quinta-feira, 28 de julho de 2016

Opinião do dia - Enrico Berlinguer

(...) ¿Cuál es el origen de la necesidad de ponernos a pensar y a trabajar sobre un proyecto de transformación de la sociedad que indique objetivos y metas a perseguir y alcanzar en los próximos tres o cuatro años, pero que se traduzcan en hechos, disposiciones y medidas inmediatas que señalen su puesta en marcha?

Esta necesidad nace de la consciencia de que hay que darle un sentido y una finalidad a la política de austeridad que es una opción obligada y duradera y, al mismo tiempo, una condición de salvación para los pueblos de Occidente en general, y especialmente para el pueblo italiano.

La austeridad no es hoy un mero instrumento de política económica al que hay que recurrir para superar una dificultad temporal, coyuntural, para permitir la recuperación y la restauración de los viejos mecanismos económicos y sociales. Así conciben y presentan la austeridad los grupos dominantes y las fuerzas políticas conservadoras. Para nosotros, por el contrario, la austeridad es el medio de impugnar por la raíz y sentar las bases para la superación de un sistema que ha entrado en una crisis estructural y de fondo, no coyuntural, y cuyas características distintivas son el derroche y el desaprovechamiento, la exaltación de los particularismos y de los individualismos más exacerbados, del consumismo más desenfrenado. Austeridad significa rigor, eficiencia, seriedad y también justicia, es decir, lo contrario de lo que hemos conocido y sufrido hasta ahora y que nos ha conducido a la gravísima crisis cuyos daños hace años que se acumulan y se manifiestan hoy en Italia en todo su dramático alcance.

Es, pues, en base a este enfoque como el movimiento obrero puede enarbolar la bandera de la austeridad. Austeridad es para los comunistas lucha efectiva contra la situación existente, contra la evolución espontánea de las cosas, y al mismo tiempo, premisa, condición material para realizar el cambio. Concebida de esta manera, la austeridad se convierte en un arma de lucha moderna y actualizada tanto contra los defensores de orden económico y social existente como contra los que la consideran como la única situación posible de una sociedad destinada orgánicamente a permanecer atrasada, subdesarrollada y, además, cada vez más desequilibrada, cada vez más cargada de injusticias, de contradicciones, de desigualdades.

Lejos de ser, pues, una concesión a los intereses de los grupos dominantes o a las necesidades de supervivencia del capitalismo, la austeridad puede ser una opción con un avanzado y concreto contenido de clase, puede y debe ser una de las formas en que el movimiento obrero se erige en portador de una organización diferente de la vida social, a través de la cual lucha por afirmar, en las condiciones actuales, sus antiguos y siempre válidos ideales de liberación.

En efecto, creo que en las condiciones actuales es inimaginable luchar realmente y con eficacia por una sociedad superior sin partir de la necesidad imprescindible de la austeridad.

Pero la austeridad, según sus contenidos y las fuerzas que la encauzan, puede utilizarse como instrumento de depresión económica, de represión política y de perpetuación de las injusticias sociales o como ocasión para un desarrollo económico y social nuevo, para un riguroso saneamiento del Estado, para una profunda transformación de la organización social, para la defensa y expansión de la democracia: en un palabra, como medio de justicia y de liberación del hombre y de todas sus energías, hoy postradas, dispersas, desperdiciadas.

--------------------
Enrico Berlinguer (25 de Maio de 1922 -11 de Junho de 1984), foi um político italiano, secretário-geral do Partido Comunista Italiano desde 1972 até à sua morte e principal expoente do "eurocomunismo". Fragmentos selecionados. La austeridad. Conclusiones ante la convención de intelectuales. (Roma, 1977)

Dilma diz que pagamentos a João Santana são responsabilidade do PT

• Presidente afastada garante que marqueteiro tratou direto com tesouraria do partido

Cristiane Jungblut – O Globo

BRASÍLIA - A presidente afastada Dilma Rousseff disse nesta quarta-feira que não está "cansada" e que lutará até o fim para evitar a aprovação do impeachment pelo Senado, cuja votação está prevista para o final de agosto. Em entrevista à “Rádio Educadora”, de Uberlândia (MG), Dilma ainda disse que repassou ao PT a responsabilidade pelos pagamentos feitos ao ex-marqueteiro João Santana, investigado na Operação Lava-Jato. Ela disse que o próprio João Santana afirmou ter tratado dos pagamentos com a tesouraria do PT, e não com seu comitê de campanha.

Na semana passada, um dia depois de Santana admitir em depoimento ao juiz Sérgio Moro ter recebido US$ 4,5 milhões por meio de caixa dois no exterior para saldar uma dívida de campanha de Dilma Rousseff em 2010, a presidente afastada adotou tom cauteloso e negou ter autorizado ou saber da existência do caixa dois, mas não descartou que ele tenha existido, como fizera em outras oportunidades. Depois, em nova entrevista, mudou a versão sobre o caixa dois na campanha.

— Se ele recebeu os US$ 4,5 milhões que diz que recebeu não foi da organização da minha campanha. Porque ele diz que recebeu isso em 2013. Como você sabe, a campanha começa em 2010 e, até o final do ano, ela é encerrada. A partir do momento em que ela é encerrada, tudo que ficou pendente de pagamento da campanha passa a ser responsabilidade do partido. A minha campanha não tem a menor responsabilidade sobre em que condições pagou-se a dívida remanescente de 2010. Não é a mim que tem que perguntar isso. Com quem ele tratou isso foi com a tesouraria do PT, como disse o próprio Santana — disse Dilma, na entrevista.

‘Só acaba quando termina’
Dilma negou qualquer intenção de renunciar e garantiu que sua defesa será apresentada no prazo - que encerra nesta quinta-feira - na comissão especial do impeachment. Ela comparou o processo a uma partida de futebol.

— Não estou cansada. Estou plenamente disposta a lutar até o último minuto pelos meus direitos. Tudo bem que me escondam. Não apareço em jornais nacionais há muito tempo. Fui cassada, como se diz, da TV. Tenho uma meta: lutarei até o fim para impedir que esse impeachment ocorra — disse Dilma, enfática.

Dilma disse que haverá uma guerra de informações até o final.

— Quanto mais próximo chegarmos desse dia, teremos uma guerra de informações. Só no dia saberemos o que realmente vai acontecer. É como uma partida de futebol, a gente joga até o fim da partida e ganha, e ganha e ganha. Isso tem que ser um bom jogador. E, nesse caso, lutar até o fim para ganhar — disse Dilma, fazendo uma metáfora sobre futebol.

Dilma disse que não tem se encontrado com o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), mas que tem conversado com senadores:

— O site do Senado saiu do ar e algumas coisas eram fundamentais. Vamos fazer esforço para cumpri-lo. Isso não acredito que isso tenha consequência maior. Nossa defesa está praticamente pronta.

"Fundamentos da economia são do meu governo"
Dilma ainda reagiu às interpretações de que sua saída do governo melhorou o humor na economia.

— Como podem os fundamentos da economia melhorarem devido a dois meses apenas? Todos os fundamentos da economia estão dados pelo meu governo. Em dois meses ninguém recupera nada. Havia uma sistemática tentativa de criar mau humor na economia, porque todo o dia iria cair o mundo na nossa cabeça — disse ela.

E disse que participará das eleições municipais, se for chamada:

— Se for convidada, não tenho problema em apoiar forças progressistas .

TSE envia ao Supremo novo indício de irregularidade em campanha de Dilma

TSE envia ao STF novos indícios de irregularidade na campanha de Dilma em 2014

• Alvo da vez é empresa contratada para disparar mensagens para celulares que recebeu R$ 4,8 milhões pelo serviço, mas não possui identificação na fachada e, aparentemente, funciona também como residência, aponta relatório

Gustavo Aguiar - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) encontrou novos indícios de irregularidades nas contas de uma empresa que prestou serviço para a campanha de reeleição da presidente afastada Dilma Rousseff em 2014. O presidente da Corte, ministro Gilmar Mendes, enviou as informações para compor a ação que trata da prestação de contas da petista no Supremo Tribunal Federal (STF).

Os novos detalhes envolvem a empresa DCO Informática, contratada para disparar mensagens para celulares via WhatsApp durante a campanha. A empresa tem sede na cidade mineira de Uberlândia e recebeu R$ 4,8 milhões pelo serviço, em quatro repasses feitos ao longo de uma semana em outubro de 2014.

"O estabelecimento não possui identificação na fachada, aparentemente também funciona como residência e não tivemos acesso ao interior do mesmo", aponta o relatório da Secretaria Municipal de Finanças de Uberlândia feito a pedido de Gilmar. Além disso, a empresa possui apenas um servidor, um notebook e três funcionários que trabalham sem carteira assinada.

Um dos funcionários da DCO relatou que a campanha de Dilma contratou a empresa por R$ 0,06 a R$ 0,16 para cada disparo, e que o preço variava de acordo com o porte e solicitação. Ele também disse que a empresa desenvolveu o programa para fazer os disparos de mensagens e subcontratou a 2K Comunicações para fazer os relatórios das atividades.

Em fevereiro, Gilmar já havia pedido que órgãos de controle fiscalizassem a DCO e outras seis empresas por suspeitas de irregularidades. Os indícios foram apontados pelo PSDB, que alegou possível ilegalidade na contratação e pagamento efetuado às empresas supostamente sem capacidade operacional para prestar os serviços à campanha petista.

Inquérito. O TSE aprovou em 2014 as contas da campanha de Dilma, mas Gilmar, relator da prestação feita pela presidente afastada, determinou que as investigações sobre supostas irregularidades continuassem. Em outubro do ano passado, a Polícia Federal instaurou um inquérito sobre o assunto com base numa determinação do ministro.

Gilmar utiliza informações reveladas pelas investigações da Operação Lava Jato para dizer que a campanha foi supostamente financiada com recursos da Petrobrás. Por ser uma empresa de capital misto (recursos públicos e privados) a petroleira é vedada de financiar campanhas eleitorais.

O inquérito da PF, no entanto, aguarda uma decisão do STF para saber se o caso deve ser conduzido pela primeira instância ou pela própria Suprema Corte, já que envolve autoridade com foro privilegiado. O caso no Supremo está sob a relatoria do ministro Edson Fachin, para quem as novas informações sobre a DCO foram enviadas.

A campanha de Dilma nega qualquer irregularidade."Todas as contribuições e despesas da campanha de 2014 foram apresentadas ao TSE, que após rigorosa sindicância, aprovou as contas por unanimidade", diz uma nota assinada por Edinho Silva, que foi tesoureiro da campanha de Dilma.

Temer recebe Aécio para discutir reforma política

• Proposta debatida trata da diminuição de partidos e fim das coligações

Eduardo Barretto – O Globo

BRASÍLIA - Em reunião fora da agenda oficial, o senador Aécio Neves (PSDB-MG) foi ao Palácio do Planalto levar ao presidente interino Michel Temer proposta de emenda constitucional (PEC) de reforma política nesta quarta-feira. Segundo Aécio, já há concordância para instalar no Congresso uma comissão especial para discutir o tema. A PEC, de autoria de Aécio Neves e Ricardo Ferraço (PSDB-ES) visa ao retorno da cláusula de barreira - o que diminuiria os partidos - e ao fim das coligações para pleitos parlamentares - que impediria o voto de um candidato ir para outro da mesma aliança.

— Essa, de todas as reformas que estão para ser discutidas no Congresso, me parece a mais urgente, porque ela facilitará as outras — disse o tucano.

Aécio afirmou já haver concordância para discutir esses dois pontos com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL). Desde que foi eleito, há duas semanas, Maia tem dado declarações favoráveis à questão. Segundo Aécio, Temer se mostrou "muito simpático" à proposta. Na semana passada, o ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, admitiu que já havia consenso nessas duas propostas.

A cláusula de barreira, ou cláusula de desempenho, restringiria o número de partidos - hoje são 35 -, uma vez que impõe um percentual mínimo de votos a ser alcançado por cada legenda para conseguir representação. Essa sigla que não conseguisse a fatia de votos perderia recursos do fundo partidário, não teria direito a cargos em lideranças ou Mesa Diretora das duas Casas legislativas e perderiam tempo de rádio e TV. Aprovada pelo Congresso em 1995, a medida não chegou a vigorar porque foi barrada pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

Já o fim das coligações proporcionais evitaria que um parlamentar "transfira" votos para outros da mesma aliança, e o eleitor não ajude a eleger estritamente o candidato em quem votou.

Temer promete empenho em redução de partidos

Temer recebe Aécio para discutir redução do número de partidos

• Segundo o senador tucano, que é contrário ao fim do financiamento de empresas para candidatos, o presidente em exercício se mostrou sensível e prometeu empenho a esse e demais temas da reforma política

Carla Araújo - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA – O senador Aécio Neves (PSDB-MG) foi recebido nesta quarta-feira, 27, pelo presidente em exercício Michel Temer e, segundo ele, conseguiu o apoio do presidente para dar agilidade às suas propostas de mudanças na Reforma Política. “Vim dar ciência ao presidente e vamos centrar esforços no fim das coligações proporcionais, que precisa ser enfrentado, e no reestabelecimento da cláusula de barreira”, disse.

Aécio lembrou que já conversou com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, para entregar uma emenda constitucional elaborada pelo senador Ricardo Ferraço (PSDB-ES), da qual, segundo ele, é coautor. O texto prevê uma adoção gradual da cláusula: 2% em 2018 distribuídos em 14 Estados e 3% em 2022.

Segundo Aécio, Temer se mostrou sensível ao tema. “Ele disse que terá todo o empenho e marcamos uma nova conversa. Ele sabe que é um tema do Congresso, mas tem toda disposição em participar das discussões e envolver o seu partido”, afirmou. Aécio afirmou que pretende na semana que vem, logo após o fim do recesso, criar uma comissão especial para iniciar os debates e que os dois temas possam ser apreciados ainda este ano. “São dois temas que me parecem hoje aqueles mais próximos de alcançar maioria (no Congresso). Vamos centrar nossos esforços nesses temas, com apoio do presidente”, completou.

Aécio disse ainda que caso essas duas reformas forem aprovadas elas possibilitarão uma facilidade maior para outros temas, como a questão das reformas previdenciária e trabalhista.

O senador lembrou ainda que na época das discussões da reforma política ele se manifestou contrário ao fim do financiamento de empresas para candidatos. “Eu temo muito e manifestei essa posição a proibição definitiva de financiamento por pessoas jurídicas. Nos defendíamos que fossem restringidos, que houvesse um teto”, afirmou, ressaltando que “essa eleição municipal vai ser uma grande experiência”. “Vamos todos enfrentá-las com as regras que estão aí”, afirmou.

São Paulo. O senador minimizou o anúncio da chapa do ex-tucano Andrea Matarazzo como vice de Marta Suplicy, hoje no PDMB, e disse que os candidatos do PSDB são aqueles consagrados nas convenções do partido. “Em São Paulo nosso candidato é o João Dória e a partir de agora os adversários do PSDB não estão dentro do partido, vamos disputar para dar a São Paulo uma administração eficiente, ética, ousada, que olhe para o futuro”, disse. “Nosso principal adversário em São Paulo é o PT como continuará sendo”, completou.

Segundo Aécio, antes da convenção do partido era natural que existissem outras opções. “Outras alternativas existiam dentro do partido e é natural que nossas lideranças locais tivessem suas preferências, mas agora não há mais isso”, disse.

De acordo com Aécio, conforme a sua disponibilidade e a vontade dos candidatos ele participará ativamente das campanhas e que já está gravando para “centenas de candidatos”.

Em rede social, ministro da Cultura desabafa e critica gestão anterior

• Marcelo Calero afirmou que administração passada foi 'irresponsável' e 'incompetente'

- O Globo

RIO — A exoneração de 81 funcionários do Ministério da Cultura, entre eles os que formavam a cúpula da Cinemateca Brasileira, foi criticada por setores do meio artístico. Acusado de comandar um "desmonte" na pasta, o ministro Marcelo Calero escolheu, nesta quarta-feira, o Facebook para desabafar e acusar as gestões anteriores.

Escolhido em maio pelo presidente interino Michel Temer, Calero chamou de "estapafúrdia" a avaliação. Ele também disse que a administração passada foi "irresponsável" e "incompetente". De janeiro de 2015 até o afastamento de Dilma Rousseff, a pasta era liderada pelo sociólogo baiano Juca Ferreira.

"Na tentativa desesperada de construir uma narrativa política, o pessoal raivoso insiste na tese estapafúrdia do 'desmonte' do MinC. Desmonte, para mim, é uma gestão irresponsável e incompetente, que para além de preencher mais da metade dos cargos de confiança por apadrinhados políticos, permite que o orçamento do Ministério seja reduzido a míseros 400 milhões de reais - o menor da Esplanada - e deixa como legado uma dívida de mais de 1 bilhão de reais, incluindo inúmeros editais e fornecedores não pagos, além de obras paralisadas. Isso é desmonte".

Na terça-feira, o MinC divulgou uma nota oficial em que justifica as demissões. "As exonerações fazem parte da reestruturação da pasta e do plano de valorização dos servidores de carreira, anunciado pelo Ministro da Cultura, Marcelo Calero, por ocasião de sua posse. A medida promove o desaparelhamento do Ministério da Cultura e valoriza o servidor de carreira".

Ministro defende demissões e pede 'desaparelhamento' do MinC

• Exoneração em massa ocorre um dia após Polícia Federal desocupar a sede da pasta no Rio; Juca Ferreira, que comandou o órgão na gestão Dilma, classificou como 'canalhice' a crítica de Marcelo Calero

Guilherme Sobota, Valmar Hupsel Filho, Sandra Manfrini e Roberta Pennafort - O Estado de S. Paulo

O Ministério da Cultura demitiu nesta terça-feira, 26, 81 funcionários ligados a diversas diretorias e instituições importantes de sua estrutura. As exonerações geraram críticas entre representantes do setor, que demonstrou forte resistência ao governo interino de Michel Temer. O ministro Marcelo Calero saiu em defesa da medida, pediu “o fim do aparelhamento no MinC” e disse que a atual gestão não quer “um ministério que se contente com fotinhos bonitas e ‘posts engajados’”.

A pasta chegou a ser extinta após o afastamento da presidente Dilma Rousseff, em maio. Houve forte reação da classe artística. Logo nos seus primeiros dias, a gestão Temer enfrentou protestos de servidores do MinC e artistas. Prédios de órgãos vinculados ao ministério foram ocupados e viraram palco de manifestações “Fora, Temer”.

Diante da pressão, menos de dez dias depois de iniciado o governo interino, Temer recuou e decidiu recriar o MinC – que havia sido rebaixado ao status de secretaria subordinada ao Ministério da Educação (MEC).

A exoneração em massa ocorreu um dia após a Polícia Federal desocupar o Palácio Gustavo Capanema, sede do MinC no Rio. Os manifestantes estavam no prédio desde 16 de maio, em protesto contra o governo Temer.

Segundo interlocutores do presidente em exercício, Calero assumiu a pasta com a missão de rebater acusações da classe artística de que promove uma desmanche de projetos e de políticas públicas e demonstrar que os recursos do antigo MinC eram desperdiçados e direcionados a um grupo de artistas e produtores privilegiados pela gestão anterior.

As demissões publicadas ontem no Diário Oficial da Uniãoincluíam os diretores e coordenadores da Cinemateca Brasileira, em São Paulo – entre elas a coordenadora-geral Olga Toshiko Futemma –, e da Diretoria do Livro, Leitura, Literatura e Bibliotecas, em Brasília. Também houve exonerações na Fundação Biblioteca Nacional, no Museu Villa-Lobos e em diretorias do próprio MinC. Todos os demitidos detinham cargos comissionados.

De acordo com o ministério, as demissões fazem parte da “reestruturação da pasta e do plano de valorização dos servidores de carreira” e atendem a “uma demanda da sociedade civil por uma gestão republicana”, na qual os servidores concursados ocupariam os cargos de chefia.
Oswaldo Massaini Filho foi confirmado como novo coordenador-geral da Cinemateca.

Segundo fontes ouvidas pela reportagem, as exonerações no Ministério da Cultura ocorreram para “acomodação” política de outros indicados. O Estado apurou que foi dada uma orientação para que todos os servidores sem vínculo com o serviço público federal, que ocupassem DAS 3, 4 ou 5, fossem demitidos. A notícia das demissões repercutiu mal entre especialistas que estavam ligados às políticas do MinC e ex-dirigentes da pasta.

‘Canalhice’. Juca Ferreira, ex-ministro da Cultura na gestão Dilma, afirmou que as demissões comprometem a “capacidade de funcionamento” do ministério. “É uma tentativa malandra de cativar os funcionários de carreira com essa decisão superficial”, afirmou Ferreira, que classificou como uma “canalhice” a crítica do ministro ao que chamou de “aparelhamento” do MinC.

“Não conseguiram acabar com o ministério, agora querem destruir seu funcionamento”, disse. “O senhor Calero não está preparado para ser ministro da Cultura. Ele não sabe para onde o vento sopra. Vai fazer o que mandarem ele fazer.”

No post que publicou no Facebook, o ministro chamou de “levianas e irresponsáveis” as ilações a respeito de eventual extinção da Diretoria do Livro, Leitura, Literatura e Bibliotecas. “Ao contrário, será fortalecida, na medida em que sua chefia será exercida, preferencialmente, por servidor de carreira”, escreveu. “Queremos um ministério de entregas e resultados.”

Fornecedor da campanha de 2014 sob suspeita

• Assessor de Edinho foi subcontratado por empresa sem estrutura de serviço

Eduardo Bresciani, André de Souza e Cristiane Jungblut - O Globo

- BRASÍLIA- Um assessor que acompanha o ex-ministro Edinho Silva desde quando ele era deputado estadual em São Paulo recebeu recursos, de forma indireta, da campanha à reeleição da presidente afastada, Dilma Rousseff. Keffin Gracher era dono da 2K Comunicações, empresa subcontratada pela DCO Informática, esta contratada diretamente e sob investigação.

A DCO recebeu R$ 4,8 milhões da campanha petista em 2014 e tem em sua sede apenas um notebook, um servidor e três funcionários sem registro em carteira. A campanha negou irregularidades, mas não comentou a relação de Keffin com Edinho, que era tesoureiro da chapa formada por Dilma e Michel Temer.

A suspeita sobre irregularidades na DCO foi enviada pelo presidente do Tribunal Superior Eleitoral ( TSE), Gilmar Mendes, ao Supremo Tribunal Federal ( STF). A empresa foi contratada para enviar mensagens pelo WhatsApp, mas não teria estrutura para tal serviço. Foi em resposta à Justiça Eleitoral que a DCO alegou ter desenvolvido o software para o envio das mensagens e subcontratado a empresa de Keffin para enviá- las e para fazer relatórios de acordo com a base de dados fornecida pelo PT.

Na nota divulgada por Flávio Caetano, advogado da campanha de Dilma no TSE, não há qualquer menção à subcontratação. Questionado pelo GLOBO, ele afirmou que trata- se de o assunto interno da DCO.

“A atividade interna da empresa não diz respeito à campanha”, respondeu Flávio Caetano, por mensagem de texto.

Edinho Silva disse que a nota seria sua resposta e não atendeu às ligações para responder sobre a relação com Keffin. O ex- assessor não foi localizado.

Na nota, a campanha sustenta ter contratado a DCO para mandar mensagens por SMS e WhatsApp, durante o segundo turno das eleições, como “resposta” à propaganda feita por esses meios pelo adversário, o senador Aécio Neves. Sustenta que os serviços foram prestados e ressalta que as contas da chapa Dilma e Temer foram aprovadas pelo TSE.

“A contratação foi necessária em resposta à intensa campanha feita por Whatsapp e SMS pela chapa adversária. Os serviços contratados foram devidamente prestados e atestados”, diz a nota.

Gilmar Mendes foi o relator das contas da campanha de 2014. Apesar de o TSE ter aprovado a prestação de contas, ele pediu posteriormente investigações sobre alguns fornecedores da campanha. Foi dessa forma que se solicitou à Secretaria Municipal de Finanças de Uberlândia dados sobre a DCO e ficou constatada a falta de estrutura da empresa para o trabalho. No STF, a investigação relativa a fornecedores foi remetida em sigilo ao ministro Edson Fachin.

PT diverge sobre uso de tese do ‘golpe’ nas eleições

• Às vésperas da votação do impeachment, partido discute melhor estratégia nas disputas municipais; candidatos avaliam conveniência de ter Lula ou Dilma no palanque

Vera Rosa - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - A estratégia de “nacionalizar” a campanha municipal já divide o PT. Às vésperas da votação do impeachment da presidente afastada Dilma Rousseff no Senado, dirigentes do partido e candidatos mostram divergências sobre a eficácia de repetir a narrativa do “golpe” nas disputas pelas prefeituras. Além disso, com a expectativa de um cenário adverso para o PT, candidatos avaliam a conveniência de ter o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva no palanque e muitos preferem que Dilma fique distante.

Ao contrário da eleição de 2012, por exemplo, Lula não terá papel preponderante na campanha do prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, que concorrerá ao segundo mandato com alto índice de rejeição. Embora não seja réu, o ex-presidente é alvo da Lava Jato e perdeu grande parte do capital político.

Dilma disse nesta quarta-feira, 27, em entrevista, estar disposta a participar das eleições municipais, “se for convidada”, apoiando candidatos “da grande base progressista”. Nos bastidores, porém, a equipe de Haddad prefere que ela não apareça em São Paulo.

A ideia é vestir no prefeito o figurino do homem preparado para fazer “mais e melhor”. Auxiliares de Haddad estão convencidos de que as crises envolvendo o PT, Lula e o governo Dilma ofuscaram o trabalho dele. Haddad é um dos que mais se opõem à ideia de “nacionalizar” a campanha, defendida por candidatos no Nordeste.

“Mas qual o motivo para não mostrar a Dilma?”, perguntou o secretário de Organização do PT, Florisvaldo Souza. “Não temos como fugir dessa nacionalização, embora o que esteja em jogo sejam as propostas para melhorar a vida das pessoas.”

Comunicação. A ordem da cúpula petista é aproveitar a propaganda no rádio e na TV – que começa em 26 de agosto, quando a votação do afastamento definitivo de Dilma deve ter início no Senado – para também jogar luz sobre experiências bem-sucedidas nos quase 14 anos do PT no Palácio do Planalto.

Haddad, no entanto, acha que pecou na divulgação de suas ações e precisa mostrar o que fez, descolando-se dos malfeitos do PT. “É um erro grave a estratégia de ‘nacionalizar’ a disputa. Nesse caso, o eleitor sempre vota em função dos temas da cidade”, argumentou o cientista político Aldo Fornazieri, diretor da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo e colaborador do programa de governo petista, em 2012. “Além disso, quem tem de se defender de denúncias é o PT, e não o candidato.”

Na prática, a eleição em São Paulo, considerada a “joia da coroa”, é vista como a antessala da briga presidencial de 2018. Os maiores adversários de Haddad, hoje, são Celso Russomanno (PRB), Marta Suplicy (PMDB) e João Doria (PSDB).

Nordeste. Na outra ponta, o Nordeste, antigo reduto do PT, ainda exibe o maior índice de apoio a Dilma e Lula, o que faz muita diferença na definição do discurso de campanha. Na região, candidatos do PT querem associar o possível impeachment ao corte de programas sociais, apresentando-se como os nomes capazes de reverter a perda dos benefícios nas cidades.

A maior aposta do PT no Nordeste é a candidatura de João Paulo à prefeitura do Recife. Quatro anos após a debacle que se abateu sobre o partido na capital pernambucana – quando o então governador Eduardo Campos, morto em 2014, emplacou seu afilhado Geraldo Júlio (PSB) na prefeitura –, João Paulo aparece bem posicionado nas pesquisas.

“Se o PT souber capitalizar essa ideia do golpe nas eleições municipais, poderemos vencer a batalha, principalmente no Nordeste”, afirmou o deputado federal José Guimarães (CE), ex-líder do governo Dilma e um dos vice-presidentes do PT. “A ‘nacionalização’ ajuda muito no Nordeste e no Rio, mas em São Paulo admito que o terreno é mais hostil”, emendou o senador Lindbergh Farias (PT-RJ).

Rede aposta em Marina como trunfo

Por Estevão Taiar e Fernando Taquari – Valor Econômico

SÃO PAULO - O Rede Sustentabilidade faz sua estreia em eleições com Marina Silva fora da disputa, mas com a expectativa de que ela possa atuar intensamente nos palanques. Dona de 22 milhões de votos na última eleição presidencial, a ex-senadora trabalha para compartilhar parte do seu capital político com os correligionários que concorrerão neste ano em uma estratégia que tem o objetivo de fortalecer a sigla de olho na disputa pelo Planalto em 2018.

"A participação dela na minha campanha será total", diz Ricardo Young, vereador e candidato à Prefeitura de São Paulo. "Temos o privilégio de ter uma grande liderança nacional. Marina vai participar ativamente das campanhas do Rede pelo país e isso é um grande trunfo para nós candidatos", complementa o deputado estadual Paulo Lamac, candidato a prefeito de Belo Horizonte (MG).

Na última pesquisa Datafolha para a eleição presidencial de 2018, Marina ficou em segundo lugar. Teve 17% das preferências, cinco pontos percentuais atrás do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e três à frente do senador Aécio Neves (PSDB-MG). Oficialmente, no entanto, o partido nega que tenha planos mais ambiciosos do que se fortalecer e preparar o terreno para eleição presidencial.

"O esforço todo deste momento é para criarmos uma identidade. Não estamos antecipando 2018", diz Bazileu Margarido, coordenador-executivo do Rede. "Mas ela já tem contribuído com as campanhas e a participação dela vai se intensificar ainda mais", acrescentou o dirigente. Os próprios candidatos também procuram dissociar as duas eleições para não ampliar a pressão sobre Marina.

"O desempenho do Rede neste ano não é definidor do futuro de Marina. O partido não deve se preocupar neste momento em ser do tamanho dela. Agora, tudo que fizermos neste eleição soma a ela", afirma Lamac, que inspirado na ex-senadora e nas propostas "progressistas" do Rede deixou o PT no fim de 2015 para se filiar na legenda.

Embora o Rede faça questão de divulgar a sua estrutura horizontal, na prática, Marina é a líder e a figura pública do partido. Desde o começo de junho, dois meses e meio antes do início oficial da campanha, ela visitou pré-candidatos ou diretórios em oito Estados: São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Espírito Santo, Acre, Rio Grande do Norte, Maranhão, Pará e Rio Grande do Sul. Hoje, a ex-senadora estará presente na convenção que oficializa o nome de Young na capital paulista.

Apesar do capital político de Marina, os candidatos do Rede enfrentam um desafio adicional em sua estreia em eleições: o pouco tempo de TV e a rigidez na hora de estabelecer alianças. As restrições, contudo, são bem vistas por alguns dos postulantes. Lamac, por exemplo, argumenta que o menor tempo no horário eleitoral gratuito reduzirá os gastos com propaganda em uma campanha em que as doações privadas estão proibidas.

"Não tenho porque me preocupar com as novas regras eleitorais. Com pouco tempo de TV, não vamos gastar rios de dinheiro com propaganda. Faremos uma campanha pé no chão. Vamos apostar nas ruas e nas mídias digitais", afirma o pré-candidato.

A tendência é que o Rede tenha entre 12 e 15 candidatos a prefeito nas capitais, inclusive, nos maiores colégios eleitorais. Além de Young em São Paulo e Lamac em Belo Horizonte, a sigla terá o deputado federal Alessandro Molon na disputa no Rio e ainda busca um nome em Salvador (BA). No Recife (PE) vai apoiar a reeleição do prefeito Geraldo Julio (PSB).

O PSB, aliás, deve ser junto com o PPS o principal aliado do Rede onde o partido não tiver candidatura própria. Curiosamente, na sigla comandada por uma mulher, só deve haver uma candidata à prefeita nas capitais: a jornalista Ursula Vidal, em Belém (PA).

Impeachment: Mobilização da cidadania vai garantir afastamento definitivo de Dilma, diz Freire

 - Portal do PPS

O presidente do PPS, deputado Roberto Freire (SP), disse nesta quarta-feira estar confiante de que o Senado Federal irá aprovar de forma definitiva o impeachment da presidente afastada Dilma Rousseff, em votação prevista para o final deste mês.  Ele considera fundamental a mobilização da cidadania nas ruas, no ato pró-impeachment programada para o próximo domingo, dia 31 de julho, em todo o País.

“Não tenho dúvida de que o Senado compreende o que é necessário para viramos essa infeliz página da história, do desmantelo, do processo de roubalheira, corrupção e de irresponsabilidade [causados pelos governos do PT], que provocaram o uso do instrumento constitucional e democrático do impeachment”, afirmou.

Segundo Freire, “a democracia está sendo respeitada” e que “isso está viabilizando um novo rumo que o Brasil está tomando com o governo de transição” do presidente interino Michel Temer.

“É necessário continuarmos mobilizados; vamos às ruas porque é com a participação da cidadania que podemos ter um Brasil melhor amanhã”, conclamou o presidente do PPS.

Crise tira ânimo dos jovens eleitores

• TSE aponta queda no número de votantes de 16 e 17 anos em relação às eleições de 2012

Gilberto Amendola - O Estado de S. Paulo

Não vai ser fácil para ninguém, mas deve ser um tanto pior para quem vai encarar uma urna eletrônica pela primeira vez. Nas próximas eleições, mais de 2 milhões de jovens, entre 16 e 17 anos ou recém-chegados à maioridade, estarão aptos ao voto. Trata-se de uma geração que cresceu sob governos petistas, que se acostumou com uma certa calmaria econômica, que aprendeu a discutir sexualidade e liberdades individuais sem travas, que mergulhou em seus próprios smartphones e participou da revolução das redes sociais.

O presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Gilmar Mendes, divulgou na segunda-feira,25, os dados oficiais sobre as eleições municipais de 2016. O Brasil tem hoje 144.088.912 de eleitores aptos a votar no próximo dia 2 de outubro. Os que têm 16 e 17 anos correspondem 1,6% do total (2,3 milhões). O número é inferior ao registrado nas eleições de 2012, de 2,4 milhões, e à série história, que teve seu pico em 1994 (2,34% do total de eleitores).
Mas como estará o espírito e a cabeça desse jovem estreante? É preciso considerar o caldo em que esse eleitor está sendo forjado, um caldeirão em que se misturam Operação Lava Jato, processo de impeachment da presidente afastada Dilma Rousseff, governo interino de Michel Temer, ocupações das escolas estaduais e muito mais.

Interesse. Quatro alunos do Colégio Singular, de Santo André, na Grande São Paulo, foram convidados a debater o futuro eleitoral: Júlio Brito, de 17 anos; Renata Santana, 17; Caio Franquini, 17; e Julia Fugiwara, 16. Os garotos se mostraram pouco animados ou interessados no processo eleitoral. Por outro lado, as garotas aparentaram ansiedade e vontade de participar formalmente (por meio do voto) de uma eleição.

Sobre a importância do título de eleitor, por exemplo, Brito diz que “não tinha tido tempo de correr atrás disso” e Caio afirmou que “prefere se concentrar nos estudos para o vestibular”.

Renata e Julia, pelo contrário, não querem esperar e devem votar para prefeito e vereador nas eleições de outubro. Julia, por participar do primeiro coletivo feminista da escola, é a mais animada: “Às vezes ouço meus pais falarem do tempo do governo Fernando Henrique, do (Fernando) Collor, do Itamar (Franco). Acho que as coisas eram diferentes. Muita coisa melhorou. Outras pioraram.”

Marco Antonio Carvalho Teixeira, cientista político da FGV-SP, considera que esse eleitor de primeira viagem chega “contaminado pela polarização atual”. “Chega no meio desse debate político que é muito raso, um debate que está convocando o eleitor a participar de um ‘ser ou não ser’”, afirma.

Invariavelmente, os estudantes apontam as redes sociais como sendo a principal fonte de informação. De acordo com dados do Instituto de Imprensa Norte-americano e da Associated Press-Norc Center for Public Affairs Research, cerca de 88% dos usuários consomem regularmente notícias a partir das redes sociais. Cerca de 47% leem notícias sobre política nacional a partir do Facebook.

O cientista político Pedro Fassoni Arruda, da PUC-SP, diz que falar em “voto jovem” como bloco é um erro. “Tem o recorte de idade, grau de escolaridade, sexo, cor da pele, se é de periferia, se é de bairro nobre, se estuda em um colégio Dante ou Bandeirantes...”

Quando a reportagem ouviu estudantes da periferia da mesma idade, encontrou mais participação política e engajamento em projetos comunitários, mas pouca gente disposta a tirar título de eleitor ou a fim de participar de uma forma mais institucional.

“Política é todo dia. A gente faz muita coisa social, ajuda muitas famílias. Tenho grupo da igreja, tenho grupo na escola, mas votar, votar mesmo, acho que posso deixar pra quando for obrigatório”, afirma Rogério Motta Cruz, de 17 anos, aluno de uma escola estadual na zona leste de São Paulo.

Para a antropóloga Isabela Oliveira Pereira da Silva, o voto não é a única forma de participação – e uma parcela desse eleitorado percebeu isso. “Essa é uma geração que vai atuar de outro jeito.”

Brasil fecha 531 mil vagas no 1 º semestre

• Redução de emprego formal foi registrada em quase todos os setores da economia

Geralda Doca, Manoel Ventura* - O Globo

- BRASÍLIA- O país perdeu 531.765 empregos com carteira assinada no primeiro semestre deste ano, pior resultado desde 2002, início da série histórica do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados ( Caged), do Ministério do Trabalho. A redução das vagas está espalhada entre quase todos os ramos da atividade econômica.

No primeiro semestre, o comércio cortou 253.855 empregos. A indústria fechou 139.927 postos e a construção civil, 114.099 vagas. Apenas a agricultura e a administração pública abriram vagas de trabalho. O primeiro, criou 89.954 postos e o segundo, 18.790.

Entre as regiões, o maior corte de vagas foi na Sudeste, 263.892; seguida, por Nordeste, com 201.037. No recorte por estados, São Paulo foi o que mais encerrou postos de trabalho, com 137.634 cortes; seguido do Rio, com 104.818.

Em junho, o mercado formal de trabalho registrou saldo líquido negativo ( contratações menos demissões) de 91.032 postos de trabalho, 15 º mês seguido de queda. Apesar dos números negativos, os dados do segundo trimestre deste ano mostram uma queda no ritmo das demissões. O saldos mensais registrados desde abril foram menores na comparação com o mesmo período do ano passado. Em junho de 2015, por exemplo, foram eliminados 111.599 empregos com carteira assinada.

Os números negativos do mês passado foram puxados, principalmente, pelas demissões no setor de serviços ( 42.678) e pela indústria de transformação ( 31.102). Construção civil fechou 28.149 vagas, ao mesmo tempo em que o comércio demitiu 26.787 empregados formais. A agricultura, por motivos sazonais abriu 38.630 postos em junho.

No recorte por regiões, em junho, o Sudeste apresentou a maior redução de vagas com a perda de 47.524 postos. Em seguida, o Sul ( com 25.760) e o Nordeste ( recuo de 16.223). Entre os estados, São Paulo cortou mais vagas ( 29.915), seguido pelo Rio ( 15.748).

(*) Estagiário, sob supervisão de Eliane Oliveira


Sem CUT, centrais começam a discutir mudanças nas regras trabalhistas

Por Thiago Resende – Valor Econômico

BRASÍLIA - Centrais sindicais aceitaram negociar com o governo mudanças em regras trabalhistas. Uma postura diferente em relação à reforma da Previdência, tema em que as mesmas entidades rejeitam praticamente qualquer proposta. Representantes dos empregadores irão participar das discussões sobre as normas de trabalho apenas futuramente.

Alinhados, o ministro do Trabalho, Ronaldo Nogueira, e sindicalistas exprimem a necessidade de se aprovar um projeto de lei para regulamentar a terceirização - modelo de contrato de quase 12 milhões de brasileiros. Porém, seria num formato diferente do aprovado pela Câmara dos Deputados e que foi articulado pelo então presidente da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), em que se prevê a terceirização de todas as funções.

Nogueira informou que o governo pretende enviar um novo projeto ao Congresso Nacional - ou seja, sem aproveitar o já encampado por Cunha - para regular a situação dos terceirizados, mas impedindo essa forma de contratação para a atividade-fim, aquelas funções ligadas diretamente à atuação empresarial.

Quatro das seis centrais sindicais reconhecidas pelo governo participaram de uma longa reunião ontem no ministério. UGT, Força Sindical, Nova Central e CSB já estão dentro do grupo que, juntamente com o governo, vai costurar a proposta de reforma trabalhista. A CUT e a CTB não foram ao encontro. Preferiram esperar o resultado do processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff para tomar uma posição.

"A necessidade de atualizar a legislação trabalhista é comentada por todos, pelo próprio trabalhador. Esse grupo de trabalho é que vai decidir os termos. A nossa intenção é que até o fim do ano possamos apresentar um texto que pacifique essa relação entre capital e trabalho. Agora, se for necessário mais tempo, não tem nenhum problema. Mas o país não pode esperar muito", afirmou Nogueira, reconhecendo ser possível adiar o prazo estabelecido inicialmente.

Outros pontos a serem discutidos nos próximos meses são: medidas para combater o desemprego, extensão do Plano de Proteção do Emprego (PPE) e que convenções coletivas possam prevalecer em relação a normas legais, conhecido como negociado sobre o legislado.

"Agora, vamos nos entender melhor entre as centrais. E trazer posições consensuais para iniciar o diálogo com mais facilidade", afirmou o presidente da UGT, Ricardo Patah. Em relação ao PPE, ele defende que o plano que visa evitar demissões seja prorrogado para alguns setores, como montadoras, mas que não valha para comércio e serviços.

Secretário-geral da Força Sindical, João Carlos Gonçalves, o Juruna, também entende que o programa precisa ser aprimorado. Ele, no entanto, não faz distinção de setores da economia. Apenas sustenta que seja implementado para pequenas e médias empresas; não só para as grandes.

Sobre a priorização das negociações coletivas, o ministro declarou que a ideia é, para ter segurança jurídica, "definir na legislação quais são os pontos em que um acordo entre trabalhador e empregador terá força de lei". Apesar de ser um dos principais pontos para Temer, esse assunto deve ser o mais polêmico. A CUT, por exemplo, já se posicionou contra. Demais centrais querem buscar um consenso para que não se retire direitos trabalhistas.

Brasil, refém da CLT? - Almir Pazzianotto Pinto*

• Para voltar a crescer o País deve se livrar das raízes que o prendem ao Estado Novo

- O Estado de S. Paulo

O Brasil tornou-se refém da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). A convivência de 73 anos desgastou-se. O divórcio é inevitável. Como nas velhas famílias, a separação enfrentará dificuldades. Para ambos, porém, é melhor que cada um tome o seu caminho. A CLT se reunirá ao Código Civil de 1916 e aos Códigos de Processo Civil de 1939 e 1973, que prestaram bons serviços, mas estavam superados.

Foi redigida em 1942 por intelectuais de gabinete, para um país agrário cujo parque industrial se reduzia a médias e pequenas empresas familiares e onde escasso proletariado reivindicava simplesmente redução das horas de trabalho. Tudo se importava, de máquinas operatrizes a veículos, de ferramentas a bacias de privada, de pincel a barbeador.

Desaparelhados de informações colhidas do contato com a realidade, os integrantes da comissão elaboradora – Luiz Augusto do Rego Monteiro, José de Segadas Vianna, Dorval de Lacerda e Arnaldo Sussekind – não se acanharam: legislaram sobre tudo, das definições erradas de empregador e empregado a grupo econômico, identificação profissional, jornada de trabalho, salário mínimo, férias, higiene e segurança, operadores cinematográficos, serviço ferroviário, estiva, proteção ao trabalho da mulher e do menor, contrato individual, organização sindical, contrato coletivo, Justiça do Trabalho. Para concluir, anexaram à CLT arbitrário quadro de atividades e profissões, separando empregadores e trabalhadores em categorias econômicas e profissionais.

Bons exemplos de dispositivos que agridem a realidade são o parágrafo primeiro do artigo 2.º, que define a figura do empregador, e o parágrafo único do artigo 3.º, que traça o perfil do empregado. O primeiro equipara a empresa que objetiva lucros com “os profissionais liberais, as instituições de beneficência, as associações recreativas ou outras instituições sem fins lucrativos”; o segundo rejeita distinções relativas à espécie de emprego e à condição de trabalhador, ou entre o trabalho intelectual, técnico e manual. A CLT põe, portanto, em pé de igualdade a instituição financeira e a Fundação Hospital do Câncer, a empresa petrolífera e a Santa Casa de Misericórdia, o supermercado e a bodega, a montadora e a serralheria. Ignora que o executivo, cuja gorda remuneração mensal é complementada por milionários bônus no final do ano, é inconfundível com o peão que percebe salário mínimo.

Confinados em gabinete no Rio de Janeiro, os autores da CLT legislaram no vácuo, tomando teses eruditas como fatos comprovados, como diria Oliveira Vianna. Ignoraram que preparavam lei de alcance nacional e uniforme. Seria a mesma para capitais e lugarejos sem indústria, sem emprego, sem dinheiro, sem trabalho; bolsões de miséria à espera do milagre do desenvolvimento que até hoje não chegou.

A suposição de que se tratava de obra perfeita e definitiva levou o ministro do Trabalho Alexandre Marcondes Filho, em arroubo de vaidade e bajulação, a escrever na exposição de motivos ao presidente Vargas: “No relatório elaborado pela Comissão respectiva que corresponde a um prefácio admirável de uma obra monumental, e no qual se filia a presente exposição de motivos, encontrará Vossa Excelência minucioso e brilhante estudo de doutrinas, dos sistemas, das leis, dos regulamentos e das emendas sugeridas, comprovando que a Consolidação representa um documento resultante da intuição do gênio com que Vossa Excelência vem preparando o Brasil para uma missão universal”.

Como explicar a longevidade da CLT, obra da ditadura de 1937, sobrevivente das Constituições democráticas de 1946 e 1988? Justifica-se porque, entre 1937, 1946 e 1988 não houve ruptura, mas conciliação de interesses convergentes. Veja-se o caso de Getúlio Vargas: deposto em 29 de outubro de 1945, ficou confinado em São Borja, mas foi eleito em 2 de dezembro para a Câmara dos Deputados e para o Senado, sem fazer campanha. Seu apoio, como revela a História, foi decisivo para a eleição do general Gaspar Dutra e a derrota do brigadeiro Eduardo Gomes. Voltou à Presidência da República nas eleições de 1950, para deixar o governo pelo suicídio em agosto de 1954.

Em aparente rompimento com a ditadura, a Constituição de 1946 determinou a liberdade de associação profissional ou sindical e reconheceu o direito de greve. Por inércia do Poder Legislativo e desinteresse do Executivo, nada aconteceu. A CLT manteve-se intacta, com os dispositivos referentes à estrutura sindical fascista. Quanto ao direito de greve, foi preventivamente reprimido por decreto-lei de Dutra.

Com a Constituição de 1988 a situação piorou. Apesar de assegurar a liberdade de associação sindical, conservou o monopólio de representação, a divisão em categorias, a estrutura verticalizada, manteve a contribuição obrigatória e, de quebra, instituiu a taxa para custeio do sistema confederativo.

No plano da legislação trabalhista, Arnaldo Lopes Sussekind foi a presença dominante desde 1943. Serviu de maneira exemplar à ditadura de Vargas. Restabelecido formalmente o regime democrático, conservou o prestígio intacto. Em abril de 1964 foi nomeado ministro do Trabalho pelo Alto Comando Revolucionário, cargo que ocupou até ser designado ministro do Tribunal Superior do Trabalho, em dezembro de 1965, pelo presidente Castelo Branco. Representou o Brasil em dezenas de reuniões da Organização Internacional do Trabalho. Em 1979 presidiu comissão interministerial incumbida de apresentar projeto de atualização da CLT, da qual resultou cartapácio de 922 artigos e 24 anexos, condenado ao esquecimento por fulminante matéria da revista Veja.

Para voltar a crescer o Brasil deve se livrar das raízes que o prendem ao Estado Novo. Divorciar-se da era Vargas, começando pela revisão profunda da CLT. Ou conviver com o atraso, o subdesenvolvimento e o desemprego.
---------------------
* Almir Pazzianotto Pinto é advogado, foi ministro do Trabalho e presidente do Tribunal Superior do Trabalho

Organizar a bagunça - Merval Pereira

- O Globo

A crise econômica pode ter efeitos colaterais saudáveis. Como O GLOBO mostrou em reportagem recente, há boas indicações de que uma reforma política básica pode ser aprovada no Congresso, agora que a proibição de financiamento por empresas está em vigor e que os reflexos da retração da economia chegaram aos partidos.

Está sendo alcançado um consenso no Congresso para a aprovação de um projeto de emenda constitucional de autoria do senador Ricardo Ferraço, do PSDB, para a instituição da cláusula de barreira e o fim das coligações proporcionais. Com o apoio do presidente interino, Michel Temer, que ontem recebeu o presidente do PSDB, senador Aécio Neves, e do novo presidente da Câmara, Rodrigo Maia, a PEC pode ser aprovada.

Pelos cálculos dos especialistas, as duas medidas teriam o efeito de reduzir radicalmente o número de partidos com atuação plena no Congresso. Mesmo que não fosse proibido, o financiamento de empresas estaria comprometido pela Lava- Jato e por seus filhotes, como a Custo Brasil, que flagrou a exploração do empréstimo consignado para financiamento de campanhas de graúdos petistas, como o ex- ministro Paulo Bernardo, indiciado pela Polícia Federal.

Sem ter para onde correr, os partidos mais relevantes descobriram que a verba do Fundo Partidário não pode ser desperdiçada com siglas de aluguel. Há no Congresso, em atividade parlamentar, 28 partidos, dos 35 existentes. O Fundo Partidário deste ano aumentou de R$ 311 milhões para R$ 819 milhões, já com a finalidade de suprir deficiências financeiras previstas com a nova legislação.

Mas o que torna a lei eleitoral incentivo para criação de partidos é que todos os legalizados pelo TSE têm direito a dividir igualmente 5% desse valor, o que quer dizer que todos receberão no mínimo mais de R$ 1 milhão este ano. A redução de partidos com condições de atuar no Congresso, de 35 para 10 a 12, viria acompanhada de lei que vetaria o financiamento oficial de partidos que não tivessem a votação mínima de 2% do eleitorado, espalhados no mínimo por 14 estados.

A partir de 2022, essa exigência de desempenho passaria a ser de 3% dos votos totais, mantendo- se o mínimo de 2% em cada um de 14 estados. Bem menos do que a legislação anterior, que foi invalidada pelo STF e exigia mínimo de 5% dos votos nacionais.

Prevaleceu na decisão do STF naquela ocasião a tese de que as cláusulas de barreira impedem a pluralidade partidária e seriam maléficas à democracia, e por isso mesmo inconstitucionais. Os políticos que defendiam a adoção dessas exigências para controlar a fragmentação partidária temiam que fossem conhecidas como “cláusulas de barreira” ou de “exclusão”, pois pressentiam que a denominação poderia ser usada, como de fato foi, para classificar as regras de preconceituosas.

Cármen Lúcia, que presidirá o STF a partir de setembro, usou sempre a expressão “cláusula de exclusão”, para dizer que, já pelo nome, não gostava da ideia.

Em termos gerais, a norma estabelecia que os partidos com menos de 5% dos votos nacionais não poderiam indicar titulares para as comissões, não teriam direito à liderança ou cargos na Mesa Diretora, bem como perderiam recursos do Fundo e ficariam com tempo restrito de propaganda eleitoral em rede nacional de rádio e televisão.

O parágrafo 7 º da proposição, diz Ferraço, expressamente garante aos eleitos por siglas que não alcançarem o funcionamento parlamentar o direito de participar de todos os atos inerentes ao exercício do mandato.

Na proposta atual do senador Ricardo Ferraço, os partidos que não atingirem o mínimo de votos poderão exercer todas as atividades parlamentares, menos receber o Fundo Partidário e o tempo de propaganda eleitoral gratuita, e seus representantes não poderão propor matérias constitucionais.

Os parlamentares de siglas sem a votação exigida poderão, se quiserem, trocar de legenda sem perder o mandato, mas não levam tempo de TV nem Fundo proporcional à votação. Os demais têm de permanecer nas siglas que os elegeram, pelo menos no mandato.

São medidas que ainda poderão ser mudadas no Congresso, mas que darão nova dinâmica à atuação parlamentar, tornando- a mais coerente com programas e projetos partidários.

Sonho de uma noite de inverno - José Roberto de Toledo

- O Estado de S. Paulo

Renunciar ele não vai. Nem ela. Restaria, assim, só a cassação da chapa Dilma/Temer pela Justiça para que houvesse nova eleição – a preferência da maioria absoluta da população, segundo todas as pesquisas. Apesar de reiterados indícios de irregularidades no financiamento e na prestação de contas da campanha eleitoral da dupla em 2014, não parece que o processo andará no Tribunal Superior Eleitoral este ano. Sobra, portanto, a hipótese de um presidente biônico eleito por um redivivo colégio eleitoral.

Como se sabe, se o cargo ficar vago depois de ultrapassada a metade do mandato presidencial, cabe a um mistão de deputados e senadores escolher o novo presidente. É um sonho para os congressistas, capaz de umedecer o mais árido dos invernos brasilienses. Se para manter Michel Temer no poder eles já conseguiram nomear quase todo o Ministério, com os respectivos cargos de segundo e terceiro escalão, imagine-se quais façanhas não alcançariam se pudessem renegociar seus votos com o biônico?

Seria o parlamentarismo de fato, pouco importa o direito. A farra de nomeações, emendas ao Orçamento e indicações de fornecedores bateria recordes olímpicos – um salto triplo na contabilidade política e eleitoral de deputados e senadores. Seria também um tiro ao alvo mortal para as medidas de combate à corrupção, como a criminalização do caixa 2, a responsabilização dos partidos políticos por seus malfeitos e o confisco da grana proveniente dessas atividades ilícitas.

Por ora, é apenas o sonho de uma noite de inverno brasiliense. O TSE não demonstra pressa em julgar as contas da chapa Dilma/Temer. O mercado financeiro torce e trabalha pelo futuro ex-vice, junto com boa parte do empresariado. Tem Olimpíada, julgamento do impeachment de Dilma Rousseff no Senado e eleição municipal a congestionar o calendário. O colégio eleitoral não está nem sequer em pauta. Mas pode vir a estar.

Vai depender, como sempre, da economia – e de seus obscuros ou brilhantes reflexos na popularidade do presidente. Decepção ou satisfação do público são resultantes opostas de uma mesma conta: realização menos expectativa. Quanto mais se espera de um governante, mais difícil é para ele atender às demandas da população e alcançar um saldo positivo na equação da popularidade. É o que acontece com a maioria dos eleitos.

A disputa eleitoral eleva a esperança e aumenta a cobrança sobre o vencedor. Mas, quando o presidente é um vice que muita gente nem sequer sabia o nome, a expectativa é baixa. A maioria não sabe bem o que esperar, o que acaba se transformando em um período de “deixa estar para ver como é que fica”.

É o que aconteceu com Temer: a desinformação produziu baixa expectativa, o que garantiu um período de carência para o presidente interino. Por menos que faz, dificilmente fica aquém do que se espera dele – já que não se esperava nada. É o contrário do que ocorreu com Dilma, cujo eleitorado esperava tudo, menos o que ela tentou fazer depois de reeleita.

Há sinais, todavia, de que a carência de Temer pode estar vencendo. A pesquisa de julho do instituto Ipsos sobre o desempenho do interino mostrou um crescimento de 43% para 48% na taxa de ruim e péssimo, em comparação ao mês anterior. O aumento se deu às custas da queda do “não sabe e não respondeu”. Também houve queda no apoio ao impeachment de Dilma, de 54% para 48%.

São poucos pontos porcentuais de diferença e poucas pesquisas para se fazer projeções. É preciso pelo menos quatro pontos na curva, com oscilações sempre na mesma direção, para caracterizar uma tendência. Ou seja: só em setembro vai se tirar a prova. Até lá, já terão passado Olimpíada e impeachment. Temer não terá mais desculpas para deixar de entregar resultados. O TSE poderá, então, se ver apressado. E os congressistas? Sonhando molhado.

Sistema político em maus lençóis - Sérgio Eduardo Ferraz

- Folha de S. Paulo

A crise política atual faz pensar em como lidamos com conflitos desde a independência do país, há quase 200 anos. A política brasileira nunca teve longos períodos de estabilidade institucional.

A imagem de um império plácido, fiado nas barbas de dom Pedro 2º, não resiste a um exame histórico mais minucioso do período, marcado por décadas de enfrentamento, inclusive armados. Nos 49 anos de duração do segundo reinado (1840-1889), tivemos 37 gabinetes (conjunto de ministros de Estado), um a cada 14 ou 15 meses.

A República Velha (1889-1930) estabilizou o sistema à custa da oligarquização dos Estados. A Revolução de 1930, uma ruptura chefiada por um dos atores da oligarquia precedente, o gaúcho Getúlio Vargas, vai descambar na ditadura do Estado Novo (1937-1945).

O intervalo democrático de 1945 a 1964, vivido com a Guerra Fria ao fundo e o desapreço generalizado pelas regras democráticas, termina em duradoura intervenção militar.

A estabilidade, com competição e pluralismo, é exceção. Talvez 1994-2013, um arco que vai da criação do real às manifestações de junho, tenha sido um raro intervalo. O que levou à metamorfose rumo ao atual "salve-se quem puder"? Fatores estruturais ou conjunturais?

Uma conjunção dessas duas dimensões. Provavelmente, a crise não explodiria, em modo cataclísmico, sem o fim do ciclo das commodities, que encerrou a fase de crescimento e distribuição da renda. Nem sem os erros do primeiro mandato de Dilma Rousseff, que desorganizaram de vez a economia e o equilíbrio fiscal e conduziram ao "estelionato" na virada para o segundo mandato, alienando à presidente o apoio da maioria de seus eleitores.

Também não estaríamos nesse quiproquó sem a inépcia política da presidente afastada, sua tendência ao insulamento tecnocrático, refratário à negociação com a sociedade.

Dificilmente a confusão atingiria a escala alcançada sem que surgisse no Congresso a figura do deputado Eduardo Cunha. Além de romper com o governo e forjar agenda independente, de viés conservador, implodindo umas das condições cruciais do presidencialismo de coalizão (a tabelinha entre o Planalto e as chefias do Congresso), ofertou cérebro a um imenso baixo clero.

Por óbvio, as dificuldades não teriam se tornado agudas sem a Lava Jato e seus desdobramentos. Mas a operação, para se tornar inteligível, requer observação de duas dimensões estruturais inscritas no sistema político brasileiro.

O primeiro aspecto é o modo de financiamento de partidos e políticos, responsável pelo completo descontrole da influência do poder econômico sobre a conquista de mandatos. O acesso aos contratos públicos, por meios ilegais, foi a moeda de troca nesse sistema de dominância do dinheiro nas eleições.

Ao longo de décadas, isso alterou a paisagem da competição política e de sua "fauna", criando um viés favorável àqueles políticos capazes, por quaisquer vias, de levantar grandes somas e colocar seus mandatos a serviço dos financiadores.

O chamado "centrão" e os partidos especializados na venda de apoio parlamentar têm tudo a ver com essa situação.

O outro aspecto estrutural foi o amadurecimento, a partir de 1988, dos sistemas de controles, centrados no Ministério Público e no Judiciário, mas também em órgãos internos ao Executivo (Polícia Federal, Controladoria Geral da União etc.), com forte "ethos" de independência e domínio de recursos de poder.

As dimensões estruturais do sistema eram como transatlânticos navegando em potencial rota de colisão. A emergência dos fatores contingentes fez com que o embate se consumasse. A crise resulta de sucessivas ondas sísmicas de choque decorrentes do abalroamento que segue seu curso. Os escombros já estão a nossa volta.

Se os órgãos judiciais e de controle continuarem com a mão dominante, todo o sistema partidário desmoronará, incapaz de resistir ao desvelamento de suas práticas ilícitas de levantar recursos.

Como não constam na agenda do país -nem nos anos petistas nem agora- alterações das estruturas que permitiram a captura das elites políticas pelo poder econômico, novas eleições trarão material igual ou ainda mais degradado. Não se sabe se em algum momento esse "material" não logrará engolfar, em revanche, o próprio sistema de controle. Antes, portanto, de vislumbrar a luz, a escuridão talvez se adense.

Por poucas que sejam as possibilidades imediatas de efetivação, são cruciais as reformas que enfrentem a relação promíscua da atividade política com o dinheiro. Sem isso, os 20 anos dourados de estabilidade recente (1994-2013) restarão mesmo como exceção -ou como nostalgia em um perigoso cotidiano de decepção com a política.
---------------------
Sérgio Eduardo Ferraz, 52, é doutor em ciência política pela USP e auditor do Tesouro da Secretaria da Fazenda de Pernambuco

Dilma pensa no dia seguinte - Luiz Carlos Azedo

• A presidente afastada tenta se livrar da responsabilidade sobre a denúncia de caixa dois na sua campanha e diz que o problema é do PT

- Correio Braziliense

Um famoso revolucionário dizia que recuar em ordem mais difícil do que avançar, pois exige muito além de coragem e audácia, mas sangue-frio, cálculo, organização, disciplina, capacidade de comando, avaliação correta da correlação de forças, para a retirada não virar uma debandada, o completo desastre. Esse parece ser o desafio posto para a presidente Dilma Rousseff, que prepara sua retirada definitiva do poder e despacha para Porto Alegre, a cada viagem, uma parte de seus pertences pessoais.

Depois da derrota do “Não vai ter golpe”, a palavra de ordem que empolgou a militância petista, sepultada já na aprovação do pedido de impeachment pela Câmara; e do esvaziamento do “Fora Temer”, que embalou a saída de Dilma Rousseff do Palácio do Planalto e a resistência dos petistas nos ministérios, já não restam muitas esperanças de impedir a aprovação definitiva do impeachment pelo Senado e voltar ao poder.

O embargo de uma decisão dos senadores — a contagem regressiva já começou — é a mais remota das possibilidades no Supremo Tribunal Federal (STF), ainda que a tese do “golpe parlamentar”, o eixo da defesa de Dilma, continue sendo propagada aos quatro ventos pelo PT e aliados. O julgamento do impeachment pelo “tribunal internacional” armado para condenar o golpe, formado por juristas indicados pelos partidos aliados do PT no exterior, foi apenas um ato de repercussão. Não tem a menor legitimidade nos fóruns internacionais dos quais o Brasil participa.

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva já desencanou do impeachment e foi cuidar da sua vida, numa estratégia para segurar a sua base eleitoral mais resistente, principalmente no Nordeste, e se manter como alternativa de poder em 2018. O PT finge que luta pela volta de Dilma, a ponto de o senador Cristovam Buarque (PPS-DF), olimpicamente, afirmar que ainda não decidiu seu voto, mas acredita que, em caso de votação, secreta até o PT votaria pelo impeachment. Pura ironia: ele traduz o que os parlamentares petistas dizem à boca pequena, ou seja, para a sobrevivência da legenda é melhor ter o presidente interino, Michel Temer, como inimigo, e a tese do golpe parlamentar como o discurso do que ter que defender Dilma até o fim do mandato.

Mas voltemos à retirada. O problema de Dilma é o seu “day after”, ou seja, o dia seguinte após deixar o Palácio da Alvorada. Explica-se: com mandato cassado, perderá as prerrogativas de foro e imunidades de presidente da República, entre as quais a de não ser investigada por fatos anteriores ao exercício do mandato. Toda a estratégia de defesa de Dilma é blindada por esse dispositivo, pois até mesmo o que aconteceu entre 2010 e 2014, seu primeiro mandato, está fora de consideração no julgamento do impeachment. Ocorre que a aprovação de Dilma e a cassação de seu mandato pelo Senado, por crime de responsabilidade, ainda que polêmica, abrir-lhe-á as portas do inferno da Operação Lava-Jato, em Curitiba.

Caixa dois
É por isso que Dilma tenta se livrar da responsabilidade sobre a denúncia de caixa dois na sua campanha de 2010 e diz que o problema é do PT. Como se sabe, o publicitário João Santana e sua mulher e sócia, Mônica Moura, na semana passada, disseram que receberam US$ 4,5 milhões recebidos em uma conta na Suíça, tendo como origem o caixa dois da campanha de Dilma. O casal foi interrogado pelo juiz Sérgio Moro, responsável pelos processos da Operação Lava-Jato na primeira instância.

Argumenta Dilma: “Se ele recebeu US$ 4,5 milhões, não foi da organização da minha campanha, porque ele diz que recebeu isso em 2013. A campanha começa em 2010 e, até o fim do ano, antes da diplomação, ela é encerrada. Tudo que ficou pendente sobre pagamentos da campanha passa a ser responsabilidade do partido. Minha campanha não tem a menor responsabilidade”. Dilma é quem mandava na sua campanha e não o presidente do PT, Rui Falcão, cujo nome não apareceu em nenhuma delação premiada até agora.

Para complicar a vida de Dilma, o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Gilmar Mendes, encaminhou para o ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal, relator do caso, novos detalhes sobre a empresa DCO Informática, contratada para disparar mensagens para celulares via WhatsApp durante a campanha. A empresa tem sede na cidade mineira de Uberlândia e recebeu R$ 4,8 milhões pelo serviço, em quatro repasses feitos ao longo de uma semana em outubro de 2014. A empresa não tem identificação na fachada e funciona como residência. O avanço das investigações sobre a campanha de Dilma desconstrói o discurso do golpe.

O risco Paulinho no mercado de seguros - Maria Cristina Fernandes

• Susep expõe duas rachaduras no edifício da legitimidade

- Valor Econômico

A entrega da Superintendência de Seguros Privados (Susep) ao SD, do deputado Paulo Pereira da Silva (SP), expõe duas rachaduras nos pilares com os quais o governo Michel Temer tenta erguer o edifício de sua legitimidade.

O primeiro é o de que a gestão pública seria blindada das barganhas partidárias. Depois de um ano e meio nas mãos de um professor universitário cuja atuação como consultor o aproximou do mercado de seguradoras, a Susep voltou para as mãos do grupo de corretores de seguro que chegou ao cargo no segundo governo Luiz Inácio Lula da Silva. Antes de se abrigar no SD, este grupo passou por PTB, PSD, e é chefiado por um ex-deputado federal que disputou o governo de Goiás como vice do PMDB e hoje preside a federação nacional da categoria.

A troca, no entanto, é mais do que um capítulo na guerra entre seguradoras e corretores de seguro. Acontece num momento de grande efervescência no mercado de seguro-garantia, aquele que, se funcionasse a contento, poderia ter evitado o espetáculo do superfaturamento de obras das últimas décadas. O setor acompanhou o boom das grandes obras com sucessivos anos de crescimento acima de 20%. Graças às fluidas relações do contratante (Estado) com os contratados (empreiteiras), o seguro-garantia se tornou um mercado de terrenos na lua - de contratação obrigatória e baixíssima sinistralidade (frequência com a qual é acionado). O lastro desse mercado sempre foi a certeza de que obras atrasadas e mal feitas sempre contariam com o beneplácito de aditivos capazes de multiplicar o valor dos contratos sob a cumplicidade de agentes públicos.

Com a Lava-Jato, o lastro se rompeu e o setor passou a ser chamado a comparecer. Ainda que a cobertura de grande parte dos contratos não ultrapasse 10%, o aumento na sinistralidade colaborou para o mais amplo momento de internacionalização das carteiras de seguro-garantia dos grandes bancos.

A captura da superintendência dos seguros pelos aliados de Paulinho da Força acontece ainda no momento em que as grandes empreiteiras envolvidas na Operação Lava-Jato, em meio à interminável novela das delações premiadas e acordos de leniência, obtêm, da Advocacia-Geral da União, parecer favorável para que voltem a contratar créditos junto ao BNDES.

A entrada de estrangeiros chacoalha a antiga sociedade entre o seguro-garantia e o espetáculo do superfaturamento, mas não é suficiente para fazer com que o setor cumpra a eficácia e a função social dos contratos.

As delações premiadas têm sido pródigas em atestar que a corrupção de obras públicas no Brasil é tão antiga quanto a Serra da Mantiqueira. Tese de doutorado do advogado Ernesto Tzirulnik, publicada em forma de livro no ano passado ("Seguro de risco de engenharia: instrumento do desenvolvimento, Editora Roncarati), mostra que se a corrupção é antiga, nem sempre a indústria de seguros foi sua sócia majoritária.

Foi a partir da década de 1990 que Tzirulnik avalia que o setor deixou de prover um instrumento de proteção dos segurados para produzir uma commodity que atendesse aos interesses das seguradoras e daquelas que pulverizam seu risco e garantem a execução de seus contratos, as resseguradoras, nacionais e estrangeiras.

Até aquele momento, a maior obra de engenharia do país, Itaipu, que entrou em funcionamento em 1984, celebrou uma apólice-modelo, sob os auspícios dos governos brasileiro e paraguaio, de seguradoras de ambos os países e do Instituto de Resseguros do Brasil (IRB).

Um sinal de que o vento tinha começado a virar veio com o Plano Collor, de 1990, quando uma circular da Susep mandou que segurados fossem indenizados com títulos da dívida pública. A maior mudança regulatória no setor, no entanto viria com a privatização do IRB, no governo Luiz Inácio Lula da Silva. O então presidente do instituto, Lídio Duarte, sob pressão do PTB, que lhe cobrava mesada, e da campanha pela privatização, saiu atirando: "Se o governo deixar uma empresa estrangeira comprá-lo, será como entregar a Embraer para a Bombardier."

A quebra do monopólio e a privatização dividiu os grandes bancos brasileiros que tinham ações do IRB e negociaram com o governo uma abertura da qual participassem como acionistas, o que acabaria acontecendo. Com a privatização, a Susep assumiu, parcialmente, funções exercidas pelo IRB. Mas o que se viu não foi exatamente uma regulação que viesse a garantir que seguradoras acompanhassem as obras para evitar aditivos e garantir que prazos e especificações fossem seguidas.

Por medida provisória de 2012, foi criada a Agência Brasileira de Gestora de Fundos e Garantias (ABGF). Provida de um fundo garantidor de investimentos em infraestrutura, essa agência passou a ser acusada, pelas seguradoras, de pretender competir no seu mercado, a despeito de uma dotação que não ultrapassava R$ 50 milhões.

Com a mudança de governo, a capitalização do fundo, a despeito do ajuste fiscal, foi multiplicada por dez e pode vir a chegar a R$ 2 bilhões até 2018. Apesar disso, o discurso, no mercado, em relação a este fundo, mudou. Passou a ser bem-vindo para garantir a cobertura de riscos ambientais ou "políticos", como aqueles decorrentes de medidas governamentais que alterem condições do mercado.

O fundo pode vir a ser paulatinamente capitalizado para arcar com riscos pouco atrativos para as seguradoras privadas. A entrada do BNDES no mercado, abertamente considerada pela nova diretoria do banco, também pode vir a aumentar a participação estatal nesse mercado.

O projeto de lei que tramita no Senado propõe aumentar a cobertura do seguro-garantia para 30% do valor da obra. A medida, que encarece o seguro, sempre enfrentou resistência de empreiteiras. O projeto é relatado por um senador envolvido até a medula na Lava-Jato. As aparas desta regulamentação, que congrega maior participação estatal num mercado historicamente resistente ao risco, são a tarefa entregue aos correligionários de Paulo Pereira da Silva.

A falta que nos faz o patriotismo - Carlos Alberto Sardenberg

• Faz sentido subir salários dos funcionários mais bem pagos do país neste momento, em que o setor público está quebrado?

- O Globo

Depois de alguma resistência, o governo Temer capitulou e resolveu mandar ao Congresso Nacional projeto de lei que reajusta os vencimentos dos auditores da Receita e agentes da Polícia Federal. Oficialmente, ministros disseram que os acordos já haviam sido negociados com o governo anterior, que se trata apenas de uma reposição da inflação etc.

Tudo desculpa — e que não pegou, aliás. Todo mundo sabe que o governo ficou com medo de uma greve ou do corpo mole ou da tal operação padrão daquelas duas categorias. Um medo compreensível. Auditores e policiais federais podem paralisar os aeroportos ou, mesmo sem greve, impor uma confusão embaraçosa no momento em que começam a chegar atletas e turistas da Olimpíada.

Em termos diretos: aquelas categorias simplesmente aproveitaram o momento para colocar a faca no pescoço do governo.

É verdade que todo trabalhador tem o direito de lutar pelo seu salário, indo até a greve. Mas há muita desigualdade entre os trabalhadores do setor público e do privado. O que indica que deveria haver diferenças nos direitos e deveres de cada grupo.

Em números: o salário médio do trabalhador brasileiro foi de R$ 1.982 em maio último, uma perda de R$ 55 em relação ao mesmo mês do ano passado. Tudo em termos reais, já descontada a inflação. No mesmo período, o desemprego subiu de 8,1% para 11,2% — ou 11,4 milhões de brasileiros que querem trabalhar e não encontram vaga.

Não há desemprego no setor público. Funcionários têm estabilidade. E todas as categorias que receberam reajustes recentes, ou estão para receber, têm salários maiores do que aqueles R$ 1.982 do trabalhador médio.

Na Polícia Federal, o salario inicial mais baixo, de agente administrativo, sem curso superior, é de R$ 4.000 — o dobro do rendimento médio no país. Já o policial, com diploma superior, começa com R$ 9.132. Para delegados, com exigência de diploma de Direito, a carreira começa com R$ 17.288 — o equivalente a nove meses de salário do trabalhador médio.

E isso antes dos aumentos agora propostos. Aliás, com o novo reajuste, o vencimento básico do auditor da Receita, sem os benefícios pessoais, saltará de R$ 15 mil para R$ 19 mil — ou dez vezes o salário real médio pago em maio último.

Não há qualquer dúvida sobre a importância da Polícia Federal e da Receita. Se não fosse pelo conjunto da obra, o que os funcionários dessas duas instituições fizeram na LavaJato já garantiria um diploma de competência.

Mas, francamente, faz sentido elevar os salários dos funcionários mais bem pagos do país neste momento de crise econômica, em que o setor público está literalmente quebrado? O maior problema do país é o déficit nas contas públicas. De novo, está correto alargar esse déficit com salários de um funcionalismo que ganha muito, mas muito mais que os demais?

Está correto, dizem lideranças sindicais dos auditores fiscais. Seu argumento: o trabalho de fiscalizar receitas e arrecadar impostos é o mais importante de todos, simplesmente porque o governo não funcionaria sem dinheiro.

Parece razoável, mas não tem cabimento. Pensem pelo avesso: se o SUS tivesse muito dinheiro mas não contasse com os médicos nos seus hospitais, o governo também não estaria funcionando — e num setor crucial.

Então, qual a função mais importante, a do auditor que recolhe o dinheiro ou do médico que salva vidas?

O absurdo da pergunta mostra que essa questão não tem sentido. Há no Estado atividades fim e atividades meio, isso compondo o conjunto do serviço público.

Claro que deve haver diferenças salariais, conforme a função, a carga de trabalho, formação, mérito e produtividade. Mas não é isso que acontece no Brasil.

Os salários maiores vão para as categorias que estão mais perto do centro do poder — como funcionários do Congresso — e que têm maior capacidade de pressão. Os salários caem quanto mais o funcionário está perto do público- cliente, como o médico no pronto- socorro.

E por falar nisso: a carreira de funcionário público exige ou deveria exigir um sentido de serviço público. Seria demais pedir algum patriotismo?

Algo assim: bom pessoal, vamos fazer uma Olimpíada de primeira, trabalhar mais que o exigido, dar o sangue para mostrar um país com um serviço público de qualidade — e depois vamos discutir salários.

É verdade que, diante da lambança feita pelos dirigentes políticos, fica difícil pedir patriotismo e sentimento de dever. Mas o que queremos? Um vale- tudo, cada um por si?

Convém lembrar: o povo brasileiro, aquele trabalhador médio, que rala todo dia, o sujeito que financia o governo pagando impostos eé o cliente final do serviço público, essa gente não é igual aos ladrões da Lava- Jato.

E querem saber? Há servidores de verdade, tanto funcionários de carreira quanto profissionais do setor privado que vão para o governo cumprir uma missão. Que apareçam mais.
----------------
Carlos Alberto Sardenberg é jornalista