terça-feira, 6 de outubro de 2009

O carioca vai renascer

Arnaldo Jabor
DEU EM O GLOBO


Com as Olimpíadas, o Rio passou a ter futuro

Meu avô estava velhinho, quando me disse com os olhos úmidos: “É chato morrer, meu neto, porque eu nunca mais vou ver a Avenida Rio Branco!” Foi um pungente sentimento carioca.

Era na Avenida que ele me levava, para tomar frapé de coco na Casa Simpatia.

Para fazer meu filme, recentemente, andei por todos os subúrbios e vi com horror a decadência, não digo dos miseráveis, mas da classe média sem rumo, sem dinheiro, sem desejo. Não quero falar dos ratos políticos que destruíram a cidade nas últimas décadas, não, isso é conhecido em nossa vergonhosa História. Mas sinto que, depois de décadas de críticas contra a óbvia catástrofe urbana, alguma consciência civil já se consolidou. Se houver transparência nas obras de infraestrutura, sem roubos, podemos ter um novo futuro, legado até pelo acaso dos votos de uma comissão dinamarquesa. Agora, nós, cidadãos, temos de vigiar a execução de um sonho, impedindo superfaturamentos, desvios de recursos, para que as Olimpíadas não sejam pretexto para aventureiros.

De qualquer forma, uma morta ressuscitou: a esperança. E, como vão revitalizar o Porto e a Lapa, o humor dos cariocas também pode renascer.

Mas aqui não quero listar saudades. Claro que me lembro do bonde entrando na Galeria Cruzeiro, sob a chuva, no carnaval, claro que me lembro do tempo em que as geladeiras eram brancas, e os telefones eram pretos, como definiu Rubem Braga, mas não me interessa o tempo — apenas o “espaço” do Rio, as coisas que vejo desde criança como carioca do Meyer, da Urca e de Ipanema: cores, cheiros, ventos da terra e do mar, sal e peixes, súbitas luzes, súbitas brumas, súbitas “brahmas”. Assim como Salvador flutua sobre o olho do oceano, o Rio tem um espaço que nos define e desenha.

Sei que corro o risco da subliteratura, mas enfrentá-lo-ei de testa alta.

Vejo a púrpura que colore por instantes a Lagoa antes do crepúsculo, nos dias em que a água é um espelho sem uma onda, sem um peixe saltando, ouço os quartetos de cigarras abrindo o verão, vejo o esquilo atravessando a Estrada das Canoas, a cotia do Campo de Santana farejando perigo, ando sob a chuva quente que faz subir vapor nas calçadas, vejo as flores dos flamboyants caindo como gotas de sangue, vejo uma garça magra e branca como um manequim em desfile caminhando no Jardim de Alá, olho os imensos granitos de 500 milhões de anos atrás de minha casa, onde os dinossauros se aqueciam, contemplo os urubus dormindo na perna do vento do Corcovado e um teco-teco vermelho passando entre eles, anoto as nuvens rosas no Pão de Açúcar em fins de tarde, a cara do imperador assírio na Pedra da Gávea.

Apesar do tráfico e da violência, há nos morros uma sabedoria calma de velhos sambistas, há Zeca Pagodinho e tudo que ele preservou, há os poéticos caixotinhos dos apontadores dos bicheiros, vendendo apostas nas esquinas em calmas conversas com aposentados, há as frutas, os legumes, as gargalhadas dos feirantes nas manhãs, há a malandragem, o tom debochado do carioca sabido, o arrastado sotaque que evoca a desconfiança nos poderes da capital que já fomos, ritmos e gestos nascidos nos balcões de secretarias desde os tempos do Rei, sotaque curvo como a paisagem arredondada, oscilando em negaças e volteios, a fala marcada por sambas, metáforas vivas condensando morte e amor, cachaça, empada, navalha, bilhares e futebol. Entre a fórmica, os sujos grafites e os edifícios boçais, dá para ver ainda pedaços dos anos 50, restos de uma delicadeza perdida, as anedotas que se renovavam a cada semana, com papagaios e portugueses, piadas que morreram e que podem renascer. Há, sim, uma beleza em nossas fragilidades, no “samba, na prontidão e outras bossas que são coisas nossas...”, há a poética dos camelôs, objetinhos insignificantes nos tabuleiros, há também, apesar da decadência, uma satisfação cotidiana nos subúrbios, uma alegria desesperançada, uma aceitação das impossibilidades, diferente dos lamentos utópicos de inocentes do Leblon; há, sim, o jeito de andar das cariocas (olha o jeitinho dela andar), hoje com barrigas de fora e calças apertadas, sim, uma sexualidade forte não de celebridades de plantão, mas das gostosíssimas comerciárias e bancárias ao fim do expediente no Centro, há o prazer de amar a cidade de novo, principalmente depois que o prefeito derrubou o muro da vergonha do Cesar Maia no poético Bar 20, onde o bonde fazia a curva desde o início dos tempos (só falta derrubar a piroca de plástico do Casé), há a tragédia da miséria em toda parte, sim, mas entre os raios da tristeza, há os inúmeros grupos de choro e samba, tocando anônimos nos botequins e sob sovacos de morro, há uma alegria soterrada que pode reflorir daqui para a frente, para além da excessiva euforia das escolas de samba, uma alegria mais discreta e verdadeira, há a alma de Nelson Rodrigues entre botequins e negões, que diria que, depois da vitória em Copenhague, os cariocas são “príncipes e Napoleões tropeçando nos próprios mantos de arminho”, não mais vira-latas; há coisas ínfimas que só o carioca vê, detalhes tão pequenos de nós dois, há um velho Rio cultural, com cinema, teatro, música, que decaiu mas que pode renascer, há uma preguiça sábia, diferente da paranoia paulista, há uma preguiça para além do ócio ou do desemprego, a preguiça das conversas, de um ritmo sem capitalismo, há restos de trilhos de bonde entrevistos nas falhas do asfalto, há a cidade desenhada sobre um corpo de mulher, tudo é redondo, doce, as montanhas da Barra são mulher, as curvas, tudo mulher, há a linha infinita da Restinga de Marambaia à Joatinga, linha frágil que divide o mar ao meio, e finalmente há até a poética da sujeira, da zorra total, do baixo mundo, há a putaria poética em Copacabana entre putas, veados, aloprados, lunfas, potrucas, michês, miquimbas e cafifas, todos num desabrigo corajoso e batalhador.

O carioca vai reviver.

Revitalizar o Rio

Merval Pereira
DEU EM O GLOBO


A característica vocação do Rio de Janeiro como cidade de serviços, especialmente nas áreas de esporte, entretenimento, cultura, mídia e lazer, pode ser medida em números pelos dados de emprego do Ministério do Trabalho de 2008. Apesar de, para o total das atividades econômicas, a cidade de São Paulo apresentar o dobro de empregos da cidade do Rio — cerca de 4,5 milhões contra 2,1 milhões —, nas áreas mencionadas o emprego na cidade do Rio de Janeiro é basicamente igual ao da cidade de São Paulo: 38.682 contra 44.508.

Esses setores representam 1,8% dos empregos da cidade do Rio, o maior percentual de todas as grandes capitais, enquanto para São Paulo representam apenas 1%. Além das Olimpíadas e Paraolimpíadas de 2016, o Rio receberá os Jogos Mundiais Militares em 2011, a Copa das Confederações em 2013, a Copa do Mundo em 2014.

O economista Mauro Osório, especialista em planejamento urbano e professor da UFRJ, considera que a visibilidade internacional que uma cidade adquire quando escolhida como sede das Olimpíadas “fica particularmente potencializada no Rio, por sua história”.

Quando o Império resolve transferir a capital de Salvador para o Rio, segundo Osório, a decisão já é fruto “não só da maior proximidade com Minas Gerais e do ciclo do ouro, mas, também, da história de centro nacional que o Rio construía”.

Com a vinda da família real, consolida-se o que o historiador de arte e ex-prefeito de Roma Giulio Argan denomina de Cidade Capital.

De acordo com Argan, todo país do mundo tem uma cidade que é sua referência internacional.

No caso dos EUA, é Nova York, e não Washington. No Brasil, até hoje, é o Rio, e não São Paulo, “apesar da potencialidade econômica paulista”. Osório lembra que “o mundo atual opera com a imagem. Apenas no dia do resultado da disputa pela sede das Olimpíadas, em torno de 1 bilhão de pessoas assistiram ao evento através da mídia internacional.

Isso também reforça a importância de o Rio receber eventos internacionais, por sua plasticidade”.

Estamos, portanto, ressalta Osório, diante de uma rara oportunidade histórica de a cidade, a Região Metropolitana e Estado do Rio “reverterem a trajetória de decadência ocorrida desde a mudança da capital para Brasília, nos anos 1960”.

Para o aproveitamento dessa oportunidade, no entanto, o professor considera fundamentais dois fatores: o adequado desenho de estratégias e o controle público.

Ele lembra que Barcelona “se apropriou adequadamente em uma série de aspectos das possibilidades trazidas pelos Jogos Olímpicos devido à forte cultura regionalista catalã, que favorece a reflexão e o olhar regional”.

Já o Rio tem uma história que é o contrário disso, lamenta Osório, que costuma dizer que os cariocas “mais provincianos” pensam o Brasil e os “mais cosmopolitas” pensam o mundo.

Isso faz com que, segundo ele, mesmo após 50 anos da mudança da capital — que se completam no ano que vem —, “até hoje tenhamos uma rarefeita reflexão regional e, por conseguinte, incorremos em importantes equívocos no desenho de prioridades e estratégias”.

Essa ausência de uma cultura e olhar regional tem nos levado a erros de diagnóstico e de estratégias.

Ele considera que a conquista dos eventos esportivos, ao lado do bom momento da economia brasileira, dos investimentos previstos para a nossa região, da parceria entre as esferas de governo e do início de uma reestruturação do setor público em nossa região, “podem facilitar que realizemos, pela primeira vez desde a mudança da capital, a discussão e o desenho de estratégias integradas para a cidade e Região Metropolitana, e não apenas, por exemplo, uma política para a Barra da Tijuca”.

Mauro Osório é um dos vários estudiosos do Rio que consideram que a Vila Olímpica deve ser instalada na área portuária da cidade, em vez de localizá-la na Barra.

“Isso porque os principais ícones da cidade do Rio de Janeiro estão no espaço entre o Centro e a Zona Sul, como o Cristo Redentor e o Pão de Açúcar”.

Além disso, Mauro Osório entende que essa iniciativa poderia consolidar uma política de revitalização do Centro, como ocorreu em Barcelona. Um foco maior no Centro e na área portuária “pode permitir maior adensamento e dinamização das regiões centrais e suburbanas do Rio”.

Ele considera também que “tão importante quanto é aproveitar essa oportunidade para trabalhar a retomada da autoestima da população em nossa região e o desenho de uma política metropolitana”.

Por que não, com base nas Olimpíadas, começarmos a pensar uma política de massificação e diversificação dos esportes?, pergunta Osório. Em resposta, ele imagina começarmos a pensar uma política metropolitana que pode ter uma de suas ênfases no estímulo e massificação do esporte nas cidades periféricas ao Rio de Janeiro e em nossos subúrbios e Zona Oeste.

Também acha que deveria ser aproveitado esse momento “de forte e correto aporte de recursos federais” para traçarmos não apenas o metrô para a Barra, mas uma política de transporte de massa em toda a Região Metropolitana.

O prefeito Eduardo Paes, confrontado com todas essas demandas da sociedade, diz que se preocupa com a percepção de que, com a vinda das Olimpíadas para o Rio, todos os nossos problemas estarão resolvidos.

Mas garante que não limitará as políticas públicas a garantir a realização organizada e pacífica dos Jogos, e pretende que a cidade se beneficie de maneira permanente das mudanças estruturais que virão com sua realização, especialmente na parte de segurança pública, com o aprofundamento da política de urbanização das favelas e na revitalização de suas áreas degradadas

Seriedade é posto

Dora Kramer
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO


Porta-voz de um discurso absolutamente adequado, sóbrio e preciso na cerimônia em que o Rio foi escolhido cidade-sede das Olimpíadas de 2016, o presidente Luiz Inácio da Silva não fez jus ao desempenho quando, em seu programa de rádio de ontem, disse que o Brasil não deve se preocupar com gastos a serem feitos.

"Nós temos que nos perguntar, não quanto o Brasil vai gastar, mas quanto o Brasil vai ganhar com a realização das Olimpíadas. É acreditando assim (sic) que a gente vai fazer uma grande Olimpíada", disse, tendo partido da premissa óbvia de sempre: "Não considero gasto, considero investimento."

É claro que todo o dinheiro posto na infraestrutura para a realização dos jogos é investimento. Mas ninguém com um mínimo de seriedade - a não ser governos pouco sérios - investe em coisa alguma de maneira despreocupada.

Tampouco adianta o conselho de Lula para que se troque a palavra "gasto" por "investimento" porque aos olhos do mundo, se houver a falta de planejamento (para ficarmos na versão generosa) ocorrida na organização do Pan e os orçamentos estourarem no grau do descontrole, o Brasil não será visto como um país sério.

Aliás, cumpre lembrar ao presidente da República que o País só começou a ser levado em conta no mundo como parceiro confiável e atraente ao mercado internacional no momento em que começou a se preocupar real e objetivamente com os gastos.

Estabilizou a moeda, organizou as contas públicas, tornou lei a responsabilidade fiscal, deixou de lado o modus operandi do calote, parou de renegociar dívidas mediante queixumes de governadores e prefeitos irresponsáveis, cumpriu contratos e integrou-se ao mundos dos preocupados.

A rigor não seria preciso lembrar nada disso ao presidente, pois o candidato Lula firmou exatamente aqueles compromissos na Carta aos Brasileiros para poder conquistar a confiança do País e se eleger presidente desta República.

O palavrório otimista e bastante ufanista é eficiente para animar a arquibancada, mas não é ele que ganha a parada. Não foi ele nem o charme ou o veneno dos brasileiros o que produziu a vitória sobre Chicago, Tóquio e Madri. Foi a persistência, o trabalho duro e conjunto e uma enorme competência de marketing a sustentar as promessas às quais temos sete anos para fazer frente.

Com muita preocupação de nos comportarmos à altura do compromisso assumido e do reconhecimento internacional conferido ao Brasil, em particular à figura de Lula.

Financiamento público

O Senado quase aprovou, mas a Mesa teve de recuar da decisão de autorizar funcionários em cargos de confiança nos gabinetes das lideranças a se transferirem para os Estados de origem de líderes de partidos para reforçar a campanha eleitoral das chefias.

O recuo deu-se na esfera das decisões oficiais. Na prática, nada impede que os funcionários sejam incorporados às campanhas na base da informalidade.

Primeiro, porque tal "empréstimo" é uma praxe; segundo, porque no Congresso nenhuma infração é castigada; terceiro, porque suas excelências fingem não distinguir funcionários pagos para assessorar o Senado - uma ação pública - de cabos eleitorais contratados para ajudar a conquistar mandato, um ato de vontade privada.

Sob nova direção

A mudança do título de eleitor do deputado Ciro Gomes para São Paulo deixa o PT local como Lula gosta: nas mãos dele, Lula.

Recapitulando a situação até a semana passada, Antonio Palocci seria a opção preferencial de Lula para a disputa do governo do Estado, mas a rejeição é alta por causa do caso do caseiro.

O presidente, então, fixou sua preferência no nome do ministro da Educação, Fernando Haddad: boa aparência, ao que consta inteligente e, segundo testemunho de gente ligada ao alto empresariado, causa boa impressão na área.

Mas o grupo de Marta Suplicy - que domina a máquina no PT paulista - apoiaria Palocci e não quer Haddad. Nesta hipótese, lançaria Marta, mesmo sabendo dos riscos.

O mais prudente para ela seria uma candidatura a deputada federal, mas petistas também pretendentes a uma vaga na Câmara temem que a ex-prefeita lhes "roube" votos.

Mesmo confusa, a situação estava na esfera de influência partidária. Desde a entrada de Ciro em cena, a administração está nas mãos do Palácio do Planalto e das circunstâncias da eleição presidencial.

A menos que o PT faça um lance ousado, escolha um candidato, ou candidata, e antecipe o lançamento. Na eleição para a presidência do Senado tentou fazer isso, escolhendo o senador Tião Viana cinco meses antes da eleição.

Não deu certo, acabou prevalecendo a vontade de Lula e do PMDB: José Sarney na cabeça.

Literalmente, seria de se acrescentar face aos acontecimentos decorrentes da crise pós-eleição.

A Rio-2016 e a onda eleitoral

Plínio Fraga
DEU NA FOLHA DE S. PAULO

RIO DE JANEIRO - As magistrais imagens de "Olympia", filme da cineasta alemã Leni Riefenstahl (1902-2003) sobre os Jogos Olímpicos de 1936, realizados em Berlim, faziam parte de um projeto do regime nazista de mostrar ao mundo a suposta superioridade da raça ariana. A vitória do corredor negro norte-americano Jesse Owens é um dos exemplos de como o esporte pode ser pouco afeito às interferências políticas, driblando-a.

Os refugiados políticos brasileiros na Argélia em 1970 lembram de ter pactuado para não torcer pela seleção na Copa do México porque o título favoreceria a ditadura. O pacto não foi além da primeira vitória. O esporte havia driblado a política mais uma vez.

O presidente Lula pode ser beneficiado politicamente pela vitória do projeto Rio-2016? Depende -a mais inteligente das respostas já inventadas, porque embute salvo-conduto para qualquer cataclismo futuramente a ela associado.

Ninguém sabe qual é o modelo de José Serra para, por exemplo, a exploração do pré-sal, mas o pré-candidato tucano foi rápido ao pegar carona para dizer que o Rio é a "vitrine" do Brasil e que, com o "desenvolvimento do Rio, desenvolve-se também o país". Ou seja, o tucano movimentou-se para tentar ocupar um espaço no qual Lula foi predominante, e Dilma, personagem-satélite -com direito a horas de falação ufanista e camiseta amarela com a inscrição "I Love Rio".

Na prática, a vitória da Rio-2016 ou o clima de Brasil Grande que o governo tenta espalhar não têm efeito eleitoral por si. Podem formar uma onda, que precisa de um candidato com mérito para surfá-la. Pode ser Serra, pode ser Dilma. É preciso saber manobrar a prancha conforme as condições do mar e do vento. A vitória no surfe não vem do tamanho da onda, mas da habilidade do surfista em enfrentá-la.

Caça ao vice

Eliane Cantanhêde
DEU NA FOLHA DE S. PAULO


BRASÍLIA - O verbo da escolha do vice é "agregar". Mulheres costumam escolher vices homens, vices mulheres são benvindas, candidatos jovens procuram vices mais velhos, velhos optam por novos, pobres escolhem ricos, e vice-versa.

Se o candidato é forte no Nordeste, busca um vice do Sul. Se é no Sul, inverte a direção. Se é de um partido pequeno, corre atrás de um vice que possa trazer minutos na TV e palanques nos Estados.

Nessa fase de pré-candidatos e de pré-alianças, Dilma parece ter se fixado em Michel Temer, que "agrega" o PMDB. É o partido mais disputado, porque nunca tem candidato, mas tem uma penca de vices na vitrine, ramificação nacional, as maiores bancadas no Congresso e o maior tempo de TV.

E Temer tem algo mais: é de São Paulo, onde ficam Serra, favorito nas pesquisas, e Orestes Quércia, líder do PMDB pró-tucanos. Pode garantir a aliança formal com o PMDB nacional, rachar de vez o PMDB paulista e cutucar os tucanos na sua principal base.

No caso de Serra, o DEM lhe ofereceria os vices Kátia Abreu, José Roberto Arruda e Rodrigo Maia, mas sabe que todos lucram mais com uma "chapa puro sangue", com Aécio Neves na vice. Um tem São Paulo, o outro tem Minas. Juntos poderiam equilibrar a força de Lula no Norte/Nordeste e no Rio, ainda mais com a Olimpíada. Depende de Aécio, que se faz de difícil.

Com Ciro, tudo é uma incógnita, até a candidatura. Pode ser ao governo de São Paulo, pode ser a presidente -acertado com Lula ou contra Dilma. O ideal seria Ciro presidente, Carlos Luppi na vice, puxando o PDT. Mas Luppi é volúvel. Está entre Dilma, Ciro e Marina.

Marina agrega valor à sua chapa ao levar empresários para o PV e sinaliza que seu vice pode ser o ambientalista Guilherme Leal, da Natura, que reforça o que ela já tem de forte: boa imagem, boa causa. Mas sem palanques e sem tempo na TV.

É bonito, mas pouco para ganhar.

Lula vai de Ciro

Marcos Nobre
DEU NA FOLHA DE S. PAULO


A estratégia parecia boa.

Lula usou sua enorme popularidade para antecipar a disputa presidencial em mais de dois anos e impor uma candidata e uma estratégia em que a eleição seria um plebiscito sobre seu governo.

Não deu certo. Essa estratégia só teria chance de funcionar em um confronto direto e único. E esse cenário já não existe: Ciro veio para ficar. Ainda assim, Lula continua insistindo na mesma estratégia.

Quer agora selar o quanto antes o apoio do PMDB. E tenta neutralizar Ciro.No final, Lula pagou e vai continuar a pagar um preço extorsivo pelo apoio do PMDB. Conseguirá essa aliança. E a candidatura Dilma será abandonada pelo PMDB assim que começar a patinar.

A lógica tradicional do sistema político se impôs. Conforme o calendário de Brasília, só um ano antes da eleição o quadro sucessório começa a ficar um pouco mais claro. A fidelidade partidária virou piada: nem precisou do disfarce de uma reforma política. Como poças depois da chuva, aparecem as legendas-estacionamento, com políticos esperando o desfecho para aderir à candidatura vencedora.

Enquanto o PT conseguiu apenas filiações simbólicas -como as do empresário Ivo Rosset e do ministro Celso Amorim-, o PSB atuou como se já estivesse fazendo coalizões de governo. Ignorou os desdobramentos da Operação Castelo de Areia da PF, que envolveu seu mais novo filiado, Paulo Skaf.

Não tomou conhecimento das críticas generalizadas à atuação do ex-secretário da Educação Gabriel Chalita.

Esse contraste fica ainda mais dramático quando se vê que Lula perde a cada dia o poder de influenciar as sucessões estaduais. Com a consolidação da candidatura de Ciro, os palanques estaduais vão se pulverizar. A lógica do cada um por si vai acabar se impondo.

Até seis meses atrás, Dilma teve chances de conseguir que Ciro fosse candidato a vice em sua chapa.

Hoje, pode no máximo pretender ser vice de Ciro. Porque Ciro reconheceu o óbvio: que o candidato da oposição é favorito. E Ciro é o autêntico anti-Serra. Tem muito mais legitimidade que Dilma para fazer o confronto no campo do governo FHC, que é para onde pretende levar Serra.

Ninguém tem a mais remota ideia de onde estava Dilma durante o governo FHC. Ciro esteve na posição chave de ministro da Fazenda no final do governo Itamar. E foi crítico do governo FHC durante oito anos. Dado seu estilo, sua defesa do governo Lula no confronto com o governo FHC terá ares de confronto histórico. E, no final, não vai restar a Lula outra opção que não a de aderir à candidatura de seu ex-ministro.

O candidato na manga de Lula

Raymundo Costa
DEU NO VALOR ECONÔMICO


O presidente Lula e o PT têm razão quando afirmam que não há Plano B, apenas o Plano D de Dilma presidente para 2010. Mas não faltam candidatos ao posto. Depois de Ciro Gomes, as especulações agora giram em torno do presidente do Banco Central, Henrique Meirelles. Enquanto D não consolida posição nas pesquisas, haverá sempre uma letra do abecedário pronta para assumir seu lugar.

O que não faltará para Dilma, até o fim do ano, é oportunidade para voltar a crescer nas pesquisas e ocupar o lugar que Lula e o PT esperam que ela ocupe. Sozinha ou a tiracolo de Lula, está nas cadeias nacionais de tevê três vezes mais que os adversários. Nas comemorações pela escolha do Rio para sediar os jogos olímpicos de 2016, lá estava ela em rede nacional - vestia uma camisa amarela.

Em dezembro, o programa nacional do PT, no rádio e na televisão, deve catapultar o nome de Dilma nas pesquisas, assim como os programas do PSB e do PV serviram para engordar os índices do deputado Ciro Gomes e da senadora verde Marina Silva, respectivamente.

Nesse aspecto, Dilma leva uma vantagem a mais sobre o adversário: o programa do PSDB será em novembro, quando os tucanos provavelmente ainda não terão decidido entre as candidaturas dos governadores José Serra (SP) e Aécio Neves (MG).

Dilma, ao contrário, é a candidata de Lula e tem tudo para deslanchar: retomada do crescimento econômico, pré-sal, Copa do Mundo de 2014 e os jogos olímpicos de 2016. São os índices atuais da ministra nas pesquisas, abaixo daqueles esperados por Lula e o PT, que estimulam a especulação sobre o "candidato oculto" no colete ou manga da camisa do presidente.

O desempenho de Dilma, sempre abaixo ou tecnicamente empatada com Ciro Gomes, também estimula fantasias sobre o "gênio estratégico" de Lula movendo peças num tabuleiro de xadrez imaginário. Numa jogada - de mestre, é claro - move o domicílio eleitoral de Ciro Gomes para São Paulo. Em outra, posiciona Henrique Meirelles como um cavalo, no jogo de xadrez, que se move em "L" seja para um lado ou outro.

Para desabrochar como flor da pré-campanha, bastou a Meirelles ocupar lugar de destaque na delegação de Lula que celebrou a vitória do projeto olímpico Rio 2016, em Copenhague. O caminho mais simples para o presidente do BC é a disputa por uma das duas vagas que caberá a Goiás, no Senado. Ciro bem que quer ser o Plano B, o que não é plano de Lula, e se duvidar, muito menos do PSB, partido controlado pelo governador de Pernambuco, Eduardo Campos.

Antes de virar mito, Lula errou mais que acertou na articulação política. O pior desses erros foi subestimar o Plano Real na eleição de 1994. Sua virtude tem sido a de aprender com os próprios erros, desde os tempos de sindicalista no ABC. O presidente e seus conselheiros políticos sabem que quem tem três candidatos na verdade não tem nenhum. Para todos os efeitos, portanto, o nome é Dilma Rousseff.

Deve-se ainda ao desempenho atual da ministra Dilma nas pesquisas a queima de rojões, pelo PT, para celebrar as últimas pesquisas. Os petistas comemoram o fato de a soma dos demais pré-candidatos, nas últimas pesquisas, ter ultrapassado o total do governador de São Paulo, o tucano José Serra, o primeiro colocado em todas sondagens, com ampla margem.

O ex-deputado e ex-ministro Delfim Netto costuma dizer, com o humor rascante característico, que os números, sob tortura, confessam qualquer coisa. O PT festejou, mas não tem muito o que comemorar com a pesquisa publicada pelo jornal Zero Hora, de Porto Alegre, no domingo passado.

É bem verdade que a soma dos índices de Ciro (20%) e Dilma (19%) supera os 34% de José Serra (em quarto lugar, neste cenário, aparece Marina Silva, com 8%), no Rio Grande do Sul. Mas também é verdadeiro que, se a eleição fosse hoje, os gaúchos mandariam Serra e Ciro para o segundo turno.

O que o ex-ministro José Dirceu, em seu site na internet, considera um "quadro preocupante" para José Serra e todos os tucanos, pode também ter outra leitura: o mais provável candidato do PSDB segura o primeiro lugar, com vantagem, num Estado, o Rio Grande do Sul, onde uma filiada ao partido, a governadora Yeda Crusius, bate recorde de impopularidade.

Yeda é uma espécie de Lula às avessas, desaprovada por 74% da população, segundo pesquisa Ibope. E nem por isso tem a reeleição inteiramente descartada, nos cálculos dos políticos gaúchos. Se Yeda é recuperável, imagine-se a candidata da máquina.

Raymundo Costa é repórter especial de Política, em Brasília. Escreve às terças-feiras

O QUE PENSA A MÍDIA

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31 parlamentares ignoram TSE e trocam de partido

Eugênia Lopes, BRASÍLIA
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

PMDB da Câmara foi o que mais perdeu, com saída de oito deputados

De pouco adiantou a regra do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que pune com perda do mandato a infidelidade partidária. Na Câmara, 27 dos 513 deputados trocaram de partido, a um ano das eleições. No Senado, 4 dos 81 senadores seguiram o mesmo caminho. O PMDB da Câmara foi o que mais perdeu, com a saída de 8 deputados . Já o PSC ganhou 6, saltando de 14 para 20 cadeiras, além de conquistar um senador. E o PSDB passou de 13 para 15 senadores.

O DEM e PDT manifestaram a decisão de recorrer à Justiça. "Vamos pedir de volta o mandato dos nossos deputados. O mandato pertence ao partido", disse o presidente do DEM, deputado Rodrigo Maia (RJ). "Ficamos surpresos com a saída de três deputados. Estamos estudando ir à Justiça", afirmou o líder do PDT na Câmara, Dagoberto Nogueira (MS). Os "infieis" alegam problemas locais.

"Perdemos deputados por questões regionais", lamentou o líder do PSB na Câmara, Rodrigo Rollemberg (DF). Foi o caso de Marcondes Gadelha, que foi para o PSC, e Manoel Junior, agora no PMDB - ambos deixaram o PSB da Paraíba por divergências com a aliança estadual. "Não vamos à Justiça porque entendemos que quem tem de dar e tirar o mandato é a população", declarou Rollemberg.

A cúpula do PMDB também avisou que não vai tentar reaver os mandatos dos oito deputados - incluindo Antonio Bulhões, que saiu do partido e não definiu sua filiação - e do senador Mão Santa (PI), que foi para o PSC. A garantia foi dada pelo presidente licenciado do partido, deputado Michel Temer (SP). Na semana passada, após a deputada Rita Camata (ES) anunciar sua entrada no PSDB, o líder peemedebista na Câmara, Henrique Eduardo Alves (RN), reforçou a garantia.

O PT é outro que não cogita ir à Justiça. "Minha posição é que do ponto de vista ético deveriam entregar o mandato ao partido. Mas o PT não vai pedir os mandatos na Justiça porque a população é que vai julgar essas pessoas nas eleições do ano que vem", disse o líder da legenda na Câmara, Cândido Vaccarezza (SP). A ex-ministra e senadora Marina Silva (AC) deixou o PT e foi para o PV, onde deverá disputar a Presidência. Já os deputados Luiz Bassuma (BA) e Henrique Afonso (AC) saíram após serem punidos pela Executiva Nacional por terem posições contra o aborto.

Marta lidera ataque contra Ciro e defende candidatura própria do PT

Clarissa Oliveira
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Ex-prefeita diz que deputado "não tem a ver com São Paulo" e apoia nome de Palocci para o governo do Estado

Três dias após o deputado Ciro Gomes (PSB-CE) transferir seu domicílio eleitoral para São Paulo, setores do PT ligados ao deputado petista Antonio Palocci se uniram ao time da ex-ministra do Turismo Marta Suplicy (PT-SP) para ressuscitar a tese da candidatura própria ao Palácio dos Bandeirantes. Aproveitando o desconforto com a avaliação de que o PT paulista virou refém de Ciro, Marta assumiu a linha de frente para vitaminar o nome do ex-ministro da Fazenda na disputa.

A estratégia ficou clara na reunião convocada ontem pelo comando regional do partido. Na saída, Marta foi contundente e partiu para o ataque ao deputado cearense e ao PSB. "Estamos chegando a uma percepção de que a candidatura Ciro não tem a ver com São Paulo", disse. Ela defendeu de forma enfática o lançamento de Palocci. "Não temos que fechar portas, mas o PSB nunca fez um caminho de flores para nós no Estado."

Num esforço para conseguir uma eleição plebiscitária, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva pediu a Ciro que entre na corrida estadual, abrindo caminho para a chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, na disputa presidencial. Ao aceitar transferir o título, Ciro colocou o PT paulista em compasso de espera.

Ontem, Marta manifestou sua divergência dizendo respeitar a posição do presidente, mas destacou que ele comete erros. E afirmou que "todo mundo deu muita risada" na reunião, ao mencionarem que "Lula agora não só é olímpico como veio do Olimpo", aproveitando a referência à escolha do Rio para sediar as Olimpíadas de 2016.

Palocci, que já foi o favorito do presidente para a vaga, foi mais cauteloso. Entrou e saiu pela garagem, despistando os jornalistas. A portas fechadas, ele não se colocou abertamente como opção para a disputa. Não demonstrou, porém, resistência aos apelos para que se candidate. Disse que o PT precisa dar continuidade aos preparativos para 2010, se não quiser correr risco de fazer campanha para Paulo Skaf, presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), recém-filiado ao PSB que está de olho no Palácio dos Bandeirantes. Palocci acrescentou que não descarta a possibilidade de Ciro liderar uma segunda candidatura da base aliada à Presidência. Mas propôs um "diálogo" com Lula.

PRAZO DE INSCRIÇÃO

Ontem, alguns petistas faziam questão de destacar que a posição de Marta e Palocci não era unanimidade. Ao saberem das declarações da ex-ministra, até alguns de seus aliados se disseram surpresos. Defensores do apoio a Ciro reclamaram da agressividade e acusaram os dois ex-ministros de privilegiar projetos pessoais.

Pelo menos uma decisão jogou a favor de Marta e Palocci. O PT vai abrir em 1º de novembro o prazo para a inscrição de pré-candidaturas ao governo de São Paulo. Qualquer filiado poderá indicar um nome que gostaria de ver na disputa. Assim, os candidatos não precisarão sequer dizer publicamente que querem concorrer e ficam livres do desgaste se Ciro se decidir pela corrida estadual.

"O Ciro mudou o título para São Paulo, mas declara sistematicamente a candidatura a presidente. Para nós, o PT precisa se preparar para o processo eleitoral de 2010 desde já", justificou o presidente nacional do partido, deputado Ricardo Berzoini (PT-SP), que preferiu um tom mais conciliador. "Não significa obrigatoriamente que o PT terá candidato."

O presidente estadual do partido, Edinho Silva, reforçou: "O que tiramos como encaminhamento é uma posição de não afronta ao PSB."

Único pré-candidato declarado, o prefeito de Osasco, Emidio de Souza, engrossou o coro. "O PT tem força suficiente para se movimentar, independentemente do que o Ciro acha", declarou.

Adepto da candidatura de Ciro, o líder na Câmara, Cândido Vaccarezza (PT-SP), preferiu pedir a formação de uma "grande frente em São Paulo para eleger Dilma".

Em culto, Dilma pede fé no crescimento do país

Adauri Antunes Barbosa e Walter Ogama*
DEU EM O GLOBO

Ministra mistura política com religião em discurso na Assembleia de Deus, ao lado de Garotinho e petistas

SÃO PAULO e LONDRINA (PR). A ministra Dilma Rousseff, précandidata do PT à Presidência em 2010, misturou política e religião ontem à noite, em São Paulo, ao participar de culto da Assembleia de Deus. Discursando no púlpito do templo, para cerca de quatro mil pessoas, ela comparou a fé dos fiéis da igreja com a fé que as pessoas devem ter no desenvolvimento do país.

— Lembro aqui as palavras do profeta João: “Vim para que todos tenham vida em abundância.” Esse é o sonho que nos une a todos aqui — disse Dilma, afirmando que falava em nome do presidente Lula.

Acompanhada pelo novo ministro de Relações Institucionais, Alexandre Padilha, e pelo presidente estadual do PT em São Paulo, Edinho Silva, Dilma mencionou até a conquista do Rio, que sediará as Olimpíadas de 2016. Segundo ela, o governo tem feito do país “um vencedor em todo o mundo”.

— As Olimpíadas podem ser consideradas um momento de paz e de confraternização especial, como este aqui. E é isso que estamos fazendo com o país, uma grande Olimpíada que estamos vencendo a cada dia, vencendo com fé — disse Dilma, a última a falar, antes do presidente da Assembleia de Deus, o pastor José Wellington Bezerra da Costa, o homenageado, que comemorava 75 anos.

O mestre de cerimônia do culto, José Wellington Bezerra da Costa Junior, filho do pastor, pediu que todos os presentes dessem um “amém” à ministra.

Dilma recebeu uma bíblia de presente e ficou no púlpito acompanhando as orações. O ex-governador Anthony Garotinho (PR-RJ), pré-candidato ao governo do Rio, também participou do culto e abraçou Dilma.

Em Ipatinga, Minas, a senadora Marina Silva (AC), pré-candidata a presidente pelo PV, também participou de culto da Assembleia de Deus.

De manhã, em Londrina, no Paraná, a Dilma foi a estrela na assinatura de contrato do programa Minha Casa, Minha Vida, com a presença de vários ministros.

Em clima de campanha, ela foi recebida como representante de Lula por um público de mil pessoas, formado por aspirantes à casa própria, funcionários públicos e políticos. O prefeito Homero Barbosa Neto é pedetista.

Ciceroneada pelo ministro londrinense Paulo Bernardo (Planejamento), Dilma teve a companhia de Márcio Fortes (Cidades) e José Gomes Temporão (Saúde), além da presidente da CEF, Maria Fernanda Ramos Coelho.

Também foi acompanhada por um senador, o vice-governador paranaense, Orlando Pessutti, deputados federais e estaduais, prefeitos e vereadores.

Moradores da periferia de Londrina chegaram cedo ao pátio da prefeitura, em ônibus patrocinados por empresas parceiras do programa habitacional do governo.

Nos discursos, os participantes enfatizaram o papel de Dilma na consolidação do programa habitacional e elogiaram Lula.

Assim como na Assembleia de Deus, Dilma também comparou o evento a uma vitória como a conquista das Olimpíadas.

— A conquista brasileira é fruto de uma união nacional, assim como o programa de moradias para a população de baixa renda, que é resultado da mobilização das forças políticas brasileiras — disse a ministra.

Depois, a comitiva de ministros seguiu para a Santa Casa de Londrina, onde o ministro Temporão assinou a liberação de R$ 27 milhões para convênios

PMDB decide exigir vice na chapa de Dilma

Gerson Camarotti e Cristiane Jungblut
DEU EM O GLOBO

Partido ameaça apoiar Serra se petistas preferirem Ciro Gomes

BRASÍLIA. Determinada a garantir a vaga de vice na chapa presidencial petista encabeçada pela ministra Dilma Rousseff, a cúpula do PMDB se reúne hoje à noite para fechar acordo em torno do nome do presidente da Câmara, Michel Temer (PMDBSP).

A decisão do PMDB de levar a posição ao presidente Lula é reforçada pelo fato de setores do PT cogitarem o deputado Ciro Gomes (PSB-CE) como vice.

Anfitrião do jantar, o líder do PMDB, deputado Henrique Eduardo Alves (RN), adverte que isso levaria a legenda a apoiar a candidatura do governador José Serra (PSDB-SP).

— Se Ciro for o candidato a vice, o que o PT vai fazer com o PMDB? Isso jogaria o partido na candidatura do Serra. Ciro não será vice de Dilma. A vaga é do PMDB. O partido é a maior força política, com nove governadores, 90 deputados federais e 1.300 prefeitos. É bom para PT e PMDB que estejam juntos.

Mesmo com a queda da ministra nas pesquisas, o PMDB mudou a estratégia para 2010: em vez de cobrar solução para os palanques nos estados, decidiu assegurar espaço na chapa presidencial e ter força para negociar impasses regionais.

O PT fará reuniões para acertar o discurso do acordo a ser fechado com o PMDB, que conta com aval de Lula. Nesse acordo, o PMDB poderia solucionar problemas locais — como uma saída honrosa para o ministro da Integração, Geddel Vieira Lima, retirando sua candidatura ao governo da Bahia e apoiando a reeleição de Jaques Wagner (PT).

— Haverá conversa com Lula e Dilma para fechar o entendimento de PT e PMDB. A candidatura entra em nova fase: a explicitação eleitoral. Aliança com o PMDB é fundamental — disse o líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR).

O PT terá uma conversa prévia com Lula para fechar a proposta a ser levada aos peemedebistas.

O presidente do PT, Ricardo Berzoini (SP), concorda que o acordo deve apontar bases da aliança nacional, sem entrar em peculiaridades dos estados.

— As pessoas aqui estão firmemente dispostas a fazer a aliança, PT e PMDB na chapa.

Para Berzoini, dependerá do PMDB o nome do vice. Quando perguntado sobre a possibilidade de Ciro na chapa, ele insistiu que o vice seja do PMDB

Estudo mostra que classe média encolheu em 2008

Cássia Almeida
DEU EM O GLOBO

A classe média parou de crescer e até encolheu em 2008, após três anos de expansão. A conclusão é de um estudo do economista Waldir Quadros, da Unicamp, com base na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), do IBGE. A alta classe média, com renda per capita a partir de R$ 3.177 e que reúne, entre outros, professores universitários, médicos, arquitetos, caiu de 5,7% para 5,1% entre os brasileiros ocupados com renda. A média classe média, com renda entre R$ 1.588 e R$ 3.177, é formada por técnicos e professores do ensino médio, por exemplo, recuou de 9,6% para 9,2%. A baixa classe média dos professores primários, balconistas e auxiliares de escritório, com renda entre R$ 635 e R$ 1.588, caiu de 30,6% para 29,8%. A exceção é a massa trabalhadora, que ganha até R$ 635 e avançou de 34,3% para 35%. "Temos uma economia de baixo conteúdo tecnológico, que cria empregos de baixa remuneração", diz Quadros.

Classe média mais enxuta

Estudo mostra queda nessa fatia da população. Apenas baixa classe média cresceu

A alta classe média parou de crescer e até diminuiu no Brasil em 2008. A constatação faz parte do estudo do professor da Unicamp Waldir Quadros, que vem acompanhando a estratificação social no país. Com os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) de 2008, divulgada no último dia 18, Quadros percebeu que o crescimento dessa fatia da população — que vinha ocorrendo desde 2005 — estacionou.

O mesmo fenômeno atingiu a média classe média: — O que vem aumentando é a classe média baixa. Por isso, o consumo de produtos de baixo valor está aquecido. O Brasil virou o país do R$ 1,99.

A expectativa do economista, diante da forte expansão do Produto Interno Bruto (PIB, conjunto dos bens e serviços produzidos no país) em 2008, com alta de 5,1%, era de que a alta classe média ficasse maior. Essa fatia da população, que respondia por 8,1% das famílias brasileiras em 2007, caiu para 7,5%. Já a classe média baixa passou de 35,9% para 36,9%.

Nessa conta, de acordo com o economista, não entram os ricos.

A classe média alta também perdeu espaço quando a referência é o seu peso entre os trabalhadores.

Respondia por 5,7% dos ocupados em 2007 e, em 2008, viu essa fatia cair para 5,1%.

Pesquisa considera o tipo de ocupação

Quadros classifica as faixas da pirâmide social brasileira segundo as ocupações. Na alta classe média estão inseridos os professores universitários, médicos, economistas, engenheiros, gerentes, dirigentes de empresas, com renda individual superior a R$ 3.177 em outubro de 2008. A razão para a ligeira queda dessa fatia da população de um ano para o outro, diz Quadros, está na “baixa performance da economia brasileira”: — É uma economia de baixo conteúdo tecnológico, por isso cria empregos de baixa remuneração. E quando os salários sobem mais, trocamse os funcionários.
Assim, cresce somente a baixa classe média.

Nesse estrato social, estão professores primários, auxiliares de escritório e outros, que têm renda individual entre R$ 635 e R$ 1.588.

Para Quadros, a baixa performance do restante da classe média estaria relacionada aos juros elevados e ao real muito valorizado, o que faz os salários serem muito baixos no país.

— Para que alguém vai estudar para ganhar R$ 3 mil por mês? Isso até inibe o aumento da formação da mão de obra. Esse baixo dinamismo das camadas mais bem situadas limita a mobilidade social.

Segundo Quadros, a Pnad do ano passado mostrou que caiu a proporção de ocupações mais bem remuneradas, dando lugar a empregos com salários menores.

Já a fração de miseráveis, que recebiam até R$ 317 no ano passado, vem caindo consistentemente, como mostra o estudo de Quadros e de todos os economistas que se debruçam sobre os dados de pobreza.

O economista Sergei Soares, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), concorda com o professor da Unicamp na forma de estratificação.

Porém, ele afirma que não é só a economia que oferece vagas de baixo salário. A mão de obra brasileira também carece de formação.

— Há o problema da qualificação das pessoas. Temos um sistema educacional ruim, fruto dos anos 90. Até então, era horrível. Os mais velhos vieram do sistema horrível. E os mais jovens, do sistema ruim. É difícil oferecer empregos melhores quando não há qualificação — avalia Soares.

O economista do Ipea lembra que as atividades rotineiras são fáceis de ser mecanizadas. Como exemplo, usa o próprio presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

— A profissão de torneiro mecânico que permitiu a ascensão de Lula à presidência não existe mais em nenhum lugar do mundo.

Desemprego é maior entre mais pobres

Apesar de a classe média baixa estar crescendo, reduzindo a massa trabalhadora e os miseráveis, o desemprego ainda está muito concentrado nesses dois grupos.

Do contingente de desempregados, 66,2% estão na baixa classe média e entre os trabalhadores, mostra o estudo de Quadros. Nem a melhora contínua do mercado de trabalho nos últimos anos foi capaz de muar o peso do desemprego entre os mais pobres, avalia o economista.

— Mesmo com a queda do desemprego, ele continua atingindo os mais pobres. No Brasil, a concentração dos desempregados nessa faixa é muito alta. Isso aconteceu no fim do ciclo de crescimento. Com a crise, a tendência é isso piorar. É muito preocupante — concluiu Quadros.

Não há um único conceito para definir classificação social. Quadros estabeleceu as ocupações como forma de separar a população em classes sociais. Para calcular as oscilações nessas faixas, o professor da Unicamp usa o rendimento médio do trabalhador ou do membro mais bem remunerado da família. Nessa forma de cálculo, para pertencer à alta classe média, é preciso ganhar mais de R$ 3.177 de salário. A renda média desse grupo é de R$ 6.399.

Recente estudo do economista Marcelo Neri, da Fundação Getúlio Vargas (FGV), chegou a conclusões opostas às obtidas por Quadros.

Nas contas de Neri, a classe AB cresceu em 2008. O economista da FGV usa a renda domiciliar total como critério. Na estratificação do economista, a classe AB tem renda domiciliar total superior a R$ 4.807.

Ele não usa o salário individual.

Comoção no adeus à voz latina de Mercedes

Ariel Palacios
BUENOS AIRES
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO


Populares, muitas autoridades e artistas despedem-se da cantora na Argentina

O corpo da cantora Mercedes Sosa foi cremado ontem no cemitério de La Chacarita, na capital argentina, no início da tarde. Seu filho, Fabián Matus, declarou que a maior parte das cinzas de sua mãe será espalhada em Tucumán, sua província natal. Outra parte será colocada na província de Mendoza, onde ela dizia que havia passado seus anos de maior felicidade. O restante será espalhado em Buenos Aires, cidade onde residiu nas últimas duas décadas e meia.

Enquanto seu corpo era cremado, os amigos de "La Negra", como era chamada carinhosamente, entoaram Luna Tucumana, uma canção que retrata a província natal de Mercedes Sosa, Tucumán. Antes de ser levado para La Chacarita, o corpo de Mercedes Sosa foi velado ao longo de quase 24 horas no Congresso Nacional, com todas as honras. Milhares de pessoas foram a seu velório para dar o último adeus à intérprete que imortalizou canções como Gracias a la Vida e Duerme Negrita. A cantora morreu no domingo de madrugada após graves complicações hepáticas, renais, respiratórias e cardíacas.

Desde 1962 até este ano, Mercedes gravou 47 álbuns e participou de seis filmes. Ela apresentou-se nos principais templos da cultura mundial, entre os quais o nova-iorquino Lincoln Center, o Concertgebouw de Amsterdã e o Vaticano. Seu último álbum, Cantora, é candidato ao Grammy Latino.

O ministro da Cultura do Brasil, Juca Ferreira, desembarcou ontem de madrugada em Buenos Aires para participar do velório, em representação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Após ter dado o adeus à cantora no Congresso Nacional, Ferreira declarou aos correspondentes brasileiros na Embaixada do Brasil em Buenos Aires que "Mercedes foi um símbolo! Sinto que ela furou um bloqueio entre a cultura da cidade de Buenos Aires e a do interior da Argentina, essa Argentina profunda das províncias".

Segundo Ferreira, que assistiu a vários shows da cantora ao longo das últimas duas décadas, destacou a voz "doce e suave, mas profunda ao mesmo tempo" de Mercedes Sosa. O ministro afirmou que o velório da cantora foi "comovente" e que não conseguiu conter as lágrimas. No velório, o filho de Mercedes Sosa, Fabián Matus, afirmou ao ministro Ferreira, que sua mãe considerava o Brasil seu "segundo país".

O técnico da seleção argentina, Diego Armando Maradona, foi ao velório em plena madrugada. Maradona, após beijar a testa da cantora, não deixou de lado seu peculiar estilo polêmico ao referir-se à cantora que admirava: "Mercedes tinha essa impressionante liberdade com a qual cantava... nenhuma outra mulher tinha os ovários para cantar tal como ela cantava!" Segundo Maradona, "morreu a deusa da liberdade".

A morte de Mercedes também abalou presidentes latino-americanos como o venezuelano Hugo Chávez, que afirmou que "Mercedes foi embora fisicamente, mas continuará entre nós". O boliviano Evo Morales sustentou que "morreu uma voz, uma inspiração que sempre esteve do lado dos movimentos sociais, dos pobres, das pessoas que aspiravam tempos melhores". O presidente israelense Shimon Peres também referiu-se à cantora: "Ela encarnou a liberação da América Latina, e de certa forma, também a decepção que essa liberação trouxe."

Justiça implica Berlusconi por suborno de juiz nos anos 90

Da Reuters
DEU NA FOLHA DE S. PAULO

O premiê da Itália, Silvio Berlusconi, foi considerado "corresponsável" no caso de suborno de um juiz em disputa envolvendo firma do seu conglomerado empresarial na década de 90, em sentença emitida no fim de semana no Tribunal de Milão. Cabe recurso da decisão.

A disputa opôs os grupos Fininvest, à época presidido por Berlusconi, e CIR, pertencente a Carlo De Benedetti, desafeto do premiê, na compra da editora Mondadori.

A decisão judicial, sobre a qual pesa a acusação de suborno, favoreceu a Fininvest.Na decisão contra Berlusconi, o tribunal ordenou à Fininvest pagar indenização de US$ 1,1 bilhão ao CIR.

"Estou chocado", afirmou o premiê ao saber da sentença, para ele "inacreditável."Aliados do líder saíram em sua defesa, alegando motivação política na decisão para enfraquecê-lo e obrigá-lo a convocar eleições antecipadas. O atual mandato de Berlusconi termina em 2013.

O premiê rejeitou a possibilidade, dizendo que "nada nos fará trair o mandato dado pelo povo". Mas jornais italianos publicaram ontem declarações atribuídas a ele, nas quais diz ter vontade de deixar o país. "Eu o faria, se não fosse justamente isso que desejam os meus inimigos", teria dito.

A situação do premiê, que se vê envolto ainda em escândalos sexuais, pode complicar-se. A Corte Suprema inicia hoje debates sobre constitucionalidade de lei do ano passado que dá imunidade na Justiça ao mandatário.

Em caso negativo, podem ser reativados na Justiça casos contra o premiê, incluindo acusações de suborno de um advogado para que testemunhasse a seu favor e de senadores para que se aliassem à sua campanha eleitoral.

Após vitória, socialista começa a formar novo governo grego

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

O líder socialista grego George Papandreou foi formalmente convidado ontem pelo presidente Karolos Papoulias para o cargo de primeiro-ministro após a vitória de seu partido nas eleições legislativas de domingo.

O Movimento Socialista Pan-Helênico (Pasok) derrotou o conservador Nova Democracia, do atual primeiro-ministro, Costas Karamanlis -desde 2004 no poder-, por 43,92% dos votos contra 33,48%. Com isso, o Pasok obteve uma maioria de 160 cadeiras, de um total de 300, no Parlamento.

Papandreou deve anunciar hoje os integrantes de seu governo, que terá como principal desafio a economia. O deficit orçamentário do país atingiu 6% do PIB -bem acima do limite de 3% imposto pela União Europeia-, e a expectativa é a de que a economia grega registre retração em 2009 após anos seguidos de crescimento.Anteontem, Papandreou alertou que a Grécia enfrenta tempos difíceis. "Nada será fácil. Isso demandará muito trabalho pesado", disse.

O novo governo deve criar um Ministério de Proteção ao Cidadão para evitar desastres como os incêndios florestais de 2007, que causaram dezenas de mortes e se repetiram neste ano.

As eleições de domingo foram antecipadas porque os socialistas se recusaram a cooperar para a reeleição do presidente Papoulias -que deixará o cargo em março.

Além disso, o governo de Karamanlis perdeu apoio por escândalos de corrupção e pelos distúrbios de dezembro de 2008, quando a morte de um adolescente em Atenas por um policial gerou depredações em várias cidades, sem que a polícia interviesse.

Com agências internacionais

Honduras suspende estado de sítio

Ricardo Galhardo
Enviado especial • Tegucigalpa
DEU EM O GLOBO


O presidente interino de Honduras, Roberto Micheletti, revogou o estado de sítio e pediu punição aos responsáveis por tirar Zelaya do país em junho. Três estudantes ocuparam por 7 horas a embaixada brasileira em Caracas, pedindo a mediação de Lula junto ao governo Chávez.

Honduras revoga estado de sítio

Governo de Micheletti recua às vésperas da chegada de missão da OEA ao país

No momento em que o golpe de Estado que derrubou Manuel Zelaya completa cem dias, e às vésperas de uma reunião de chanceleres planejada pela Organização dos Estados Americanos (OEA), o presidente interino de Honduras, Roberto Micheletti, deu sinais de flexibilidade em busca de um acordo para o fim da crise. Ontem, anunciou a revogação do decreto que suspendia direitos civis como a liberdade de imprensa, de reunião e de protestos; admitiu pela primeira vez a possibilidade da restituição de Zelaya ao poder; e pediu punição aos responsáveis por tirar o presidente deposto do país, na madrugada de 28 de junho.

Semana passada, Zelaya também dera sinais de disposição para o diálogo ao aceitar ser submetido à Justiça, abrir mão da Assembleia Constituinte e reassumir com poderes limitados.

Ontem pela manhã, em entrevista ao Canal 5 de Honduras, Micheletti admitiu a possibilidade de Zelaya reassumir o governo após as eleições de 29 de novembro.

— Se tivermos eleições transparentes e elegermos um novo chefe de Estado, se poderá então falar de qualquer cenário e qualquer solução.

Cremos que a pátria é a primeira razão para sentar e dialogar, e a volta ao poder de Zelaya é uma aspiração que teríamos que entender desde um ponto de vista mais amplo, um ponto de vista legal — disse Micheletti, que na mesma entrevista rechaçou ainda uma possível Constituinte.

Depois, em entrevista coletiva na Casa Presidencial, Micheletti foi esquivo, mas não rejeitou a possibilidade da restituição.

— É uma questão de diálogo — admitiu.

Punição a grupo que retirou Zelaya do país

Para analistas políticos hondurenhos, a proposta de Micheletti é clara: Zelaya apoia e legitima as eleições e, em troca, é restituído ao poder, ainda que simbolicamente, para mostrar que a América Latina não aceita mais golpes de Estado.

Na coletiva, Micheletti aproveitou para anunciar a revogação do decreto, que suspendia direitos civis como a liberdade de imprensa.

— Quero dar a notícia ao mundo inteiro e dizer que na reunião do Conselho de Ministros revogamos o decreto todo, revogamos completamente — afirmou.

A revogação ocorreu após forte pressão internacional e consultas a diversos setores sociais hondurenhos, unânimes em rechaçar o decreto. Micheletti não explicou, porém, se o governo devolverá as frequências do Canal 36 e da Rádio Globo, invadidos e tirados do ar por militares por serem ligados a Zelaya.

Depois de admitir que foi um erro a forma como Zelaya foi deposto (de pijamas, embarcado à força num avião militar e retirado do país), o atual presidente afirmou que os responsáveis serão castigados no rigor da lei.

— Definitivamente é uma decisão que foi tomada por alguns setores que serão castigados conforme a lei — disse Micheletti, sem explicar, porém, quais são esses setores.

A flexibilização aconteceu às vésperas da visita de chanceleres da OEA, marcada para amanhã, da qual se espera uma solução definitiva para a crise política hondurenha. Além do secretáriogeral da entidade, a missão incluirá o secretário de Estado da Espanha para a Iberoamérica, os chanceleres de Costa Rica, Equador, El Salvador, México, Panamá, Canadá e Jamaica, e os representantes permanentes de Argentina e Brasil na OEA. Víctor Rico, secretário de Assuntos Políticos da OEA, afirmou que a entidade se dispõe, caso necessário, a alterar os termos do Acordo de San José, elaborado pelo presidente da Costa Rica, Óscar Arias, como proposta de solução para a crise: — Isso é absolutamente factível, aqui não há nada escrito em pedra ou em bronze.

Arias também falou sobre a crise ontem, dizendo que “mais cedo ou mais tarde” a Constituição hondurenha terá de ser modificada, e que a atual situação no país não deveria ser levada ao Conselho de Segurança da ONU, já que não representaria perigo ao mundo.

Ontem, de dentro da embaixada brasileira, Zelaya pressionou Micheletti a aceitar a imediata assinatura do Acordo de San José. O presidente deposto divulgou um comunicado no qual estabelece como condições para a negociação o fim do cerco à embaixada brasileira e a liberdade para receber quem queira na representação diplomática, onde está desde o último dia 21. A pessoas que se encontram retidas com ele na embaixada, também queixou-se da falta de canais de comunicação com seus assessores. Segundo Zelaya, os telefones celulares estão grampeados e seus interlocutores foram proibidos de entrar na representação brasileira, o que inviabiliza a articulação de estratégias de negociação. Zelaya teria inclusive ameaçado não participar do diálogo pelo fim da crise caso não lhe sejam garantidos canais seguros de comunicação com seus assessores.

Embaixada também ocupada em Caracas

DEU EM O GLOBO

Estudantes se acorrentam por 7 horas na representação exigindo mediação do Brasil

CARACAS. Três estudantes universitários contrários ao governo Hugo Chávez ocuparam ontem a Embaixada do Brasil em Caracas pedindo a intermediação brasileira para investigação de supostas violações dos direitos humanos no país. Os estudantes, que se acorrentaram na sala de acesso à embaixada, anunciaram que não sairiam da representação antes de receber garantias de ajuda numa negociação com Chávez.

Os três acabaram deixando o prédio no início da noite, depois de sete horas, dizendo ter recebido a promessa do embaixador brasileiro Antonio Simões de que entregaria a petição do grupo ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Simões não quis comentar o episódio. O estudante Luis Magallanes declarara a um jornal local que, diante da atuação do Brasil na crise política de Honduras, esperava que o país pudesse fazer o mesmo na Venezuela. No caso de Honduras, a embaixada brasileira serve de abrigo a um aliado de Chávez.

Os jovens exigiam que o governo Chávez convide a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) da Organização dos Estados Americanos (OEA) para visitar o país e avaliar a situação dos direitos humanos. O protesto aconteceu cinco dias depois de uma greve de fome de 155 horas realizada por 163 estudantes de nove cidades do país para pressionar a OEA para interceder em favor da visita da comissão da CIDH. Segundo a associação Vítimas Venezuelanas de Violações aos Direitos Humanos (Vive), há atualmente entre 40 e 305 presos políticos na Venezuela.

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