Num cenário de dólar em alta e de inflação elevada, os diretores do Banco Central tomaram a decisão unânime de subir os juros de 8,5% para 9% ao ano. Foi a quarta alta seguida, e a nova taxa faz a caderneta voltar a ser corrigida pela variação da TR mais 0,5% ao mês: ela deve perder para CDBs e fundos DIs
Para segurar inflação, BC sobe juros a 9%, na 4ª alta seguida
Decisão mira controle de preços em 2014. Analistas apostam em novo aumento
Gabriela Valente, Ronaldo D"Ercole e João Sorima Neto
BRASÍLIA E SÃO PAULO - Mesmo com o cenário econômico cada vez mais turbulento e incerto, o Banco Central decidiu manter o plano de voo e aumentou a taxa básica (Selic) em 0,5 ponto percentual. Por unanimidade, o Comitê de Política Monetária (Copom) elevou os juros de 8,5% para 9% ao ano. Foi a quarta alta seguida e a terceira nessa proporção. A decisão foi tomada num ambiente repleto de dúvidas sobre a economia mundial e sobre os reflexos no Brasil. No radar da cúpula do BC, estão uma possível guerra na Síria, a pressão sobre o dólar por causa do fim dos estímulos à economia americana, uma provável alta da gasolina e novas ameaças à inflação brasileira como a seca nos EUA.
Após a reunião, que terminou mais cedo do que de costume, o BC publicou exatamente o mesmo comunicado divulgado nos dois encontros anteriores. No curtíssimo texto, disse que a decisão mira no controle dos preços em 2014. Com isso, os diretores deram a entender que continuarão a subir os juros na mesma dose usada ontem.
"O comitê avalia que essa decisão contribuirá para colocar a inflação em declínio e assegurar que essa tendência persista no próximo ano", afirmou o Copom em nota.
- A decisão, em linha com que esperava o mercado, e o mesmo teor do comunicado mostram que eles entendem que o ritmo é adequado e a aposta óbvia é que haverá mais uma alta de 0,5 ponto percentual - afirmou o economista-chefe do Santander, Maurício Molan.
Para o economista-chefe da corretora Gradual, André Perfeito, o Copom deveria ter sido mais claro. Ele apostava que o BC usaria a comunicação para atacar um dos principais problemas da inflação: o aumento das previsões dos agentes econômicos que contaminam as projeções de preços.
- O Copom perdeu uma chance maravilhosa de ancorar melhor as expectativas com um comunicado mais explícito - criticou.
Fiesp e Firjan cobram melhora na política fiscal
Apesar de a maioria do mercado esperar esse desfecho, alguns especialistas passaram a admitir anteontem a possibilidade de uma alta mais intensa, de 0,75 ponto percentual. A hipótese surgiu por causa da alta do dólar. Quanto maior a cotação da moeda americana, mais pressão para a inflação, já que o Brasil é um grande consumidor de produtos importados.
Para o ex-diretor do BC Alexandre Schwartsman, o câmbio é o fator doméstico mais perigoso. Ele ressalta que, apesar da queda da moeda americana ontem, que fechou em queda de 0,84% a R$ 2,348, o patamar do dólar é bem mais alto do que o de julho, quando estava em R$ 2,25. Apesar do cenário de tensão no mercado internacional com a perspectiva de uma intervenção militar na Síria, operadores justificaram a queda do dólar citando as intervenções programadas do Banco Central no mercado futuro até o fim do ano. No mercado de ações, a Bolsa registrou o terceiro pregão de queda, com desvalorização de 0,45%, aos 49.866 pontos.
Schwartsman lembra que as altas dos juros feitas agora não combatem o efeito imediato do dólar nos preços internos, porque demora uns seis meses para o remédio do BC começar a fazer efeito. E justamente por causa dessa defasagem, o economista afirma que não espera que o Copom promova todo o aumento dos juros necessário para conter a inflação.
- O Banco Central tem restrições políticas para isso. Estamos em ano pré-eleitoral e como os próximos aumentos dos juros terão impacto só no ano que vem, primeiro no crescimento e só depois nos preços, duvido que o BC irá até onde for preciso - disse Schwartsman.
Após a ação do BC, o Brasil ficou em terceiro lugar no ranking de juros reais, com uma taxa de 2,8% ao ano, atrás de Chile (3,1%) e China (3,3%). Os dados são do site de informações financeiras Moneyou, com informações de 40 países.
- Nossa taxa real está impactada pela perspectiva de inflação mais forte nos próximos 12 meses. Embora estejamos de novo subindo os juros, não significa que vamos retomar a atração dos investidores externos no curto prazo, por causa dos riscos regulatórios que veem no Brasil atualmente -disse o economista Jason Vieira, diretor da Moneyou.
Na previsão dos economistas ouvidos semanalmente pelo Banco Central, os diretores do Copom ainda subirão os juros mais uma vez. Se isso ocorrer, a taxa chegará a 9,5% ao ano.
Mesmo com a deterioração das expectativas, Perfeito acredita que a decisão de manter a dose do remédio contra a inflação estava dada, porque além das incertezas, o BC deve esperar novos dados da economia brasileira, como o crescimento do segundo trimestre, que será divulgado amanhã.
As principais entidades empresariais cobraram do governo mas rigor na política fiscal para restabelecer o equilíbrio da inflação sem sacrificar a economia com juros mais altos. Paulo Skaf, presidente da Federação das Indústrias de São Paulo (FIesp), disse que o Copom "errou novamente" ao elevar a Selic diante do "quadro letárgico" da economia.
- Não é hora de subir juros. Há muito tempo pedimos mudanças na política econômica, na direção de maior controle de gastos e menos uso da taxa de juros - disse Skaf.
Em comunicado, a Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (Firjan) insiste na necessidade de correção no mix de políticas do governo, "de forma que a política fiscal contribua no combate à inflação e na retomada da confiança dos empresários e investidores estrangeiros".
As centrais sindicais engrossaram o coro de críticas à decisão do Copom. Paulo Pereira da Silva, o Paulinho, presidente da Força Sindical,disse que elevar a Selic "só contribui para a redução de investimentos no setor produtivo, obrigando o governo a pagar mais juros a especuladores".
Fonte: O Globo