fez parte de uma proposta, jamais explicitamente declarada, de atualização ideológica e cultural, que teve em Héctor P. Agosti seu mais inteligente e consciente promotor. Pensador e ensaísta de destaque, importante membro do grupo dirigente do Partido Comunista, Agosti foi – nos anos 50 – o centro de gravidade de um movimento intelectual tendencialmente gramsciano. A história da formação e do desenvolvimento desse movimento, de suas direções conflitivas com direções políticas que impediam a circulação de idéias, de sua marginalização da esfera de decisões até mesmo em seu próprio ambiente de trabalho, de seu choque e de sua ruptura com o comunismo dos anos 60, de sua divisão e posterior marginalização, tudo isso encerra a essência do processo de introdução de Gramsci na Argentina. É provável que algo análogo tenha ocorrido no Brasil no final dos anos 60, quando se iniciou a tradução de alguns volumes dos Cadernos. "
ARICÓ, José (1931-1991). Geografia de Gramsci na América Latina. Gramsci e a América Latina, págs. 26-27, 2ª edição. Editora Paz e Terra 1993.
Não creio que minhas recordações me traiam se digo que, entre nós, a primeira tentativa orgânica de inserção do pensamento de Gramsci na cultura política da esquerda ocorreu no interior do Partido Comunista Argentino. Ela fez parte de uma proposta, jamais explicitamente declarada, de atualização ideológica e cultural, que teve em Héctor P. Agosti seu mais inteligente e consciente promotor. Pensador e ensaísta de destaque, importante membro do grupo dirigente do Partido Comunista, Agosti foi – nos anos 50 – o centro de gravidade de um movimento intelectual tendencialmente gramsciano. A história da formação e do desenvolvimento desse movimento, de suas direções conflitivas com direções políticas que impediam a circulação de idéias, de sua marginalização da esfera de decisões até mesmo em seu próprio ambiente de trabalho, de seu choque e de sua ruptura com o comunismo dos anos 60, de sua divisão e posterior marginalização, tudo isso encerra a essência do processo de introdução de Gramsci na Argentina. É provável que algo análogo tenha ocorrido no Brasil no final dos anos 60, quando se iniciou a tradução de alguns volumes dos Cadernos. "
ARICÓ, José (1931-1991). Geografia de Gramsci na América Latina. Gramsci e a América Latina, págs. 26-27, 2ª edição. Editora Paz e Terra 1993.