quinta-feira, 17 de novembro de 2022

Merval Pereira - De volta ao futuro

O Globo

Querer exercer uma liderança global em meio ambiente é uma ambição saudável de Lula, mas é um péssimo sinal a volta da megalomania lulista de querer ser um negociador internacional

A presença do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva na COP27, no Egito, antes mesmo de ele assumir o cargo para o qual foi eleito em outubro, contrasta com a primeira decisão do atual presidente brasileiro, que cancelou a reunião do clima que seria realizada no Brasil em 2019.

A reivindicação de que uma reunião seja na Amazônia ainda durante o mandato de Lula tem uma simbologia óbvia. Informa o interesse do futuro governo brasileiro de dar um cavalo de pau na diretriz do país para retomar o protagonismo que sempre foi nosso nesse campo.

Querer exercer uma liderança global em meio ambiente é uma ambição saudável de Lula, já que, efetivamente, o mundo depende do que fará o Brasil nesse tema, depois de ter sido governado por quatro anos por um negacionista das mudanças climáticas.

Mas é um péssimo sinal a volta da megalomania lulista de querer ser um negociador internacional — na imaginação de alguns petistas mais afoitos, até na guerra da Ucrânia. Não deu certo na negociação nuclear com o Irã e provavelmente não daria certo no atual momento.

Malu Gaspar - Está na hora de soltar o Cabral

O Globo

Na última sexta-feira, Sérgio Cabral quase saiu da cadeia. O Tribunal de Justiça do Rio lhe concedeu um habeas corpus no processo em que é acusado de cobrar propinas de empreiteiras que construíram o Complexo Petroquímico do Rio pela Petrobras. Segundo a decisão, Cabral podia passar para a prisão domiciliar, desde que não houvesse mais nenhuma ordem de prisão válida contra ele.

O oficial de Justiça fez uma pesquisa, não achou nada e foi para o Batalhão Especial Prisional (BEP) soltar o ex-governador. Nesse meio tempo, alguém lembrou que havia ordens de prisão assinadas por Sergio Moro, contra as quais a defesa ainda está recorrendo ao STF.

Só que, com o sistema da Justiça fora do ar, elas não apareciam na busca. Cabral, portanto, não podia ser liberado. Já era noite quando o oficial de Justiça foi embora levando o documento sem serventia.

Ricardo Mendonça - Lula, o jato e potenciais conflitos de interesse

Valor Econômico

Membros do STF, do BC e do TCU foram à NY às custas do Lide

A viagem do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva ao Egito no jato de um bem sucedido empresário do ramo da saúde suscitou uma relevante discussão sobre conflitos de interesse.

Lula venceu a eleição, mas ainda não exerce o cargo de presidente e nem sequer foi diplomado. A rigor, portanto, ele não foi à COP27, a Conferência do Clima, como representante do governo brasileiro. Pelo prestígio e pelo cargo que irá assumir em janeiro, o petista cumpre uma agenda típica de chefe de Estado em Sharm el-Sheikh, a cidade sede do encontro. Mas chefe de Estado ele não é.

Não há dúvida de que teria sido melhor evitar a aeronave do empresário. Mas só uma cabeça muito obtusa pode defender que, no atual patamar de polarização, o petista, em nome da impessoalidade, deveria se arriscar num voo comercial. O PT poderia financiar via Fundo Partidário, mas não tem essa obrigação e alega não dispor dos recursos. Caberia ao governo brasileiro fornecer o transporte ao presidente eleito?

Ninguém enxergaria problema nisso se Lula estivesse prestes a suceder um presidente que, em elevado clima de transição, tivesse tido a inteligência política de convidá-lo para uma participação conjunta na importante conferência.

Luiz Carlos Azedo - Lula propõe aliança estratégica com o agronegócio

Correio Braziliense

Emerge da COP27 uma nova institucionalidade ambiental, na qual o Brasil precisa se inserir, pois ditará os rumos das relações comerciais e das cadeias globais de produção

A reforma agrária, a velha bandeira da esquerda brasileira, que remonta ao debate sobre a industrialização na década de 1930, partia da premissa de que monocultura agrícola, inclusive a agromanufatura açucareira, era uma das causas do nosso subdesenvolvimento. Havia até então a concepção de que somente a eliminação dos grandes latifúndios poderia desenvolver o capitalismo no campo, o que na verdade já existia desde o fim da escravidão. Achava-se que éramos um país de agricultura feudal.

Essa compreensão, por exemplo, ignorava o fato de que o Convênio de Taubaté havia mudado completamente a relação do Brasil com o mercado mundial de café, sendo um fator decisivo para a própria industrialização, principalmente em São Paulo, cujos cafeicultores acumularam muito capital e priorizaram os investimentos em atividades produtivas, em vez do patrimonialismo que predominou em outras regiões do país.

William Waack - O muro ficou estreito

O Estado de S. Paulo

Lula ainda não decidiu entre velha e nova política externa para seu governo

No domingo, dia 30, Lula tinha acabado de ganhar a eleição, mas era essencial que governos dos países centrais reconhecessem a vitória o mais rápido possível, ajudando a torná-la um fato consumado incontestável. Foi então que o presidente francês ligou.

Passava das duas da manhã de segunda-feira, 31 de outubro, em Paris e era o próprio Macron que estava do outro lado da linha. Mas Lula nem ficou sabendo. Integrantes da velha-guarda do PT, Celso Amorim à frente, controlaram as demandas internacionais pelo presidente eleito. Deram preferência a Cuba, Bolívia e Argentina. E o secretário-geral da ONU recebeu o mesmo tratamento dispensado a Macron, ou seja, ficou para o dia seguinte.

Eugênio Bucci* - O lábaro estiolado

O Estado de S. Paulo

Os golpistas que sequestraram e estiolaram as cores nacionais ainda vão dar muito trabalho. As instituições que se preparem

No feriado de 15 de novembro, data da Proclamação da República, subiu um pouco o número de pedestres que se concentram em frente a quartéis de algumas cidades brasileiras para requisitar um golpe de Estado. Tem sido assim desde que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) proclamou o resultado das urnas, dando a vitória a Luiz Inácio Lula da Silva. A turma que não se conforma exige que as baionetas anulem a eleição. Uma das faixas desfraldadas em São Paulo, diante da sede do Comando Militar do Sudeste, ao lado da Assembleia Legislativa, anteontem, resumiu bem o espírito do pessoal: “Nação brasileira implora por socorro – SOS Forças Armadas”.

Míriam Leitão – Acertos na COP e problemas aqui

O Globo

Lula envia o recado certo na Egito. No Brasil, problemas o esperam Na volta, vai enfrentará o xadrez na montagem do ministério e delírios golpistas

O presidente eleito Lula demonstrou no forte discurso na COP27 que amadureceu sua compreensão sobre o tema. Ele já havia sido um bom governante no combate ao desmatamento, mas desta vez chegou falando em “emergência climática”, em como o clima passou a ser central. Lula disse que não medirá esforços para combater o desmatamento, defendeu indígenas, propôs aliança mundial contra a fome, uma parceria com o agronegócio, fez cobranças aos países ricos, convidou a COP para vir para o Brasil e indicou que pode vir a criar uma coordenação “do mais alto perfil” para o tema, referindo-se talvez à Autoridade Climática.

— Em dez minutos de discurso fez mais pelo meio ambiente do que Bolsonaro em toda a vida. Falou de forma direta, sem rodeios, ao ponto. Falou o que interessava na questão interna, e também foi direto ao ponto ao se dirigir aos países ricos. Ele cobrou promessa dos outros, mas fez suas próprias promessas — afirmou Marcio Astrini, secretário executivo do Observatório do Clima.

Maria Hermínia Tavares* - Uma voz nova no planeta

Folha de S. Paulo

Na esfera climática, o país é crucial para o destino da vida na Terra

Dois Brasis fazem parte da numerosa delegação que foi a Sharm El-Sheikh, no Egito, para a COP27 (27ª Conferência das Partes). Patrocinado pela ONU, o encontro reúne lideranças dos quatro cantos do mundo para discutir o desafio comum das mudanças climáticas. O Brasil do presidente vencido nas urnas, nos estertores de seu desgoverno, foi cumprir tabela, encerrando, com um murmúrio, quatro anos de desmantelamento da imagem da nação.

O outro Brasil, representado por governadores e demais autoridades subnacionais; personalidades ligadas à defesa do meio ambiente; organizações da sociedade civil; empresários e — sobretudo — pelo presidente eleito, compareceu para mostrar o quanto se avançou na percepção dos inúmeros riscos ambientais aqui presentes e nas propostas para enfrentá-los. Desde 2019, amadureceu a consciência da importância da defesa do patrimônio ambiental para o desenvolvimento e a projeção externa do país.

Bruno Boghossian - Lula faz política interna no Egito

Folha de S. Paulo

Passagem pela COP27 dá impulso antecipado ao petista em meio a incertezas domésticas

Lula viajou 10.000 km para fazer política interna. Dias antes de embarcar para o Egito, o presidente eleito explicou a um aliado que a ideia de um giro internacional no período de transição e no início do mandato seria importante para reposicionar o país no mundo. O petista indicou, no entanto, que sua principal aposta está nos efeitos domésticos que pode colher nesse prazo.

Uma pista já havia aparecido no discurso após a vitória nas urnas. Ao lançar o slogan da política externa de seu terceiro mandato ("o Brasil está de volta"), Lula apontou que pretendia recuperar credibilidade internacional para obter a confiança de investidores estrangeiros.

Thiago Amparo - Clima além da COP no Brasil

Folha de S. Paulo

Presidente eleito precisa mostrar que não é só de discursos que a sua política climática será feita

A fala do presidente eleito Lula na COP27 é nada menos do que uma aula de política externa estadista cujo primor resta cristalino em suas linhas e entrelinhas — é um discurso marcado pelo equilíbrio de opostos, que evita o confronto, mas mantém a contundência. Nada disso poderia ser feito, aliás, sem a liderança de Marina Silva. Pena que o grupo de transição na área internacional não reflita a pluralidade que fez possível este momento na COP.

Vinicius Torres Freire - Governo paga caro pela transição

Folha de S. Paulo

Juros na praça do mercado dão salto grande; Senado diz que PEC não passa como está

Se o governo quisesse tomar dinheiro emprestado nesta quarta-feira (16), pagaria muito mais do que na quarta passada, um dia antes do "Lula Day", como dizem os povos dos mercados. As taxas de juros deram um salto no mercado de títulos da dívida pública. Foram ao pico recente, de julho passado, e estão no nível mais alto desde o início do desastroso 2016.

O governo, o Tesouro Nacional, não precisa tomar dinheiro emprestado durante esses tumultos. Pode (ainda) esperar por uns dias, por um preço melhor. Se o caldo engrossar por mais tempo, o Tesouro acaba tendo de engolir a coisa. Isto é, pagar taxas de juros mais altas para cobrir a despesa para a qual não há receita e para rolar a dívida que vence, grosso modo.

Ruy Castro - Os novos subversivos

Folha de S. Paulo

Em 1964, a subversão foi pretexto para um golpe; em 2022, pode ser de novo

É tocante: homens, mulheres e crianças fantasiados de verde-amarelo e enrolados em bandeiras, ajoelhados e de mãos postas diante dos quartéis, implorando que os militares salvem o Brasil. Esta salvação consiste em impedir, a sabre e cavalo, a posse do presidente eleito e manter no poder o derrotado, parece que ainda em exercício. Como a alternância do poder pelo voto direto é uma condição da democracia e, segundo a Constituição, o Brasil é um estado democrático de direito, é acintoso que se pregue aberta e impunemente um golpe de Estado. Mas o que espanta é que os quartéis ouçam toda essa subversão e fiquem em silêncio.

Celso Lafer* - Goldfajn é boa opção para Lula

O Globo

Sua indicação pelo governo Bolsonaro foi por mérito, e não compadrio político

Há assuntos que têm natureza de Estado, não de governos. É o caso da candidatura de Ilan Goldfajn à presidência do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). Faço a observação na condição de quem foi persistente crítico do atual governo e declarou publicamente voto em Lula na eleição presidencial, em conjunto com muitos outros que não integram a família petista, mas entenderam que ele era a melhor alternativa para superar os desastres da era Bolsonaro.

A indicação de Goldfajn pelo governo Bolsonaro foi por mérito, e não compadrio político. Muito poucos possuem as qualificações comprovadas de Goldfajn como economista, exercidas com grande competência na presidência do Banco Central.

Solapar sua candidatura, que tem grande potencial de viabilidade, em função de seus méritos e de seu percurso, não é do interesse do Brasil. É, no entanto, o que ocorreu com a manifestação de prócer da família petista. Pode significar que o Brasil corre o risco de perder a oportunidade de exercer a presidência do BID, na lógica da alternância dos compromissos dos integrantes de um banco em cuja criação o país teve papel decisivo — uma expressão da diplomacia econômica de desenvolvimento do governo JK.

O que a mídia pensa - Editoriais / Opiniões

Discurso de Lula na COP27 resgata papel do Brasil

O Globo

Presidente eleito errou feio ao aceitar carona em jatinho de empresário, mas falou o que se esperava dele

O presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva errou feio ao aceitar a carona no avião de um empresário envolvido na Operação Lava-Jato para Sharm el-Sheikh, no Egito, onde acontece a conferência do clima das Nações Unidas, a COP 27. A atitude mostra que não apenas a extrema direita acampada diante dos quartéis vive numa realidade alternativa. As amizades do PT com empresários estão na raiz de escândalos de corrupção que o Brasil não esqueceu — e nem deveria.

É uma pena, pois a presença de Lula na COP27, além de bem-vinda, é essencial para resgatar o Brasil dos escombros a que foi lançado pela diplomacia errática e pela política ambiental devastadora do governo Jair Bolsonaro. Em seu discurso, Lula falou o que se esperava. Prometeu lutar contra o desmatamento ilegal, cuidar dos povos indígenas e dar cidadania aos habitantes da região. Em tempos normais, seria um discurso previsível. Depois de quatro anos de destruição da Amazônia sob Bolsonaro, foi um alívio.

Poesia | Manuel Bandeira - Circuito da Poesia do Recife

 

Música | Joyce Cândido e Luanda Cozetti em Lisboa - Samba em prelúdio (Vinícius de Moraes e Baden Powel)