domingo, 29 de março de 2020

Merval Pereira - Ações desencontradas

- O Globo

O ministro Mandetta está querendo se equilibrar entre o lado técnico e o político, e só faz aumentar a incerteza

O ação desagregadora do presidente Jair Bolsonaro torna-se mais grave neste momento em que é necessário que o país tenha um rumo no combate à pandemia do Covid-19. Bolsonaro toma decisões sem consultar seus ministros mais afeitos aos problemas, como Paulo Guedes, da Economia, e Luiz Henrique Mandetta, da Saúde, e provoca crises intestinas que se refletem em decisões postergadas ou desencontradas.

Quando resolveu aumentar para R$ 600 o voucher para os informais para não deixar que o presidente da Câmara Rodrigo Maia, que propusera aumentar de R$ 200 para R$ 500, saísse como o grande benfeitor dos pobres, Paulo Guedes não foi consultado.

Quando fez o pronunciamento defendendo o fim da quarentena horizontal, também não falou com Mandetta. Paulo Guedes foi para o Rio depois de conflitos com Bolsonaro sobre o montante de gastos na crise, situação aparentemente superada como demonstra o vídeo que Guedes gravou, engajando-se na política de Bolsonaro.

O ministro Luiz Henrique Mandetta está querendo se equilibrar entre o lado técnico e o político, e só faz aumentar a incerteza a respeito das diretrizes do governo. Ontem, em seu pronunciamento depois de uma reunião no Palácio da Alvorada com o presidente Bolsonaro e outros ministros, Mandetta não mudou nenhuma orientação, como exige sua equipe técnica, mas acenou com mudanças a curto prazo, o que não parece viável.

Bernardo Mello Franco - Impeachment pode ser pouco

- O Globo

Ao sabotar medidas contra a pandemia, o presidente põe milhares de vidas em risco e se candidata a um processo no Tribunal Penal Internacional

Os desvarios de Jair Bolsonaro não cabem mais na esfera da política. Quando o presidente se torna uma ameaça à saúde pública, sabotando o esforço nacional contra a pandemia, seus atos devem ser submetidos aos tribunais.

Nos últimos dias, a Justiça começou a impor freios ao Capitão Corona. O Supremo derrubou duas canetadas odiosas: o corte de 158 mil benefícios do Bolsa Família e a MP que mutilou a Lei de Acesso à Informação.

Para surpresa de ninguém, Bolsonaro tentou usar a crise para garfar miseráveis e reduzir a transparência do governo. As medidas foram invalidadas pelos ministros Marco Aurélio Mello e Alexandre de Moraes. Em tempo: nenhum deles foi indicado por governos do PT.

Luiz Carlos Azedo - Saúde, economia e democracia

- Nas entrelinhas | Correio Braziliense

“Se prevalecer a teoria da “gripezinha”e do “resfriadinho”, contra a política de distanciamento social, a evolução da crise seguirá um roteiro trágico. É a teoria do caos”

O Brasil é uma democracia de massas, com um Estado ampliado. O presidente da República é eleito pelo voto direto, secreto e universal, assim como governadores e prefeitos, todos com atribuições bem definidas em sua esfera de poder. Ninguém pode tudo. O Estado brasileiro é uma federação, na qual a União, estados e municípios têm autonomia no exercício de seus respectivos papéis. Um complexo de leis aprovadas pelo Congresso e interpretadas pelo Judiciário limita o Executivo, em todos os níveis. Órgãos de controle, fiscalização e coerção, subordinados aos três poderes, zelam para que as regras do jogo sejam respeitadas, tanto pelos cidadãos quanto pelas autoridades.

O presidente Jair Bolsonaro tem dificuldades para operar esse complexo institucional e se relacionar com seus representantes, o que exige mais liderança do que autoridade formal, que é limitada. Essa é a causa de conflitos que não deveriam existir na resolução de graves problemas nacionais. O presidente da República prefere liderar e se legitimar pelas redes sociais, que emulam com as instituições da democracia representativa e criam um ambiente político de grande fluidez e volatilidade.

Bolsonaro tem uma concepção autoritária de poder, adquirida na Academia Militar de Agulhas Negras, na época da ditadura militar. É uma vertente do positivismo disseminado pela Escola Militar da Praia Vermelha, que inspirou a República, o “florianismo”, o movimento tenentista, a Revolução de 1930, a Intentona de 1935, o Estado Novo e o golpe militar de 1964, além de uma série de outras rebeliões e quarteladas. Parte do pressuposto de que cabe aos militares tutelar a sociedade brasileira e exercer o papel de Poder Moderador, extinto com o fim da monarquia.

Essa concepção vem de longe, mais precisamente das intervenções militares ocorridas no período regencial, que tiveram um duplo papel. De um lado, evitar a fragmentação territorial do Brasil; de outro, preservar a escravidão, alicerce econômico da monarquia, a pretexto de que a abolição desorganizaria a economia. Sua gênese é o período de grande turbulência entre a abdicação de D. Pedro I e a posse de D. Pedro II no trono do Brasil, ou seja, entre 1831 e 1840. Na Regência Trina (1831 a 1834) e na Regência Una (1834 a 1840), se digladiavam Moderados (maioria, representavam a elite e defendiam centralização), Restauradores (queriam a reunificação do Império, com a volta de D. Pedro I) e Exaltados (lutavam pela descentralização do poder).

Dorrit Harazim - Todos no mesmo barco

- O Globo

Brasil tem no comando um fio desencapado

É falsa a ilusão de que à atual perda de liberdade por quem está em isolamento corresponde uma súbita fartura de tempo — commodity que ontem como agora vale uma fortuna e é disputada por ilusionistas de todos os tipos. Alguns mercadores ainda teimam em infiltrar nosso confinamento com oferendas bizarras como “Fashion Trends: Metalizados para o Inverno 2020”. Ou “Saldão de Vinhos Grand Cru, Só Até Amanhã!”. Que amanhã?? Os robôs da rede social Linkedin, que já foi comparada a uma escadaria Escher travestida de degrau de ascensão profissional, continuam a informar promoções individuais e de aniversários em empregos. Que empregos??

Confinados ou não, nos sobra pouco tempo para qualquer coisa que não seja relacionada ao coronavírus — o qual, por sinal, dispensa o qualificativo de “novo” por já ter nome e sobrenome de doença (Covid-19). Em compensação o adjetivo é mais atual do que nunca no conceito de “novo-pobre” delineado pelo economista Ricardo Paes de Barros, que há dias prega políticas sociais imediatas, coerentes e sustentadas para as periferias urbanas. Na nave chamada Brasília a urgência é outra.

Míriam Leitão - O risco duplo para o país

- O Globo

Bolsonaro só pensa em reeleição e é capaz de pôr a saúde dos brasileiros em risco para chegar lá com condição de renovar seu mandato

Jair Bolsonaro é o pior presidente que poderíamos ter para nos guiar na travessia desta tempestade sem precedentes. Ele sempre foi menor do que a cadeira que ocupa, mas agora revela em cada ato, palavra e decisão que conspira contra a saúde da população. Não é uma questão de gostar ou não do governante. A análise objetiva leva à conclusão de que ele hoje é um obstáculo a que o país supere a turbulência, minimizando perdas humanas e econômicas.

Nas últimas semanas, foram sucessivos episódios completamente desviantes. Açulou manifestação contra o Congresso, foi cumprimentar manifestantes em época de pandemia e que carregavam faixas hostis a lideranças políticas, fez declarações bizarras e mal informadas sobre assunto da maior gravidade. Estimulou brasileiros a não seguirem a orientação das autoridades sanitárias e enquadrou o ministro da Saúde, Luiz Mandetta, que ficou no governo, depois de “adaptar” suas opiniões, para usar a expressão da ex-ministra Marina Silva. É o soldado que marcha errado no batalhão dos governantes mundiais. Todos os outros, com maior ou menor rapidez, entenderam que nenhum líder pode pôr em risco a vida dos seus concidadãos.

Bolsonaro não faz o que faz por incompreensão do problema e dos riscos. Ele não se importa com o perigo que estamos correndo. O centro de suas atenções está apenas nele próprio e nos seus filhos. Vê em cada sombra um adversário, em cada discordante, um traidor, em cada decisão de outra autoridade, uma conspiração contra o seu poder.

Joaquim Falcão* - Vai dar tempo

- O Globo

Angela Merkel decide consultando cientistas alemães

Sempre que o presidente Trump aparece na televisão, está acompanhado de médicos e cientistas. Ele fala e depois cede para eles o microfone. O primeiro-ministro Boris Johnson decide com ajuda dos cientistas do Imperial College. Quando informado, muda, inclusive, sua política. Cede aos cientistas. Antes contra, agora a favor da quarentena.

O governador João Doria está sempre acompanhado de grandes médicos e cientistas. Angela Merkel decide consultando cientistas alemães. Aqui mesmo, no início, o presidente Bolsonaro aparecia acompanhado do entusiasmado e confiante ministro Mandetta. Agora nem tanto.

O que significa este visível ritual, união entre poder político e conhecimento científico?

A autoridade constitucional máxima da nação, seja primeiro-ministro ou presidente, qualquer uma, diz aos telespectadores mais ou menos o seguinte: “Eu sou a autoridade política e legal máxima de meu país. A última palavra é minha. Mas estou baseando esta autoridade máxima na ciência”.

A aplicação da Constituição não é apenas pacto ou arena de interesses sociais competitivos. Que ganham ou perdem a cada interpretação do Supremo. Ou nova lei do Congresso.

Como dizia o professor Portella Nunes, da Academia Nacional de Medicina: ao interpretar a vida temos que partir sempre de uma verdade básica.

Os cientistas são como legisladores também. A Ciência inspira a aplicação da Constituição.

Elio Gaspari - O que você fez durante a epidemia?

- O Globo | Folha de S. Paulo

Quando a crise passar, veremos quem fez o quê

A Gerdau, a Ambev e o hospital Albert Einstein deram uma lição ao grande empresariado nacional. Anunciaram a doação de um centro de tratamento de Covid-19 com cem leitos à prefeitura de São Paulo. Em duas semanas entregarão 40 leitos e, até o fim de abril, estarão prontos os outros 60. A unidade atenderá pacientes do SUS.

O pavilhão ficará anexo ao hospital M’Boi Mirim, na periferia da cidade. A Gerdau doará a estrutura do prédio, a Ambev bancará o custo, e o Einstein cuidará dos pacientes. Nenhum grande acionista da Gerdau ou da Ambev ficará mais pobre com a doação. Nas últimas semanas nenhum deles saiu por aí dizendo tolices demófobas em eventos teatrais. Sem espetáculo, fizeram o que acharam que deviam.

O Albert Einstein, nascido da filantropia da comunidade judaica de São Paulo aderiu à iniciativa num momento em que as grandes empresas de medicina privada (inclusive algumas que se dizem filantrópicas) oferecem aos brasileiros um virótico silêncio. Quando celebridades e ministros adoecem, é comum ver-se o logotipo desses hospitais na telinha. Agora que a emergência sanitária chegou ao andar de baixo, sumiram. (O ministro Luiz Henrique Mandetta queixou-se de que um desses potentados sequer devolveu seu telefonema.)

Coisas boas também acontecem. O colégio Miguel de Cervantes, situado nas proximidades do Einstein, abriu 300 vagas para filhos de enfermeiros, técnicos e médicos do hospital. A escola ocupa uma área de 60 mil metros quadrados e as crianças ficarão lá durante os turnos dos pais, assistidos por voluntários, sem contato físico. O hospital fornecerá a alimentação da garotada. Outro colégio da cidade, o Porto Seguro, aderiu à iniciativa.

Janio de Freitas - Nova cara para o caos

- Folha de S. Paulo

A proposta de prioridade à economia sobre a vida está na lógica de Bolsonaro

A disposição das forças políticas, no tabuleiro do Poder, avançou em alterações importantes, nos últimos dias. Ainda que confundindo botinas com luvas, mulheres e furos, Bolsa e humanidade, o bolsonarismo oficial não foi contrastado pela oposição desde a sua posse. Dominou para nada que prestasse, aceito pela passividade proveitosa ou atemorizada diante da inépcia amalucada e regressiva. O contraste apareceu. Incipiente, mas já capaz de empurrar Bolsonaro e o bolsonarismo para mais próximos do seu lugar legítimo.

É o aparecimento quase simultâneo da lucidez independente no Congresso, há algum tempo puxada por Rodrigo Maia e, em algumas ocasiões, por Davi Alcolumbre; também da consciência ativada em muitos governadores, quase todos, tanto da sua responsabilidade como do seu poder; e, ainda, da marselhesa das panelas, som da opinião pública desalentada.

Essa combinação é uma força real, em condições de atenuar o estado caótico geral e o regressismo social e legal comum aos atos e projetos do governo. Não em condições, porém, de diminuir a alienação mental de Bolsonaro e dos seus três orientadores. Dotados de meios de resistência, como recusa a sanções, incidentes internacionais, mobilização de agitações com PMs, caminhoneiros, milícias. O cardápio é farto. E, sim ou não, com os militares.

Hélio Schwartsman - O dilema é real

- Folha de S. Paulo

Tentar preservar a atividade econômica não é preocupação sem sentido

Jair Bolsonaro é um alienado, mas a preocupação em tentar preservar a atividade econômica não é sem sentido, sobretudo porque não há clareza sobre quanto tempo a crise da Covid-19 pode durar. A normalização de fato só virá se conseguirmos desenvolver uma vacina ou depois que gente o bastante tiver sido infectada e se recuperado, produzindo a tal da imunidade de rebanho.

Precisamos parar quase tudo por um tempo, para tentar reduzir o impacto da primeira onda da epidemia sobre os sistemas de saúde, mas um lockdown não pode durar para sempre. Basta um experimento mental para constatá-lo: ignoramos a real letalidade do Sars-Cov-2, que pode ficar em qualquer cifra entre 0,05% e 3%, mas não precisamos de estudos epidemiológicos para saber que a inanição é letal em 100% dos casos.

Bruno Boghossian – Mortos pela ignorância

- Folha de S. Paulo

Presidente não tem evidências ou estudos para justificar reação delirante à crise

Duas universidades britânicas estimam que o Brasil terá centenas de milhares de mortos se não adotar medidas de distanciamento para enfrentar o coronavírus. Confrontado com essas previsões, Jair Bolsonaro deu risada. "Isso aí, no meu entender, é chute. Deve ter algum interesse econômico colocado em jogo aí", disse o presidente.

Bolsonaro é incapaz de apresentar evidências ou levantamentos sérios para justificar sua reação delirante à mais grave crise de saúde pública desta geração. O presidente se move por palpites, mentiras e interesses políticos. Está disposto a produzir um massacre com sua ignorância.

Pesquisadores brasileiros que trabalham diretamente no combate à pandemia alertam que há mais mortes por Covid-19 do que as anunciadas até agora. Esses especialistas dizem que algumas vítimas do vírus não recebem o diagnóstico correto.

Do sofá do Palácio da Alvorada, o presidente desconfia. Em entrevista à TV Bandeirantes, Bolsonaro disse que outras doenças causaram as mortes registradas até aqui. Ainda contestou, sem provas, as estatísticas do estado de São Paulo. "Não estou acreditando nesse número", afirmou, sem oferecer nenhum dado.

Ruy Castro* - Para quando as celas se abrirem

- Folha de S. Paulo

Nossa sede de expressão não pode se limitar ao sustento de hoje e amanhã

O romancista Théo-Filho (1895-1973) foi um dos escritores do Rio dos anos 20 que exploraram a questão social do Brasil e deixaram muito material sobre sua época. Assim como Julia Lopes de Almeida, Carmen Dolores, João do Rio e Orestes Barbosa, interessou-se pelas condições dos prisioneiros da Casa de Detenção, a maior penitenciária do país e tão desumana quanto as de hoje. Théo-Filho frequentou-a inclusive na condição de presidiário, em 1916, encarcerado por reagir armado a uma agressão na rua.

Nos três meses que levou na Detenção, escreveu o livro "Do Vagão-Leito à Prisão". Pôde fazer isso confortavelmente, porque seus amigos lhe levavam penas, papel e tinteiros —ainda raras as "canetas de tinta". Mas Théo-Filho dividia o material com seus colegas de cela que também queriam escrever, os "poetas da prisão". Alguns, quase analfabetos, usavam o que tivessem à mão para se expressar.

Escreviam a lápis nos papéis amarrotados que encontravam, nas costas dos maços de cigarros, abertos e esticados, ou nas margens dos jornais que alguém esquecia por lá. Quando o lápis se reduzia a um toco pouco maior que suas unhas, escreviam a giz no chão ou a carvão nas paredes e, em último caso, com as próprias unhas, que ninguém lhes vinha cortar. O importante era escrever, quase sempre um soneto sobre a mulher que tinham perdido ou que os abandonara.

Vinicius Torres Freire – Na coronacrise, é preciso dar dinheiro

- Folha de S. Paulo

Governo quer fazer o mínimo para combater o vírus e a ruína econômica

O governo tem preferido fazer o mínimo para atenuar a coronacrise. Quer gastar o mínimo possível, que não é o mínimo necessário ou prudente. Quer que a economia volte a rodar o quanto antes, sem as amarras de cordões sanitários e equivalentes; sem mais gasto público.

Essa é a opinião desse indivíduo que ocupa a Presidência, afinada com a de seus economistas, embora o indivíduo tenha também motivos que a razão desconhece.

A preferência fica evidente nas medidas de socorro. Em larga medida, trata-se de adiamento de impostos, antecipação de benefícios sociais, suspensão de dívidas ou oferta de crédito. Tais medidas são úteis, se parte de um plano maior, que inexiste, porém.

O adiamento de despesas cria um passivo, um peso a ser carregado por uma economia muito deprimida, o que deve tornar ainda mais lenta a recuperação depois da epidemia.

“Depois da epidemia” não é uma data, mas uma época, um tempo que vai se arrastar, uma convalescença demorada. O problema será tanto menor quando mais empresas e famílias resistam à peste econômica. Para que assim seja, é preciso compensar a renda destruída pelo paradão da coronacrise, não apenas criar passivos talvez impagáveis para daqui a alguns meses.

De mais impactante até agora, deve haver doação de R$ 60 bilhões para informais sem trabalho, que devem ficar com R$ 600 por mês cada um, graças ao Congresso, pois o governo propunha a mesquinharia de um terço disso.

O crédito para pequenas e médias empresas é uma boa ideia que o governo adotou no mínimo possível, com atraso. Não está previsto crédito para empresas que empregam dois terços dos trabalhadores com CLT (na média geral, ganham R$ 2.300 mensais).

Persio Arida* - Despreparados para a guerra**

- Folha de S. Paulo / Ilustríssima

[RESUMO] Diante da perspectiva de queda sem precedentes do PIB, economista propõe achatamento da curva de juros, defende que governo complemente salários e sugere mudança institucional para permitir que BC possa comprar títulos do Tesouro em mercado. Neste momento só lunático veria risco inflacionário, afirma.

A história vai mostrar que a ideia de que o coronavírus é uma gripezinha causou uma tragédia humana e social. Tivemos sorte porque o vírus demorou para chegar aqui, mas a desperdiçamos com a inépcia governamental.

Se o governo tivesse levado a sério a epidemia, poderia ter testado desde o começo do ano todos os viajantes que entraram no Brasil, como a China testa até hoje todos os que chegam do exterior. Poderia ter se preparado aumentando o número de leitos, estocando equipamentos médicos e de proteção para os profissionais da saúde. Poderia ter providenciado um grande estoque de kits de testagem do coronavírus.

Se o Brasil tivesse um sistema de saúde com grande capacidade ociosa, teríamos a opção de um tratamento social verticalizado, isolando os mais fragilizados e fazendo uma grande campanha de prevenção para o restante da população que iria trabalhar normalmente, mas não é esse o nosso caso.

O fato é que nenhuma sociedade tolera continuar a vida econômica como se nada estivesse acontecendo enquanto pessoas morrem na fila de espera do pronto-socorro ou do hospital porque não há vagas para internação. Nas nossas circunstâncias, as medidas de distanciamento social ou quarentena estão corretas —o resto é terraplanismo, oportunismo político ou lobby de empresários insatisfeitos.

Do ponto de vista econômico, há dois desafios. O primeiro é como responder à recessão. O segundo é como sair da quarentena sem causar repiques ou novos surtos de contaminação do coronavírus.

Começo pela recessão. As estimativas do PIB de 2020 variam muito, até porque dependem da duração da quarentena, da amplitude da rede de sustentação social que vier a ser implementada e também do que acontecerá no resto do mundo. Porém, a julgar pelo que acontece à nossa volta, teremos uma queda sem precedentes em nossa história.

A resposta do governo tem sido tímida, desorganizada e a reboque dos fatos. A garantia de que não faltará dinheiro para a saúde foi importante, mas muitas medidas anunciadas com pompa e circunstância não saíram do papel. E muito mais deve ser feito, tanto para pessoas físicas quanto para empresas, para reduzir ao mínimo o impacto da crise.

Várias propostas já foram escritas pelos economistas para assegurar uma rede de proteção social efetiva —e muitas delas já deveriam ter sido postas em prática. São medidas de caráter temporário e com foco nos mais necessitados. Segue uma lista, com alguns acréscimos meus:

Ricardo Noblat - Por ora, Mandetta garante lugar na galeria dos indemissíveis

- Blog do Noblat | Veja

Daqui a pouco só restarão Mourão e Moro

Luiz Henrique Mandetta entrou para a restrita galeria dos indemissíveis do governo. E mais: contra a vontade do presidente Jair Bolsonaro. Da galeria fazem parte o general Hamilton Mourão, vice-presidente da República, que Bolsonaro há dois dias chamou de “tosco”, o ministro Sergio Moro, da Justiça e da Segurança Pública, e o general Braga Neto, chefe da Casa Civil.

Não, Paulo Guedes, ministro da Economia, não faz parte da galeria. Fez no começo do governo. Mas com o pibinho de 1.1%, pisadas na bola do tipo anunciar o fim da “festa danada” das domésticas na Disney, e temperamento belicoso tal qual o de Bolsonaro, poderá deixar o governo de uma hora para a outra. Ou então ficar até o fim engolindo sapos indigestos.

O general Augusto Heleno, ministro do Gabinete da Segurança Institucional? Indemissível? Só porque foi posto no governo por seus companheiros de farda para controlar Bolsonaro e desinflar todas as crises que ele pudesse criar? Não. Não faz parte da galeria. Deram-lhe uma missão impossível. Virou um acompanhante de luxo de Bolsonaro e tornou-se tão tóxico quanto ele.

Literalmente mais tóxico. Para desmentir a notícia de que participara de uma reunião no Palácio do Planalto depois de ter contraído o vírus, o general distribuiu uma nota onde disse que a história era mentirosa, mas em seguida admitiu que participara, sim, da reunião com a presença de Bolsonaro, Mourão e metade dos ministros. Alguns deles, em seguida, adoeceram.

Vera Magalhães - O mundo pós-corona

- O Estado de S.Paulo

Da economia às relações pessoais, passando pela política, nada será como antes

Se há uma única certeza a respeito de como sairemos dessa pandemia que bagunçou o dia a dia das pessoas, as relações interpessoais, a economia e a geopolítica do planeta é que nada, em nenhum desses territórios, voltará a ser como antes quando (e se) tudo isso passar.

Governantes populares até a virada do ano foram solapados pela crise; outros cuja imagem já parecia desgastada renasceram das cinzas; aqueles com uma reeleição certa no horizonte padecem na incerteza, enquanto os casos escalam em seus países; lideranças jovens aparecem em países não centrais do globo, e chamam a atenção pela forma segura com que conduzem seus governados no combate a um inimigo invisível, mas poderoso.

Na economia, na meca do capitalismo mundial, os Estados Unidos, Donald Trump, depois de flertar em ondas com o negacionismo em relação à pandemia, terminou a semana acionando o Ato de Proteção de Defesa, uma lei da época da Guerra da Coreia, para exigir que empresas como as icônicas montadoras de veículos produzam ventiladores para respiradores pulmonares e os forneçam ao Estado.

O Reino Unido, outro país que tentou ser blasé, deu um cavalo de pau e terminou a semana com restrições severas à circulação e o príncipe Charles e o premiê Boris Johnson “coronados”, símbolo imagético dificilmente superável.

Não será possível retornar - depois que o mundo sair de uma quarentena dura, que separa famílias e obriga as pessoas a redescobrirem desde regras de higiene pessoal até técnicas de trabalho e estudo remotos - ao estado em que estávamos, de um mundo polarizado e radicalizado em certezas tão absolutas quanto estúpidas.

Eliane Cantanhêde - Isolamento sim!

- O Estado de S.Paulo

Governo emite sinais trocados e Brasil começa a se dividir. Coronavírus agradece

Eta gripezinha que está custando caro! O presidente da República fala para um lado e os ministérios agem para o outro, anunciando montanhas de dinheiro para enfrentar o abandono dos miseráveis que precisam do Bolsa Família, a insegurança dos informais e a dramática ameaça aos empregos. Isolamento, sim, para salvar vidas. E medidas emergenciais para reduzir os danos na economia.

É a realidade se impondo, com as lições vindo assustadoramente de fora. Se não quer ouvir a Organização Mundial da Saúde (OMS), o Ministério da Saúde, a ciência e as estatísticas, o presidente deve ao menos se informar sobre o que aconteceu nos dois países mais afetados pelo Covid-19 no mundo. Nos Estados Unidos, seu tão amado Trump foi obrigado a recuar e agora clama para os americanos ficarem em casa. Na Itália, o mea culpa do prefeito de Milão é um grito de alerta.

Trump, como o “amigo” brasileiro, minimizou o coronavírus até que os EUA passaram a ser o epicentro da doença, ultrapassando os cem mil infectados e beirando 1.500 mortos. Só aí ele se rendeu à única “vacina” contra a pandemia: o isolamento social. Na Itália, o prefeito de Milão desdenhou do tsunami, animando as pessoas a saírem. Agora admite: “Errei”. Tarde demais. Os italianos já contabilizam mais de 9 mil mortes, 919 só na sexta-feira.

“Infelizmente, algumas mortes terão. Paciência, acontece, e vamos tocar o barco”, conformava-se o presidente brasileiro no mesmo dia, ignorando alertas e estatísticas, a lógica, o bom senso, a humanidade. Pior: a responsabilidade. Tudo em nome do seu novo slogan político: “O Brasil não pode parar”. O problema é que, se milhões são contaminados e milhares morrem, aí é que o Brasil vai parar. Só não vê quem põe sua visão pessoal acima das evidências.

Entrevista | Steven Levitsky: ‘O vírus põe os populistas em isolamento’

Steven Levitsky, cientista político e autor de Como as Democracias Morrem

José Eduardo Barella | O Estado de S. Paulo

Para cientista político, ignorar especialistas fez líderes como Trump e Bolsonaro reagirem tarde à pandemia

Líderes populistas que ignoraram a ameaça da pandemia correm o risco de isolamento e de perder apoio em razão da crise econômica.

Acostumados a fazer dos adversários inimigos mortais e desprezar o que chamam de elite política, acadêmica, científica e cultural, muitos líderes populistas estão experimentando o próprio veneno. Pegos de surpresa pelo novo coronavírus, eles reagiram tarde à pandemia e estão às voltas com o aumento de casos e mortes, além da expectativa de uma gravíssima crise econômica.

Para o cientista político Steven Levitsky, coautor do livro Como as Democracias Morrem, que mostra as razões da expansão populista nos últimos anos, o desprezo pela ciência e pela elite caiu por terra com o avanço da pandemia.

Agora, eles correm risco de isolamento e de perder mais popularidade em razão da crise econômica.

A pandemia, segundo Levitsky, é o maior desafio dos populistas. Primeiro, porque corrói a popularidade que os sustentam. Sem popularidade, fica mais difícil tomar medidas autocráticas para ameaçar a democracia. Em segundo lugar, por colocar a própria sobrevivência desses líderes em risco. “A pandemia está mostrando que o desprezo desses populistas pela ciência e pelos especialistas vai custar caro”, disse.

A seguir, trechos da conversa com Levitsky.

• Por que populistas como Trump, Bolsonaro e Boris Johnson foram lentos ao reagir à pandemia?

Líderes populistas costumam se eleger atacando o establishment, dizendo ao povo que, uma vez no poder, varrerão a elite. Mas parte dessa elite é formada por especialistas – economistas, cientistas, técnicos, profissionais de saúde, como os que lideram agora o combate ao coronavírus. E a primeira resposta dos populistas à pandemia foi rejeitar os conselhos dos especialistas, recorrendo a pessoas próximas que não são do ramo. Bolsonaro preferiu ouvir conselhos dos filhos. Trump, do genro. Não é por acaso que Trump, Bolsonaro e (Andrés Manuel) López Obrador (presidente do México) demoraram a reagir. Já o primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, é um caso à parte. Embora tenha demorado, ele acabou aceitando os conselhos de especialistas e foi mais rápido em adotar medidas. Mas ficou evidente que a inação inicial deve trazer consequências trágicas, como estamos vendo.

• Se fosse possível formar um ranking, quem levaria a medalha de ouro em performance populista na reação ao coronavírus?

Sem sombra de dúvida, a medalha de ouro vai para Bolsonaro. Ele continua a desdenhar da crise. A maior parte do seu discurso (do dia 24) na TV continha inverdades que refletem um nível de ignorância que vai além da demonstrada por Trump. Vale notar que o desprezo do presidente brasileiro pelas recomendações de especialistas, parte da estratégia populista de rejeitar a elite, não tem precedentes na história recente do País.

• No seu livro, o senhor afirma que parte da estratégia dos populistas é ignorar o respeito mútuo e a tolerância. Numa crise profunda, adotar essa estratégia autoritária tende a levar os populistas ao isolamento?

Situações de emergência nacional exigem cooperação entre o presidente e o Congresso, entre presidente, governadores e prefeitos, e entre governo e oposição. Os populistas costumam fazer de seus oponentes inimigos ferozes, o que dificulta esse tipo de cooperação durante uma crise.

• Essa disputa costuma levar o líder populista ao isolamento?

Normalmente, o populista cria uma espécie de ambiente tóxico na política entre ele e seus oponentes. Isso não torna impossível reunir a classe política para responder a uma crise, mas certamente é mais difícil. Muitas vezes, durante situações do tipo, é comum uma união em torno do presidente. Aparentemente, isso não está acontecendo com Bolsonaro, que parece ser um caso claro de isolamento.

João Doria* - Serenidade e equilíbrio para enfrentar a crise

- O Estado de S. Paulo

Só se reconstrói a economia se mantivermos a curva de contaminação achatada

Diante da maior crise mundial de saúde em mais de cem anos, com profundos reflexos econômicos, há atitudes que autoridades podem e devem adotar. A primeira é tomar decisões com base em informações técnicas. Falar a verdade. Informar a população com transparência e fornecer dados reais. De maneira serena e equilibrada. E procurar unir as pessoas e o seu país. Esse tem sido o exemplo dos líderes mundiais de maior sucesso na guerra contra a covid-19.

São Paulo foi o primeiro lugar a instalar, no Brasil, um Centro de Contingência contra o Coronavírus. Desde o primeiro caso da covid-19, em 26 de fevereiro, implantamos gradativamente medidas de prevenção do contágio, limitando eventos públicos e recomendando a suspensão de atividades como cinemas, espetáculos e shoppings, até decretar a quarentena de 15 dias, em vigor desde 24 de março.

Inicialmente, reduzir o contágio é a forma correta de combater a nova doença, salvando o maior número possível de vidas. Ao mesmo tempo é preciso enfrentar os problemas decorrentes da pandemia com ações nas mais diversas frentes. Na área econômica, garantir os serviços essenciais e manter o maior nível de atividade possível das empresas.

O sistema financeiro e as empresas precisam ter a garantia de liquidez para evitar estrangulamento e a retroalimentação de uma crise superável, esclarece nosso secretário de Fazenda, o ex-ministro Henrique Meirelles. Em São Paulo, liberamos R$ 500 milhões de crédito subsidiado para empresas, por meio da DesenvolveSP e do Banco do Povo. Suspendemos o protesto de dívidas de pessoas físicas e empresas por 90 dias.

The Economist - Como pagar pela pandemia

- O Estado de S.Paulo

A crise econômica causada pela covid-19 pode inaugurar uma nova era no gerenciamento da dívida soberana

Não é hora de se preocupar com a dívida do governo. Enquanto os casos de covid-19 explodem e a atividade econômica trava, os governos têm razão em investir todos os recursos que podem nos esforços para limitar os custos humanos e econômicos da pandemia. Apesar dessa urgência, a crise empurrará os encargos da dívida soberana para um novo território. Ao longo do século passado, grandes crises globais ocasionaram empréstimos em larga escala por parte dos governos e mudanças – muitas vezes radicais – na maneira como estes lidam com seus credores.

É improvável que a batalha contra a covid-19 seja uma exceção. Os planos de recuperação econômica que estão sendo elaborados provavelmente vão superar os implementados durante a crise financeira; nos Estados Unidos, as medidas podem custar cerca de 10% do PIB. O impacto na produção e nas receitas tributárias também pode ser maior. É provável que pelo menos algumas economias acabem com dívidas muito superiores a 150% do PIB.

A história dos empréstimos governamentais nos últimos 100 anos pode ser dividida em três períodos. Entre o início da Primeira Guerra Mundial e o da Segunda, o conflito armado, a reconstrução e a Grande Depressão impuseram enormes demandas aos balanços dos governos. Durante esse período tumultuado, os governos muitas vezes se viram à mercê dos sentimentos do mercado. A Grã-Bretanha procurou manter a confiança do mercado reduzindo a dívida – que chegou a 140% do PIB logo depois da Primeira Guerra Mundial – por meio de uma austeridade dolorosa. O governo gerou superávits de 7% do PIB no orçamento primário ao longo da década de 20.

Os resultados foram desastrosos. A austeridade minou o crescimento econômico: a produção em 1928 ficou abaixo da registrada em 1918. Como consequência, a dívida continuou a subir, chegando a 170% do PIB em 1930. Ao observar essa amarga experiência, John Maynard Keynes disse que “certamente não valia a pena”.

Outras economias, forçadas a tomar medidas mais desesperadas, se saíram ainda pior. A Alemanha, enfraquecida pela guerra e incapaz de cumprir suas obrigações de dívida, afundou na hiperinflação. A deterioração do valor da moeda reduziu o fardo da dívida em relação ao PIB em 129 pontos porcentuais, mas a um custo social e econômico incalculável. Moratórias também foram comuns. Em 1933, os países que compunham quase metade do PIB global estavam sob alguma forma de reestruturação por dívida ou inadimplência.

Nova abordagem
Durante e após a Segunda Guerra Mundial, os governos das economias avançadas tentaram uma abordagem diferente. Depois do trauma dos 30 anos anteriores, a austeridade deixou de ser um meio politicamente sustentável de lidar com as dívidas acumuladas no período. Alguns países decretaram moratória ou experimentaram hiperinflação no pós-guerra.

A hora da solidariedade – Editorial | O Estado de S. Paulo

Se nesta hora extrema o País souber implementar um surto de solidariedade, pode reduzir radicalmente as perdas e sair maior do que entrou na crise

“Esta é a crise de saúde global definidora dos nossos tempos”, disse o diretor da OMS, Tedros Adhanom Ghebreyesus, logo após declarar que o surto de coronavírus se tornara uma pandemia. “Os dias, semanas e meses à frente serão um teste para nossa determinação, um teste para nossa confiança na ciência e um teste para a nossa solidariedade.”

Todos podem doar algo – tempo ou dinheiro. Mas, para doar bem, é preciso ouvir as autoridades sanitárias, ponderando recursos e identificando os grupos vulneráveis. Na infraestrutura, os sistemas de saúde correm contra o tempo para evitar o colapso. Entre os grupos sociais, os mais pobres, em condições precárias de moradia e saneamento, estão mais expostos. Na distribuição geracional, a covid-19 é brutal com os mais velhos – além das pessoas com comorbidades. E na área econômica, autônomos e pequenos empresários veem o vírus desintegrar do dia para a noite sua fonte de renda.

O Fundo Emergencial para a Saúde foi organizado para prover equipamentos e insumos a entidades de saúde, como a Fiocruz e as Santas Casas. A Comunitas, uma organização da sociedade civil, juntou-se a lideranças empresariais para adquirir respiradores pulmonares para a rede pública de saúde. Até o momento foram arrecadados mais de R$ 23 milhões, e já estão garantidos 345 respiradores. O Comitê Executivo Covid-19 do governo de São Paulo já angariou R$ 96 milhões com o empresariado para materiais e serviços médicos. Indústrias de cosméticos estão produzindo álcool em gel para hospitais públicos e empresas de transporte estão disponibilizando vouchers para os profissionais de saúde. E é preciso não esquecer doações essenciais: os postos de coleta de sangue alertam para uma queda de 30% nos últimos dez dias.

O que a mídia pensa - Editoriais

A hora da solidariedade – Editorial | O Estado de S. Paulo

Se nesta hora extrema o País souber implementar um surto de solidariedade, pode reduzir radicalmente as perdas e sair maior do que entrou na crise

“Esta é a crise de saúde global definidora dos nossos tempos”, disse o diretor da OMS, Tedros Adhanom Ghebreyesus, logo após declarar que o surto de coronavírus se tornara uma pandemia. “Os dias, semanas e meses à frente serão um teste para nossa determinação, um teste para nossa confiança na ciência e um teste para a nossa solidariedade.”

Todos podem doar algo – tempo ou dinheiro. Mas, para doar bem, é preciso ouvir as autoridades sanitárias, ponderando recursos e identificando os grupos vulneráveis. Na infraestrutura, os sistemas de saúde correm contra o tempo para evitar o colapso. Entre os grupos sociais, os mais pobres, em condições precárias de moradia e saneamento, estão mais expostos. Na distribuição geracional, a covid-19 é brutal com os mais velhos – além das pessoas com comorbidades. E na área econômica, autônomos e pequenos empresários veem o vírus desintegrar do dia para a noite sua fonte de renda.

Música | Casuarina - Falso Moralista

Poesia | Manuel Bandeira - Madrigal Melancólico

O que eu adoro em ti
Não é a tua beleza
A beleza é em nós que existe
A beleza é um conceito
E a beleza é triste
Não é triste em si
Mas pelo que há nela
De fragilidade e incerteza

O que eu adoro em ti
Não é a tua inteligência
Não é o teu espírito sutil
Tão ágil e tão luminoso
Ave solta no céu matinal da montanha
Nem é a tua ciência
Do coração dos homens e das coisas.

O que eu adoro em ti
Não é a tua graça musical
Sucessiva e renovada a cada momento
Graça aérea como teu próprio momento
Graça que perturba e que satisfaz

O que eu adoro em ti
Não é a mãe que já perdi
E nem meu pai

O que eu adoro em tua natureza
Não é o profundo instinto matinal
Em teu flanco aberto como uma ferida
Nem a tua pureza. Nem a tua impureza.

O que adoro em ti lastima-me e consola-me:
O que eu adoro em ti é a vida!