Raphael Bruno
Brasília
DEU NO JORNAL DO BRASIL
Cresce insatisfação de grupos que acusam ministro de desviar o partido de bandeiras históricas
Além das preocupações com o sobe e desce, impulsionado pelos impactos da crise econômica no mercado de trabalho brasileiro, dos números de geração de empregos e demissões, o ministro do Trabalho e Emprego, Carlos Lupi, ganhou, nos últimos dias, uma preocupação adicional: ele enfrenta crescentes focos de insatisfação dentro de seu partido, o PDT, com a forma pela qual vem conduzindo a direção da legenda e os trabalhos à frente do ministério. Para piorar, uma das maiores tensões entre o ministro, presidente licenciado do partido, e outras correntes pedetistas, se desenvolve justamente no quintal político de Lupi, o Rio de Janeiro. Hoje, integrantes do diretório municipal carioca tentam, na sede do partido, realizar uma convenção extraordinária com o objetivo de renovar a direção partidária na cidade. Lupi e a atual direção são acusados pela oposição interna de desviarem a legenda do brizolismo histórico e podarem a participação de grupos insatisfeitos com os rumos do partido.
O período de gestão do atual diretório municipal se encerra hoje. Como até alguns dias atrás uma nova convenção não havia sido marcada, integrantes do diretório, opositores a Lupi, se organizaram para realizar, hoje, convenção extraordinária na sede do partido no Rio de Janeiro.
A direção nacional do PDT reagiu e instalou uma comissão provisória que, de acordo com o estatuto partidário, tem até 90 dias para realizar novas eleições para o diretório. Para os grupos alinhados com Lupi, uma maneira de ampliar a participação no processo eleitoral interno. Para os pedetistas insatisfeitos, uma manobra para ganhar tempo e evitar a perda do controle da legenda.
– Qual a razão de não ter havido, normalmente, a convocação da convenção pelo diretório municipal? – questiona o deputado estadual e candidato à prefeito do partido nas últimas eleições municipais, Paulo Ramos. – Esse tipo de prática acaba colocando em situação de conflito companheiros. É uma situação triste, porque não constrói. Por quê a necessidade de tudo ser arrancado à força? Há uma tentativa de excluir da participação. É tudo muito desgastante.
– Há uma rebeldia contra a direção do partido, contra toda a direção nacional, estadual e municipal – completa o ex-deputado federal, membro do diretório nacional do partido e atual assessor da presidência da Petrobras, Vivaldo Barbosa. – A comissão provisória é para manter o controle do partido. Não querem dar a oportunidade de disputar. É uma visão estreita de controle do partido. O Diretório Nacional do PDT não se reúne há dois anos. Queremos reuniões, o debate de ideias. O Brizola era um poço de ideias.
Um dos organizadores da tentativa de realizar a convenção extraordinária, Barbosa acusa Lupi e a atual direção de afastarem o partido dos princípios históricos do brizolismo e do trabalhismo.
– A condução política do PDT está equivocada – dispara o ex-deputado federal. – O alinhamento ao governo Lula está muito automático. Nosso entendimento é de que a participação do PDT no governo tem que ser pautada na diretriz de empurrar o governo para o trabalhismo, e isso não está ocorrendo.
Como exemplo de que Lupi não estaria atuando, no ministério, de acordo com as bandeiras tradicionais do PDT, Barbosa menciona uma portaria do órgão que, segundo ele, ataca a unicidade sindical, fragmentando e enfraquecendo os sindicatos, além da proposta de acabar com o imposto sindical, um projeto que no entendimento do ex-deputado federal fere a autonomia financeira dos sindicatos. Segundo Barbosa, essas e outras medidas teriam despertado insatisfações, também, em partes do PDT do Paraná, de São Paulo, de Minas Gerais e de Goiás.
– São críticas que não tem ressonância dentro do partido, porque não tem fundamento algum – rebate o líder do PDT na Câmara, Brizola Neto (RJ), um dos defensores da ideia de instalar a comissão provisória para organizar o processo eleitoral no diretório municipal do Rio. – A portaria criticada não ataca a unicidade, isso é uma interpretação equivocada da parte deles. Ela faz é garantir a presença dos sindicatos nos municípios. E quanto ao imposto sindical sou testemunha do esforço do ministro Lupi, no Congresso, para derrotar o fim do imposto.
Na avaliação do parlamentar, se a convenção extraordinária for mesmo realizada hoje, ela será ilegal por não cumprir as regras estatutárias de recolhimento de assinaturas e aprovação de pedido pelas instâncias superiores do partido. A questão, de toda maneira, dificilmente será resolvida sem a necessidade de envolvimento da Justiça Eleitoral, que terá julgar a validade da convenção caso ela se realize. A atual convenção estadual do partido no Rio já enfrenta ação que pede sua anulação no Tribunal Regional Eleitoral do estado.
– Há uma certa dose de impaciência desses grupos – critica Brizola Neto. – A comissão provisória foi instalada, vamos ter eleições. O que fizemos foi uma tentativa de acalmar os ânimos para dar tempo de organizar as zonais e evitar um processo eleitoral dentro do partido sem discussão política.
Antecedentes
Lupi está à frente do PDT desde 2004, quando o fundador e estrela maior do partido, o ex-governador do Rio de Janeiro, Leonel Brizola, faleceu. Desde 2007, após pressão da Comissão de Ética do Palácio do Planalto, que lhe recomendou não exercer simultaneamente a presidência do partido e o cargo de ministro, Lupi se licenciou do comando formal da legenda. Na prática, porém, continua exercendo grande influência sobre as decisões partidárias.
Os questionamentos em relação aos rumos que o ministro deu ao partido não são novos. No início de 2007, Lupi foi duramente criticado por pedetistas que se posicionaram contrários à adesão formal do partido ao governo Lula, embora a participação na coalizão governista tenha sido aprovada por ampla maioria do diretório nacional. No final do mesmo ano, foi a vez do senador Osmar Dias (PDT-PR), ameaçado de expulsão por não concordar em votar favoravelmente à prorrogação da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), se estranhar com o ministro.
Luz no fim do túnel
Ao menos no Rio de Janeiro, contudo, os rachas internos podem estar com os dias contados. O motivo: as eleições de 2010. Atualmente, o partido, em quase sua totalidade, está insatisfeito com o governador Sérgio Cabral. Líderes da legenda não escondem a irritação com a decisão de Cabral de interromper a construção de um memorial em homenagem a Brizola e questionam a política de segurança pública do governo, vista como truculenta pelos pedetistas, especialmente se comparada com o modelo implantado enquanto Brizola esteve na chefia do governo estadual. A leitura é de que o receio de que nenhuma outra candidatura surja dos partidos que hoje compõem a base de Cabral pode levar a legenda a se unir em torno da candidatura do deputado estadual Wagner Montes, hoje um dos nomes mais bem posicionados em pesquisas de intenção de voto para o governo estadual.