• A mais inútil das discussões da campanha
Valor Econômico
Jânio Quadros escolheu seu ministro do Trabalho, de importância capital à época, na fila de cumprimentos da posse. Chegou a vez do advogado trabalhista, o piracicabano Francisco Castro Neves, que conhecera por acaso em uma redação de jornal onde dava entrevista. Castro Neves tivera uma participação secundária na campanha, tinha ligações com o PTB mas não era um prócer partidário, humildemente seguia os mortais do beija-mão. O presidente pediu-lhe, quando se deparou com o amigo, que ficasse para depois da cerimônia porque queria falar com ele. E então convidou-o para ser ministro. Equipe é formada assim, no Brasil, vai-se constituindo com os melhores dos grupos com os quais o presidente dialoga.
Itamar Franco foi o vice que chegou à Presidência tendo ao lado a República do Pão de Queijo, quatro ou cinco amigos de Minas Gerais que ocuparam os cargos mais próximos a ele, como Henrique Hargreaves e Mauro Durante, no Palácio; Djalma Moraes e Murilo Hingel, em Minas e Energia e Educação.
Montou vários ministérios ao longo de seu período, os partidos correram a ajudá-lo na governabilidade, deu chances a amigos do Senado, indicações de políticos, professores, intelectuais, diplomatas, o mundo acadêmico do eixo Petrópolis-Juiz de Fora. O fato de não assumir com uma equipe completa e todos os postos ocupados não impediu que fizesse, na política, um plebiscito sobre sistema de governo, na economia o Plano Real, para cuja aprovação fez maioria no Parlamento.
O plano Real teve elaboração liderada pelo ministro da Fazenda, Fernando Henrique Cardoso, de quem Itamar se aproximou no Senado, que reuniu um time de primeira, inquestionável. Se Itamar conhecesse um ou dois, era porque nasceram em Minas.
A presidente Dilma, não se pode dizer, até hoje, quatro anos depois, que seja uma líder de equipe e tenha nomes seus a distribuir pelos postos. Desde o primeiro ano de governo que faz e refaz o ministério, com indicações dos partidos de sua aliança e com nomes de quem sequer ouvira falar. Já demitiu e já nomeou vários ministros, por corrupção, principalmente. Puxa para perto de si alguns auxiliares, por simpatia ou afinidade, e mantém uma cota grande de indicações do seu antecessor, que também não primou pelas escolhas. Dilma tem as inúmeras facções do partido a contemplar, tem o aparelhamento, essa inexorável vocação petista que inclusive lhe amarra as iniciativas.
Agora mesmo, a candidata foi praticamente obrigada a admitir que trocaria, em um segundo mandato, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, com quem governou o primeiro tempo. O desempenho do seu governo na economia passava de sofrível a calamitoso, sem que indicasse intenção de mudar nada. Menos de uma semana após o registro da troca, e diante do protesto do ministro, que se sentiu humilhado, se desdisse e explicou que Mantega sairia a pedido. Ora, quem anuncia que vai sair só porque quer em qualquer dia dos próximos quatro meses, pode recuar e dizer que vai ficar. A troca de ministro da Fazenda seria uma promessa de campanha para não ser cumprida. Dilma não tem quem botar no lugar. Uma história inacreditável para conferir em janeiro, se Dilma vencer.
A presidente não tem também equipe para as demais áreas, inclusive aquelas onde foi mal, como na Saúde, na Educação, na Justiça, na Energia, nas agência reguladoras e em tantas outras.
O recente erro cometido pelo IBGE no processamento da PNAD mostrou que, mesmo com equipe estável, se o governo não der condições de estrutura, pessoal e recursos ao exercício das funções, o resultado é dramático. Na última sexta, a ministra do Planejamento, Miriam Belchior, esconjurou o equívoco do IBGE, unindo-se à presidente na perplexidade e decretando o governo em choque pelo "erro gravíssimo". No sábado, Dilma determinou a quatro ministros a convocação de uma entrevista com transmissão ao vivo pelos canais oficiais, para novamente reiterar a dimensão catastrófica do acontecido. Tereza Campelo, do Desenvolvimento Social, produziu a declaração que causou, essa sim, perplexidade. Criticou "aqueles que se apegam às microvariações e deixam de verificar as grandes tendências". Foi a deixa para a presidente, em 24 horas, assumir outro tom: o erro, de "gravíssimo", virou "banal".
No governo Dilma já houve erro em pesquisa do Ipea, decisão tomada com base em relatório tecnicamente falho por um conselho de notáveis da direção da maior estatal brasileira, a Petrobras. Encontraram-se erros nas avaliações e exames nacionais do ensino médio do MEC. Foram reincidentes apagões de energia com explicações claudicantes. Se tivesse equipe antes da eleição teria sido diferente?
Pode-se temer o governo Marina, caso eleita, por várias razões, mas a falta de equipe não será uma delas. Como Itamar, ela tem sua República da Floresta, integrada por amigos da Igreja e ambientalistas, inclusive já em disputa clara pelos cargos. Em entrevista à 'Folha de S.Paulo', João Paulo Capobianco falou com pose de chefe da Casa Civil. Já está em disputa óbvia com Walter Feldman. E quando passarem a considerar o PSB e os aliados, que têm nomes a oferecer, inclusive o candidato a vice-presidente, Beto Albuquerque, certamente um político que receberá missões além do posto figurativo, de falta de equipe Marina não sofrerá.
Ao contrário da República do Pão de Queijo, a República da Floresta manda muito e quer monopolizar as decisões da candidata, agora.
A partir desse núcleo, que deve com ela assumir o Palácio, a candidata emite sinais de que tem pessoas para todas as funções. Na economia, por exemplo, Eduardo Giannetti se apresenta ao debate, mas é apenas um paradigma da equipe que deve reunir, buscando políticos, integrantes da academia, intelectuais.
Aécio Neves seria capaz de colocar um time de primeira linha em todos os postos, logo de início, até já inovou na campanha, ao indicar Armínio Fraga como o ministro da Fazenda, se for eleito, para dar transparência ao seu projeto e às suas opções. Mas aí é histórico no PSDB, considerado um partido de quadros, uma vantagem comparativa do candidato.
Uma certeza pode-se encontrar nos preâmbulos de formação das equipes: como é típico do Brasil, nada há em comum entre os nomes mencionados, oferecidos ou convidados. Nem juntos nem misturados, os melhores ou piores, mais loteria que filosofia.