• Dilma desafiou o Congresso a um teste para o impeachment
-Valor Econômico
O ex-presidente Lula tem consciência do que seria o melhor para ele, e já teve o rompante de ir a público se desculpar e explicar que não deu para seguir adiante com Dilma Rousseff. Dito isso, passaria à oposição, levando consigo a maioria do PT e do PMDB. Já que não consegue ajudar a presidente, apesar das seguidas viagens a Brasília - hoje mesmo virá de novo, chamado para de novo discutir a reforma e de novo acalmar o PMDB - Lula combateria o governo com Dilma no cargo. Um sonho?
É um sentimento diferente, mais que um sonho. Um passo adiante com relação aos ardentes desejos anteriores de, com o impeachment ou a renúncia da presidente, promoverem, ele e o PT, uma mudança para a oposição e, de camarote, seguirem até as eleições de 2018. O descalabro administrativo e as crises econômica, política e moral iriam para a conta de quem assumisse um mandato tampão.
Porém, é na convicção de que a vida de Dilma não se move nem em um sentido nem em outro, que a consciência-sonho de Lula de vez em quando já lhe aponta o caminho da oposição com ela no cargo. Lula fala sobre isso sempre, mas não fará isso. Não tem coragem, a criatura é sua. Está acabrunhado, passa dois dias de aflição depois de cada rodada em Brasília, reclama, critica, insulta, mas não faz o que gostaria. Até porque não tem certeza se só um pedido de desculpas seria suficiente para dissociá-lo de Dilma. Provavelmente, não.
O ex-presidente então volta, na semana seguinte, faz as conversas políticas, repassa recomendações não executadas, desencrespa o PMDB, dá meia volta. Anda em círculo.
Quando em Brasília, Lula trata principalmente do PMDB. Conversa de um lado, de outro, tenta mostrar à presidente cada perfil, quem é quem no partido, os grupos, recomenda atenção a um e outro, reune-se com Sarney, Renan, Cunha, Temer, Jader, vira as costas e a confusão se refaz.
Situação idêntica à que vive o presidente do PMDB e vice-presidente da República Michel Temer. Está sendo tratado mais do que como adversário, como inimigo mesmo, pela presidente e sua entourage. Numa relação de faz e desfaz infinita. Alguém disse a Dilma, e esse alguém sabe quem, que é preciso dividir para governar. O PMDB é reconhecido por suas divisões e a harmonia da convivência entre elas. É organizadamente dividido, cada grupo com negociação em separado dos seus interesses com o governo, naturalmente. Pois Dilma não faz outra coisa senão inventar um confronto.
Tentou jogar o PMDB do Senado contra o da Câmara (eles já são times adversários, há décadas) e nas últimas três semanas está tentando rachar a bancada do Rio investindo no governador Pezão e no líder Picciani, que já formam um grupo, contra um inimigo ainda indefinido: pode ser Michel Temer, ou a parte da bancada que apoia o impeachment, ou sabe-se lá que idiossincrasia outra.
Indicou a ministra Kátia Abreu, que está no governo na sua cota pessoal e não do partido, onde é cristã nova, para negociar os cargos que Temer, Renan e outros refugaram. Forma dramática de resolver um problema criando dez outros. Pelo menos agora já se tem uma noção do que significam essas ações que pareciam total falta de noção.
A presidente optou por um caminho confuso, desafiador, soberbo, de fazer o teste do impeachment e movimentou-se mais ontem do que em todo o primeiro mandato e o início do segundo juntos. De manhã apelou para os presidentes da Câmara e do Senado evitarem a sessão em que seriam votados seus vetos a medidas que criam despesas, pois achava que perderia. De repente, quando o dólar bateu em R$ 4, mandou votar de qualquer jeito em busca de uma arriscada porém boa notícia, se tudo desse certo. A presidente precisava de um alento, um pouco de ar.
Foi assim que tentou encontrar o fio de Ariadne no labirinto para o qual arrasta o ex-presidente Lula e o principal partido da aliança, o PMDB. E onde está cada vez mais enredada. Um labirinto tecido pelas relações com o congresso, com o PMDB, com o PT, com o governo, com o Judiciário, com o Tribunal de Contas, com a Câmara, com o Senado, com os agentes econômicos, com a população e até com suas relações pessoais. As últimas entrevistas do ex-marido Paulo Araújo, que considerou inoportunas, tiveram papel importante na vertigem presidencial. Tem prazo para buscar a saída, precisa resolver cada uma dessas pontas que a tornam prisioneira em seu próprio bunker.
Em menos de cinco meses depois de assumir o cargo, Murilo Ferreira, presidente da Vale, pediu afastamento da presidência do Conselho de Administração da Petrobras. Já está fora do vespeiro há uma semana e até agora a empresa, provando-se ser ainda uma caixa-preta, como mostra diariamente a Operação Lava-Jato, não achou que devesse explicações convincentes sobre o gesto. Murilo Ferreira alegou motivos pessoais temporários até 30 de novembro, uma licença que no mercado se dá como sem volta.
O seu segundo na Petrobras Clovis Torres, que levou também da Vale, para exercer uma espécie de consultoria jurídica, atividade crucial neste momento, também pediu licença. Está no Conselho da BR aguardando desdobramentos. Diz-se, na Petrobras, que Clovis saiu para que o conselho não se julgasse constrangido a indicá-lo para suceder Murilo.
Desculpas pueris. Já se ensaiou explicar, também, que ambos se afastaram porque houve uma pequena discordância quanto à fatia da BR a ser vendida, além de divergências quanto a benefícios aos funcionários.
Em se tratando do presidente executivo de uma mineradora como a Vale, e de uma companhia do quilate da Petrobras que sofreu o abalo que sofreu em seus alicerces, saqueados para criação dos dutos de propina inimagináveis, as justificativas não condizem com os personagens.
Diz-se que a diretoria da Petrobras sabotava o Conselho de Administração, uma razão para Murilo se afastar. Outra que Aldemir Bendine, o novo presidente da empresa, não se dá com Murilo, com quem disputa não os holofotes, esses ninguém quer mais na Petrobras, mas a última palavra nas decisões. Talvez por aí se encontre um caminho para revelar o que aconteceu, de verdade. Transparência é que não foi.