Folha de S. Paulo
Postura militante da corte deve refluir
para ser menos interventiva
A democracia brasileira muito deve ao
Supremo e a Alexandre de Moraes. Difícil imaginar onde estaríamos se à frente
dos inquéritos que investigam atos antidemocráticos, e do próprio processo
eleitoral, tivéssemos um juiz mais contemporizador, que imaginasse poder
alimentar o crocodilo na expectativa de ser o último a ser engolido, para
parafrasear Winston Churchill.
O fato é que a democracia saiu da zona de
risco existencial. Voltou aos trilhos. As ameaças que vinham do centro do
poder, pois perpetrados pelo próprio presidente da República, comandante máximo
das Forças Armadas, não mais existem. Não se nega que grupos golpistas e
bolsonaristas ressentidos ainda estejam por aí, exalando autoritarismo. Mas os
riscos impostos por esses radicais são muito distintos daqueles impostos por um
presidente extremista.
Nesse sentido, a postura militante do
Supremo deve refluir para uma atitude menos interventiva. É fundamental que o tribunal
tome cuidado para não estabelecer precedentes que, no futuro, ameacem o próprio
debate democrático.
A democracia constitucional é um regime superior aos demais exatamente por essa sua capacidade de assegurar que visões distintas de mundo possam conviver, ainda que em forte tensão, desde que não transborde em violência. A liberdade de expressão serve exatamente para proteger discursos impróprios. Para habilitar que o conflito não fique escamoteado e reprimido, mas que ganhe a luz do dia; até para que saibamos o que pensam os nossos adversários.