terça-feira, 16 de maio de 2023

Daniela Chiaretti - O Cadastro Ambiental Rural e o boneco João Bobo

Valor Econômico

Qual o recado que está sendo dado com a pressão para que o CAR volte ao Ministério da Agricultura?

João Bobo, também conhecido como João Teimoso, desde sempre é socado pra cá e pra lá, pobre boneco. Mas também desde sempre retorna ao centro graças a um peso de lastro colocado em sua base arredondada. A ideia pedagógica do brinquedo não é ativar o gosto pela luta nas crianças, mas incentivá-las ao equilíbrio. Pois bem: a discussão corrente sobre o Cadastro Ambiental Rural, o CAR, de sair do Ministério do Meio Ambiente e Mudança Climática (MMA), seu ponto de origem, e retornar ao Ministério da Agricultura (Mapa), onde foi levado no governo Jair Bolsonaro, lembra o movimento do João Bobo, só que com fundamentos menos nobres e divertidos.

Cristovam Buarque* - Evasão tolerada

Correio Braziliense

Por falta de lutar para acabar com a divisão do sistema escolar entre escolas senzala para os filhos dos pobres, em geral afrodescendentes, e escolas casa grande para os filhos dos ricos, em geral eurodescendentes, essa opção termina fazendo com que o sistema universitário tenha universidades senzala e universidades casa grande

Uma demonstração de nosso racismo institucional é o ensino de história esquecendo o papel dos negros e ignorando a riqueza da cultura africana na formação do Brasil. Esse é um racismo supremacista, mas há um racismo submisso que vem sendo imputado há séculos.

A reserva de vagas para ingresso na universidade tem uma finalidade positiva na luta contra o racismo, mas o debate visando reduzir exigências no conteúdo da disciplina de cálculo, nos cursos de engenharia, para diminuir a evasão de alunos cotistas tem um caráter negativo nessa luta, ao desviá-la para quebrar a desigualdade na educação de base.

Joel Pinheiro da Fonseca – Bolsonaro seguirá Trump

Folha de S. Paulo

O ex-presidente americano mostra o que acontecerá com a direita brasileira

Quando Trump deixou o poder em 2021, em meio ao trauma que foi o 6 de janeiro, ele parecia liquidado. Mau perdedor, tendo que enfrentar vários processos judiciais e ainda com o maior ataque à democracia americana pesando sobre suas costas; suas falas bombásticas agora pareciam simplesmente irrelevantes.

Desde então, tudo mudou. Trump está mais forte do que nunca. Não só seu estilo conseguiu manter uma base de apoiadores forte, como mesmo os problemas jurídicos que ele enfrenta acabaram por fortalecê-lo. Pesam contra ele desde acusações graves (como ter interferido junto a autoridades eleitorais para mudar o resultado da votação) até contravenções menores e que só receberam a atenção da imprensa e do sistema de Justiça por se tratarem do ex-presidente.

O próprio fato de enfrentar um processo judicial e até o de ser condenado o fortalece, por alimentar a narrativa de que é um perseguido pelo sistema. Não tenho dúvida de que isso seja especialmente verdade quando o processo é por algo menor, por alguma tecnicalidade que escapa ao entendimento da maioria. Mas é bem possível que até acusações de crimes mais sérios possam ter o mesmo efeito.

Dora Kramer - Direita esquenta o tamborim

Folha de S. Paulo

Dúvidas recaem sobre prós e contras de Bolsonaro, Tarcísio e Zema

É cedo para falar das próximas eleições presidenciais? É, mas políticos só pensam nisso e movimentam-se nessa direção. O presidente da República sinaliza disputar novo mandato —bem como o antecessor, indica o mesmo, por ora elegível.

Entre o querer e a conquista do poder há as circunstâncias, há o imponderável e há o fator destreza na montagem do xadrez. No meio do caminho também está a corrida municipal do próximo ano.

A despeito do esforço para ganhar nas capitais e grandes cidades em 2024, por ser uma demonstração de força, os resultados não têm relação de causa e efeito entre si. O PT foi mal em 2020 e levou a Presidência em 2022.

Hélio Schwartsman - Sorte ou competência?

Folha de S. Paulo

Impressão é que presidente não se deu conta de que a correlação de forças mudou

O governo de Luiz Inácio Lula da Silva coleciona acertos importantes, mas já cometeu muitos erros —alguns deles primários. Os decretos do saneamento são um bom exemplo, já que embutem equívocos de mérito (as mudanças pretendidas representariam um retrocesso) e de execução (a derrubada dos diplomas pela Câmara escancarou a fragilidade da base legislativa de Lula).

Parte das barbeiragens pode ser atribuída à equipe do presidente, notadamente a seus articuladores políticos, mas não há como isentar o próprio Lula de responsabilidade. As principais ideias defendidas pelo governo, afinal, têm o seu aval, e vêm de sua própria boca declarações que turvam desnecessariamente o ambiente econômico e afastam potenciais aliados. É grande o contraste com seus dois primeiros mandatos, que costumam ser descritos como um sucesso. Daí que se torna inevitável perguntar se foi sorte ou competência que fizeram a diferença nas gestões anteriores.

Luiz Carlos Azedo - O presidencialismo no Brasil está enfraquecido

Correio Braziliense

O Congresso e o Supremo Tribunal Federal (STF) estão mais fortalecidos em relação ao Executivo, por vários motivos, entre os quais as mudanças na legislação partidária e na execução das emendas ao Orçamento

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva anda triste. Não manda tanto quanto gostaria, o que é normal para qualquer governante que não seja um ditador, mas também porque a diferença nas relações de força entre os Poderes da República também mudou muito de 2010 para 2023. O Congresso e o Supremo Tribunal Federal (STF) estão mais fortalecidos em relação ao Executivo, por vários motivos, entre os quais as mudanças nas regras eleitorais, na legislação partidária e na execução das emendas parlamentares ao Orçamento da União. Há uma diferença entre o agir do governo como estrutura de Estado, que é insubstituível, e a liderança do presidente da República.

Não custa nada lembrar a frase famosa de Karl Marx no O 18 Brumário de Luís Bonaparte, de 1852, uma grande reportagem sobre a restauração na França, após o golpe de Estado do sobrinho de Napoleão, escrita sob encomenda para uma revista. “Os homens fazem sua própria história, mas não a fazem como querem; não a fazem sob circunstâncias de sua escolha e, sim, sob aquelas com que se defrontam diretamente, legadas e transmitidas pelo passado”, escreveu.

Eliane Cantanhêde - Lula e PT, Bolsonaro e Cid

O Estado de S. Paulo

Bolsonaro vai dizer hoje que não sabia de nada; e se Mauro Cid disser o oposto?

Cada um com sua agonia. A âncora fiscal começa de fato a tramitar no Congresso, com o presidente Lula às voltas com o PT, o Congresso e sua obsessão de recuperar protagonismo internacional e reinventar a roda aqui no Brasil. E o ex-presidente Jair Bolsonaro vai depor hoje em meio a um turbilhão de denúncias que nunca acabam, cada uma pior que a outra.

Como dizem na Fazenda, “negociar com o Congresso não é nada, duro mesmo é aguentar o PT e a Gleisi (Hoffmann)”. E é assim que a âncora fiscal começa a efetivamente tramitar, com sete partidos “progressistas” esticando a corda para um lado, o centro e os moderados puxando para o outro, e a oposição se divertindo.

Merval Pereira - Um raio justiceiro

O Globo

Anistia proposta impede punição a irregularidades dos partidos políticos

Se um raio divino não cair sobre o Congresso para castigar os pecadores, deve ser aprovada hoje na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara o que já é avaliado como a maior anistia da história política recente, impedindo que irregularidades eleitorais dos partidos políticos detectadas pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) sejam punidas.

O TSE terminou recentemente a análise dos gastos partidários de 2017 — atraso que, por si só, favorece a impunidade — e determinou multas no valor de R$ 40 milhões, corrigidas pela inflação. A anistia pretendida beneficia governo e oposição, esquerda e direita, é ampla, geral e irrestrita, atinge praticamente todos os partidos, acusados de gastos indevidos do dinheiro público ou de não cumprirem a legislação eleitoral, principalmente a que determina cotas raciais e de gênero para as candidaturas.

Andrea Jubé - A base quer cargos, emendas e carinho

Valor Econômico

Às vésperas de votações decisivas no Congresso, como a nova regra fiscal, o governo voltou a abrir os cofres para afagar a base aliada a fim de evitar mais sustos

Às vésperas de votações decisivas no Congresso, como a nova regra fiscal, o governo voltou a abrir os cofres para afagar a base aliada a fim de evitar mais sustos. Nos últimos seis dias, foram empenhados mais R$ 400 milhões em emendas individuais de deputados e senadores. O movimento atinge R$ 1,7 bilhão comprometidos com os aliados em 2023.

Na sexta-feira, o Valor mostrou que até 10 de maio, o governo havia comprometido R$ 1,3 bilhão em recursos para pagar emendas individuais. Com a peculiaridade de que houve um salto exponencial nos valores: até abril, somente R$ 97,3 milhões haviam sido reservados para esta despesa.

Carlos Andreazza - Elmendas

O Globo

O orçamento é secreto. Elmar Nascimento, não. Não há constrangimento. O papo sai reto. Patrimonialista e reto. Os entrevistadores, Gabriel Sabóia e Lauriberto Pompeu, fizeram as perguntas necessárias sem enrolação — e ele entregou sem rodeios. Deu no GLOBO do dia 11.

Se toda a verba outrora do orçamento secreto ficasse com o Congresso, a articulação política melhoraria? Esse não seria um modelo fisiológico, de troca de recursos por votos?

— O governo não teria dificuldade. O Bolsonaro tinha uma base sólida. A estratégia do governo Lula, de participação via indicação de ministros, não traz base consolidada. O chão da fábrica, que é o plenário da Câmara dos Deputados, está muito mais ligado à execução de obras nas bases do que à ocupação desse tipo de espaço, que não chega para eles.

Hamilton Garcia de Lima* - A doença de Chagas da política brasileira

Os quatro anos do governo Bolsonaro deram a falsa impressão a uma boa parte da opinião pública, nacional e internacional, de que os males do Brasil tiveram origem em sua gestão, que só foi possível graças à operação Lava-Jato que “criminalizou a política”. Nada mais distante da realidade.

É mister reconhecer que a “criminalização da política” é tema antigo em nosso país e que não começou com a operação Lava-Jato. A participação política fora dos quadros das elites dominantes nunca fez parte de nosso cotidiano como nação, basta ver como, do período regencial no Império (1831-1840) até 1964, a emergência de novos atores amiúde desaguou em revoluções e contra-revoluções pela fragilidade dos canais de participação que fomos capazes de constituir ao longo deste período.

O que a mídia pensa - Editoriais / Opiniões

Apesar da pressão, queda de juros seria prematura

O Globo

Ao contrário do que afirmam Lula e petistas, nossa inflação é de demanda e exige remédio amargo

É prematura a pressão para que o Banco Central (BC) reduza os juros. Pelos últimos dados do IBGE, o BC tem adotado uma política de juros responsável e não deveria ceder às pressões para mudá-la. Apesar de a taxa básica de juros permanecer em patamar alto (13,75%), a queda da inflação tem sido mais lenta que o esperado. Tal lentidão reforça a necessidade de os diretores do BC se manterem imunes aos ataques do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, de seus ministros, de cardeais do PT e das alas do empresariado tolerantes com o descontrole de preços.

Há, é certo, sinais positivos. Nos primeiros quatro meses deste ano, a inflação foi inferior à do mesmo período de 2022 (2,72% ante 4,29%). Em abril, o IPCA acumulado em 12 meses sofreu queda pelo décimo mês consecutivo e ficou em 4,18%, menor taxa desde outubro de 2020. Como o teto da meta do BC é 4,75%, é compreensível que muita gente diga estar na hora de baixar os juros. Infelizmente, não é o que sugere uma análise mais cuidadosa.

Poesia | Bertolt Brecht - Anos atrás

 

Música | Alcymar Monteiro - Evocação nº 1 (Nelson Ferreira)