- O Globo
É um engano pensar que os governadores dos
estados estão prestes a perder o controle sobre as polícias, sobretudo a
Polícia Militar. A quebra do elo de hierarquia e, além disso, a dissociação
política na tropa já são uma realidade, e esse fenômeno oferece um risco
adicional a tantos que vêm sendo acrescidos ao barril de pólvora da eleição de
2022.
Episódios como o motim da PM do Ceará, a
forma violenta e injustificável como a polícia de Pernambuco coibiu o protesto
contra Jair Bolsonaro em 29 de maio último e relatos de policiais cada vez mais
adotando discurso político em defesa do presidente em detrimento dos
governadores, como verificado recentemente em Alagoas, mostram que a
insubordinação e a politização correm soltas entre os policiais, assim como já
vem acontecendo no Exército.
Num texto em que usei o neologismo
“bolsochavismo”, no início de 2020, antes da pandemia, eu já anotava que a
cooptação das Forças Armadas e das polícias, combinada com a criação de
milícias paraestatais, era peça decisiva na perpetuação do chavismo, começada
pelo próprio Hugo Chávez e aprofundada sob Nicolás Maduro.
Ironicamente, aqueles que votaram tendo como um dos mantras-clichês aquele segundo o qual, se o PT vencesse, o Brasil iria “virar uma Venezuela” abriram as comportas para que, veja só, começássemos a importar muitos dos métodos que fizeram o país vizinho mergulhar numa ditadura que condena os cidadãos à falta de liberdade, à miséria, à fome e a violações sistemáticas dos direitos humanos.
Bagunçar a hierarquia, as regras e a
disciplina militares, seja no Exército, seja nas PMs, é investir de forma
bastante deliberada nesse sentido.
No último fim de semana, um incidente nos obrigou a um contato mais próximo com a PM paulista. O discurso pró-Bolsonaro e anti-Doria, reproduzindo desinformação acerca da vacinação e da pandemia e pregando ostensivamente a reeleição do presidente, é conversa corriqueira entre os policiais.