Por Raymundo Costa | Valor Econômico
BRASÍLIA - A divulgação do diálogo entre Michel Temer e Joesley Batista deixou o presidente em situação delicada. No áudio, o empresário relata pagamentos de R$ 50 mil por mês a um procurador cooptado por ele e que lhe dá informações sigilosas da força-tarefa do Ministério Público. O relato de obstrução à Justiça é feito ao presidente da República sem que este esboce nenhuma reação de desconforto. Em nota, o Palácio do Planalto alega que o presidente "não acreditou" na veracidade das declarações. Para ele, o empresário "parecia contar vantagem".
Na avaliação do governo, o áudio não é comprometedor, por não comprovar o envolvimento de Temer na compra do silêncio do ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha, como se depreendeu dos vazamentos sobre o diálogo na quarta-feira.
Ontem, no fim do dia, o Supremo Tribunal Federal levantou o sigilo de parte das gravações que provocaram um terremoto no país. O PMDB comparou o impacto da delação da JBS ao da Operação Carne Fraca, que parecia ter desmontado um grande esquema de corrupção, mas pegou apenas funcionários corruptos e prejudicou a exportação da carne brasileira. No entanto, nem o impacto da Carne Fraca, cujo conteúdo ainda está por ser revelado, foi tão insignificante, nem a crise da delação da JBS foi superada.
Em pronunciamento à nação, Temer foi claro: "Não renunciarei". Ao decidir ficar, fez uma aposta de alto risco. Com menos de 10% de aprovação popular, o presidente espera para ver a reação das ruas, em protestos programados para o domingo. As grandes manifestações foram decisivas para a queda da ex-presidente Dilma Rousseff. Em segundo lugar, mas não por último, ele conta com um julgamento favorável do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) na ação de impugnação da chapa Dilma-Temer, proposta pelo PSDB, já marcado para a primeira semana de junho. Eventual absolvição ajudaria a aliviar a pressão política sobre o governo.
Temer e seu grupo de conselheiros mais próximos avaliam todas as possibilidades. O presidente quer recompor sua base política, que está esgarçada, como mostram as defecções ocorridas ontem no PSDB e no PPS, mas precisa dizer aos aliados em torno do quê pretende juntar os cacos. Ele vai acenar com a complementação das reformas e com a estabilização da economia. Se ficar sem base de apoio e incapaz de cumprir a promessa, como aconteceu com a ex-presidente Dilma Rousseff, não terá muito mais o que fazer sozinho no Palácio do Planalto.