O QUE PENSA A MÍDIA
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Política e cultura, segundo uma opção democrática, constitucionalista, reformista, plural.
sábado, 9 de agosto de 2008
DEU EM O GLOBO
ELEIÇÃO É SOBRE OBAMA
Merval Pereira
Merval Pereira
NOVA YORK. A dança dos números das incontáveis pesquisas eleitorais feitas no ritmo diário aqui nos Estados Unidos não muda a tendência de vitória do candidato democrata Barack Obama. Desde as primárias, a campanha americana gira em torno dele, e há quem veja na eleição de novembro um plebiscito sobre suas qualidades e incapacidades, muito mais do que uma disputa entre ele e McCain. Isto é, se Obama vier a perder, terá sido por não ter convencido a maioria do eleitorado de que é capacitado para dirigir o país. Para um dos mais famosos marqueteiros americanos, Dick Morris, que tem um viés republicano, o que impede Obama de fazer uma dianteira consistente sobre McCain é menos o fato de ser o primeiro candidato negro a presidente e mais a sua inexperiência administrativa.
Para Dick Morris, seria bom para Obama que a resistência do eleitorado fosse por ele ser "diferente daqueles presidentes que aparecem nas notas de 1 dólar". Mas os receios do eleitorado são mais profundos, segundo ele. Os eleitores temem votar em um político que eles não conhecem, que está no seu primeiro mandato de senador apenas desde 2005 e que, dedicando-se à campanha presidencial desde 2007, bateu recordes de ausência do Senado, e mesmo assim foi considerado o senador mais liberal (de esquerda) em atuação.
Os receios se situam em duas áreas sensíveis: a economia e a segurança nacional. Nesse ponto, a crise econômica, que é prejudicial aos republicanos, também não favorece a inexperiência de Obama. Já o professor emérito de economia da Universidade de Gotemburgo, Douglas Hibbs, que montou um modelo matemático para avaliar as eleições presidenciais nos Estados Unidos com base na economia e nas guerras, com o nome de "Bread and Peace" (Pão e Paz"), acha que dois fatos fora dos padrões podem influenciar o resultado da eleição, embora considere Obama o favorito: o fator racial e o fator idade.
Para o professor sueco, "fatores idiossincráticos" sempre podem afetar os resultados de modelos baseados em questões estruturais, como a situação econômica na época da eleição ou o número de mortos e feridos em uma guerra. Embora a maioria de nós, diz o professor em seu estudo, "gostaríamos de pensar que os Estados Unidos amadureceram a ponto de que a raça ou o gênero de um candidato não terão conseqüências eleitorais, somos realistas o bastante para saber que esta proposição não testada é no mínimo incerta, e provavelmente errada".
Ele acha mesmo que Obama será mais prejudicado por esse fator racial do que a senadora Hillary Clinton seria por ser mulher. Do lado republicano, o professor Dibbs considera que a questão da idade afeta bastante o candidato John McCain, ainda mais associada a problemas de saúde. McCain, que completará 72 anos dia 29 deste mês, poucos dias antes do início da convenção republicana, a 1º de setembro, será, se vencer a eleição, o mais velho presidente eleito de todos os tempos.
Também o problema que McCain tem com uma doença de pele pode vir a ter um impacto forte na candidatura, se um outro melanoma surgir ( ele foi diagnosticado com um anos atrás). Houve a suspeita recente dias atrás, mas o exame mostrou que o sinal retirado do rosto do candidato não era maligno, mas essa ameaça ronda sua candidatura.
O candidato Barack Obama também está tendo de lidar com uma persistente divisão dentro do partido democrata, já que uma parte dos eleitores da senadora Hillary Clinton não se conforma com sua vitória nas primárias. Pesquisas apontam que cerca de 12% dos eleitores democratas permanecem indecisos, contra 9% dos republicanos.
Os republicanos, aliás, sempre tiveram mais fidelidade de seus eleitores do que os democratas. Na controvertida eleição de 2000, as pesquisas mostraram que nada menos que 91% dos eleitores republicanos votaram em George Bush, enquanto Al Gore só conseguiu levar os votos de 86% dos eleitores democratas registrados. Também existem ainda 28% de eleitores que se dizem independentes, um número alto se comparado com a mesma época em outras ocasiões.
Em uma eleição em que não há obrigatoriedade de votar, a capacidade de mobilização do eleitorado é fundamental. Embora os eleitores de Obama sejam muito mais entusiasmados com sua candidatura do que os republicanos com a de McCain, a fidelidade partidária pode ajudar o republicano. Depois da vitória nas primárias, o candidato Obama alterou várias de suas posições, em busca de ampliar seu eleitorado. Mas está deixando desapontados uma parte da esquerda americana, tanto entre os movimentos negros quanto entre os intelectuais.
Susan Buck-Morss, professora de filosofia política e teoria social da Universidade Cornell, resume esse sentimento de frustração que, em última instância, pode tirar eleitores de Obama: "A candidatura de Obama tem sido desapontadora para muitos de nós, porque vem progressivamente perdendo consistência nos temas progressistas, caindo no lugar comum da política usual do Partido Democrata. Isso se deve em parte à esquerda progressista americana, que deu por garantido o seu apoio a ele sem pressionar para que continuasse na trilha em que iniciou. As razões para votar nele agora parecem ser mais "qualquer coisa é melhor do que um outro republicano".
Esse não é o mesmo sentimento que tínhamos na primavera, lamenta Susan Buck-Morss, quando ousamos ter esperanças de ter esperança, que poderíamos ficar acima de políticas de identidade (o voto latino; o voto negro; o voto da mulher). "No final das contas, metade dos latinos é de mulheres, e muitos deles são negros". Ela atribuiu a Hillary Clinton o discurso politico puxado para este lado, colocando Obama como "o candidato negro", e querendo aparecer como o símbolo da mulher progressista, coisa que ela nunca procurou representar antes". (Amanhã, onde os candidatos têm que buscar seus votos)
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO
DO BANQUEIRO AO PEDREIRO
Dora Kramer
O episódio que levou o Supremo Tribunal Federal a restringir o uso de algemas aos presos que representem risco de fuga ou morte acabou desmentindo a escrita segundo a qual só o rico vilipendiado sensibiliza a Justiça. Por essa norma, algema no pulso do pobre seria refresco.
O STF se baseou na contestação de um pedreiro sobre o tratamento recebido durante o julgamento de um homicídio. Antonio Sérgio da Silva matou um homem numa briga de rua, foi condenado a 13 anos de prisão, mas teve a sentença anulada pelo Supremo porque ficou algemado diante do júri.
No entendimento do STF, houve abuso por hipotética indução dos jurados a presumir a culpa do réu, independentemente da consistência das provas.
Antonio está solto, bem como Daniel Dantas, Naji Nahas e Celso Pitta, para citar só as prisões mais recentes de gente famosa e “bem” de vida em operações da Polícia Federal.
Ninguém contestou a decisão sobre o pedreiro nem lançou suspeita sobre as intenções dos magistrados, como se fez contra o presidente do tribunal, ministro Gilmar Mendes, quando reclamou dos abusos da PF por ocasião da prisão do banqueiro.
Perderam força as alegações de que a agressão às garantias individuais nos métodos da polícia só provocaram protestos porque os abusos chegaram à elite.
No caso, deu-se o oposto: a queixa contra excessos feita por um pobre deu ensejo à ordenação de procedimentos que, se não favorece totalmente, porque não impede punições, pelo menos desobriga o “tubaronato” de ter sempre um paletó à mão para esconder os pulsos das câmeras, na eventualidade de uma captura.
O equívoco do raciocínio sobre a deferência aos ricos e a indiferença aos pobres ficou claro no tocante ao tribunal superior.
Mas não se fala a respeito das razões pelas quais um político, um financista ou um empresário presos provocam comoção, já que anônimos aos magotes tanto são humilhados quanto deixam de ser punidos pela ineficácia das instituições.
A questão é justamente o anonimato. O interesse pelas mazelas da elite não é uma invenção da Justiça nem fruto de seus defeitos. É da natureza humana. Os pobres e desconhecidos, em geral e de forma isolada, não são notícia.
Antonio Sérgio teria a condenação suspensa independentemente da prisão de Daniel Dantas. Mas, é certo que o caso do pedreiro só teve repercussão por causa do banqueiro.
Fora isso, sobra a essência: a anulação de sentença por falha no processo, ato corriqueiro sem poder de alterar a (des) ordem geral dos abusos e discriminações.
Pão, pão
O presidente do Senado, Garibaldi Alves, faz constatações tão realistas que chegam a parecer ingênuas.
Enquanto deputados e senadores saudavam a decisão do Supremo sobre os “fichas-sujas”, predispondo-se a impor restrições na lei das elegibilidades aos processados sem sentença transitada em julgado, Garibaldi foi ao ponto: “É difícil, dirão que o próprio Judiciário resolveu não decidir sobre isso”.
É isso mesmo. Passado o clamor, o assunto fará companhia ao fim do voto secreto para cassações de mandatos, ao exame rigoroso dos critérios de urgência e relevância na edição de medidas provisórias, ao fim do suplente sem voto no Senado, à perda dos direitos políticos de quem renunciar para escapar da cassação e a vários temas cuja urgência só dura enquanto são destaque no noticiário.
Quanto a vidas pregressas de políticos, a previsão é fava para lá de contada, tendo em vista a norma consagrada no Congresso de considerar fatos anteriores ao mandato em curso inexistentes para efeito de decoro parlamentar.
Quem chega sujo ao Parlamento, na concepção do Parlamento fica limpo por obra e graça da “absolvição” nas urnas.
Ou não foi justamente esse o argumento usado pelos reeleitos envolvidos em escândalos da legislatura anterior à eleição de 2006?
Os colegas recorreram ao mesmo artifício para evitar a reabertura dos casos quando do início da nova sessão legislativa, em 2007. Gente até decente na Câmara defendeu a tese dizendo-se impedida de contrariar a “vontade do eleitor”.
E isso porque falavam de personagens cujas peripécias haviam sido notórias e recentes.
Evidentemente, não perderão a chance de se escorar na sentença do STF, como se o tribunal tivesse impedido o Congresso de mudar a lei ou proibido os partidos - entidades privadas - de adotar o preceito básico da boa conduta.
Queijo, queijo
Sob a mesma ótica da objetividade, o presidente do Senado anda pagando para ver os líderes partidários cumprirem a promessa de manter a Casa funcionando durante a campanha eleitoral.
Garibaldi havia proposto uma semana de recesso e três de trabalho nos meses de agosto e setembro. Os líderes não quiseram oficializar o êxodo pré-eleitoral para evitar desgaste. Acharam menos oneroso mentir.
Dora Kramer
O episódio que levou o Supremo Tribunal Federal a restringir o uso de algemas aos presos que representem risco de fuga ou morte acabou desmentindo a escrita segundo a qual só o rico vilipendiado sensibiliza a Justiça. Por essa norma, algema no pulso do pobre seria refresco.
O STF se baseou na contestação de um pedreiro sobre o tratamento recebido durante o julgamento de um homicídio. Antonio Sérgio da Silva matou um homem numa briga de rua, foi condenado a 13 anos de prisão, mas teve a sentença anulada pelo Supremo porque ficou algemado diante do júri.
No entendimento do STF, houve abuso por hipotética indução dos jurados a presumir a culpa do réu, independentemente da consistência das provas.
Antonio está solto, bem como Daniel Dantas, Naji Nahas e Celso Pitta, para citar só as prisões mais recentes de gente famosa e “bem” de vida em operações da Polícia Federal.
Ninguém contestou a decisão sobre o pedreiro nem lançou suspeita sobre as intenções dos magistrados, como se fez contra o presidente do tribunal, ministro Gilmar Mendes, quando reclamou dos abusos da PF por ocasião da prisão do banqueiro.
Perderam força as alegações de que a agressão às garantias individuais nos métodos da polícia só provocaram protestos porque os abusos chegaram à elite.
No caso, deu-se o oposto: a queixa contra excessos feita por um pobre deu ensejo à ordenação de procedimentos que, se não favorece totalmente, porque não impede punições, pelo menos desobriga o “tubaronato” de ter sempre um paletó à mão para esconder os pulsos das câmeras, na eventualidade de uma captura.
O equívoco do raciocínio sobre a deferência aos ricos e a indiferença aos pobres ficou claro no tocante ao tribunal superior.
Mas não se fala a respeito das razões pelas quais um político, um financista ou um empresário presos provocam comoção, já que anônimos aos magotes tanto são humilhados quanto deixam de ser punidos pela ineficácia das instituições.
A questão é justamente o anonimato. O interesse pelas mazelas da elite não é uma invenção da Justiça nem fruto de seus defeitos. É da natureza humana. Os pobres e desconhecidos, em geral e de forma isolada, não são notícia.
Antonio Sérgio teria a condenação suspensa independentemente da prisão de Daniel Dantas. Mas, é certo que o caso do pedreiro só teve repercussão por causa do banqueiro.
Fora isso, sobra a essência: a anulação de sentença por falha no processo, ato corriqueiro sem poder de alterar a (des) ordem geral dos abusos e discriminações.
Pão, pão
O presidente do Senado, Garibaldi Alves, faz constatações tão realistas que chegam a parecer ingênuas.
Enquanto deputados e senadores saudavam a decisão do Supremo sobre os “fichas-sujas”, predispondo-se a impor restrições na lei das elegibilidades aos processados sem sentença transitada em julgado, Garibaldi foi ao ponto: “É difícil, dirão que o próprio Judiciário resolveu não decidir sobre isso”.
É isso mesmo. Passado o clamor, o assunto fará companhia ao fim do voto secreto para cassações de mandatos, ao exame rigoroso dos critérios de urgência e relevância na edição de medidas provisórias, ao fim do suplente sem voto no Senado, à perda dos direitos políticos de quem renunciar para escapar da cassação e a vários temas cuja urgência só dura enquanto são destaque no noticiário.
Quanto a vidas pregressas de políticos, a previsão é fava para lá de contada, tendo em vista a norma consagrada no Congresso de considerar fatos anteriores ao mandato em curso inexistentes para efeito de decoro parlamentar.
Quem chega sujo ao Parlamento, na concepção do Parlamento fica limpo por obra e graça da “absolvição” nas urnas.
Ou não foi justamente esse o argumento usado pelos reeleitos envolvidos em escândalos da legislatura anterior à eleição de 2006?
Os colegas recorreram ao mesmo artifício para evitar a reabertura dos casos quando do início da nova sessão legislativa, em 2007. Gente até decente na Câmara defendeu a tese dizendo-se impedida de contrariar a “vontade do eleitor”.
E isso porque falavam de personagens cujas peripécias haviam sido notórias e recentes.
Evidentemente, não perderão a chance de se escorar na sentença do STF, como se o tribunal tivesse impedido o Congresso de mudar a lei ou proibido os partidos - entidades privadas - de adotar o preceito básico da boa conduta.
Queijo, queijo
Sob a mesma ótica da objetividade, o presidente do Senado anda pagando para ver os líderes partidários cumprirem a promessa de manter a Casa funcionando durante a campanha eleitoral.
Garibaldi havia proposto uma semana de recesso e três de trabalho nos meses de agosto e setembro. Os líderes não quiseram oficializar o êxodo pré-eleitoral para evitar desgaste. Acharam menos oneroso mentir.
DEU NO JORNAL DO BRASIL
A FAXINA QUE NINGUÉM QUER
Villas-Bôas Corrêa
A campanha política não é a temporada ideal para testar o compromisso com a verdade de candidatos, cabos eleitorais e demais envolvidos na caça ao voto.
Os índices das pesquisas sobre as tendências do eleitor falam mais alto do que o juramento de dizer a verdade, pura como sorriso da criança.
Portanto, vamos deixar de hipocrisia e reconhecer que o Supremo Tribunal Federal (STF) cumpriu o seu dever e foi fiel ao texto constitucional ao decidir, pelo voto de nove dos seus 11 ministros, que a Justiça Eleitoral não pode negar registro de candidato que seja réu em processo criminal ou de improbidade administrativa que não tenha sentença julgada em tribunal superior.
É duro engolir a presença dos candidatos com fichas-sujas como prontuário de marginal. Mas, não é este o único nem o mais grave dos descompassos da campanha e da eleição em uma fase negra de decadência moral da atividade política e das instituições republicanas.
Basta um esforço de memória para repassar a série infindável de escândalos, com todas as provas e evidências da roubalheira, do desvio de bilhões em contas-fantasma no exterior, investigadas por CPIs que apuraram e levantaram as provas da gatunagem, como as do caixa 2 para financiamento de campanhas e o mensalão para a compra ou aluguel de parlamentares para a montagem de sólida maioria nas duas Casas do Congresso, que garantissem a aprovação de matérias do interesse do governo.
A degringolada ética do mais democrático dos poderes é envergonhar quem não perdeu a santa sensibilidade da revolta.
Não se pode culpar Brasília por uma praga que vem de longe, nos seus ciclos alternativos de períodos de justas esperanças e o negrume dos escorregões na imundície e no desatino ativado pelas dificuldades de adaptação à nova capital, inaugurada antes de estar pronta pela ambição do presidente Juscelino Kubitschek. Para vencer resistência, pagou o preço da irresponsável concessão de vantagens, da dobradinha de salários de servidores, de mansões para os ministros dos tribunais superiores.
Quando candidatos a eleição e a reeleição aos mandatos milionários queixam-se das severidades da toga, benevolente com as doidices das mordomias, vantagens, privilégios, como a imoralíssima verba indenizatória de R$ 15 mil mensais para ressarcir as despesas de senadores e deputados nos fins de semana com a família em suas bases eleitorais, certamente não se olham no espelho.
Por certo que seria desejável uma depuração em regra dos candidatos com fichas-sujas, apesar do risco de inviabilizar a eleição por falta de pretendentes a todas as vagas.
Mas o coro das lamúrias perdeu a hora. Em marcha batida a orgia da desmoralização do Legislativo atravessou mandatos presidenciais, curtiu a provação dos quase 21 anos da ditadura militar, da Constituinte de 87, que aprovou, em 1988, a Constituição mais remendada que fundilho de mendigo até os resmungados reconhecimento da urgência de uma revisão ou de nova Assembléia Constituinte com poderes limitados.
São especulações de inviabilidade. O Congresso não tem a mínima possibilidade de melhorar com a renovação de 2010, o debate e a eleição simultânea para o sucessor do presidente Lula, seja a ministra Dilma Rousseff ou uma surpresa ainda escondida no fundo da alma do voto.
O eleitor pode antecipar a primeira fase da faxina votando com raiva e sabedoria nas urnas de 5 de outubro. Um teste e um treino para daqui a dois anos e quebrados. Pois ele não tem nenhuma desculpa válida para não votar ou anular o voto. O voto nulo é fuga, não é protesto.
E se o STF não pode limpar as listas de candidatos, o eleitor tem a faca e o queijo nas mãos.
Nem todos os candidatos à reeleição são farinha do mesmo saco. E se poucos merecem novo mandato, é mais justo e gratificante o voto do reconhecimento.
Se entre os pretendentes a novo mandato nenhum atende à sua exigente avaliação, aposte uma ficha na renovação.
O eleitor que não cumpre o seu dever perde a autoridade para reclamar a falência do serviço público em geral que martirizam a virtual unanimidade da população.
Villas-Bôas Corrêa
A campanha política não é a temporada ideal para testar o compromisso com a verdade de candidatos, cabos eleitorais e demais envolvidos na caça ao voto.
Os índices das pesquisas sobre as tendências do eleitor falam mais alto do que o juramento de dizer a verdade, pura como sorriso da criança.
Portanto, vamos deixar de hipocrisia e reconhecer que o Supremo Tribunal Federal (STF) cumpriu o seu dever e foi fiel ao texto constitucional ao decidir, pelo voto de nove dos seus 11 ministros, que a Justiça Eleitoral não pode negar registro de candidato que seja réu em processo criminal ou de improbidade administrativa que não tenha sentença julgada em tribunal superior.
É duro engolir a presença dos candidatos com fichas-sujas como prontuário de marginal. Mas, não é este o único nem o mais grave dos descompassos da campanha e da eleição em uma fase negra de decadência moral da atividade política e das instituições republicanas.
Basta um esforço de memória para repassar a série infindável de escândalos, com todas as provas e evidências da roubalheira, do desvio de bilhões em contas-fantasma no exterior, investigadas por CPIs que apuraram e levantaram as provas da gatunagem, como as do caixa 2 para financiamento de campanhas e o mensalão para a compra ou aluguel de parlamentares para a montagem de sólida maioria nas duas Casas do Congresso, que garantissem a aprovação de matérias do interesse do governo.
A degringolada ética do mais democrático dos poderes é envergonhar quem não perdeu a santa sensibilidade da revolta.
Não se pode culpar Brasília por uma praga que vem de longe, nos seus ciclos alternativos de períodos de justas esperanças e o negrume dos escorregões na imundície e no desatino ativado pelas dificuldades de adaptação à nova capital, inaugurada antes de estar pronta pela ambição do presidente Juscelino Kubitschek. Para vencer resistência, pagou o preço da irresponsável concessão de vantagens, da dobradinha de salários de servidores, de mansões para os ministros dos tribunais superiores.
Quando candidatos a eleição e a reeleição aos mandatos milionários queixam-se das severidades da toga, benevolente com as doidices das mordomias, vantagens, privilégios, como a imoralíssima verba indenizatória de R$ 15 mil mensais para ressarcir as despesas de senadores e deputados nos fins de semana com a família em suas bases eleitorais, certamente não se olham no espelho.
Por certo que seria desejável uma depuração em regra dos candidatos com fichas-sujas, apesar do risco de inviabilizar a eleição por falta de pretendentes a todas as vagas.
Mas o coro das lamúrias perdeu a hora. Em marcha batida a orgia da desmoralização do Legislativo atravessou mandatos presidenciais, curtiu a provação dos quase 21 anos da ditadura militar, da Constituinte de 87, que aprovou, em 1988, a Constituição mais remendada que fundilho de mendigo até os resmungados reconhecimento da urgência de uma revisão ou de nova Assembléia Constituinte com poderes limitados.
São especulações de inviabilidade. O Congresso não tem a mínima possibilidade de melhorar com a renovação de 2010, o debate e a eleição simultânea para o sucessor do presidente Lula, seja a ministra Dilma Rousseff ou uma surpresa ainda escondida no fundo da alma do voto.
O eleitor pode antecipar a primeira fase da faxina votando com raiva e sabedoria nas urnas de 5 de outubro. Um teste e um treino para daqui a dois anos e quebrados. Pois ele não tem nenhuma desculpa válida para não votar ou anular o voto. O voto nulo é fuga, não é protesto.
E se o STF não pode limpar as listas de candidatos, o eleitor tem a faca e o queijo nas mãos.
Nem todos os candidatos à reeleição são farinha do mesmo saco. E se poucos merecem novo mandato, é mais justo e gratificante o voto do reconhecimento.
Se entre os pretendentes a novo mandato nenhum atende à sua exigente avaliação, aposte uma ficha na renovação.
O eleitor que não cumpre o seu dever perde a autoridade para reclamar a falência do serviço público em geral que martirizam a virtual unanimidade da população.
DEU NA FOLHA DE S. PAULO
LEI NÃO EVITA ALGEMAS
Clóvis Rossi
SÃO PAULO - Brasileiro tem a infeliz mania de achar que a solução de todo problema passa por um regulamento, um édito, uma lei ou algo parecido. É o caso do uso das algemas. Não tem a mais leve lógica e praticidade supor que o Supremo Tribunal Federal (ou qualquer outro tribunal) possa regulamentar um assunto cujo encaminhamento correto só depende da cultura dos agentes envolvidos.
Ou os agentes públicos têm a plena noção de que não podem cometer abusos (no uso de algemas, em ricos e em pobres, ou em qualquer outro abuso) ou não haverá solução. Olhemos a vida como ela é.
1 - O STF determinou que algema só pode ser usada em casos "excepcionais" e de "evidente perigo de fuga ou agressão". Muito bem. Quem é que decide se o caso é excepcional ou se há "evidente perigo de fuga ou agressão"? O policial, no momento da ação. Portanto, ou ele é devidamente capacitado e sabe que não pode cometer abuso, ou o abuso ocorrerá, seja qual for a jurisprudência decidida pelo STF.
2 - Digamos que haja abuso. Com a nova regra, se é que é nova, os que sofrem abusos podem recorrer à Justiça e, portanto, houve avanço, certo? Errado, na vida real. Pobre que sofre abuso não recorre à Justiça por medo do aparelho de Estado, medo não raro justificado. Rico não o faz, se indevidamente algemado, para não prolongar a exposição pública de sua humilhação.
3 - Ainda que haja recurso à Justiça, tratar-se-á, em quase todos os casos, da palavra do policial contra a da vítima do abuso, já que dificilmente um advogado ou qualquer outra testemunha neutra está presente ao local da detenção. O policial dirá que a algema se justificava, o "abusado" dirá que não, e qualquer decisão será necessariamente arbitrária.
Clóvis Rossi
SÃO PAULO - Brasileiro tem a infeliz mania de achar que a solução de todo problema passa por um regulamento, um édito, uma lei ou algo parecido. É o caso do uso das algemas. Não tem a mais leve lógica e praticidade supor que o Supremo Tribunal Federal (ou qualquer outro tribunal) possa regulamentar um assunto cujo encaminhamento correto só depende da cultura dos agentes envolvidos.
Ou os agentes públicos têm a plena noção de que não podem cometer abusos (no uso de algemas, em ricos e em pobres, ou em qualquer outro abuso) ou não haverá solução. Olhemos a vida como ela é.
1 - O STF determinou que algema só pode ser usada em casos "excepcionais" e de "evidente perigo de fuga ou agressão". Muito bem. Quem é que decide se o caso é excepcional ou se há "evidente perigo de fuga ou agressão"? O policial, no momento da ação. Portanto, ou ele é devidamente capacitado e sabe que não pode cometer abuso, ou o abuso ocorrerá, seja qual for a jurisprudência decidida pelo STF.
2 - Digamos que haja abuso. Com a nova regra, se é que é nova, os que sofrem abusos podem recorrer à Justiça e, portanto, houve avanço, certo? Errado, na vida real. Pobre que sofre abuso não recorre à Justiça por medo do aparelho de Estado, medo não raro justificado. Rico não o faz, se indevidamente algemado, para não prolongar a exposição pública de sua humilhação.
3 - Ainda que haja recurso à Justiça, tratar-se-á, em quase todos os casos, da palavra do policial contra a da vítima do abuso, já que dificilmente um advogado ou qualquer outra testemunha neutra está presente ao local da detenção. O policial dirá que a algema se justificava, o "abusado" dirá que não, e qualquer decisão será necessariamente arbitrária.
Você não acha que o STF tem um zilhão de outras jurisprudências a definir e que, estas, sim, têm efeitos prático e garantem direitos?
DEU EM O GLOBO
ESTADO POLICIAL
Editorial
A Operação Satiagraha, a espetaculosa ação da Polícia Federal, do Ministério Público e da Justiça contra o banqueiro Daniel Dantas, Naji Nahas e o ex-prefeito Celso Pitta, de São Paulo, se um mérito teve foi alertar para a ação sem limites de agentes públicos sobre direitos individuais garantidos pela Constituição - mesmo que amanhã as denúncias contra o grupo venham a ser confirmadas e todos sejam condenados em última instância.
Na mesma época da operação, no início de julho, O GLOBO revelou que, em 2007, pouco mais de 400 mil linhas telefônicas haviam sido grampeadas, segundo as operadoras. Além da dimensão espantosa do número - no mínimo 800 mil pessoas devem ter sido bisbilhotadas pelo menos uma vez, no ano passado -, ele superava os registros oficiais. Vale dizer, perdera-se o controle da escuta eletrônica, e muita gente estava, e pode estar, sendo espionada sem o conhecimento da Justiça.
A grande repercussão da operação provocou uma reunião no Planalto entre o presidente Lula, o ministro da Justiça, Tarso Genro, e o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes. O encontro serviu para aparar arestas entre a mais alta Corte do país e o Ministério, a quem está subordinada a Polícia Federal. Dele saiu, ainda, o compromisso de que o Executivo e o Judiciário encaminharão juntos ao Congresso proposta de legislação para coibir o abuso de autoridade e regular a escuta eletrônica. A iniciativa precisa ser efetivada.
Ficou visível na atuação da equipe do delegado Protógenes Queiroz, da PF, na Operação Satiagraha, em parceria com o Ministério Público e o juiz federal Fausto De Sanctis, que existe uma cultura messiânica entre agentes públicos imbuídos da missão de fazer uma limpeza ética na sociedade brasileira, em que sinais de riqueza de pessoas físicas e jurídicas são considerados indício de ilegalidades.
Daí é um passo para arbitrariedades como as verificadas nessas operações. A intenção de reforçar a proteção dos cidadãos diante da sanha, mesmo que bem-intencionada, de agentes públicos é vista, de forma rasteira, como manobra para defender os "ricos", a "elite". Balela.
São os desmandos cometidos nessas ações teatralizadas que terminam livrando criminosos do colarinho branco de qualquer punição. Se direitos fundamentais forem mais bem protegidos, haverá menos chances de erros processuais que livrem criminosos de serem julgados.
Nesse sentido, o STF tem exercido papel pedagógico. Na Operação Satiagraha, ao rever a decretação descabida de prisões temporárias e preventivas, e, agora, na regulamentação do uso das algemas, que, banalizado, passou a ser um dos símbolos do abuso de autoridade.
O pior que poderia acontecer à sociedade brasileira seria sair de uma ditadura militar para cair num Estado policial conduzido por funcionários públicos fundamentalistas.
Editorial
A Operação Satiagraha, a espetaculosa ação da Polícia Federal, do Ministério Público e da Justiça contra o banqueiro Daniel Dantas, Naji Nahas e o ex-prefeito Celso Pitta, de São Paulo, se um mérito teve foi alertar para a ação sem limites de agentes públicos sobre direitos individuais garantidos pela Constituição - mesmo que amanhã as denúncias contra o grupo venham a ser confirmadas e todos sejam condenados em última instância.
Na mesma época da operação, no início de julho, O GLOBO revelou que, em 2007, pouco mais de 400 mil linhas telefônicas haviam sido grampeadas, segundo as operadoras. Além da dimensão espantosa do número - no mínimo 800 mil pessoas devem ter sido bisbilhotadas pelo menos uma vez, no ano passado -, ele superava os registros oficiais. Vale dizer, perdera-se o controle da escuta eletrônica, e muita gente estava, e pode estar, sendo espionada sem o conhecimento da Justiça.
A grande repercussão da operação provocou uma reunião no Planalto entre o presidente Lula, o ministro da Justiça, Tarso Genro, e o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes. O encontro serviu para aparar arestas entre a mais alta Corte do país e o Ministério, a quem está subordinada a Polícia Federal. Dele saiu, ainda, o compromisso de que o Executivo e o Judiciário encaminharão juntos ao Congresso proposta de legislação para coibir o abuso de autoridade e regular a escuta eletrônica. A iniciativa precisa ser efetivada.
Ficou visível na atuação da equipe do delegado Protógenes Queiroz, da PF, na Operação Satiagraha, em parceria com o Ministério Público e o juiz federal Fausto De Sanctis, que existe uma cultura messiânica entre agentes públicos imbuídos da missão de fazer uma limpeza ética na sociedade brasileira, em que sinais de riqueza de pessoas físicas e jurídicas são considerados indício de ilegalidades.
Daí é um passo para arbitrariedades como as verificadas nessas operações. A intenção de reforçar a proteção dos cidadãos diante da sanha, mesmo que bem-intencionada, de agentes públicos é vista, de forma rasteira, como manobra para defender os "ricos", a "elite". Balela.
São os desmandos cometidos nessas ações teatralizadas que terminam livrando criminosos do colarinho branco de qualquer punição. Se direitos fundamentais forem mais bem protegidos, haverá menos chances de erros processuais que livrem criminosos de serem julgados.
Nesse sentido, o STF tem exercido papel pedagógico. Na Operação Satiagraha, ao rever a decretação descabida de prisões temporárias e preventivas, e, agora, na regulamentação do uso das algemas, que, banalizado, passou a ser um dos símbolos do abuso de autoridade.
O pior que poderia acontecer à sociedade brasileira seria sair de uma ditadura militar para cair num Estado policial conduzido por funcionários públicos fundamentalistas.
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO
A 'PEDAGOGIA' DO SUPREMO
Editorial
Editorial
O Brasil se tornou um país melhor esta semana graças a duas límpidas decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) - uma, contrariando uma opinião pública compreensivelmente revoltada com a desenvoltura dos políticos corruptos que se mantêm impunes; outra, restringindo a situações excepcionais uma prática corriqueira no trabalho policial, apreciada com sabor de desforra por setores dessa mesma opinião pública quando dirigida contra figuras notórias que simbolizam os privilégios da política ou do capital. Ambas as decisões eram esperadas nesse período em que o Supremo tomou a si a incumbência civilizatória de promover “uma pedagogia dos direitos fundamentais”, nas palavras do seu presidente e principal porta-voz da causa entre os seus pares, ministro Gilmar Mendes.
A primeira decisão, tomada por 9 votos a 2 na terça-feira, ratificou o entendimento do Tribunal Superior Eleitoral - vitorioso, é bem verdade, por um único voto de diferença - de que ninguém pode ser privado do direito de disputar uma eleição em razão de acusações pregressas que acabaram levando o candidato ao banco dos réus, enquanto ele não for inapelavelmente condenado em razão de alguma delas. A segunda decisão, adotada por unanimidade no dia seguinte, limitou a eventualidades claramente enunciadas o uso legítimo de algemas no cumprimento de um mandado de prisão e em circunstâncias posteriores - quando houver fundados receios de que o acusado ou poderá fugir ou poderá agredir o agente policial (ou atentar contra a própria vida).
No caso dos chamados “fichas-sujas”, o STF não cedeu ao movimento das autoridades eleitorais regionais para negar registro às candidaturas dos políticos que respondem a processos, geralmente por corrupção, em qualquer esfera do sistema judicial. Tampouco cedeu à influente Associação dos Magistrados do Brasil (AMB) que encampou a bandeira do banimento dos candidatos sub judice, com maciço apoio da sociedade - da ordem de 80% da população, ao que se estima.
O apoio se estendeu à iniciativa da AMB de passar a identificar no seu site os políticos que respondem a ações penais públicas ou de improbidade administrativa (com as respectivas informações). Não admira. Sendo o que são os estratagemas que permitem aos que têm meios para tal arrastar um processo até o Dia de São Nunca, e chegando até onde chega a sangria do dinheiro público no Brasil, é salutar o espírito moralizador do eleitorado.
Não fosse pelo proverbial pequeno detalhe: entre as situações de inelegibilidade previstas em lei não figura a de se ter processos em curso. E não figura por causa do princípio constitucional da presunção de inocência até a eventual condenação transitada em julgado.
Os “fichas-sujas” poderão ser barrados das eleições apenas se uma nova lei considerar que a norma não se aplica por inteiro à vida pública, porque o direito de ser votado não é absoluto. Do contrário, apontou o ministro Celso de Mello, “a legitimidade dos fins, por mais dignos que sejam, não justifica a ilegalidade dos meios”. Sem falar que 28% das condenações de instâncias inferiores caem no STF. Em tese, portanto, “um quarto dos postulantes ficaria impedido de concorrer e, só seria reabilitado depois de passadas as eleições”, argumentou o seu colega Ricardo Lewandowski.
Já no caso das algemas, o ponto de partida foi o recurso de um condenado a 13 anos e meio de prisão por homicídio. Ele pediu a anulação do julgamento, alegando que o “constrangimento ilegal” de ter sido algemado no tribunal influenciou o corpo de jurados. Mas o que levou o Supremo a impor as restrições a serem seguidas doravante pelas polícias foi evidentemente o abuso dos federais da Operação Satiagraha ao algemar o empresário Daniel Dantas, o especulador Naji Nahas e o ex-prefeito Celso Pitta ao serem presos - e filmados. Eles “foram apenados sem o devido processo legal, mediante a imposição das algemas”, criticou o ministro Marco Aurélio Mello.
Decerto não faltaram aqueles que acharam a violência um ato de nivelamento social: eis um trio de bacanas sendo tratado como o povão. O Supremo repôs as coisas nos devidos lugares. “A pedagogia dos direitos fundamentais”, ressaltou Gilmar Mendes, “se faz em função de todos, ricos e pobres.”
DEU NO JORNAL DO BRASIL
O USO DE ALGEMAS EM DEBATE
Editorial
O Supremo Tribunal Federal abriu caminho esta semana para um bem-vindo e necessário ajustamento do uso, hoje indiscriminado, das algemas. A partir de um caso específico de réu condenado por Tribunal do Júri, em julgamento durante o qual permaneceu algemado, o STF resolveu, por unanimidade, editar súmula vinculante segundo a qual o uso de algemas – não só em julgamentos de acusados de crimes dolosos contra a vida, mas também em audiências e, sobretudo em ações policiais com cobertura ao vivo por um canal de televisão privilegiado – deve ser medida de caráter excepcional, a ser tomada apenas quando for "absolutamente necessária", tendo em vista a segurança dos réus, dos acusados e de terceiros.
Em recente editorial, neste mesmo espaço, o Jornal do Brasil já antecipava a iminência dessa súmula, que terá como base os dispositivos fundamentais da Constituição que protegem a integridade física e moral das pessoas, a recente reforma do Código Processo Penal, o "abuso de autoridade" e a jurisprudência acumulada sobre a questão tanto no STF quanto no Superior Tribunal de Justiça.
A idéia da súmula, proposta inicialmente pelo ministro Cezar Peluso, surgiu ao fim do julgamento de um recurso em habeas corpus apresentado pela defesa de um pedreiro, que cometeu crime passional e foi condenado a mais de 13 anos de reclusão. Sua defesa postulou e conseguiu a anulação do julgamento. O ministro-relator tomou como ponto de partida de seu voto o princípio fundamental da Constituição Federal da "dignidade da pessoa humana" (artigo 1º, inciso 3) e o inciso 49 do artigo 5º, pelo qual "é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral".
O ministro Marco Aurélio, relator do recurso, afirmou que "manter o acusado em audiência, com algema, sem que demonstrada a periculosidade, ante práticas anteriores, significa colocar a defesa, antecipadamente, em patamar inferior, não bastasse a situação de todo degradante". Além disso – como lembrou o ministro Eros Grau – dispositivo da recente reforma parcial do Código de Processo Penal (Lei 11.689/08) estabelece que "não se permitirá o uso de algemas no acusado durante o período em que permanecer no plenário do júri, salvo se absolutamente necessário à ordem dos trabalhos, à segurança das testemunhas ou à garantia da integridade física dos presentes".
No seu voto, Marco Aurélio referiu-se indiretamente aos excessos cometidos pela Polícia Federal, durante a Operação Satiagraha – com direito a espetáculo midiático – ao comentar que o país tem testemunhado "abusos de toda sorte, vendo-se, nos veículos de comunicação, algemadas, pessoas sem o menor traço agressivo, até mesmo outrora detentores de cargos da maior importância na República". Na sessão do STF, falou-se também da lei vigente sobre abuso de autoridade, de 1965, que – embora defasada e oriunda do período ditatorial – proíbe "submeter pessoa sob sua guarda ou custódia a vexame ou a constrangimento não autorizado em lei".
É uma decisão bem-vinda, insista-se. Muitos analistas sublinhados pela sensatez reforçam a tese de que os direitos dos criminosos são desrespeitados no Brasil. Isso vale, em especial, para os presos pobres. A própria regulamentação da Polícia Federal recomenda o uso da algema para quando o preso quer fugir, agredir ou se agredir. Já ficou patente que a utilização do recurso transformou-se em pirotecnia – um subproduto mal acabado da tentativa de livrar o país das chagas da impunidade. No afã de romper com a sina histórica de que a imposição da lei se dá desigualmente, corre-se o risco de devastar irremediavelmente a imagem de quem é, até prova contrária, um suspeito.
Editorial
O Supremo Tribunal Federal abriu caminho esta semana para um bem-vindo e necessário ajustamento do uso, hoje indiscriminado, das algemas. A partir de um caso específico de réu condenado por Tribunal do Júri, em julgamento durante o qual permaneceu algemado, o STF resolveu, por unanimidade, editar súmula vinculante segundo a qual o uso de algemas – não só em julgamentos de acusados de crimes dolosos contra a vida, mas também em audiências e, sobretudo em ações policiais com cobertura ao vivo por um canal de televisão privilegiado – deve ser medida de caráter excepcional, a ser tomada apenas quando for "absolutamente necessária", tendo em vista a segurança dos réus, dos acusados e de terceiros.
Em recente editorial, neste mesmo espaço, o Jornal do Brasil já antecipava a iminência dessa súmula, que terá como base os dispositivos fundamentais da Constituição que protegem a integridade física e moral das pessoas, a recente reforma do Código Processo Penal, o "abuso de autoridade" e a jurisprudência acumulada sobre a questão tanto no STF quanto no Superior Tribunal de Justiça.
A idéia da súmula, proposta inicialmente pelo ministro Cezar Peluso, surgiu ao fim do julgamento de um recurso em habeas corpus apresentado pela defesa de um pedreiro, que cometeu crime passional e foi condenado a mais de 13 anos de reclusão. Sua defesa postulou e conseguiu a anulação do julgamento. O ministro-relator tomou como ponto de partida de seu voto o princípio fundamental da Constituição Federal da "dignidade da pessoa humana" (artigo 1º, inciso 3) e o inciso 49 do artigo 5º, pelo qual "é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral".
O ministro Marco Aurélio, relator do recurso, afirmou que "manter o acusado em audiência, com algema, sem que demonstrada a periculosidade, ante práticas anteriores, significa colocar a defesa, antecipadamente, em patamar inferior, não bastasse a situação de todo degradante". Além disso – como lembrou o ministro Eros Grau – dispositivo da recente reforma parcial do Código de Processo Penal (Lei 11.689/08) estabelece que "não se permitirá o uso de algemas no acusado durante o período em que permanecer no plenário do júri, salvo se absolutamente necessário à ordem dos trabalhos, à segurança das testemunhas ou à garantia da integridade física dos presentes".
No seu voto, Marco Aurélio referiu-se indiretamente aos excessos cometidos pela Polícia Federal, durante a Operação Satiagraha – com direito a espetáculo midiático – ao comentar que o país tem testemunhado "abusos de toda sorte, vendo-se, nos veículos de comunicação, algemadas, pessoas sem o menor traço agressivo, até mesmo outrora detentores de cargos da maior importância na República". Na sessão do STF, falou-se também da lei vigente sobre abuso de autoridade, de 1965, que – embora defasada e oriunda do período ditatorial – proíbe "submeter pessoa sob sua guarda ou custódia a vexame ou a constrangimento não autorizado em lei".
É uma decisão bem-vinda, insista-se. Muitos analistas sublinhados pela sensatez reforçam a tese de que os direitos dos criminosos são desrespeitados no Brasil. Isso vale, em especial, para os presos pobres. A própria regulamentação da Polícia Federal recomenda o uso da algema para quando o preso quer fugir, agredir ou se agredir. Já ficou patente que a utilização do recurso transformou-se em pirotecnia – um subproduto mal acabado da tentativa de livrar o país das chagas da impunidade. No afã de romper com a sina histórica de que a imposição da lei se dá desigualmente, corre-se o risco de devastar irremediavelmente a imagem de quem é, até prova contrária, um suspeito.
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