Fundo diz que economia brasileira deve acelerar mais no fim deste ano e sugere elevar poupança e investimento.
A economia brasileira entrará no quarto trimestre deste ano acelerando, com taxa anualizada de crescimento de 4%, prevê o Fundo Monetário Internacional (FMI). No entanto, a instituição recomenda que o governo troque o foco poupança e investimento de incentivo ao consumo por investimento e estímulo às exportações. Além disso, sugere elevar o seu nível de poupança interna. O Ministério do Planejamento informou ontem que espera ter expansão em 3% em 2012.
FMI recomenda mudança de rumo
Fundo: Brasil crescerá 4% no 4 trimestre, mas foco deve mudar de consumo para investimento
Flávia Barbosa* Debora Diniz
WASHINGTON e RIO - O Fundo Monetário Internacional (FMI) prevê que a economia brasileira entrará no quarto trimestre deste ano acelerando, com uma taxa de crescimento de 4%, mas precisa de mais incentivos ao investimento e às exportações, em substituição ao foco atual no consumo, para garantir a expansão sustentada do Produto Interno Bruto (PIB, conjunto de bens e serviços produzidos no país). Paralelamente, o Brasil deve aumentar o nível de poupança interna para garantir esses desembolsos, monitorar a expansão do crédito e evitar a formação de bolhas. Essas são as principais recomendações do relatório anual de avaliação da economia brasileira, divulgado ontem pelo Fundo.
Para tentar segurar a economia, em desaceleração desde a expansão recorde de 7,5% em 2010, o governo tem se apoiado em medidas que ampliam o volume de dinheiro em circulação na economia e barateiam a compra de bens duráveis. O FMI apoia o uso conjuntural destas ferramentas, mas alerta que elas não garantirão um desempenho robusto nos próximos anos.
- Para continuar crescendo, achamos necessárias medidas adicionais para garantir que uma expansão estável e balanceada continue no Brasil. Será importante aumentar o nível agregado de poupança e investimento na economia, que são baixos na comparação com mercados emergentes. Além disso, fortalecer o ambiente de negócios também será crucial. Isso não só criará mais incentivos para o investimento privado, mas dará suporte a ganhos de produtividade e competitividade - afirmou o chefe da missão brasileira do Fundo, Vikram Haksar.
Fundo alerta para risco inflacionário
O FMI projeta uma expansão de 2,5% para o PIB deste ano e de 4,6%, em 2013 (resultado dos estímulos hoje em curso). O representante brasileiro no Fundo, Paulo Nogueira Batista Jr, destacou que as expectativas do FMI estão em linha com as do governo e que o Brasil reconhece a necessidade de investir:
- A taxa de investimentos se recuperou nos últimos anos, mas ainda é insuficiente. É preciso esforço adicional.
A instituição avalia que os principais riscos para o Brasil hoje são a crise europeia - que pode reduzir a demanda por produtos nacionais -, uma queda dos preços das commodities e o aperto das condições de crédito no mercado internacional e dos fluxos de capitais.
- Mas achamos que as autoridades têm espaço substancial de manobra. O Brasil construiu um arcabouço de políticas forte e elevou seus colchões de amortecimento, e esses amortecedores podem ser usados para prover liquidez caso haja choques inesperados - disse Haksar, que elogiou o Banco Central e a condução da política fiscal. - E há espaço substancial para futuro afrouxamento da política monetária - completou.
Porém, o FMI alerta que, em breve, o Brasil terá que começar a calibrar as políticas expansivas para evitar uma inflação "muito acima do centro da meta" em 2013. No relatório, a equipe de Haksar considera que o IPCA está sob controle (4,8%) este ano. A projeção de uma variação de preços de 5% no ano que vem pressupõe que os juros voltarão a subir no período.
Mas a prévia da inflação oficial acelerou, subindo 0,33% em julho, informou ontem o IBGE. Em junho, ela havia avançado 0,18%. No mesmo mês do ano passado, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo-15 (IPCA-15) avançara 0,10%. Desde então, os preços subiram 5,24% - houve assim, um avanço no acumulado dos últimos 12 meses, que estava em 5% em junho. Só este ano, a inflação medida pelo IPCA-15 acumula alta de 2,91%.
A equipe do FMI também alerta para a necessidade de monitorar o mercado de crédito, que apresentou expansão muito acelerada na última década. Apesar de destacar que esta expansão deveu-se basicamente à inclusão de novos clientes e que o sistema financeiro brasileiro é forte, Haksar diz que preocupa o peso do endividamento sobre o orçamento das famílias, o aumento da inadimplência e a explosão do financiamento imobiliário, com programas como o Minha Casa, Minha Vida.
O relatório do FMI não surpreendeu economistas, que já previam uma aceleração do crescimento a partir do quarto trimestre, embora não o suficiente para que o índice ultrapasse 2%. O mesmo vale para as críticas ao modelo de estímulo adotado pelo governo, até aqui focado no consumo.
- O país precisa conter gastos correntes e aumentar o investimento. Mas vemos que o governo ainda tem dificuldade de tirar os investimentos do papel. O incentivo ao consumo não garante um crescimento sustentado e ainda traz o risco de inflação - alerta Fernando de Holanda Barbosa Filho, pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) e professor da Fundação Getulio Vargas (FGV).
O documento, amplamente discutido com as autoridades e concluído no fim de junho, agradou o governo brasileiro, que chamou atenção especialmente para as projeções de crescimento e inflação, para o reconhecimento do FMI da importância das medidas de controle de capitais e para a avaliação do bom preparo da economia do Brasil para enfrentar turbulências internacionais. Como divergência principal, Paulo Nogueira Batista destacou os riscos inflacionários:
- Foi um pouco exagerado. Mas claro que, se o Banco Central e a Fazenda virem risco de descontrole, tomarão as medidas necessárias.
Economista-chefe da Confederação Nacional do Comércio, Carlos Thadeu de Freitas concorda com o diagnóstico do FMI e chama atenção para o esgotamento da capacidade de endividamento das famílias:
- Hoje, estamos melhores que outros países, somos solventes, enquanto outros estão insolventes. Mas a nossa capacidade de crescer está limitada pelo fato de que o consumo, que foi o grande impulsionador nos últimos anos, vai continuar crescendo, mas em ritmo menor.
* Correspondente
FONTE: O GLOBO