domingo, 27 de junho de 2010

Reflexão do dia – Roberto Romano



O governo atual é inimigo da livre expressão do pensamento. Para salvar as aparências na ordem externa, aumentando o número de votos em plano interno, seus adjuntos e aliados pregam o "controle social da imprensa". Tal prática, sob o disfarce da vontade coletiva, herda a pior razão de Estado moderna, a fascista.


Roberto Romano, no artigo, A razão nanica de Estado, hoje, em O Estado de S. Paulo)

A arte de enganar :: Ferreira Gullar

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Vejo Lula como o oposto de tudo o que seu partido prometia trazer à vida política brasileira

ÉTICA NA política é coisa rara, qualquer que seja o partido. É surpreendente, no entanto, que o partido que nasceu empunhando a ética como bandeira tenha se tornado a expressão da antiética. Certamente, haverá, no próprio PT, exemplos louváveis de políticos que não se deixam seduzir, seja pela esperteza, seja corrupção, mas não são estes que dão as ordens na equipe do presidente Lula.

Não quero cometer injustiças mas, se não é mera impressão minha, vejo o presidente Lula como o oposto de tudo o que seu partido prometia trazer à vida política brasileira. Posso estar enganado, mas, se bem o percebo, ele, com a sua esperteza sindicalista, induz os que atuam sob seu comando a pôr de lado todo e qualquer escrúpulo: manipulam informações, falseiam a verdade dos fatos, forjam dossiês com falsas acusações, acusam vítimas de os estarem caluniando. Esses são alguns dos procedimentos comuns ao governo do atual presidente.

Os exemplos não faltam. Todos sabem que um dos objetivos de Lula, no plano internacional, é conseguir, para o Brasil, um lugar permanente no Conselho de Segurança da ONU. Em face de sua desastrada aliança com Ahmadnejad, de que resultou o isolamento do país, uma repórter perguntou ao ministro Celso Amorim se esse isolamento não inviabilizaria aquela pretensão do governo brasileiro.

A resposta dele não foi própria à de um ministro de Estado, que tem a obrigação de prestar contas à opinião pública. Disse ele: "É engraçado, os que consideravam tolice do governo pretender um lugar no Conselho de Segurança, agora lamentam a possibilidade de o perdermos". Ora, não importa o que certas pessoas pensavam da pretensão do governo; importa, sim, que o governo pretendia alcançar aquele objetivo e o inviabilizou por se ter aliado a uma ditadura belicista. Admiti-lo seria aceitar que errara e Lula, claro, não erra...

Mas assim é esse governo, só assume como coisa sua o que lhe dê prestígio, ainda que sua não seja, como no caso da defesa do meio ambiente. Alguém já viu, no plano internacional, uma comédia semelhante à representada por Lula e Dilma durante a reunião do clima em Copenhague?

O país todo sabe que Marina Silva deixou o Ministério do Meio Ambiente porque Dilma, então ministra da Casa Civil, seguindo as ordens de Lula, impunha a aprovação, a toque de caixa, dos projetos do PAC, ainda que atentassem contra a preservação do meio ambiente. No entanto, em Copenhague, ambos, apareceram como defensores da preservação ambiental. O tema é tão distante das preocupações de Dilma que ela, num ato falho, soltou uma frase reveladora do que realmente pensa da ecologia.

Nesse terreno da farsa descarada, um dos últimos episódios foi o do novo dossiê que o PT preparava para caluniar o candidato José Serra, mais um dentre outros, como aquele que foi escandalosamente flagrado num quarto de hotel, em São Paulo, quando a polícia apreendeu, em mãos de uma quadrilha petista, uma montanha de dinheiro. Em face de tão incontestável flagrante, Lula imediatamente chamou os responsáveis pela falcatrua de "aloprados", ou seja, tendo de admitir que era gente sua, tratou de desqualificá-los, como se agissem por conta própria. Como sempre, ele e seu partido nunca sabem de nada, desde que vire escândalo.

Surgiu, recentemente, outro dossiê e, de novo, contra Serra. Um dos convidados a armar a falcatrua abriu a boca e a denunciou, voltando a confirmar a denúncia numa CPI da Câmara de Deputados. A reação de Lula e seu partido não podia ser outra: afirmam que o dossiê foi inventado para acusar o PT e, assim, mais uma vez, o vilão se torna vítima e a vítima, vilão.

Um exemplo, para concluir. A equipe econômica do governo afirmara que, se aprovado pelo Congresso, o aumento de 7,7% para os aposentados comprometeria o equilíbrio orçamentário do país.

Mas Lula, que só pensa na eleição de Dilma, contrariando a opinião de seus ministros, sancionou o aumento e alegou: "Não é isso que vai levar o país à bancarrota". Só que ninguém afirmara tal coisa.

Como sempre, ele responde a uma afirmação que ninguém fez, para escamotear a verdade. A verdade é que esse aumento eleitoreiro agrava o déficit da Previdência, que já chega a R$ 50 bilhões.

À disposição das consequências:: Wilson Figueiredo

DEU NO JORNAL DO BRASIL

O Brasil está hoje – e não se sabe até quando – à disposição das consequências cujas causas históricas já perdeu de vista ou preferiu esquecer.

Falta ajustar a nova visão do nacionalismo e reservar ao Estado atribuições econômicas intransferíveis, cuja oportunidade historicamente correta se deu sob os dois mandatos social-democratas. O presidente Lula, com o PT para servi-lo em alguns serviços especializados, não deu continuidade ao tipo de reformas que não passam de jogo de aparência, mas não se lembrou das outras que são passadas adiante pela metade. Lula cortou a conversa, fez o que quis e o que não quis, ao optar pela via constitucional e fechar a via socialista por mau estado de conservação. O presidente vai dar uma volta completa em torno do mandato emprestado e, enquanto isso, cantará de galo republicano. Seu antecessor deixou aberto o precedente de utilizar as grandes reformas na função de bode do mujique para exasperar as reclamações da família e aceitar o desconforto normal com a alternativa.

Lula nem precisou de tanto: aprendeu que reformas valem mais como ameaça do que pelo resultado.A palavra que saiu de moda, por tempo imprevisível, foi revolução. Mas se dispõe ao recall.

Candidato a lugar de destaque, Lula sempre será daqui para a frente.

Nem na tentativa de continuar por outros meios (consulta plebiscitária para o eleitor dar a última palavra), o presidente se valeu do cacoete revolucionário em torno da qual se organizou o PT e em cujo centro Lula pontificou, mas nem mais se lembrava quando chegou ao poder. Trocou três insucessos eleitorais e um programa radical intacto por uma carta ao povo brasileiro, que poucos leram e da qual nem se lembra. Era uma renúncia de ordem prática, e não tática.

A sequência histórica da qual ele e o PT são a última consequência – a desmontagem da oligarquia republicana, passando pelos quatro anos de governo provisório, o protesto armado por São Paulo em 1932, a eleição da Constituinte em 1933 e a promulgação de Constituição de 1934, a campanha presidencial e o golpe de 10 de novembro de 1937, o Estado Novo e a retomada da via constitucional em 1945, as tensões políticas das sucessões presidenciais, a asfixia golpista de Getulio Vargas, a renúncia de Jânio, o parlamentarismo, a bipolarização sob João Goulart, o golpe militar de 64, a falta de autenticidade da eleições indiretas, o esgotamento dos governos militares, a saída eminentemente política da ditadura – pode ser considerada o delta de um sinuoso processo. Teve mais de último ato do longo processo histórico do que o início de algo realmente novo. A ver.

Lula fez o que quis e o que não quis, ao optar pela via constitucional e fechar a socialista


Wilson Figueiredo escreve nesta coluna aos domingos e terças-feiras.

A razão nanica de Estado :: Roberto Romano

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

O governo brasileiro assumiu uma prática antiga na ordem internacional. Trata-se da razão de Estado. Na Europa, na Ásia e nos Estados Unidos da América é muito clara essa forma de pensar e agir. O Brasil, por sua vez, viveu sob a razão de Estado como súdito de Portugal, depois num Império conservador e duas ditaduras. Sem potência militar ou econômica para atingir os seus interesses, o País seguiu regras alheias e alvos idem. Agora o Itamaraty executa planos heterodoxos, sobretudo no campo dos direitos humanos. Prisioneira de regimes como os de Cuba, Irã, Zimbábue, Coreia do Norte e de outros países que violam estatutos civis, a Realpolitik brasileira se justifica pela suposta eficácia geopolítica ou econômica. Em Honduras, quando quebrou normas diplomáticas, interferindo nos assuntos internos do país, e no episódio iraniano, ao apoiar um dirigente antissemita, perdeu o Brasil. O recuo no acordo com a ditadura do Irã mostra a imprudência de nossa Chancelaria. Tais desastres mostram uma razão de Estado bisonha, mas, como as suas primas sérias, afeita à dissimulação.

A razão de Estado surgiu no Renascimento e significa o recurso da força e da astúcia a serviço do poder político. O seu ápice se encontra no absolutismo. Neste último, o governante foi posto acima das instituições. Contra tal arbítrio surge a democracia moderna na Inglaterra (século 17), nos Estados Unidos e na França (século 18). Os governos e os legisladores, mesmo os juízes, passam a integrar o corpo cidadão e jamais devem colocar-se fora dele. Assim, é exigido de todos os que operam no espaço público o compromisso com a verdade (daí o livre exame e a imprensa sem peias), a dita "accountability".

Fé pública e verdade garantem, nas democracias, os deveres, as leis, os contratos. As sociedades livres não podem existir sem a verdade. Nelas o segredo e a dissimulação devem ser atenuados.

A mentira e similares ameaçam o coletivo, pois corrompem o juízo e as condutas. Nada é garantido no campo democrático, que, segundo Norbert Lenoir, "é menos um regime que duraria por suas próprias forças, em virtude de seus princípios constitucionais, do que uma dinâmica: dinâmica de uma extensão dos direitos e generalização dos direitos fundamentais, resistência à concentração do poder que pode favorecer uma oligarquia reinante em nome do povo" (Democracia e Espaço Público). Quando partidos ou líderes são postos acima ou fora da ordem constitucional, surge a tutela arbitrária exercida contra o povo, impera a razão de Estado.


Esta é sinônimo de segredo e de espionagem. O pensamento democrático é oposto ao segredo. A publicidade é "a lei mais apropriada para garantir a confiança pública, sendo a causa de seu avanço constante rumo ao fim de sua instituição". Ademais, o segredo "é instrumento de conspiração; ele não deve, portanto, ser o sistema de um governo normal" (Bentham, Of Publicity). Segundo Georg Simmel, "toda democracia considera a publicidade como intrinsecamente desejável, seguindo a premissa fundamental de que todas as pessoas deveriam conhecer os eventos e circunstâncias que lhes interessam, visto que esta é a condição sem a qual elas não podem contribuir nas decisões sobre elas mesmas". Procedimentos secretos são corrigidos pela publicidade, ou seja, pela imprensa.

O governo atual é inimigo da livre expressão do pensamento. Para salvar as aparências na ordem externa, aumentando o número de votos em plano interno, seus adjuntos e aliados pregam o "controle social da imprensa". Tal prática, sob o disfarce da vontade coletiva, herda a pior razão de Estado moderna, a fascista.

No tema, basta citar Carl Schmitt - acarinhado pela esquerda, depois de ser oráculo da direita mundial - e seu pensamento sobre o controle político. O jurista alemão afirma que, no mister de formar a opinião pública, a imprensa estaria prestes a ser destronada pelo audiovisual. A mídia ameaçaria o Estado na tarefa de moldar o pensamento coletivo. Assim, pensa Schmitt, o Estado deve ter controle direto ou indireto daquelas técnicas, usando-as para propaganda. "Não existe ainda", acrescenta Schmitt, "um Estado tão liberal que não tenha reivindicado em seu proveito pelo menos uma censura intensiva e um controle sobre filmes e imagens, e sobre o rádio. Nenhum Estado pode permitir deixar a um adversário os novos meios técnicos de dominação das massas, sugestão das massas e formação da opinião pública." O Estado total, segundo Schmitt, controla a comunicação. Assim, "os novos meios técnicos pertencem exclusivamente ao Estado e servem para o aumento de sua potência". O Estado novo "não deixa surgir em seu interior forças inimigas que o obstruam ou desagreguem. Ele não deixa que seus inimigos disponham de meios técnicos, sapando sua potência por um slogan qualquer como Estado de Direito, liberalismo ou um nome outro. Ele sabe distinguir entre amigo e inimigo. (...) Sempre foi assim e a novidade reside apenas nos meios técnicos, cuja importância política deve ser levada em conta" (citado por Olivier Beaud: Les derniers jours de Weimar. Carl Schmitt face à l"avènement du nazisme).

A razão nanica de Estado espiona cidadãos e censura a imprensa. É o "controle social"... Daí o costume de armar denúncias, os supostos dossiês, a quebra ilegal dos sigilos bancários. Recordemos o ataque covarde de agentes públicos a Francenildo Santos Costa, o dossiê dos aloprados, o dossiê contra Ruth Cardoso e, agora, os papéis contra Eduardo Jorge. Certa parcela da ordem política brasileira recorda a bonequinha matrioshka: um crime dentro de um crime, dentro de um crime, dentro de um crime... E todos os crimes são impunes porque praticados em nome da razão nanica de Estado. Quem arma dossiês aproveita a penumbra, o silêncio, o segredo que infecta as entranhas do poder político. Saibamos reagir a tempo, porque depois, sob uma ditadura, restam apenas as receitas de bolos, sob a censura e a espionagem.

Professor titular da Unicamp

Alceu Valença - Solidão..

Em Convenção, PPS oficializa apoio a Serra e aprova nome de Álvaro Dias para vice

DEU NO PORTAL DO PPS

Foto: Tuca Pinheiro

Evento reuniu mais de 500 pessoas no Rio de Janeiro.

Wilson Passos

Em Convenção Nacional realizada na noite deste sábado, no Rio, o Partido Popular Socialista (PPS) formalizou o seu apoio a candidatura de José Serra (PSDB) à Presidência da República. O nome de Álvaro Dias, indicado para ser o vice do candidato tucano, também recebeu o apoio do partido no evento que contou com a participação de mais de 500 pessoas e foi realizado no Hotel Guanabara.

Na abertura do encontro, o presidente nacional da legenda lembrou que a Convenção era fruto de uma “construção coletiva” por não representar, segundo Freire, escolha de apenas algumas pessoas. Referia-se à decisão tomada em agosto de 2009, durante Congresso Nacional, onde a legenda aprovou o apoio ao candidato do PSDB que, até então, não estava definido. Serra e o ex-governador de Minas Gerais, Aécio Neves, eram os dois nomes que postulavam a indicação para a corrida ao Planalto.

Freire também lembrou que foi neste mesmo hotel (Guanabara) onde o partido em 2004 decidiu romper a aliança com o governo do presidente Lula por discordar dos rumos que o PT tomou depois de chegar ao poder. E que, a partir daquele instante, “começava a formação da aliança com os tucanos”.

Roberto voltou a criticar o governo, principalmente a política econômica. “Não mudou nada (da política), os resultados são pífios, cresceu pouco o país e vamos sofrer as consequências no futuro”, disse.

Vice de Serra

No meio da Convenção, Freire foi interrompido por um telefonema. Era o próprio Serra se desculpando por não ter comparecido ao local por um problema ocorrido na agenda. O presidente nacional do PPS transmitiu aos presentes um recado em que o ex-governador pedia para repassar o abraço dele a todos. Também informou que “está firme na campanha”. Freire emendou: “É importante dizer aqui que Serra não é homem que morre com a zoada (barulho) do tiro. Ele não vai aceitar imposição. O candidato a vice é Álvaro Dias”.

E entrevista a jornalistas horas antes, Freire já havia reiterado que do PPS o nome do vice recebeu toda a aprovação e elogiou a escolha. “Existe um consenso em torno do Álvaro Dias. Nós que fizermos esta aliança e que vamos enfrentar um governo que não tem limites temos que estar muito unidos. É um nome (o de Álvaro) que pode significar um boa composição com Serra e vamos para a luta”, afirmou.

Gabeira

O candidato apoiado pela aliança PV/PPS/PSDB e DEM ao governo do Rio de Janeiro, Fernando Gabeira, também participou da convenção do PPS. Ressaltou a longa trajetória de luta em que participou ao lado de pessoas do PPS e disse que é preciso resgatar no país a política séria.

Gabeira também criticou o governo do PT.

“Regredimos politicamente. Políticos hoje são mal vistos porque estão interessados em problemas pessoais. Perdemos o contato com os valores”, disse. Em seu discurso, Gabeira também pediu para as pessoas que fizessem um minuto de silêncio para as vítimas das chuvas ocorridas no Nordeste.

PSDB mantém vice, mas DEM resiste

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Segundo Rodrigo Maia, Serra ligou para demistas para tentar convencer partido a aceitar indicação de Alvaro Dias

Dias diz que reação do DEM não vai levá-lo a abrir mão da vaga e, no seu 1º discurso após ser indicado, ataca o PT

SÃO PAULO, RIO, CUIABÁ - O PSDB decidiu bancar a indicação do senador Alvaro Dias (PSDB-PR) como vice na chapa de José Serra à Presidência, mas o DEM deu sinais de que não recuará do veto ao nome do tucano, o que mantém aberta a crise entre os dois partidos.

Apesar de não ter havido reuniões entre líderes do PSDB e do DEM para discutir a crise, por conta de convenções partidárias em diversos Estados, até Serra entrou em campo, pelo telefone, para tentar apagar o incêndio, segundo o presidente do DEM, deputado Rodrigo Maia.

Maia disse que Serra não falou com ele, mas que, na tentativa de convencer o partido a aceitar o nome do senador paranaense, o tucano ligou para pelo menos três expoentes do DEM: Jorge Bornhausen, Marco Maciel e José Agripino Maia.

"De todo mundo, ouviu "não"", disse o deputado.

O ex-senador Bornhausen (SC), um dos principais interlocutores de Serra no DEM, negou que tenha conversado com o tucano. A Folha não conseguiu falar com os senadores Agripino (RN) e Marco Maciel (PE).

Maia afirmou que o DEM fará convenção na quarta-feira aprovando a aliança com Serra, mas colocando como candidato a vice um filiado seu. "Vamos esperar ele indicar o nome do DEM. Se não indicar, vamos aprovar o nosso nome", declarou.

Questionado sobre o possível imbróglio jurídico se os tucanos mantiverem o nome de Dias, foi sucinto: "Pergunte ao advogado do PSDB".

Serra era esperado na convenção nacional do PPS na noite de ontem, no Rio.

Às 19h20, o presidente Roberto Freire anunciou que ele não compareceria, mas que havia mandado um recado: "Está firme e não vai se submeter à imposição de quem quer que seja".

A direção do DEM se reunirá hoje ou amanhã para analisar a repercussão do caso entre os diretórios estaduais.

"NÓS DOIS FICAMOS"

Pivô da crise, Alvaro Dias afirmou que seu nome está mantido. "Acho que isso é próprio do calor da disputa eleitoral", disse o senador à Folha, pela manhã.

À tarde, em convenção do PSDB em Cuiabá, Dias afirmou que foi "advertido" pela direção nacional tucana a não mais afirmar que desistiria da indicação em caso de o DEM ameaçar rompimento."Não tenho o direito de abrir mão de uma convocação. Não sai nem o DEM e nem eu. Nós dois ficamos."

Em seu primeiro discurso após ser indicado à vice de Serra, Dias atacou o PT e foi saudado por tucanos como o "futuro vice-presidente".

Apesar das tentativas de apaziguamento, no microblog Twitter o tom seguia beligerante, com ataques e ironias de lado a lado.

Ele avisou que não aceitará imposições, diz Roberto Freire

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Luciana Nunes Leal

O candidato do PSDB à Presidência, José Serra, desistiu na última hora de comparecer à convenção do PPS no Rio, que formalizou ontem o apoio a sua candidatura. Em meio ao conflito com o DEM em torno da indicação do candidato a vice em sua chapa, ele telefonou para o presidente do PPS, Roberto Freire, e avisou que não iria ao evento. Ao comunicar a ausência do candidato tucano à plateia da convenção, Freire disse que ele enviou um recado. "Mandou dizer que está firme e não vai se submeter a imposições de quem quer que seja."

DEM ameaça indicar outro vice na chapa de Serra

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Presidente do partido anunciou que, se necessário, levará o confronto até a convenção nacional do DEM na quarta-feira

Luciana Nunes Leal, Eugênia Lopes, Marcelo de Moraes, Eduardo Kattah e Fátima Lessa

O presidente do DEM, deputado Rodrigo Maia (RJ), acirrou ainda mais o clima de confronto com os tucanos e deixou claro ontem, no Rio, que não pretende voltar atrás na exigência de que o partido indique o candidato a vice na chapa presidencial de José Serra (PSDB). E anunciou que, se necessário, levará o confronto até a convenção nacional do DEM na quarta-feira.

Segundo ele, o partido vai esperar até lá que Serra indique um nome do DEM. Caso contrário, a própria legenda fará a indicação. " Vamos esperar que ele indique. Se ele não indicar vamos aprovar nosso nome na convenção do dia 30", afirmou Maia. Questionado sobre como se resolveria o impasse, já que o PSDB se definiu pelo senador tucano Álvaro Dias (PR), Rodrigo Maia respondeu: "Pergunte ao advogado do PSDB. Na convenção, vamos aprovar apoio ao Serra com candidato a vice do DEM."

Rodrigo Maia não foi na noite de ontem à convenção nacional do PPS que formalizou o apoio à Serra. "Estou cheio de coisas para fazer, atrás de voto para mim", afirmou o deputado, que é candidato a reeleição.

Mesmo diante das ameaças, o comando nacional da campanha do PSDB permanecia irredutível na indicação do nome de Álvaro Dias como vice na chapa. Em Cuiabá, o próprio senador paranaense se incumbiu de afirmar que é vice de Serra apesar da resistência do DEM. "Já me sinto em campanha", disse. Dias argumentou que não postulou o cargo. "Fui convocado. Aceitei e, portanto, não tenho direito de abrir mão ou ser intransigente. Minha posição é a do PSDB e principalmente do José Serra. Já está determinado desta forma e desta forma deve caminhar. Não saio eu nem sai o DEM", disse. Segundo ele, a rejeição a seu nome não é unânime no partido aliado. "Acredito no entendimento."

Tempo na TV. Coordenador da campanha tucana e presidente do PSDB, o senador Sérgio Guerra (PE) passou parte do dia de ontem em negociações com o DEM. O apoio formal do partido significa mais três minutos de TV para Serra ao longo dos 45 dias do programa eleitoral gratuito.

"Não é a primeira vez que essas diferenças acontecem. Sugerimos o nome de Álvaro Dias. Ponto. O DEM tem a posição dele", afirmou Guerra, que deverá se reunir hoje ou amanhã com os partidos que integram a campanha de Serra.

"O DEM insiste que o vice tem de ser do partido. Vamos deixar o processo andar", disse o deputado Jutahy Magalhães (PSDB-BA).

Um dos argumentos de Rodrigo Maia para cobrar o vice para o DEM foi o de que o presidente Lula "sacrificou" vários aliados nos Estados em prol da candidatura da petista Dilma Rousseff à Presidência. Citou os casos dos ex-prefeitos Fernando Pimentel (PT-MG) e Lindberg Farias (PT-RJ), que tiveram que abrir mão de suas candidaturas a governador para o PMDB. "Mas PSDB não quer sacrificar ninguém", observou Maia.

Rodrigo Maia ficou particularmente irritado com o anúncio do nome de Dias para o cargo pelo Twitter do presidente do PTB, Roberto Jefferson (RJ). O vazamento da escolha por um aliado, sem o prévio conhecimento do DEM, foi considerado no partido uma trapalhada muito grande.

Ao participar da convenção do PPS de Minas que homologou a candidatura do ex-presidente Itamar Franco ao Senado, o ex-governador Aécio Neves disse confiar num entendimento com o DEM. "Não tenho dúvidas de que o Democratas tem, acima das preferências pessoais por nomes, um compromisso com o País, com as mudanças, com os avanços e é isso que vai prevalecer", afirmou. "Tenho muita confiança que a liderança do governador Serra prevalecerá."

DEM do PR contraria cúpula nacional e apoia Alvaro Dias

DEU NA GAZETA DO POVO (PR)

Maioria das lideranças do partido no estado diz apoiar o paranaense na chapa de José Serra

Alexandre Costa Nascimento e Deise Campos

A convenção estadual do DEM, realizada neste sábado (26) em Curitiba, marcou uma posição divergente dos democratas paranaenses em relação à cúpula nacional da legenda. Enquanto o DEM nacional condenou a indicação do senador Alvaro Dias (PSDB-PR) a vice do presidenciável tucano José Serra, a maioria das lideranças do partido no Paraná apoiaram o nome do paranaense. A convenção estadual do DEM confirmou ainda o apoio da legenda à candidatura do tucano Beto Richa ao governo paranaense.

O anúncio de Alvaro como vice de Serra, na sexta-feira, foi mal recebido pela cúpula nacional do DEM, a ponto de o vice-presidente do Democratas, deputado federal Ronaldo Caiado (GO) ameaçar romper com os tucanos se a decisão não for mudada. O presidente nacional da sigla, deputado federal Rodrigo Maia (RJ) também se manifestou negativamente à decisão e disse que não medirá esforços para mudar o nome do vice. O DEM pleiteia a vaga que agora é de Alvaro.


Mas a maior parte das lideranças democratas no estado aceitou vem a indicação do tucano. O deputado Alceni Guerra (DEM-PR) disse que o apoio a Alvaro Dias é certo na bancada paranaense. “Vamos enfrentar o partido em nível nacional para defender a indicação do Alvaro Dias”,disse ele. “Tem momentos na política que o amor à terra é tão ou mais importante que o amor ao partido.” Alceni defendeu ainda que o deputado federal paranaense do DEM que não apoiar o nome de Alvaro “estaria cometendo um deslize". "Seria passar um recibo da falta de vontade de fazer o estado crescer.”

O deputado federal Eduardo Sciarra (DEM) disse que, como paranaense, ele não pode ser contra a indicação de Alvaro. “O DEM nacional abriu mão do cargo pelo Aécio Neves e agora está cobrando a indicação", disse Sciarra. Ele afirmou ainda que, pessoalmente, é favorável ao nome do Alvaro.

Já o deputado Luciano Pizzato disse apoiar o nome de um paranaense, sem citar Alvaro, e argumentou que devem ser levadas em consideração as questões locais para a escolha nacional. Ele afirmou que todos os integrantes do diretório estadual do DEM aceitaram bem o nome de Alvaro, mas que aguardam uma solução nacional, até porque as críticas do diretório nacional foram muito duras. “A questão nacional não tem a ver com o nome do Alvaro, não é objeção pessoal e sim da forma como foi feito, porque vazou antes, não sabemos se por querer ou não.”

Apesar disso, algumas lideranças do DEM no estado preferem ainda não se posicionar. É o caso do deputado federal Cassio Taniguchi. Ele disse não ter nada contra Alvaro, mas afirmou que essa é uma discussão que ainda deve ser feita pelo PSDB e pelo DEM.

Já o presidente estadual do DEM, o deputado Abelardo Lupion, foi uma das únicas vozes dissonantes, destoando dos companheiros de partido no assunto indicação de Alvaro a vice de Serra. “O PSDB não tem o direito de, para resolver uma questão paranaense [tirar o senador Osmar Dias da eleição para o governo do estado], negociar o cargo que já havia sido acordado.” Segundo ele, há dois anos já havia sido negociado que o DEM faria a indicação do nome para vice da chapa de Serra. “O DEM não abre mão dessa indicação. Se não tivermos a vice, o partido pode fechar.”

Lupion, que também foi contra o apoio do partido no Paraná a Beto Richa, disse que pedirá licença do cargo de presidente do partido no estado na próxima quarta-feira. O objetivo dele é criar um comitê no estado em favor da candidatura do senador Osmar Dias (PDT) ao governo estadual.

A crise é do candidato Serra João Bosco Rabello

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

O fato de o anúncio do vice na chapa de José Serra, o senador Álvaro Dias, ter vazado, em vez de ter sido anunciado, resume o ambiente de campanha do PSDB: confuso e desarticulado.

A escolha - provisória ou definitiva, não se sabe - não foi de Serra, mas do partido, sem consulta aos aliados, num gesto mais na linha de um clube de notáveis que de um partido.

O problema é que restou um único notável a bordo: o próprio Serra. Aécio Neves internou-se em Minas e Fernando Henrique, rejeitado como um patinho feio, foi cuidar da própria vida.

A campanha centrou-se no candidato; a estrutura é precária, cada um é porta-voz de si mesmo. Nesse contexto, o principal aliado, o DEM, soube pelo Twitter de Roberto Jefferson, do PTB, que havia sido preterido por uma chapa puro-sangue, com Dias no lugar de Aécio.

Serra já decidira que, sem Aécio, o melhor seria um vice figurativo, o que o levou a nomes inexpressivos, desconsiderando o acordo de que, naquela hipótese, a vaga seria do DEM, humilhando o aliado, que percebeu o desconforto ideológico que causava.

O Twitter de Jefferson uniu o DEM. E as próximas horas definirão o destino da aliança: se efetiva ou burocrática, limitada a acordos regionais sem envolvimento da militância.

A declaração de Dias, de que desiste para pacificar, e o gesto de Pilatos de Serra, dizendo-se alheio à decisão, indicam que tudo pode voltar à estaca zero.

Guerra versus Jarbas

As coisas não vão bem entre o presidente do PSDB, Sérgio Guerra, e o senador Jarbas Vasconcelos, palanque de Serra em Pernambuco. Segundo interlocutores de ambos, eles não conversam há mais de dois meses. Uma das razões é que o PSDB não quer indicar a segunda vaga ao Senado (a primeira é do DEM, Marco Maciel). Guerra está irritado com a influência do DEM na campanha, através da boa relação entre Jarbas e o presidente do partido no Estado, Mendonça Filho.

Pesquisa inclui Álvaro Dias

Para complicar mais um pouco a crise com o DEM, o próximo Datafolha já vem com Álvaro Dias como vice de Serra. O instituto protocolou sexta-feira no TSE a pesquisa, cujo resultado deve sair no próximo fim de semana. Na rede Twitter, o veneno ontem era de que o Datafolha soube antes do DEM que o vice seria Álvaro Dias.

A novidade é que o questionário apresentado pelo instituto inclui perguntas sobre o candidato a vice-presidente. Numa delas, o eleitor é questionado se sabe quem é o vice e se ele influencia o voto no candidato. Amadorismo

Desabafo de um senador tucano, antes do vazamento do nome de Dias para vice de Serra. "A campanha está mambembe, tudo é improvisado, há amigos fazendo tarefas por favor, no lugar de profissionais contratados". Um exemplo, segundo ele, é a agenda do candidato, cuja definição depende da senadora Marisa Serrano (PSDB-MS). Reclamou também da concentração das decisões e das informações, e que jamais recebeu um briefing da campanha, que deveria ser diário.

Dilma em Minas

Enquanto o PSDB exibe desorganização, o presidente Lula e sua candidata, Dilma Rousseff, preparam um desembarque glorioso na convenção do PMDB, em Belo Horizonte, na próxima quarta-feira, para lançar a candidatura de Hélio Costa ao governo, com Patrus Ananias de vice. À frente de uma caravana do PMDB, Michel Temer, vice de Dilma.

''Espero que Lula entenda seu peso para a afirmação da democracia na região''

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Empresário e ex-embaixador nos EUA, o chanceler hondurenho, Mário Canahuati, afirma que seu governo já assegurou ao ex-presidente Manuel Zelaya o direito de retorno. "Isso já foi resolvido, ele tem amplas garantias para voltar", diz ao Estado por telefone. Moderado, ele evita críticas ao Brasil como quem pisa em ovos e diz que o País pode ajudar "muitíssimo".

Para normalizar laços com Honduras, o Brasil exige o retorno de Zelaya ao seu país. O seu governo aceita?

É na OEA que se está discutindo o caminho para a volta de Honduras ao sistema interamericano, assim como a questão da normalização dos laços bilaterais com países que até agora não aceitaram o novo governo. Estamos sendo muito cautelosos nesse processo. Não queremos mais dizer simplesmente que defendemos a autodeterminação ou a posição desses países que não nos aceitam.

Mas seu governo pode dar garantias de que Zelaya não será perseguido pela Justiça, ou por quem quer que seja, caso volte?

Creio que isso ficou claro quando o presidente (Porfírio) Lobo encontrou-se com Zelaya na República Dominicana e lhe assegurou os mesmos direitos de qualquer cidadão hondurenho. O caso foi resolvido, ele tem garantias para retornar. Desconhecemos se há uma razão por trás da recusa brasileira em normalizar laços. Honduras é um país de paz e amigos. E a liderança do Brasil pode nos ajudar muitíssimo, assim como a de outras potências econômicas - Peru, Colômbia, México. Espero que em pouco tempo líderes como Lula, que fez um excelente trabalho no Brasil, dêem-se conta da grande responsabilidade que têm para a afirmação da democracia na América Latina.

O sr. reconhece que o fato de o governo hondurenho ter sido eleito sob um regime de facto compromete sua legitimidade?

O presidente Lobo fez um governo integrado pelas diferentes facções políticas, incluindo pessoas que participaram da Frente Nacional de Resistência (radicais pró-Zelaya). Um deles é Cesar Ham (ex-candidato do partido Unificação Democrática), que chefia agora o Ministério Nacional Agrário. O presidente assumiu totalmente do acordo Tegucigalpa-San José, cujo penúltimo ponto era a instalação de uma Comissão da Verdade. Ela foi iniciada em 4 de maio. O último ponto era o retorno automático de Honduras à OEA e a normalização dos laços com os países, mas lamentavelmente isso não ocorreu.

Vozes em Honduras já falam em desistir de voltar para a OEA.

Tomamos a decisão de trabalhar voltados para dentro, para responder às necessidade dos hondurenhos. Demos passos importantes quanto à questão de direitos humanos. O presidente convidou a Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA a avaliar tudo que ocorreu e está ocorrendo para ajudar-nos a avançar. Mas a comunidade internacional não resolverá sozinha nossos problemas.

Zelaystas continuam a dizer que lutarão até o fim por uma constituinte. Há o risco de uma nova instabilidade institucional?

Isso é parte da democracia. Alguns deles (zelaystas) estão no governo e todos têm a liberdade de se manifestar, assim como os demais 8 milhões de hondurenhos.

Família, filhos, comida e voto:: Vinicius Torres Freire

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Crescimento da renda e redução do tamanho médio das famílias fazem eleitor comer mais nos anos Lula

É evidente que as pessoas vivem e comem melhor no Brasil de agora do que no final do governo FHC. Para ser mais preciso, dadas as estatísticas disponíveis, viviam melhor em 2009 do que em 2003. Diga-se de passagem que nem todas as melhorias e pioras se devem a FHC ou Lula, embora argumentos jamais virão a convencer os torcedores fanáticos de petistas e tucanos.

Isto posto, o que nos diz sobre essas melhoras a POF (Pesquisa de Orçamentos Familiares), divulgada pelo IBGE na semana que passou? Mais precisamente, o que a POF e alguns indicadores auxiliares nos dizem sobre tais melhorias, sobre a renda e o estômago dos brasileiros?

Na equivalente da POF realizada em 1974-75, em média 34% do total da despesa dos brasileiros destinava-se à alimentação. Em 1995, 23,4%. De 2003 para 2009, a mudança foi pequena: de 20,8% para 19,8%. Ou seja, durante os anos FHC, diminuiu o peso relativo dos gastos com alimentos. Nos anos Lula, tal fatia de despesa ficou praticamente estável. Ressalte-se que não se está atribuindo a mudança a este ou aquele governo, por favor.

Nos anos FHC, porém, a renda média real (descontada a inflação) caiu ou, no mínimo, ficou estagnada, a depender do tipo de estatística empregado. No que diz respeito à despesa com alimentos, porém, tal problema foi em parte mitigado por uma mudança de preços relativos, como dizem os economistas. Em português, isso quer dizer que a inflação dos alimentos foi menor que a inflação média e a de outras rubricas do orçamento das famílias.

Entre 1995 e 2002, o IPCA, a média da inflação, subiu 200%. O preço médio dos alimentos aumentou 166%. A inflação da habitação foi de 311%; a dos transportes, 256%.

Nos anos FHC, o preço da comida subiu relativamente menos. As agruras sociais da renda estagnada foram ao menos remediadas com a queda do preço dos alimentos.

Registre-se que ao final dos anos FHC, no início de 2003, despesas com alimentação, moradia e transporte levavam 74,7% do gasto médio de consumo das famílias. Em 2009, penúltimo ano de Lula, tais gastos equivaliam a 75,7% do total.

Entre 2003 e 2009, anos Lula, o IPCA subiu 143%. A inflação da comida, 143%, assim como a da habitação; a dos transportes, 139%.

Nos anos Lula, até janeiro de 2009, data de referência da POF, portanto o preço da comida subiu mais ou menos na média do IPCA.

Mas a renda média real cresceu, como se sabe. Além do mais, houve um "bônus demográfico", digamos, para melhorar a situação.

O tamanho médio da família brasileira era de 3,7 pessoas em 1995. Em 2003, era parecido: 3,62. Em 2009, as famílias ficaram significativamente menores, ao menos em termos estatísticos: 3,3.

A renda das famílias cresceu, em termos reais, e a renda de cada pessoa (a renda familiar per capita) subiu ainda mais, claro. Entre 2003 e 2009, a renda familiar per capita cresceu na média quase 22%, em termos reais (acima da inflação), segundo cálculos do economista Marcelo Neri, com base na POF.

De 2003 a 2009, a parcela da despesa familiar destinada à alimentação ficou praticamente estável. Mas a renda das famílias aumentou; a renda que cabe a cada membro das famílias aumentou ainda mais -pode-se comer mais e/ou melhor.

O QUE PENSA A MÍDIA

Editoriais dos principais jornais do Brasil
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Valentina Lisitsa (Chopin 24 Etudes DVD track)Op. 25 No. 12

O Relógio:: João Cabral de Melo Neto


1.
Ao redor da vida do homem
há certas caixas de vidro,
dentro das quais, como em jaula,
se ouve palpitar um bicho.

Se são jaulas não é certo;
mais perto estão das gaiolas
ao menos, pelo tamanho
e quadradiço de forma.

Uma vezes, tais gaiolas
vão penduradas nos muros;
outras vezes, mais privadas,
vão num bolso, num dos pulsos.

Mas onde esteja: a gaiola
será de pássaro ou pássara:
é alada a palpitação,
a saltação que ela guarda;

e de pássaro cantor,
não pássaro de plumagem:
pois delas se emite um canto
de uma tal continuidade

que continua cantando
se deixa de ouvi-lo a gente:
como a gente às vezes canta
para sentir-se existente.
2.

O que eles cantam, se pássaros,
é diferente de todos:
cantam numa linha baixa,
com voz de pássaro rouco; desconhecem as variantes
e o estilo numeroso
dos pássaros que sabemos,
estejam presos ou soltos;

têm sempre o mesmo compasso
horizontal e monótono,
e nunca, em nenhum momento,
variam de repertório:

dir-se-ia que não importa
a nenhum ser escutado.
Assim, que não são artistas
nem artesãos, mas operários

para quem tudo o que cantam
é simplesmente trabalho,
trabalho rotina, em série,
impessoal, não assinado,

de operário que executa
seu martelo regular
proibido (ou sem querer)
do mínimo variar.
3.

A mão daquele martelo
nunca muda de compasso.
Mas tão igual sem fadiga,
mal deve ser de operário;

ela é por demais precisa
para não ser mão de máquina,
a máquina independente
de operação operária.

De máquina, mas movida
por uma força qualquer
que a move passando nela,
regular, sem decrescer:

quem sabe se algum monjolo
ou antiga roda de água
que vai rodando, passiva,
graçar a um fluido que a passa;

que fluido é ninguém vê:
da água não mostra os senões:
além de igual, é contínuo,
sem marés, sem estações.

E porque tampouco cabe,
por isso, pensar que é o vento,
há de ser um outro fluido
que a move: quem sabe, o tempo.
4.

Quando por algum motivo
a roda de água se rompe,
outra máquina se escuta:
agora, de dentro do homem;
outra máquina de dentro,
imediata, a reveza,
soando nas veias, no fundo
de poça no corpo, imersa.

Então se sente que o som
da máquina, ora interior,
nada possui de passivo,
de roda de água: é motor;

se descobre nele o afogo
de quem, ao fazer, se esforça,
e que êle, dentro, afinal,
revela vontade própria,

incapaz, agora, dentro,
de ainda disfarçar que nasce
daquela bomba motor
(coração, noutra linguagem)
que, sem nenhum coração,
vive a esgotar, gôta a gôta,
o que o homem, de reserva,
possa ter na íntima poça.