segunda-feira, 29 de janeiro de 2024

O que a mídia pensa: Editoriais / Opiniões

Brasil precisa se preparar para avanço da IA

O Globo

No país, 41% dos empregos estarão — para o bem ou para o mal — expostos à nova tecnologia, diz FMI

A preocupação com o avanço da inteligência artificial (IA) sobre o mercado de trabalho ganhou contornos mais precisos com um novo estudo sobre o tema publicado pelo Fundo Monetário Internacional (FMI). No mundo rico, diz o relatório, cerca de 60% dos empregos estarão expostos às novas tecnologias capazes de treinar máquinas para perceber, aprender e agir imitando habilidades cognitivas humanas. Nos mercados emergentes, serão 40%. Nos países de renda baixa, como a Índia, 26%. No Brasil, a parcela é estimada em 41%.

Vale lembrar que estar exposto nem sempre significa risco de perda ou extinção do trabalho. Pode ocorrer o contrário: a IA funcionar como trampolim salarial ao ampliar a produtividade nas atividades repetitivas. Não estar exposto, como acontece com os trabalhadores de baixa qualificação, é quase sempre mau negócio, por impedir os ganhos que a IA poderá proporcionar. A diferença da IA para outras ondas de automação do passado é que seus efeitos recairão principalmente sobre quem tem diploma universitário.

Fernando Gabeira - Força da grana move Brasília

O Globo

Os políticos brasileiros estão passando dos limites, uma forma de perder a sabedoria

No fim do século passado, um famoso artigo de Francis Fukuyama previu o fim da História. Errou o alvo, ainda bem, porque, sem as peripécias da História, nossa vida seria tomada pelo tédio e pela melancolia. Apesar disso, há momentos arrastados na História do Brasil, como essa briga do Congresso por verbas do Orçamento, algo tão chato como uma reunião de condomínio.

No entanto, se vencermos as barreiras do tédio, veremos que estamos diante de algo essencial para nossa vida cotidiana e mesmo para o futuro da democracia. Trava-se uma luta pela grana que todos pagam em impostos. Teoricamente, esse dinheiro deveria ser usado de uma forma racional para a prestação de todos os serviços que o Estado nos deve.

Isso é tão importante que, nas revoltas de 2013, segundo muitos observadores, houve protesto porque o Estado não devolvia em serviços eficazes o grande volume de impostos pagos a ele.

O avanço do Congresso sobre o dinheiro a ser gasto tem sido intenso nos últimos anos. Alguns ainda se lembram do orçamento secreto do período Bolsonaro. Era ilegal e acabou caindo por ordem do STF. Mas a força do Congresso é tão grande que ele continua impondo ao governo altos gastos em suas emendas parlamentares. Só no Orçamento deste ano, a coisa vai para mais de R$ 47 bilhões. Isso sem contar os quase R$ 5 bilhões que destinaram ao financiamento das eleições municipais.

Miguel de Almeida - Diretas Já, 40 anos depois

O Globo

Éramos jovens, ingênuos e sonhadores, acreditávamos na força do povo como instrumento de pressão

Passados 40 anos — no próximo 16 de abril —, o comício pelas Diretas Já, no Vale do Anhangabaú, em São Paulo, registra a maior frente ampla política ocorrida no Brasil. Para aquele milhão de brasileiros, ali reunidos, entre eles o Miguelzinho, uma nesga de esperança emanava dos discursos de diferentes personalidades, quase uma certeza para a minha geração: o país do futuro deixaria de ser uma promessa. Tínhamos apenas de derrubar a ditadura militar. Mas nos esquecemos de combinar com os russos.

Éramos jovens, ingênuos e sonhadores, acreditávamos na força do povo como instrumento de pressão e mudanças. Tá. A manifestação, antes e ainda hoje não superada em número e desejos, mirava a votação no Congresso da emenda Dante de Oliveira, que restabeleceria as eleições diretas, portanto enviaria os militares de volta aos quartéis. As passeatas, depois o palanque, traziam um elenco de oposicionistas sinceros, de quintas-colunas mal disfarçados e de oportunistas de quatro costados. Os russos em nossas camas.

Bruno Carazza* - Distorções do fundão no mercado eleitoral

Valor Econômico

Concentração de recursos em poucos candidatos desequilibra a disputa

Num tempo em que a comunicação e a disseminação de informações eram precárias, acontecia de dois acadêmicos desenvolverem teorias semelhantes na mesma época, porém de forma totalmente independente.

O economista alemão Albert Hirschman havia passado um período na Universidade da Califórnia e em 1945 publicou num livro um cálculo medindo a competição nos setores de importação e exportação. De forma paralela, na Costa Leste, o doutorando Orris Herfindahl teve uma ideia semelhante para mensurar, em sua tese apresentada à Universidade de Columbia, o poder de mercado de siderúrgicas.

Apesar de pequenas diferenças nas suas formulações, os dois economistas tiveram seus nomes eternizados numa das mais ferramentas mais importantes para análise de concentração de mercados. O HHI (Hirschman-Herfindahl Index) é um parâmetro até hoje utilizado pelos órgãos antitruste na verificação do potencial de danos que uma operação de fusão ou aquisição pode causar.

Alex Ribeiro - A expansão do BNDES vai pressionar a taxa Selic?

Valor Econômico

Exercícios matemáticos e estatísticos do BC mostram que o crédito direcionado repercute bem menos as variações da Selic do que o crédito livre

Os analistas econômicos do mercado financeiro estão reavaliando os possíveis impactos do aumento do crédito direcionado nos juros básicos da economia, depois do anúncio oficial da nova política industrial pelo governo Lula.

O tema nunca saiu do radar do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central, que, nas atas das suas reuniões, repete que o aumento de crédito direcionado é um dos fatores que podem causar “impactos deletérios sobre a potência da política monetária e, consequentemente, sobre o custo de desinflação”.

Marcus André Melo* - Calcificação política

Folha de S. Paulo

A competitividade das eleições impede que perdedores revisem suas posições para ajustá-las às preferências do eleitorado

Em uma das mais influentes análises da eleição presidencial de 2020, Lynn Vavreck, Cris Tausanovitch e John Sides argumentam que o sistema político dos EUA está "calcificado", e não apenas polarizado. A calcificação alicerça-se em quatro pilares. O primeiro é que a distância ideológica entre democratas e republicanos se ampliou muito, aumentando para o leitor o custo de mudar o voto, como já discuti aqui na coluna.

O segundo é que internamente os partidos estão crescentemente mais homogêneos em termos demográficos (religião, idade, raça, rural x urbano, etc.) e programáticos. A partir dos anos 1970, por exemplo, a população branca dos estados sulistas, que era maciçamente democrata, migrou para o partido republicano, em uma sobreposição crescente de características sociais e partidarismo.

Deborah Bizarria* - As críticas à política industrial

Folha de S. Paulo

Não é de protecionismo estatal que a indústria precisa para ganhar produtividade

‘A discussão da política econômica do momento é a respeito do Nova Indústria Brasil, programa que destina R$ 300 bilhões para impulsionar a indústria a partir de linhas de crédito, subsídios e exigências de conteúdo local.

José Luís Gordon, diretor do BNDES, rebateu as primeiras críticas dizendo que as entidades dos setores beneficiados aprovaram a nova política (jura?) e que quem criticou se valia da "velha retórica dos economistas neoliberais anacrônicos". Ao mesmo tempo, não contrapõe os argumentos colocados por diversos economistas.

economista Bernardo Guimarães escreveu uma coluna explicando alguns pontos sobre a proposta. O primeiro deles é que simplesmente colocar mais recursos em um setor econômico não necessariamente vai gerar maior produtividade e crescimento.

Por isso, ter critérios claros para a escolha dos beneficiários, metas e avaliação constante seria fundamental. Assim, poderíamos evitar o contínuo desperdício de bilhões de reais em políticas que não fortalecem a indústria nem geram crescimento para o resto da economia.

Ana Cristina Rosa - Um passo à frente, dois atrás

Folha de S. Paulo

Ter um negro à frente da pasta da igualdade racial faz diferença 'para abordar as representatividades históricas'

Será que alguém que não sabe o que é ser preterido pela aparência, que jamais perdeu uma oportunidade de trabalho em razão da cor da pele, que nunca foi olhado ou tratado com suspeição pela ascendência étnica é a pessoa mais indicada para comandar uma secretaria criada para promover a igualdade racial?

Esse é o tipo de dúvida que deveria passar pela cabeça de quem se preocupa em enfrentar o racismo no país. Mas não é bem assim. E a Prefeitura de Palmas (TO) deu um excelente exemplo disso com a criação da Secretaria Municipal de Políticas Sociais e Igualdade Racial. O que poderia ser motivo de aplausos, virou alvo de críticas fundamentadas quando a prefeita, uma mulher branca, nomeou outra mulher branca para o comando da pasta.

Lygia Maria - A raposa no galinheiro

Folha de S. Paulo

Irã na presidência de grupos sobre direitos humanos e armas da ONU parece piada, mas as vítimas da teocracia não estão rindo

Sabe-se que o poder de alcance da Organização das Nações Unidas é limitado, vide a invasão do Iraque pelos EUA sem a aprovação do Conselho de Segurança. Assim como a política doméstica, a geopolítica envolve acordos e concessões que parecem contraditórios e frustrantes.

De todo modo, trata-se da entidade cuja missão é garantir a segurança global e promover os direitos humanos. Nesse sentido, a relação da ONU com o Irã causa no mínimo espanto e, no limite, indignação por aqueles que foram alvo das atrocidades cometidas pelo regime teocrático e por quem luta contra ele.

Denis Lerrer Rosenfield* - O antissemita

O Estado de S. Paulo

Deveria causar repulsa a retomada do antissemitismo pelo PT, seja de uma forma escancarada, como a de Genoino, seja a disfarçada, de Lula

Ser antissemita tornou-se fashion no campo da esquerda. Os grupos identitários esmeram-se em um racismo invertido, denominado de racialismo, vindo a identificar os judeus ao branco opressor. Como em todo campo de pobreza intelectual, os opositores dos judeus, no caso, os palestinos, seriam então os oprimidos. O Hamas, nessa simples polarização, seria então nada mais do que o representante dos oprimidos, quando, na verdade, é o seu próprio senhor. Não há pior inimigo dos palestinos do que esses terroristas.

São, na verdade, genocidas, voltados para a extinção do Estado de Israel, em sua própria carta de fundação apregoando o antissemitismo mais explícito, utilizando-se de um panfleto antissemita, produzido pela polícia tzarista, para produzir mais essa aberração intelectual. É um longo caminho do universalismo de Marx, Lenin e Trotsky aos preconceitos dos antissemitas e aos legitimadores do terrorismo islâmico.

Poesia | Amar, de Carlos Drummond de Andrade

 

Música | Zeca Pagodinho, Moacyr Luz & Samba do Trabalhador - Vida da minha vida