quinta-feira, 20 de outubro de 2022

Merval Pereira - Jacaré preguiçoso

O Globo

Tudo indica que o próximo presidente será definido no photochart, mas estamos assistindo ao maior escândalo de abuso do poder econômico e político já visto em eleições

A pergunta de um milhão de dólares (talvez valha até mais) é da antiga, porém atualíssima, piada política eternizada por Marco Maciel, ex-vice de Fernando Henrique e político de respeito de Pernambuco. Numa de suas disputas majoritárias, o marqueteiro disse a ele, satisfeito, que as curvas dele e do adversário estavam se cruzando, a sua ascendente, a do outro descendente. Maciel calmamente perguntou:

— Elas se cruzarão antes ou depois da eleição? Quando as curvas vão se aproximando, diz-se no jargão das pesquisas eleitorais que “a boca do jacaré está se fechando”. É o que parece estar acontecendo na disputa entre o presidente Bolsonaro e o ex-presidente Lula, mas esse jacaré é um tanto preguiçoso, fecha a boca devagarinho, pontinho a pontinho. No momento já existe um empate técnico no limite da margem de erro, de dois pontos percentuais para mais ou para menos.

Como os institutos de pesquisas fazem questão de ressaltar, pela primeira vez em anos, que o resultado não é um prognóstico, mas uma fotografia da realidade no momento em que são realizadas, não há mais favoritismo na corrida presidencial. Essa situação deve-se a que os eleitores estão obrigados a escolher entre os dois candidatos mais rejeitados da campanha, uma situação instável que pode ser abalada por qualquer movimento de última hora. Mesmo que 94% dos pesquisados declarem não pretender mudar de voto, tanto em Lula quanto em Bolsonaro.

É inegável que estamos assistindo ao maior escândalo de abuso do poder econômico e político a favor de um incumbente já visto desde os tempos da República Velha. Bolsonaro criou tal clima de suspeição contra o Supremo Tribunal Federal (STF) e o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que se tornou inimputável. Por muito menos já se cassou o mandato de prefeitos e governadores eleitos, e isso poderá vir a acontecer caso Bolsonaro se reeleja, mas só que tarde demais.

Vera Magalhães - Para vencer, Bolsonaro terá de ganhar votos de Lula

O Globo

Transferência direta de eleitores do petista no primeiro turno para o presidente teria como chave Auxílio Brasil e outras benesses de governo

É impossível uma virada de Jair Bolsonaro sobre Luiz Inácio Lula da Silva que leve à vitória do presidente em 30 de outubro? Parece ser esta, na terceira semana do segundo turno, a pergunta que todos tentam responder à medida que sucessivas pesquisas mostram a lenta, porém constante, redução das vantagens do petista sobre o candidato do PL em diversos segmentos da pesquisa de intenções de voto e também a recuperação de Bolsonaro em outros fatores chaves para levar ao voto, como a rejeição e a avaliação de seu governo.

Com poucos votos ainda em disputa, pelo que mostram os levantamentos (indecisos somam 1% e aqueles que dizem pretender votar em branco ou nulo são 4%, de acordo com o Datafolha), os fatores que podem ocasionar a virada são a abstenção, que pode atingir de forma desigual eleitores de um e de outro, e a difícil, mas não impossível, transferência direta de votos que Lula teve no primeiro turno para o presidente.

Mas o que pode levar a que um eleitor que apertou 13 em 2 de outubro decida mudar de ideia no dia 30 e marcar 22? Mais que a comparação entre o que cada um fez, conta a expectativa, que pode ter sido alterada nas três semanas de campanha adicional, do que pretendem fazer, em várias esferas.

Malu Gaspar - O dilema da censura

O Globo

A guerra suja da campanha colocou a Justiça Eleitoral numa encruzilhada. De um lado, é preciso impedir a disseminação de mentiras e desinformação. De outro, há que preservar o pilar de qualquer democracia saudável, a liberdade de expressão.

Desde o trauma provocado pela onda de fake news que contaminou o pleito de 2018, consolidou-se na sociedade o consenso de que a liberdade de expressão termina onde começa a difusão de mentiras. Essa é a base sobre a qual o Judiciário vem orientando sua atuação. Mas esse consenso, hoje, parece insuficiente.

Ninguém de boa-fé discordará que é preciso tomar providências enérgicas. A questão é como fazer isso.

Para barrar a disseminação de fake news, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) mandou retirar do ar conteúdos divulgados pela campanha de Jair Bolsonaro que associavam Lula ao satanismo, assim como os vídeos de Lula sugerindo que Bolsonaro praticava canibalismo.

Peças de Bolsonaro que diziam que Lula é favorável ao aborto também foram vetadas, assim como as divulgadas por Lula associando a fala do presidente sobre garotas venezuelanas à prática de pedofilia, no episódio que ficou conhecido como “pintou um clima”.

Até aí, tudo dentro dos conformes.

Então, o ministro Paulo Sanseverino decidiu que a campanha de Bolsonaro não poderia exibir um vídeo chamando Lula de ladrão ou de corrupto, porque ele não é mais um condenado e tem direito à presunção de inocência. Isso mesmo considerando que o vídeo da campanha exibia o trecho de uma entrevista do ex-ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Marco Aurélio Mello em que ele afirma que Lula não foi inocentado, e sim que seus processos foram anulados.

Míriam Leitão - Abuso de poder político e econômico

O Globo

Vamos ser claros sobre o novo consignado: é estelionato eleitoral, irresponsabilidade fiscal, compra de votos e abuso de poder político

O governo está empurrando os vulneráveis para o superendividamento, mesmo diante do risco de queda da renda em janeiro. A equipe econômica está fazendo tudo de caso pensado. Miram os que estão nos grupos que dão mais votos a Lula: beneficiários do Auxílio Brasil, do BPC, e trabalhadores de baixa renda. As medidas têm vindo em série para dar ao eleitor a falsa sensação de conforto econômico. A Caixa está sendo usada como instrumento político. Mais uma vez.

Eu ouvi de duas autoridades que isso é abuso de poder político. E econômico. A Caixa lidera uma enxurrada de empréstimos para quem recebe R$ 600 de Auxílio Brasil e para quem recebe o Benefício de Prestação Continuada (BPC). O BPC é para idosos ou deficientes extremamente pobres. O Auxílio, também. Eles estão pegando empréstimos de R$ 2.600 por 24 meses às vésperas das eleições.

A presidente da Caixa, Daniella Marques, garantiu, a uma autoridade preocupada com a operação, que não há risco porque os juros são de 3,5%. Havia uma pressão do Ministério da Cidadania para que fossem 2,1%. Ela realmente acha que se elevar os juros para pessoas paupérrimas os riscos serão menores? Argumentou também que o Panamericano já contratou R$ 1 bilhão e que isso prova que é uma operação comercial normal.

Cristiano Romero - Getulismo, lulismo e, agora, bolsonarismo

Valor Econômico

Bolsonarismo sobreviverá ao sucesso ou não de Jair Bolsonaro nesta eleição

A polarização que vem caracterizando a política brasileira nos últimos anos aumentará depois da eleição do próximo dia 30. Não importa quem vença o pleito, se Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ou Jair Bolsonaro (PL). A eleição de 2022 marca definitivamente a emergência de novo movimento político no Brasil: o bolsonarismo.

Desde 1989, com o retorno do voto direto para Presidente da República, a disputa de poder se deu com a presença direta ou indireta de Lula. Incluindo-se 2022, Lula concorreu diretamente ao cargo em seis das nove eleições.

Nas três restantes, só não foi candidato em duas porque, em 2014, Dilma Rousseff, escolhida por ele para sucedê-lo em 2010, não abriu mão do direito de buscar a reeleição, e 2018 foi condenado à prisão pelo juiz Sergio Moro, num processo anulado mais tarde pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Em 1989, ao ter mais votos do que Leonel Brizola (PDT) para enfrentar Fernando Collor de Mello (PRN) no segundo turno, Lula não deu início propriamente dito ao lulismo. Este só se materializou depois que o petista chegou ao poder, em 2003.

Foi o lulismo que levou Dilma Rousseff ao poder duas vezes e permitiu que Fernando Haddad, um intelectual desconhecido fora da capital paulista, chegasse ao segundo turno da eleição presidencial em 2018 e, agora, da escolha para governador de São Paulo. A eleição de quem vai comandar o Estado mais rico do país reflete justamente o enfrentamento das duas forças políticas predominantes no plano nacional: o lulismo e o bolsonarismo.

Luiz Carlos Azedo - Lula tenta reduzir desvantagem entre os evangélicos

Correio Braziliense

Como fenômeno eleitoral, o presidente Bolsonaro emergiu da periferia ancorado nas comunidades evangélicas, porque capturou o sentimento de preservação da família unicelular patriarcal

Quem visita os bairros de periferias ou favelas das grandes cidades brasileiras, com muita facilidade consegue identificar uma família evangélica por meio da simples observação visual. Geralmente, moram nas casas mais bem cuidadas, mesmo que menores e com aparência mais pobre. A principal razão costuma ser o fato de que seus ocupantes integram uma família estruturada, cuja rotina de trabalho e estudo está sustentada na harmonia familiar, na disciplina, na resiliência, na austeridade e na ordem. Existe uma funcionalidade na presença das igrejas pentecostais na organização da sociedade nas periferias que não pode ser ignorada.

É óbvio que há católicos, espíritas, umbandistas etc. com família unicelular e casas bem organizadas, mas estamos falando de famílias desestruturadas. O eixo da atuação dos evangélicos nas comunidades pobres é a preservação da família unicelular patriarcal e a defesa dos seus costumes tradicionais, o que leva à formação de uma base cultural conservadora, facilmente capturada pelas narrativas políticas reacionárias. Há setores reacionários na Igreja Católica, mas a doutrina católica é menos conservadora e sua presença como organização nas periferias é muito menor, porque suas igrejas fisicamente estão fora da maioria dessas comunidades. Por força da nossa própria formação como nação, os católicos até são a maioria nessas comunidades, mas não representam uma força organizada a partir do cotidiano de seus moradores, ao contrário dos evangélicos.

Maria Cristina Fernandes - Último voto será contado em Minas

Valor Econômico

Mais do que uma síntese, Estado se transformou num “copia e cola” da disputa nacional

 “Quem ganha em Minas, ganha no Brasil” vale desde a redemocratização. O que nunca se havia visto era um “copia e cola” tão fidedigno quanto aquele do 1º turno. O percentual de votos dos dois finalistas foi exatamente o mesmo no Estado e na Federação: 48% (Lula) x 43% (Bolsonaro). O presidente já esteve quatro vezes no Estado neste 2º turno e o ex-presidente chega para sua segunda visita nesta sexta. Os movimentos que lá se sucedem explicam o estreitamento entre ambos exibido pela última rodada do Datafolha e confirmam que a disputa seguirá cada vez mais apertada até o dia 30.

Nenhum governador reeleito arregaçou tanto as mangas pelo presidente da República quanto Romeu Zema (Novo). É claro que a perspectiva de poder sinalizada nesta parceria é um ativo de Jair Bolsonaro, mas a causa e efeito desta aliança não é o que parece.

Zema resistiu à abordagem de pelo menos dois emissários, um empresário e outro do PSDB, para se manter neutro na disputa e se preservar para ser o candidato liberal à Presidência em 2026.

César Felício - Falta de transferência de votos de Lula para Bolsonaro ainda trava reversão do quadro

Valor Econômico

O cenário de segundo turno está em aberto porque há apenas dez dias de campanha pela frente

A oscilação mínima registrada pela pesquisa Datafolha nesta quarta-feira (19), em que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) manteve-se com 49% de intenção de voto e o presidente Jair Bolsonaro (PL) passou de 44% para 45% ganha relevo pelo campo da pesquisa. Diminuiu o intervalo entre os levantamentos do instituto. No caso atual, apenas cinco dias separam a pesquisa divulgada hoje da anterior. No primeiro turno, o Datafolha saía com frequência semanal.

Bolsonaro teve que enfrentar, nos últimos dias, fatores negativos, o mais relevante dos quais a polêmica sobre as meninas venezuelanas com quem se encontrou durante a pandemia, registrou ter “pintado um clima” e sugeriu de maneira injustificada serem prostitutas. Tão prejudicial foi o episódio que o presidente veio a público duas vezes para se explicar.

Vinicius Torres Freire - Eleição vai ser decidida na moedinha

Folha de S. Paulo

Quase empate entre Lula e Bolsonaro é uma possibilidade; guerra da abstenção é decisiva

"Vai ser na moedinha", diz um amigo cientista social a respeito das pesquisas do segundo turno da eleição. Isto é, a eleição está tão apertada que o Imponderável da Silva das estatísticas nos diz que não se pode descartar um resultado próximo do empate entre Lula da Silva (PT) e Jair Bolsonaro (PL).

Não é possível fazer projeções sobre o número de abstenções e votos válidos, o que vai ser relevante e provavelmente decisivo. A batalha do transporte público grátis (ou não) vai se intensificar. O assédio eleitoral está sendo denunciado aos montes, mas também não sabemos a extensão dessa violência em empresas, serviço público e, quem sabe, em áreas controladas por milícias e outras facções criminosas.

Bruno Boghossian - Pescaria no Nordeste e no Sudeste

Folha de S. Paulo

Números favorecem Lula, mas Bolsonaro tenta criar condições para ultrapassagem

Em pouco mais de duas semanas de segundo turno, Lula teve oito agendas de campanha no Sudeste e quatro no Nordeste. Jair Bolsonaro concentrou nove atos no Sudeste e outros quatro no Nordeste. Os dados do primeiro turno ajudam a explicar a disputa territorial pelos votos restantes na etapa final da corrida.

No dia 2 de outubro, quase 10 milhões de eleitores preferiram manter alguma distância de Lula e Bolsonaro, digitando nas urnas os números de outros candidatos. Os maiores estoques de votos nem-nem se concentraram no Sudeste (4,8 milhões) e no Nordeste (2 milhões).

Pescar esses eleitores é a prioridade das duas campanhas. A vantagem com que Lula saiu das urnas no primeiro turno impulsionou o petista na largada, mas o reforço da campanha de Bolsonaro e a ofensiva organizada pelo presidente nas duas regiões deixam aberta a chance de uma ultrapassagem.

Conrado Hübner Mendes* - Curriculum Vitae

Folha de S. Paulo

Profissional experiente, onívoro, fluente no dialeto dos porões

Formado por academia militar. Revela ser ex-adepto de sexo com animais, pois "naquele tempo não tinha mulher como tem hoje em dia". Mostra interesse em consumir carne humana, pois "comeria um índio sem problema nenhum". Num episódio com "menininhas de 14 anos, bonitas, arrumadinhas" conta que "pintou um clima". Costuma dizer "minha frase foi deturpada", "brincadeira", "narrativa". É seu reflexo verbal.

Tentou abortar seu quarto filho, mas garante lutar contra a prática. Discreto, prefere sigilo para assuntos familiares. Já planejou atentado a bomba. Já esteve preso.

Conhecedor da micro-corrupção, "sonego o que for possível": sabe expropriar salário de funcionário e superfaturar gasto de gasolina. Ensina a família. Conhecedor da macro-corrupção, compra centrão com dinheiro público não rastreável e fecha instituições de combate à corrupção. Manda desmatar. Não reajusta merenda escolar, corta em farmácia popular. Corta em futuro.

Proprietário residencial, usa auxílio-moradia para "comer gente" (comer, veja bem, no sentido figurado, não canibalístico). Comprou 51 imóveis com dinheiro vivo.

William Waack - O peso das memórias

O Estado de S. Paulo

Não funcionou a tática das duas campanhas de apelar ao esquecimento

Na fase final da corrida eleitoral as campanhas se dedicam também à supressão de duas memórias coletivas. Ambas de altíssimo conteúdo emocional.

Por parte de Lula, é a tentativa de apagar da recente memória coletiva os enormes escândalos de corrupção do período petista. Esforço até aqui malsucedido: a rejeição de Lula subiu nas últimas semanas.

Por parte de Bolsonaro, é a tentativa de apagar da recente memória coletiva a dor e o sofrimento trazidos pela pandemia. São sentimentos de forte impacto sobretudo no eleitorado feminino. Esforço também malsucedido: a rejeição de Bolsonaro “melhorou”, mas continua superior à de Lula.

O que explica o empenho de duas campanhas profissionais em tentar relativizar acontecimentos bastante recentes de tamanhas amplitude e relevância?

Roberto Macedo* - Lula: dos males o menor, para evitar o pior

O Estado de S. Paulo

O petista tem seus defeitos, mas o mérito mais relevante neste momento: é muitíssimo democrata, enquanto Bolsonaro tem forte viés autocrata.

No primeiro turno, votei em Simone Tebet. No segundo, votarei em Lula, que ela apoia, o que é um bom sinal. Bolsonaro desgoverna sob vários aspectos: entre eles, é grosseiro no trato pessoal, não raciocina bem, fala coisas como “imbrochável” e “pintou um clima”, descuidou da educação, da saúde, do meio ambiente, e nunca buscou seriamente o crescimento econômico de que o País tanto carece. É, também, descuidado com as finanças públicas. Medidas que tomou, em particular no fim do mandato, como a PEC Kamikaze, tiveram viés populista e eleitoreiro, como numa tentativa de comprar votos. E deixará pesado ônus fiscal para Lula, ou para si mesmo, se ficar.

Eugênio Bucci* - O lado da imprensa nas eleições

O Estado de S. Paulo

O bom jornalismo não se acomoda num ponto intermediário entre a democracia e os usurpadores da palavra liberdade.

Há coisa de duas semanas, a revista britânica The Economist afirmou que “outro mandato para o populista Jair Bolsonaro seria ruim para o Brasil e para o mundo”. Trata-se de uma tomada de posição: entre a reeleição do presidente que aí está e uma volta ao poder de Lula, a revista mais influente do mundo, considerada uma espécie de farol do liberalismo, aponta para a segunda alternativa, uma vez que “somente Lula pode impedir” (o segundo mandato do incumbente). 

Para sustentar sua escolha, a Economist lista numerosas razões, desde a mania do atual presidente de proclamar sua virilidade sexual no alto de palanques até sua omissão em interromper a destruição da Amazônia. “Ele mina as instituições, da Suprema Corte à própria democracia.” Como é sabido, o semanário nutre ostensiva antipatia pelo receituário de esquerda. Logo, ao indicar discreta preferência por Lula, cuida de sugerir que o petista se desloque na direção do centro.

Criminalizar pesquisas pode provocar ‘apagão’ de dados

Para especialistas e representantes do setor, propostas em tramitação na Câmara ameaçam o exercício da cidadania e a livre circulação da dados

Por Nicolas Iory / O Globo

SÃO PAULO - As propostas de criminalização de pesquisas eleitorais que tenham resultados diferentes dos registrados no dia da votação ameaçam o próprio processo eleitoral e a democracia. Na opinião de especialistas ouvidos pelo GLOBO, a ideia de punir institutos de pesquisa com multas ou até mesmo a prisão de seus representantes pode resultar em um “apagão” de informações, prejudicando a tomada de decisão de milhões de eleitores.

A Câmara dos Deputados aprovou nesta semana o regime de urgência para dois projetos sobre o tema. A medida teve o apoio do presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), e dos partidos aliados ao presidente e candidato à reeleição, Jair Bolsonaro (PL), que frequentemente estimula a descrença nas sondagens de opinião pública.

Uma das propostas em discussão é a do líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR). O texto prevê de quatro a dez anos de prisão para estatísticos, representantes de institutos e da empresa contratante caso uma pesquisa divulgada até 15 dias antes da eleição não coincida com o resultado oficial, dentro da margem de erro. Esse projeto tramitará junto a outro, de 2011, que estipula multas de R$ 500 mil a R$ 1 milhão aos institutos que “errarem” da mesma forma em levantamentos publicados até cinco dias antes do pleito.

Lula terá direito de respostas em 184 inserções de TV

A menos de dez dias para segundo turno, petista obteve 184 autorizações para rebater acusações feitas em programas eleitorais do presidente e candidato à reeleição

Por Mariana Muniz – O Globo

BRASÍLIA - Com a série de decisões do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em que concede direito de resposta à campanha do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o presidente Jair Bolsonaro (PL) deve perder quase metade das inserções na propaganda eleitoral de TV a que teria direito.

Ao todo, o candidato do PL perdeu 184 inserções após decisões dos ministro Paulo de Tarso Sanseverino e Maria Claudia Bucchianeri nesta terça-feira. Desde o início da campanha eleitoral, foi a primeira vez que o TSE atendeu a pedidos desse tipo.

Segundo estimativa de pessoas envolvidas na campanha, o presidente teria 400 inserções nos próximos oito dias. Assim, após os direitos de respostas, ficaria com apenas 216. Procurados para comentar as decisões, os advogados de Bolsonaro não responderam. As decisões ainda podem ser alvo de recurso.

Por meio de decisões também proferidas nesta quarta-feira, a campanha do presidente terá direito a 14 inserções, o mesmo número de propagandas veiculadas pelo PT com conteúdo vedado, de 30 segundos cada na TV durante o tempo destinado a Lula. No caso, Bolsonaro poderá rebater peças divulgadas pelos petistas que o associavam ao canibalismo.

Fernando Carvalho* - Quem é Jair Bolsonaro?

Fala de Bolsonaro sobre meninas venezuelanas é asquerosa, abjeta, nojenta e até agora não foi explicada.

Octavio Guedes

El modelo de fascista que le ofrece Bolsonaro a la nacion brasileña es más odio, más terror, más discriminacion, más prejuicio y más destrucción.

Fernando de la Cuadra

Apoiar um candidato autoritário é um jogo perigoso que raramente termina bem.

Steven Levitsky

O projeto político de Bolsonaro tangencia o velho positivismo da Escola Militar da Praia Vermelha e o castilhismo gaúcho, que são incompatíveis com nossa democracia.

Luiz Carlos Azedo

A intenção de Bolsonaro de transferir nossa embaixada em Israel para Jerusalém nos relegaria a uma situação ridícula.

Rubens Ricupero

Desde o início, o atual governo se colocou sob o signo da destruição: floresta, cultura, ciência, consensos civilizatórios básicos, nada ficou fora deste espírito de “bota abaixo”. A esfera política. A relação entre os poderes, abalada. A ameaça constante de recorrer ao Exército.

Luiz Sérgio Henriques

Bolsonaro é a regressão aos anos pré-democracia.

Alberto Aggio

As críticas do PT às instituições democráticas são retóricas. A ameaça vem de Bolsonaro. A relação dele com a democracia é muito ruim e ele está estimulando na sociedade agressões, violência.

O que a mídia pensa - Editoriais - Opiniões

Próximo governo terá de enfrentar grupos de interesse

O Globo

Principal teste para quem for eleito será promover uma reforma tributária que desmonte a teia de privilégios

Um dos principais testes que o próximo presidente terá de enfrentar, independentemente de quem seja eleito em 30 de outubro, será libertar o Estado brasileiro do sequestro por grupos de interesse. Para o eleitor, o melhor termômetro será a disposição de cada candidato em realizar mudanças profundas e urgentes no sistema de cobrança de impostos. A barafunda de tributos, alíquotas, regras, exceções, isenções e subsídios é uma das principais causas do nosso atraso.

É difícil exagerar sobre quanto o Brasil é lerdo na corrida global. Em 1980, o PIB per capita brasileiro — medido pelo critério de paridade do poder de compra, que permite comparações internacionais — era US$ 11.400 dólares. Nas quatro décadas seguintes, aumentou míseros 29%. No mesmo período, cresceu 2.500% na China. Na Coreia do Sul, 729%. Alguém poderá argumentar que os países asiáticos têm histórias e vivem circunstâncias distintas das nossas. Pois no Chile a alta foi de 188% e na Colômbia de 108%. A Colômbia foi a última a ultrapassar o Brasil. É uma vergonha.

A razão para nosso atraso não é a falha no diagnóstico, mas a dificuldade em enfrentar os interesses contrariados pelas mudanças necessárias. Os avanços costumam ocorrer apenas em momento de dor extrema — como foi o caso do controle da inflação ou da implantação de um arcabouço jurídico para controle fiscal. Mas em seguida o Brasil costuma repetir um padrão recorrente fadado ao fracasso.

Poesia | Fernando Pessoa - É fácil trocar as palavras

 

Música | Chico Buarque - Construção