terça-feira, 2 de dezembro de 2014

Opinião do dia – Jarbas Vasconcelos

"Esse modelo começa justamente tentando esvaziar o poder da democracia representativa da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, e, paralelamente, busca coibir a liberdade da imprensa."

Jarbas Vasconcelos, senador (PMDB-PE) e eleito deputado federal, do discurso de despedida em critica ao PT

Governo pressiona Congresso com verba

• Planalto condiciona liberação de emendas à alteração da meta fiscal

• Oposição acusa Executivo de Chantagear parlamentares para forças a aprovação da regra que permite descumprir superávit; Dilma reúne líderes e diz que, sem mudança estados e municípios sofrerão consequências

Toma lá dá cá

• Decreto condiciona liberação de emendas parlamentares à aprovação de mudança na meta fiscal

Cristiane Jungblut – O Globo

BRASÍLIA- Em meio ao processo de votação da proposta que muda a meta fiscal de 2014, o governo editou na sexta-feira um decreto que condiciona uma nova liberação de R$ 444,7 milhões para emendas individuais dos parlamentares ao Orçamento à aprovação da proposta que altera a meta fiscal deste ano. As emendas são as meninas dos olhos de deputados federais e senadores por se tratarem de obras e intervenções governamentais geralmente destinadas pelos políticos a suas bases eleitorais. O decreto da presidente Dilma Rousseff promete ampliar em R$ 10,032 bilhões os gastos de toda a máquina pública neste ano e destina essa cota de R$ 444,7 milhões aos 594 parlamentares (513 deputados e 81 senadores), o que garantiria uma fatia de R$ 748 mil para cada um deles. Isso significa que cada um fecharia 2014 com R$ 11,6 milhões destinados às bases.

O texto do decreto, no entanto, deixa explícita a condicionante entre a liberação dos gastos e a aprovação do projeto que altera a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2014 e permite ao governo descumprir a meta fiscal deste ano. "A distribuição e utilização do valor de ampliação ficam condicionadas à publicação da lei resultante da aprovação do PLN 36 (que é o projeto que altera a meta fiscal)" , diz o decreto assinado no dia 28 e publicado em edição extra do Diário Oficial do mesmo dia.A oposição reagiu. O líder do DEM na Câmara, deputado Mendonça Filho (PE), qualificou como "decreto da chantagem " a medida assinada pela presidente.—Com o decreto, o governo está pressionando, emparedando a base aliada. Esse é o decreto da chantagem : ou aprova a alteração da LDO ou não tem direito às emendas — disse Mendonça Filho.

Oposição critica
A pressão do Planalto ocorre depois da rebelião da base alia da na semana passada, quando os parlamentares dos partidos do governo não compareceram à sessão do Congresso . Ontem, além de garantir o chamado empenho (promessa de pagamento futuro) das verbas , Dilma se reuniu à noite com os líderes dos partidos governistas . O Congresso tem nova sessão às 18h de hoje para tentar votar , mais uma vez, a redução da meta fiscal de 2014. Na mesma linha, o líder do PSDB no Senado, Aloysio Nunes Ferreira (SP), acusou o governo de "não ter vergonha" em suas pressões junto ao Congresso para aprovar uma proposta que permite descumprir a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) e a lei orçamentária. Ele lembrou que a condicionante está detalhada no decreto.

— É uma chantagem com os parlamentares. E explícita, está escrita. É um governo que não tem vergonha. É a pouca vergonha — disse Aloysio Nunes Ferreira. Na base, os parlamentares se mostraram satisfeitos, mas adotaram o discurso de que o governo é obrigado a pagar as emendas e que os empenhos já estavam atrasados. Publicamente, no entanto, evitavam reconhecer o impacto que isso deve provocar nas votações. O líder do PMDB na Câmara, deputado Eduardo Cunha (RJ), afirmou que o decreto não acaba com todos os problemas e que o governo apenas estaria fazendo o que determina a LDO, que é prever os recursos para as emendas.— O decreto apenas amplia o limite de empenho. Mas precisa saber se o governo vai fazer mesmo o empenho.

O prazo é até dia 5 de dezembro, e ainda temos um buraco das liberações anteriores, cujos valores não foram empenhados de fato — disse Eduardo Cunha. O líder do PT no Senado, Humberto Costa (PE), também evitou fazer a relação.—O governo tem que liberar mesmo. São as regras do Orçamento Impositivo — disse Costa. Em 2014, foi aprovada a medida que tornou obrigatória a aplicação das emendas individuais. As regras das chamadas Emendas Impositivas foram incluídas na LDO de 2014. Ela obriga o governo a executar 1,2% da receita corrente líquida da União em emendas individuais dos parlamentares .

Do total, 50% das emendas devem ser destinadas a ações em Saúde. Por isso, o ministério ficou com valor maior . Em fevereiro, quando publicou o decreto com o montante que seria contingenciado do Orçamento da União , o governo havia destinado R$ 6,4 bilhões para as emendas individuais . Agora, o valor foi ampliado para R$ 6,9 bilhões. Na prática, o governo está aumentando os gastos em R$ 10,032bilhões neste fim de ano, em relação aos limites que havia fixado em fevereiro, quando anunciou o congelamento de parte dos gastos públicos. Em fevereiro, os gastos estavam liberados em R$ 252,6 bilhões e, agora, o valor final subiu para R$262,6 bilhões, no acréscimo de R$ 10,032 bilhões. No decreto, o governo ressalta ainda que,"não aprovado o PLN 36, os Ministérios do Planejamento e da Fazenda elaborarão novo relatório de receitas e despesas".

O Planalto considerou natural a edição do decreto, afirmando que faz parte da execução orçamentária. Quanto à condicionante, o ministro Ricardo Berzoini, por meio da assessoria, informou que o chamado descontingenciamento (liberação) depende de uma "questão objetiva", que é o limite de superávit que o governo tem praticado. Além disso, o Planalto diz que a LDO obriga o pagamento das emendas.

Alteração até 22 de dezembro
Com uma verba total de R$ 6,9 bilhões para as emendas no ano, os ministérios da Saúde, Cidades e Agricultura são os maiores beneficiados. O Ministério da Saúde fecharia o ano com R$ 3,2 bilhões em emendas individuais. Já o Ministério das Cidades, onde há obras do Programa de Aceleração do Crescimento (P AC) e do programa Minha Casa, Minha Vida, ficou com R$ 1,09 bilhão no ano. O Turismo ficou com R$ 348,5 milhões, e a pasta da Agricultura, com R$ 312,5 milhões.

Para 2015, as regras deverão ser incluídas na LDO ainda em discussão. Isso porque a PEC do Orçamento Impositivo já foi aprovada no Senado, mas voltou à Câmara, onde está parada. O presidente da Casa, deputado Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), tem a aprovação da PEC como um ponto de honra, mas a discussão emperrou por causa de uma proposta que foi incluída e que trata de financiamento da Saúde. Por isso , a regra colocada na LDO de 2014 — prevendo as emendas impositivas — deverá ser colocada na LDO de 2015. O relator da LDO de 2015, senador Vital do Rêgo (PMDB-PB), aguar da uma re união com a nova equipe econômica para apresentação se seu parecer fin al. A LDO do ano que vem foi enviada em abril e até agora não foi aprovada.

O governo tem até 22 de dezembro, quando encerra o ano legislativo , para aprovar a mudança na LDO de 2014. Caso contrário , descumprir á a LRF ,o que pode resultar em punições aos gestores da política econômica e à própria presidente . As punições estão previstas na lei 10.028, de 2000. O artigo 5° prevê que o gestor pagará multa de 30% dos vencimentos anuais, aplicada pelo Tribunal de Contas da União (TCU)

Dilma ameaça cortar verbas de governos estaduais

• Em reunião com base aliada, presidente diz que aprovação irá garantir empregos e obras

Júnia Gama, Cristiane Jungblut e Chico de Gois – O Globo

BRASÍLIA- Numa reunião de cerca de duas horas com lideranças da base aliada no Congresso, a presidente Dilma Rousseff fez um apelo para que seja aprovado hoje o projeto de lei que é visto como uma manobra do governo, uma vez que lhe permite não cumprir a meta de economia para pagamento dos juros, o chamado superávit primário. Para convencer os parlamentares, Dilma deixou claro que, se a mudança não for aprovada, os governos estaduais e municípios sofrerão as consequências com corte de verbas para execução de obras. Dilma, o vice-presidente Michel Temer, e os ministros da Casa Civil, Aloizio Mercadante, e da Secretaria de Relações Institucionais, Ricardo Berzoini, receberam 23 deputados e senadores.

A presidente, segundo relatos de quem participou, foi objetiva em sua fala e disse que a aprovação do projeto irá garantir a manutenção de empregos e a continuidade de obras públicas. Em entrevista após a reunião, Berzoini deu o tom do encontro, indicando que as bases dos parlamentares poderão sair prejudicadas caso os aliados não se unam para aprovar o projeto. Segundo Berzoini, até mesmo o líder do PMDB, Eduardo Cunha (RJ) — considerado um chefe rebelde na Câmara — ter ia se comprometido a mobilizar os deputados pela votação hoje. —O importante é o convencimento do impacto que teria para o país a não aprovação dessa modificação para prefeitos, governadores, para o emprego, para a renda, porque forçaria o governo, no último mês do ano, a fazer uma execução orçamentária muito restritiva. Então, nosso objetivo é garantir que o governo possa fazer sua execução orçamentária, que também influencia a execução de estados e municípios — apontou Berzoini.

Dilma disse que é importante a aprovação hoje para dar recado positivo ao mercado. Segundo parlamentares, ela defendeu as medidas adotadas e disse que se não as tivesse posto em prática, o Brasil poderia ter PIB de 1.5% negativo em 2014. A maior parte da reunião girou em torno dos procedimentos de votação, já que dois vetos traçam a pauta, e há ainda um projeto de crédito extraordinário na frente da proposta que muda a meta fiscal

Governo vincula liberação de verbas a aval do Congresso à manobra fiscal

• Decreto firmado por Dilma promete liberar R$ 444 milhões para investir em redutos eleitorais

• Planalto nega que faça pressão; Dilma afirma que fracasso na votação pode gerar desemprego e bloqueio de repasses

Márcio Falcão, Ranier Bragon e Gabriela Guerreiro – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - Em novo esforço para aprovar uma manobra fiscal que permita fechar suas contas neste ano, o governo acenou aos congressistas a liberação de R$ 444 milhões para obras e investimentos em seus redutos eleitorais.

Em reunião na noite desta segunda (1º) com os líderes dos partidos aliados, Dilma Rousseff também fez um apelo pessoal e disse, segundo relatos, que o fracasso da medida pode gerar desemprego, diminuição da renda, recessão e bloqueio de repasses a Estados e municípios.

A promessa da verba foi inserida em decreto assinado por Dilma na sexta (28) para desbloquear R$ 10,032 bilhões do Orçamento de 2014.

Publicado no "Diário Oficial da União", o texto explicita que o pagamento só será autorizado se deputados e senadores aprovarem o projeto de lei que permite ao governo descumprir a meta de economia para pagamento de juros da dívida pública em 2014, o chamado superavit primário.

De janeiro a outubro, as contas públicas acumularam um deficit de R$ 11,6 bilhões.

O Congresso se reúne nesta terça (2) para tentar novamente votar a matéria, o que só poderá ocorrer após a análise de dois vetos presidenciais a outros projetos. Nas últimas semanas, o Planalto tem enfrentado dificuldades impostas pelos próprios aliados para avançar o projeto.

Base insatisfeita
A principal insatisfação da base é com o rumo da reforma ministerial. Há ameaça de rebelião nas bancadas do PMDB, do PP, do PR e do Pros.

Com a mudança no decreto, as emendas individuais, um dos principais capitais eleitorais dos políticos, somarão R$ 6,9 bilhões. Em fevereiro, elas tinham sido restritas a R$ 6,4 bilhões.

Os outros R$ 9,6 bilhões do texto serão destinados a investimentos e custeio em áreas como saúde e educação.

O ministro Ricardo Berzoini (Relações Institucionais) nega que o decreto seja instrumento de pressão sobre os aliados. Ele diz que as emendas foram inseridas porque neste ano o governo tem obrigação de liberar os recursos.

Considerada prioridade zero pelo governo, a flexibilização do superavit também foi tratada à noite na reunião de Dilma com os aliados, no Planalto, a primeira após a sua reeleição. Segundo congressistas, embora o tom tenha sido de apelo à boa vontade dos aliados, muitos dos argumentos usados refletem a pressão patrocinada pelo Planalto.

Entre eles o de bloqueio de repasses a Estados e municípios caso a regra do superavit não seja flexibilizada.

Diante desse cenário, Berzoini e o vice-presidente Michel Temer (PMDB) ficaram de conversar com governadores para que eles mobilizem seus aliados no Congresso.

"A maioria já sabe disso, mas, quando se fala da importância da execução orçamentária deste último mês do ano para Estados e municípios, todos ficam mais conscientes de que não é só importante comparecer, mas permanecer em plenário para que todos possam votar o mais breve possível [o projeto] e vencer a eventual e previsível obstrução da oposição", disse Berzoini.

Governo condiciona pagamento de emendas à flexibilização do superávit

• Ministro diz que liberação aguarda votação do projeto que modifica regras da política fiscal; oposição fala em 'chantagem'

Ricardo Della Coletta - O Estado de S. Paulo

Brasília - O pagamento do restante das emendas parlamentares individuais previstas para este ano, instrumento fundamental para que deputados e senadores abasteçam seus redutos eleitorais, é a moeda de troca usada pelo governo federal para garantir a aprovação do projeto de lei que flexibiliza a meta do superávit primário. O Planalto condicionou a liberação das emendas à aprovação da proposta considerada "prioridade total" pelo Executivo, segundo a Secretaria de Relações Institucionais (SRI).

A projeto visa permitir que a equipe econômica possa descontar todos os investimentos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e as desonerações tributárias da economia mínima para o pagamento dos juros da dívida pública. A manobra dá um aval para que a meta seja considerada atingida mesmo se o resultado primário for bem abaixo dos R$ 49 bilhões previstos na legislação em vigor.

Por isso, PSDB, DEM e PPS têm acusado a presidente Dilma Rousseff de pedir um cheque em branco para não ser responsabilizada por um eventual descumprimento da meta.

Ao Broadcast Político, a SRI, chefiada pelo ministro Ricardo Berzoini (PT), confirmou que a liberação das programações está aguardando a votação do projeto que modifica as regras da política fiscal. "Com a aprovação do PLN 36/2014 (flexibilização do superávit), todas as emendas serão pagas assim que estiverem em conformidade para receber os recursos", disse a assessoria de imprensa da pasta, ao ser questionada se era factível pagar, em apenas um mês, o montante de emendas que obrigatoriamente precisa ser executado até o final do ano.

De acordo com dados levantados pela Consultoria de Orçamento da Câmara, o governo pagou, até o dia 24 de novembro, R$ 2,09 bilhões em emendas parlamentares individuais. Por um dispositivo inserido na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) deste ano, chamado de "Orçamento Impositivo", o mínimo que o Planalto deve desembolsar é de R$ 6,9 bilhões até o final do ano. Dessa forma, é preciso dar vazão a R$ 4,8 bilhões até o final deste ano.

"As emendas são pagas à medida em que são feitas as medições e solicitado o pagamento pelos ministérios. Este ano, houve a interrupção do pagamento devido ao período eleitoral, por isso o valor ainda está relativamente baixo", justificou a SRI.

Já o valor empenhado, etapa anterior ao pagamento e que "reserva" os recursos no Orçamento para uma determinada ação, é bem maior. Até 24 de novembro, foram empenhado R$ 5,21 bilhões.

A decisão do Palácio do Planalto de "congelar" o pagamento de emendas até que os parlamentares aprovem os abatimentos da meta gerou críticas da oposição. Para o líder do DEM, deputado Mendonça Filho (PE), o governo busca "chantagear" o Congresso. "É uma forma de chantagear o Congresso e pressionar os parlamentares a avalizar a irresponsabilidade fiscal e a irresponsabilidade do governo Dilma", afirmou.

Jarbas Vasconcelos se despede do Senado com críticas ao PT

Isadora Peron – O Estado de S. Paulo

O senador Jarbas Vasconcelos (PMDB-PE) se despediu nesta segunda-feira do Senado com críticas ao PT e defendendo a necessidade da realização de uma reforma política. Ele assumirá, a partir do próximo ano, uma vaga na Câmara dos Deputados. Apesar de ser do PMDB, Jarbas sempre fez oposição aos governos petistas, tanto durante o segundo mandato do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva quanto no primeiro de Dilma Rousseff.

Em seu discurso, ele acusou o PT de abandonar a ética que pregava quando era oposição e de lançar mão de "todas as armas" para continuar no poder. A consequência disso, segundo ele, seria que os "escândalos de corrupção se multiplicaram, passando a fazer parte da paisagem cotidiana". O senador citou como exemplo os casos do mensalão e as recentes denúncias envolvendo a Petrobras.

Jarbas afirmou ainda que o País vive uma "crise sem precedentes" na economia e que o cenário atual se assemelha a de um "filme de terror", apesar de a propaganda governamental tentar demonstrar que estamos vivendo no "País das Maravilhas".

"Este governo que aí está, da presidente Dilma Rousseff, não tem condições de implantar as mudanças que o Brasil precisa", disse.

Reforma
Para demonstrar que a pauta da reforma política não avançou, ele citou como exemplo o primeiro discurso que fez na Casa, em março 2007, que tratava justamente do tema. Na época, o pernambucano citou a necessidade de serem aprovadas novas regras para o sistema político, como o financiamento público das campanhas eleitorais e o fim das coligações proporcionais. As medidas até hoje não foram implementadas.

O peemedebista criticou, porém, a sugestão da presidente de fazer um plebiscito sobre o assunto e disse que a proposta de Dilma tem como objetivo implantar o "modelo bolivariano" já adotado por países como Venezuela, Equador e Bolívia. "Esse modelo começa justamente tentando esvaziar o poder da democracia representativa da Câmara dos Deputados e do Senado Federal e, concomitantemente, busca coibir a liberdade de imprensa", afirmou.

Câmara
Depois de oito anos como senador, Jarbas decidiu concorrer a uma vaga para a Câmara nas últimas eleições. Ele voltará à Casa depois de 30 anos, já que o último mandato que cumpriu como deputado foi entre 1983 e 1985.

Em seu discurso de despedida na tribuna, ele disse que vai levar para a nova Casa as mesmas bandeiras que defendeu no Senado. Ou seja, vai continuar como dissidente do PMDB, fazendo oposição ao governo.

Segundo ele, para manter essa postura dentro do seu partido foi preciso pagar um "elevado preço", mas que "não guarda mágoas". "Não abriria mão de minhas convicções para estar em sintonia com a prática do ''é dando que se recebe''", disse.

Durante as eleições, Jarbas apoiou a candidatura à Presidência de Eduardo Campos (PSB), de quem se aproximou em 2012 justamente com o objetivo de derrotar o PT na disputa pela prefeitura do Recife. Com a morte de Campos, ele passou a apoiar Marina Silva. No 2º turno, subiu no palanque do tucano Aécio Neves. Segundo a assessoria do senador, apesar de ter feito nesta segunda-feira o seu discurso de despedida, Jarbas vai continuar comparecendo às sessões, até o final do ano legislativo, marcado para 22 de dezembro.

Jarbas critica Planalto ao deixar o Senado

• Dissidente do PMDB diz que PT deixou ética de lado e que cenário do país é de filme de terror

Maria Lima – O Globo

BRASÍLIA- Um dos mais ácidos críticos do governo, dissidente no PMDB, o senador Jarbas Vasconcelos (PE), fez ontem um discurso de despedida do Senado com duros ataques ao Planalto e aos escândalos de corrupção do governo petista. Ele disse que não se considera um pessimista, mas diz que, em vez do "País das Maravilhas" da propaganda governamental, o cenário atual está mais para um "filme de terror" . Jarbas troca a tribuna do Senado pela tribuna da Câmara dos Deputados, na próxima legislatura , de onde deve continuar integrando o grupo que faz a mais dura oposição ao governo .No longo discurso, com apartes de apoio de outros senadores que integram o grupo dos independentes, Jarbas disse que a política perdeu com a degradação dos governos do PT , que deixou de lado a ética que professava quando estava na oposição para lutar pela permanência no poder usando todas as armas que estiverem ao alcance.

Lembrando a pequena margem de votos que levou à derrota do candidato da oposição Aécio Neves, Jarbas disse que a "maioria" — somando os aecistas com os nulos, em branco e ausentes — não aprovou o governo da presidente Dilma Rousseff. Sobre o esquema de desvios na Petrobras, acusou de crime de lesa-pátria o escândalo.— Vai demorar anos para a empresa retomar a tranquilidade necessária para enfrentar os desafios que não são apenas dela, mas que envolvem o nosso próprio futuro como nação.Mesmo na oposição, nunca me comportei pela máxima do "quanto pior, melhor". Tenho responsabilidades com Pernambuco e com o Brasil. Mas me nego a concordar com essa flexibilidade ética que o PT busca implantar no Brasil, deque o mesmo erro pode ser repetido pela enésima vez, sem consequência alguma — disse Jarbas. Jarbas criticou a intenção do governo e do PT de fazer uma reforma política de "faz de conta ", que foi prometida pelo ex-presidente Lula e por Dilma, e nunca feita.

—Porém, a palavra mágica agora é "plebiscito", indicando claramente que o PT pretende implantar o modelo "bolivariano ", já em funcionamento em países como Venezuela , Equador e Bolívia. Esse modelo, senhor presidente , começa justamente tentando esvaziar o poder da democracia representativa da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, e, paralelamente, busca coibir a liberdade da imprensa. As comemorações pela vitória apertada da presidente da República foram marcadas por ataques aos meios de comunicação , um setor que ainda resiste , felizmente , ao "modo petista " de governar — disse Jarbas . Jarbas lembrou as dificuldades enfrentadas no PMDB para exercer seu mandato, por se aliar a oposição contra o governo do PT , que tem Michel Temer como vice-presidente.

Mas disse que não se arrepende. E criticou o adesismo do PMDB em troca de cargos: — Não guardo mágoa. Não abriria mão de minhas convicções para estar em sintonia com a prática do "é dando que se recebe", de uma prática que resultou na série de escândalos de corrupção, nos últimos 12 anos, do mensalão a esse mais recente , que destrói a Petrobras. Jarbas encerrou seu longo pronunciamento prometendo manter o mesmo tipo de atuação na Câmara:—Nossa luta agora é para impedir que o Brasil perca as conquistas dos últimos 30 anos. Como deputado federal representando o povo de Pernambuco,não me calarei diante das tentativas de esvaziar a força da democracia representativa; não ficarei omisso quando tentarem calar a imprensa; não fugir ei do embate para impedir o controle hegemônico das instituições democráticas.

Aécio diz que perdeu para ‘organização criminosa’ e PT reage

• Presidente do partido, Rui Falcão, diz que vai à Justiça contra tucano por declarações, consideradas 'infâmias' por petistas

Isadora Peron - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - O presidente nacional do PT, Rui Falcão, afirmou nesta segunda-feira, 1, que a sigla vai interpelar judicialmente o senador Aécio Neves (PSDB-MG), que em entrevista à GloboNews disse que não perdeu a eleição presidencial para um partido, mas para uma "organização criminosa". "Estamos interpelando o senador mineiro derrotado. Em seguida, processo crime no STF. O PT não leva recado para casa...", escreveu Falcão no Twitter.

A declaração de Aécio foi dada ao jornalista Roberto D’Ávila. “Eu não perdi a eleição para um partido político. Eu perdi a eleição para uma organização criminosa que se instalou no seio de algumas empresas brasileiras patrocinadas por esse grupo político que aí está.”

No Senado, a reação foi por meio de declaração do líder do PT no Senado, Humberto Costa (PE). Da tribuna, o petista rebateu afirmando que o tucano acena para setores golpistas da sociedade.

"O quixotesco perdedor das eleições de outubro continua lutando contra imaginários moinhos de vento. Já estamos em dezembro. Não é possível que, mais de um mês depois do pleito, Vossa Excelência ainda esteja em um mundo à parte, ora agindo como se recontasse votos, ora criando novas teorias contra a legitimidade da presidenta reeleita, ora acenando até para setores golpistas da sociedade", afirmou Costa em discurso na tribuna do Senado.

As afirmações de Aécio foram tratadas como "infâmia" pelo líder do PT, que acusou o tucano de criar o seu próprio "enredo" para explicar a derrota nas urnas. "É uma infame ópera-bufa, essa que está sendo protagonizada pelo que chamo de 'candidato derrotado em exercício', onde sobejam atuações de péssimo gosto e para as quais há cada vez menos holofotes", disse. O petista aconselhou Aécio a "virar a página" e "abrir um novo livro" para atuar como oposição de maneira legítima e ajudar o País a avançar.

O senador Lindbergh Farias (PT-RJ) também rebateu as críticas de Aécio e afirmou que o PT vai entrar na Justiça contra as declarações do tucano. "Ele (Aécio) passou de todos os limites."

Em Florianópolis, Aécio comentou a iniciativa do PT de processá-lo. “Estão chegando um pouco tarde, porque essa expressão foi a mesma utilizada pela Polícia Federal no momento em que desbaratava essa quadrilha que atuou durante 12 anos na Petrobrás”, afirmou. Ele também rebateu as críticas de Humberto Costa (PT-PE), observando que o líder petista no Senado é suspeito de ter se beneficiado do esquema na estatal.

PT diz que processará Aécio, e tucano reage

• Falcão afirma que partido "não leva recado para casa "; senador mantém sua declaração sobre "organização criminosa "

Maria Lima e Cristiane Jungblut – O Globo

BRASÍLIA- Vai parar nos tribunais a guerra entre o PSDB do senador Aécio Neves e o PT da presidente Dilma Rousseff. O presidente nacional do PT, Rui Falcão, anunciou ontem em sua página no Twitter que já está interpelando Aécio Neves para que confirme na Justiça declaração de que não perdeu a eleição presidencial, quando disputou com a presidente Dilma, para um partido político, mas para uma "organização criminosa ". Rui Falcão disse que o passo seguinte será um processo por injúria, calúnia e difamação contra ele no Supremo Tribunal Federal, instância em que é julgado quem tem foro privilegiado. "Já estamos interpelando o senador mineiro derrotado. Em seguida, processo crime no STF . O PT não leva recado para casa... ", reagiu Rui Falcão ontem à tarde na rede social.

Na entrevista veiculada na madrugada de domingo na Globo News, e repetida na programação do canal, Aécio lembrou o uso da máquina pública por lideranças petistas durante a eleição e o esquema de corrupção na Petrobras batizado de petrolão.— Na verdade, eu não perdi a eleição para um partido político. Eu perdi a eleição para uma organização criminosa que se instalou no seio de algumas empresas brasileiras patrocinadas por esse grupo político que aí está — disse o tucano. Ao saber da interpelação, Aécio avisou que não retira uma palavra do que disse e que é preciso aguardar que a Polícia Federal faça, sem qualquer tipo de cerceamento, as investigações que tenha a fazer . Em resposta a Falcão, Aécio — que tem imunidade parlamentar — disse, em Santa Catarina, que a expressão foi usada primeiro pela própria PF , ao desbaratar a "quadrilha" que atuou durante 12 anos na Petrobras.— Não retiro absolutamente nada do que disse — avisou Aécio.

"O PT tem esse vício", diz tucano
Minimizando a ação, Aécio disse que poderia citar inúmeras outras declarações, como a do ex-presidente do STJ Felix Fischer de que nenhum outro país do mundo viveu tanta roubalheira como o Brasil. Também lembrou que o ministro Newton Trisotto, chamado a definir um mandato de segurança para um dos membros da quadrilha, negou dizendo que é uma das maiores vergonhas da humanidade a corrupção que se instalou no Brasil.— O PT tem esse vício. Em vez de interpelar os seus membros que cometeram crimes, como,por exemplo, na época do mensalão, tratou-os como heróis nacionais. Agora, em vez de interpelar , por exemplo, o tesoureiro do seu partido,acusado por um dos membros da quadrilha de ser uma parte desse processo, o PT quer processar o acusador , como, aliás, vão fazer com a própria Polícia Federal.

Essa eleição, como disse aqui, infelizmente, teve essa marca da utilização, sem qualquer limite, da máquina pública. Os recursos ou parte dos recursos desse esquema de corrupção, há indícios de que possam terem sidos utilizados na própria campanha eleitoral — reagiu Aécio.Indignado com a entrevista de Aécio, o ministro do Desenvolvimento Agrário, Miguel Rossetto, reagiu repetindo o discurso da maioria dos petistas diante das críticas do tucano:— Alguém deve lembrar ao senador Aécio que ele foi derrotado por 54.501.118 milhões de brasileiros; e aproveitar e passar o endereço de um dos excelentes terapeutas que o Rio de Janeiro tem — ironizou ao GLOBO Miguel Rossetto, um dos coordenadores da campanha de Dilma.O líder do PSDB na Câmara, Antônio Imbassahy (BA), saiu em defesa do senador tucano.

— Não vejo legitimidade no presidente do PT , Rui Falcão, que até ontem festejava os três grandes detentos da Papuda como heróis da pátria e incentivava aplausos para o atual tesoureiro do PT , João Vaccari. Essa ação na Justiça contra Aécio é desprovida de qualquer credibilidade. Ademais, quem identifica essa organização criminosa que se instalou no governo Lula e foi ampliada no governo Dilma é a Polícia Federal— reforçou Imbassahy. Outros petistas ocuparam a tribuna do Senado para contra-atacar a declaração de Aécio. O líder do PT , Humberto Costa (PE), chamou-o de "irresponsável" e acusou o tucano de ter feito uma séria de declarações "insensatas". Para Humberto Costa, "a derrota subiu à cabeça de Aécio". Ele disse que que o senador tucano se comporta como um Dom Quixote, brigando contra moinhos de ventos inexistentes.

— Enquanto o Brasil já desmontou os palanques, os governadores estudam os próximos quatro anos, enquanto a presidente compõe sua nova equipe e se debruça sobre medidas que vão ser tomadas a partir de 2015, o quixotesco perdedor continua lutando contra imaginários moinhos de vento . Já estamos em dezembro. Não é possível que, mais de um mês depois do pleito, Vossa Excelência ainda esteja em um mundo à parte . Ora agindo para recontar votos, ora criando teorias contra a legitimidade da presidente reeleita, ora acenando para setores golpistas da sociedade. Chega. Passou da hora de assumir a derrota. Ganhar e perder são atos próprios da democracia — disse Humberto Costa.

"Vire a página", recomenda Humberto Costa
Para Costa, Aécio não "aceitou a derrota":— Desta vez não deu para derrotar o PT , senador! Paciência. Foi derrotado em Minas. Vire a página, abra um novo livro para a História do nosso país. É preciso deixar de lado esse comportamento pueril. Interlocutores do presidente do PSDB chegaram a afirmar que o tucano não iria "bater boca" com senadores, mas, indagado sobre a ação do PT , Aécio aproveitou para atacar Costa, lembrando o fato de este ter sido acusado de receber recursos do esquema de desvios da Petrobras.— Vi até uma declaração do líder do PT no Senado me fazendo acusações.

Em relação ao líder Humberto Costa, até relevo o momento difícil por qual ele passa, porque ele tem que dividir suas idas à tribuna em algumas delas acusar a oposição e em outras para se defender da acusação de ter sido beneficiário na sua eleição de recursos do esquema de corrupção da Petrobras — contra-atacou Aécio. O senador Linbergh Farias (PT-RJ) disse que o senador Aécio passou dos limites na entrevista.E que o tucano estimula movimentos golpistas.— Não aguento mais o senador Aécio falar que sofreu uma campanha sórdida. É hora de encerrar esse debate eleitoral. Tenta radicalizar porque está perdendo espaço dentro do PSDB. Talvez o último caminho dele seja gritar mais alto, ser o mais radical. Estão agindo como a velha UDN, como o velho Partido Republicano dos EUA — afirmou Linbergh.

O poder bichado - O Estado de S. Paulo / Editorial

Do doleiro Alberto Youssef se pode afirmar que o que ele não sabe não vale a pena saber. E se tiver contado aos investigadores da Operação Lava Jato a metade que fosse apenas do que conhece em primeira mão, a Polícia Federal e o Ministério Público têm diante de si um cenário de bandalheiras que reduz a uma poça o "mar de lama" de tempos idos. Como informou ontem este jornal, por exemplo, a certa altura das suas mais de 100 horas de depoimentos em regime de delação premiada, concluídos há uma semana, o operador que desinfetou, por baixo, R$ 10 bilhões em dinheiro contaminado disse que "só sobram dois" no Partido Progressista (PP) sem envolvimento com a extração sistemática de recursos da Petrobrás.

Desde as eleições municipais de 2012, quando o pepista Paulo Maluf acolheu de braços abertos o candidato petista Fernando Haddad à Prefeitura de São Paulo - coroando uma operação conduzida pelo companheiro Luiz Inácio Lula da Silva, capaz de tudo para provar que poderia eleger um segundo poste, depois de Dilma Rousseff -, os partidos não se largam. Um ano antes ela entregara ao PP, na pessoa do então deputado federal baiano Mário Negromonte, o Ministério das Cidades. Ele caiu da cadeira em razão de denúncias de contratos irregulares da pasta com ONGs e de superfaturamento de obras para a Copa. Foi substituído pelo também pepista Aguinaldo Ribeiro. O PP tem atualmente 37 deputados e 5 senadores na ativa. A menos que, nas suas contas, Youssef tenha incluído membros do partido sem mandato, a sigla abrigaria 40 parlamentares de mãos manchadas.

Pudera! A força-tarefa da Lava Jato tem motivos para acreditar que o assalto aos cofres da Petrobrás começou há pelo menos 15 anos. Mas o saque só foi sistematizado a partir de 2004, graças ao talentoso José Janene, o também mensaleiro de primeira grandeza que viria a falecer em 2010. Ele pôs ordem na lambança, transformando a corrupção no varejo "em esquema de organização partidária", nas palavras de um investigador. O butim foi distribuído entre os dirigentes de siglas acumpliciadas. Modesto, o PP ficava com 1% dos contratos da Diretoria de Abastecimento da petroleira, conduzida por indicação do partido ao então presidente Lula pelo arquicorruptor confesso Paulo Roberto Costa. Somando esse e outros setores, a cota do PMDB também girava em torno de 1%. Mas a parte do PT era três vezes maior.

A insuportável realidade é que está tudo bichado nos palcos do poder. Ainda na edição de ontem o Estado noticiou que o Tribunal de Contas da União (TCU) passou a apurar em caráter prioritário suspeitas de outras falcatruas que teriam sido cometidas por empreiteiras fisgadas pela Operação Lava Jato no escândalo da Petrobrás, dessa vez em parcerias firmadas pela Eletrobrás com o setor privado - as chamadas Sociedades de Propósito Específico (SPE), que funcionam como se fossem empresas particulares. Por força desse arranjo, o TCU só consegue fiscalizar os gastos das empresas públicas participantes. Apesar dessa limitação, já em 2011 a Corte de contas advertia para "a má gestão dos recursos públicos aplicados por meio das SPE". Material para um exame acurado não falta. Nos últimos cinco anos, a Eletrobrás investiu R$ 9,7 bilhões em 150 negócios nessa modalidade de parceria.

As ramificações da farra na Petrobrás, que por muito tempo continuarão no centro das atenções, são o que delas se poderia esperar. No começo da semana passada, o último foragido da Lava Jato entregou-se à polícia. Trata-se do transportador de dinheiro de Youssef, Adarico Negromonte Filho, irmão do já citado ex-ministro das Cidades. Em um nível muitíssimo mais raso, a fraternidade do mal atingiu outro membro do Gabinete dilmista - o ministro da Agricultura, Neri Geller, do PMDB.

Na sexta-feira, dois de seus irmãos, Odair e Milton, foram presos sob a acusação de pertencer a uma quadrilha que grilava terras destinadas à reforma agrária. É o mais recente, decerto não o último, caso da epidemia de indecência no centro do poder e arredores.

Para ser "muito melhor" do que tem sido, como prometeu, Dilma precisa não só acertar as contas federais, mas refazer o seu governo em bases morais mais firmes.

PSDB pede que TSE rejeite as contas da campanha de Dilma

• Representação alega que petista excedeu teto de gastos; senador contesta acusação

Gabriela Guerreiro – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - O PSDB pediu à Justiça Eleitoral a reprovação das contas da campanha da presidente Dilma Rousseff à reeleição para a Presidência.

Os tucanos afirmam, em representação encaminhada ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral) no sábado (29), que as despesas declaradas apontam ilegalidades que impedem a aprovação das contas, como gastos superiores ao teto de R$ 295 milhões fixado pela campanha de Dilma, que somaram R$ 350,5 milhões.

O PSDB afirma que, embora o PT tenha solicitado oficialmente ao TSE a ampliação do limite de gastos, o pedido ocorreu dois dias antes do pleito --e foram executados antes do aval da Justiça.

"Com a apresentação das contas finais está comprovado que os gastos que ultrapassaram os limites foram realizados anteriormente ao pedido de alteração de valores", afirma o PSDB.

Os tucanos também argumentam que o site Muda Mais, mantido pela campanha de Dilma, foi pago com recursos omitidos pelos aliados da petista. "A campanha de Dilma Rousseff omitiu despesas relevantes de sua campanha eleitoral, cujo montante é impossível ser calculado", afirma a representação.

Segundo os tucanos, a empresa titular do site, a Polis Propagandas, recebeu pagamentos da campanha detalhados na prestação de contas como "produção de programas de rádio, televisão ou vídeo", sem pagamentos relacionados à internet.

Outro argumento do PSDB é que as despesas de Dilma com transporte ou deslocamento somam R$ 5 milhões, de acordo com a prestação de contas, mas o valor estaria abaixo do efetivamente gasto se comparado com a prestação de contas de Lula, que também usou a aeronave oficial do Planalto para suas viagens na campanha de 2006.

O senador Humberto Costa (PT-PE) negou a existência de irregularidades. Ele disse que elas serão aprovadas porque a presidente não cometeu ilegalidades. Costa disse que, apesar da análise das contas estar a cargo de Gilmar Mendes, elas serão aprovadas: "Estamos tranquilos, essas contas vão ser aprovadas". O PT ainda não respondeu aos questionamentos.

Lula manda catadores cobrarem Dilma

Cristiane Agostine – Valor Econômico

SÃO PAULO - O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva incentivou ontem catadores de material reciclável a cobrar a presidente Dilma Rousseff por mais benefícios. Lula afirmou que tem dito à presidente Dilma que quem está no governo precisa saber "de que lado está" e para quem deve priorizar os programas de política pública.

Ao participar da inauguração da ExpoCatadores 2014, na capital paulista, o ex-presidente pediu pressão sobre o segundo mandato de sua sucessora. "Dilma vai vir aqui conversar com vocês e vai receber 500 reivindicações. Quando sair daqui, vai para outra reunião e vai ter mais reivindicações. Depois vai para outra e mais um monte de reivindicações. De noite, na casa dela, é tanta reivindicação que não vai saber mais qual é a primeira e qual é a última", afirmou. "O mais esperto é quem ganha e quem é o mais esperto? É quem cobra. Então, por favor, nos cobrem, porque assim teremos consciência que vamos continuar fazendo muito mais por vocês", disse. Dilma deve participar amanhã da feira.

A declaração de Lula foi feita no momento em que movimentos sociais, intelectuais e militantes têm cobrado uma guinada mais à esquerda de Dilma no segundo mandato. Os apoiadores da presidente têm reclamado de indicações feitas para os ministérios, como a de Joaquim Levy para a Fazenda e de Kátia Abreu para Agricultura.

O ex-presidente relatou que em conversas "antes, durante e depois das eleições" com Dilma, disse à presidente que governar "tem muitos problemas", mas "que eles serão menores se a gente souber de que lado a gente está", para "onde vai" e quem deve priorizar". Em seguida, disse que o governo precisa olhar para os "mais carentes e necessitados".

O ex-presidente defendeu a gestão do prefeito da capital, Fernando Haddad (PT), e atacou as administrações anteriores à do petista. Aos catadores, Lula disse que eles sabem "a diferença" que Haddad faz na vida deles. "Uma coisa é um prefeito que tem coragem de conversar, de encarar o problema e buscar solução. Outra coisa é um prefeito que manda a polícia com carro dos bombeiros para jogar água, a uma da madrugada, em pessoas que estão dormindo na rua", disse. "Estão dormindo lá por necessidade. Ninguém dorme na rua por orgulho ou por prazer".

Horas depois, em um evento organizado pelo PSOL na capital paulista, a candidata do partido derrotada à Presidência, Luciana Genro, disse que a esquerda fará a maior oposição nos próximos anos ao governo Dilma. Luciana atacou a nomeação de Joaquim Levy para a Fazenda e criticou a mudança do discurso da presidente em relação ao que foi defendido na campanha eleitoral.

"As sinalizações que o governo deu deixam muito claro o que já dizíamos na campanha eleitoral: se não houver pressão, mobilização, Dilma iria fazer exatamente a mesma coisa que o Aécio. E é isso que está se desenhando", afirmou Luciana, que terminou a disputa presidencial em quarto lugar, com 1,6 milhão de votos. "A indicação de Levy significa uma política econômica totalmente voltada para o mercado financeiro".

Pouco antes do evento "Seguir a Luta por Mais Direitos", organizado pelo PSOL em um clube a poucos metros da sede nacional do PT, Luciana disse que nos próximos anos deve haver uma forte pressão popular sobre Dilma. "A oposição que vai se fortalecer nos próximos anos é a oposição de esquerda. É isso que vamos buscar fortalecer", afirmou Luciana, que é pré-candidata à Prefeitura de Porto Alegre em 2016.

Planalto barganha por nova regra fiscal

• Congressistas podem ganhar verba extra destinada a obras em seus redutos eleitorais desde que aprovem proposta enviada pela presidente Dilma abrindo espaço para manobra fiscal e permitindo que as contas públicas fechem no azul

Zero Hora (RS)

BRASÍLIA - Em novo esforço para aprovar uma manobra fiscal que permita fechar as contas deste ano no azul, a presidente Dilma Rousseff acenou aos congressistas prometendo liberar R$ 444 milhões para obras e investimentos em seus redutos eleitorais.

Publicado no Diário Oficial, o texto condiciona expressamente o novo dinheiro para os parlamentares à aprovação por deputados e senadores da manobra fiscal a que o governo recorreu para não ter de fechar as contas no vermelho. O projeto de lei autoriza o governo a incluir gastos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e de renúncias de impostos no cálculo da meta de economia para pagamento de juros da dívida pública em 2014, o chamado superávit primário (leia quadro).

À noite, em encontro de duas horas no Palácio do Planalto, Dilma fez um apelo pela mudança com 23 líderes da base aliada da Câmara e no Senado. Com intuito de convencer os parlamentares, ressaltou que se a proposta não for aceita, governos estaduais e municípios sofrerão as consequências com corte de verbas para obras. De acordo com o ministro Ricardo Berzoini, da Secretaria de Relações Institucionais, os líderes aliados se comprometeram a votar hoje as alterações nas regras fiscais.

O governo tem sofrido uma série de derrotas, imposta pela própria base aliada, devido à insatisfação com o rumo da reforma ministerial. Há ameaça de rebelião nas bancadas do PMDB, PP, PR e PROS. Para conter essa onda, Dilma se reuniu com os líderes aliados. Além de Berzoini, o encontro teve a presença do vice-presidente Michel Temer (PMDB) e do ministros Aloizio Mercadante, da Casa Civil.

Em campanha para comandar a Câmara no próximo biênio e tentando vencer a oposição do Palácio do Planalto, o líder do PMDB, deputado Eduardo Cunha (RJ), propôs a Dilma a reedição de um pacto para que não sejam votados em 2015 pelo Legislativo projetos que causem aumento dos gastos públicos. A ideia levantada pelo peemedebista é que seja elaborado um documento no qual deputados e senadores se comprometam a não apoiar proposições que componham a chamada "pauta bomba", a exemplo do que fez a base em 2013. O texto será elaborado pela Secretaria de Relações Institucionais.

No decreto publicado no Diário Oficial da União, o governo federal eleva de R$ 7,8 bilhões para R$ 10,032 bilhões a previsão para liberação das emendas. Um dos principais capitais eleitorais dos políticos, as emendas são usadas, geralmente, para bancar obras e investimentos nos redutos eleitorais dos congressistas.

Número faz de conta
- Superávit primário é o dinheiro que o governo federal consegue economizar para o pagamento dos juros da dívida pública.

-A meta oficial do superávit é de R$ 116,1 bilhões para este ano.

-Mas o governo quer mudar a forma de cálculo, porque constatou que não vai alcançá-lo.

-Pela nova proposta, os gastos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e de renúncias de impostos são incluídas no cálculo do superávit primário.

-Se o texto do projeto for aprovado, o governo, na prática, cumpre a meta de superávit primário sem fazer a economia originalmente anunciada.

Maior doador da eleição faz lobby contra nome de Dilma para chefiar Agricultura

• Grupo JBS, que só para o projeto à reeleição da presidente desembolsou quase R$ 70 milhões, atua para evitar que Kátia Abreu assuma pasta sobre a qual hoje exerce influência; também nos bastidores, governo afirma que decisão já está tomada

Nivaldo Souza e Erich Decat - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Maior grupo empresarial de carnes do mundo e principal doador da campanha eleitoral realizada neste ano no País, o frigorífico JBS, da marca Friboi, faz lobby contra a indicação da senadora Kátia Abreu (PMDB-TO) para comandar o Ministério da Agricultura no segundo mandato da presidente Dilma Rousseff.

O empresário Joesley Batista, um dos donos do grupo, esteve na quarta-feira com o chefe da Casa Civil do governo, Aloizio Mercadante, com quem tratou do tema em uma reunião reservada, fora da agenda oficial do ministro.

O JBS doou ao todo R$ 352 milhões nas eleições de 2014, segundo o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), dos quais R$ 69,2 milhões foram destinados à campanha de Dilma à reeleição. Também desembolsou R$ 61,2 milhões aos postulantes a uma vaga na Câmara dos Deputados e R$ 10,7 milhões aos candidatos ao Senado.

Apesar do volume aplicado na bancada ruralista, Kátia Abreu, que tentou e conseguiu renovar seu mandato de senadora pelo Tocantins, não recebeu nenhuma doação do JBS.

Presidente da Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária (CNA), ela é uma das principais lideranças do agronegócio no País, o que lhe ajudou a arrecadar quase R$ 7 milhões neste ano - incluindo doação de R$ 100 mil realizada pelo frigorífico Minerva, concorrente do JBS.

O lobby do maior frigorífico do mundo explicita uma guerra nos bastidores sobre o comando na Agricultura. Como representante dos pecuaristas, a senadora assumiu uma posição de ataque à empresa de Batista. Os criadores de gado temem a concentração de mercado que a empresa exerce cada vez mais, influenciando no valor da carne vendida por eles. O grupo JBS é responsável por cerca de 20% do abate bovino no País. O peso do frigorífico na formação de preço é uma das explicações para a acidez da senadora contra a empresa.

O clima entre Kátia e Batista ficou ruim depois que a senadora acusou de antiética a campanha publicitária do JBS sobre a segurança sanitária representada pela Friboi. Em discurso no Congresso, em agosto de 2013, a senadora protestou: "Vá e diga que a sua carne é boa, que tem boa qualidade, que é produzida em frigoríficos de primeira. Mas não diga que é a única que o povo brasileiro pode comer."

Influência. O Ministério da Agricultura acumula uma série de decisões favoráveis ao JBS. Todas adotadas pela Secretaria de Defesa Agropecuária (SDA), cujo titular, Rodrigo Figueiredo, é apadrinhado do líder do PMDB na Câmara, Eduardo Cunha (RJ). O parlamentar peemedebista, que hoje vive às turras com o governo Dilma, chegou a assinar um ofício indicando Figueiredo para o cargo em 6 de junho de 2013.

Em outubro deste ano, a Justiça impôs derrota ao ministério por ter beneficiado o JBS. Determinou a aplicação de multa diária de R$ 100 mil caso não fosse suspensa uma limitação à exportação pelos Entrepostos de Carnes e Derivados (ECDs), operados por pequenos frigoríficos, conforme determinado pela SDA. Agricultura acatou a decisão. Em setembro, menos de dois meses após proibir o uso de expressões como "especial" e "premium" em rótulos de carne, a SDA desobedeceu a própria regra para atender demanda do JBS. Empresa e ministério não se manifestaram sobre os benefícios. A direção do grupo confirma a reunião com Mercadante, mas nega que esteja fazendo lobby contra a senadora.

Balaio. A resistência do JBS vem se juntar às reclamações do PT e de movimentos sociais contra Kátia Abreu. Na lista de insatisfeitos reúne os mais diferentes campos ideológicos. A conservadora União Democrática Ruralista (UDR), por exemplo, também é contra a indicação.

Apesar das resistências, Kátia Abreu vai ser anunciada oficialmente ministra da Agricultura - algo que já está decidido há algumas semanas por Dilma, segundo assessores do Planalto - logo após o dia 15 de dezembro. É que nessa data ela tomará posse como presidente reeleita da CNA - se fosse indicada ministra antes, não poderia assumir o cargo na entidade de classe.

Os funerais da nova matriz .

• Sempre que o PT pôs suas ideias econômicas em prática, elas falharam. Daí a opção pela ortodoxia, sinal evidente de que Dilma Rousseff elegeu-se sem saber o que fazer pelo país

- ITV

Os últimos dias têm marcado as exéquias da matriz econômica adotada no país ao longo do primeiro mandato de Dilma Rousseff. Nenhuma novidade quanto ao fracasso da empreitada: na realidade, sempre que o PT pôs suas ideias econômicas em prática, elas falharam.

Até a eleição de Lula, em 2002, o partido defendia plataforma de mudanças radicais no modelo econômico, pregava a "ruptura necessária" - nome da tese que orientava o PT até o início daquela eleição - com o sistema capitalista e ações no rumo do socialismo. Com a conquista do poder, isso virou peça de museu.
Durante seu primeiro mandato, Lula valeu-se de uma agenda liberal e de talentos idem para levar o país a uma trajetória de crescimento sustentado que aproveitou adequadamente os ventos da bonança mundial. Deu certo enquanto durou a experiência baseada no respeito a contratos e na melhoria do ambiente de negócios.

Os petistas viram na crise de 2008 oportunidade para finalmente tirar suas empoeiradas teses da gaveta. Nasceu, assim, a "nova matriz econômica" que ora dá seus últimos suspiros sem ter produzido praticamente nada de bom enquanto existiu.

O modelo tinha suas pernas - ou seriam patas° - fincadas no aumento da demanda. Mais crédito, principalmente das generosas linhas da "bolsa empresário" do BNDES, mais gasto público, mais consumo, temperados por juros baixados à força e desonerações pontuais.

Os resultados estão aí para qualquer um ver: crescimento ridículo do PIB, inflação renitentemente alta, descontrole dos gastos públicos, descompromisso com a gestão fiscal, azedume generalizado no ambiente de negócios em função da falta de perspectivas, incertezas e intervencionismo exacerbado do governo.

Mais uma vez, a saída do PT está em fazer o inverso do que sempre pregou. Para tirar o país do atoleiro, mais uma vez terá de recorrer a uma agenda que não é a sua, mas que se tornou a única salvação diante do colapso generalizado por que passa nossa economia.

A opção pela ortodoxia econômica é sinal evidente de que Dilma elegeu-se sem saber o que fazer pelo país. Passado um mês das eleições que lhe deram mais quatro anos de mandato, a reeleita continua sem enunciar o que fato pretende para o país. O que poderia ser apenas prosaico torna-se bem mais grave diante da inexistência de um programa de governo apresentado aos eleitores ao longo da campanha.

Dilma Rousseff recusou-se a participar da cerimônia na qual a nova equipe econômica foi apresentada ao país na semana passada. É possível que tenha, na realidade, evitado estar na missa de corpo presente do modelo que ela pôs em prática e que redundou num fiasco de proporções como há muito tempo não se via neste país.

Merval Pereira - O PT complacente

- O Globo

A complacência do PT com seus membros envolvidos em escândalos de corrupção corresponde à própria formação física do partido, que se vendeu à opinião pública — com êxito, admita-se — como a imagem da pureza política quando já nos governos municipais estava envolvido em transações ilegais com empresas de coleta de lixo e licitações fraudulentas.

O s assassinatos de prefeitos como Celso Daniel, de Santo André, e Toninho do PT, de Campinas, são os rastros deixados no plano municipal antes de o PT alçar-se enfim ao plano federal. Já não era mais a virgem pura que se autoproclamava, mas a complacência com as transgressões permitia que sempre voltassem a público como se virgens ainda fossem. O caso recente, do último fim de semana, é repetição como farsa do que acontecera anteriormente, quando da condenação dos líderes partidários no caso do mensalão. O Diretório Nacional do PT aprovou uma nova velha regra que prevê a expulsão de qualquer filiado comprovadamente envolvido em escândalos de corrupção. A regra anterior dizia a mesma coisa, mas foi superada pela realidade do mensalão.

A proposta atual definia como "imediata" a expulsão, mas o termo tão radical foi retirado do texto oficial. Quando houve o mensalão, mesmo depois de condenados, nenhum dos líderes petistas foi expulso. O ex-presidente José Genoino, condenado por corrupção ativa e formação de quadrilha (crime depois revogado pela revisão de dois novos ministros que entraram no julgamento apenas na parte recursal), assumiu uma cadeira na Câmara dos Deputados por ser o primeiro suplente do PT paulista. Também o deputado federal João Paulo Cunha, ex-presidente da Câmara, continuou no seu papel de deputa do federal por bom tempo, até que as condições objetivas o impediram de continuar a farsa .

Quem o PT expulsou de suas fileiras nos últimos anos, quando escândalos de diversos quilates estouraram no seu colo? Apenas seu tesoureiro à época do mensalão, Delúbio Soares , que nunca perdeu sua situação de prestígio dentro do partido e foi finalmente reconduzido , antes mesmo do julgamento pelo Supremo Tribunal Federal, numa tentativa de inocentá-lo publicamente . José Dirceu continuou com tanta importância dentro do PT que se tornou um consultor de empresas altamente requisitado justamente por seu prestígio pessoal junto aos presidentes petistas e demais autoridades governamentais .

O presidente do PT, Rui Falcão, descartou na ocasião qualquer possibilidade de expulsão do partido dos condenados no julgamento do mensalão. O estatuto do partido determinava a expulsão de filiados condenados "por crime infamante ou por práticas administrativas ilícitas, com sentença transitado em julgado", mas, segundo Falcão, "nenhum deles está incluído (na punição). Não houve desvio administrativo. Quem aplica o estatuto somos nós. Nós interpretamos o estatuto". Agora, o Diretório Nacional manifestou "a disposição firme e in abalável de apoiar o combate à corrupção.

Qualquer filiado que tiver, de forma comprovada, participado de corrupção deve ser expulso". Mas, como já vimos, a suposta expulsão não será "imediata ", como dependerá da interpretação exclusiva do partido se a participação em corrupção foi devidamente comprovada. Vamos dar tempo ao tempo, no caso do petrolão ainda em curso. A relação do partido com filiados envolvidos em corrupção, porém, não dá margem a esperanças de que o PT resolveu, mais uma vez, "refundar-se". Veja-se o caso do ex-petista André Vargas, que acabou se desfiliando do partido, mas contou com o apoio dos companheiros para retardar ao máximo sua cassação.

Agora que a cassação, enfim, irá ao plenário da Câmara, veremos quantos petistas ajudarão a não dar quorum para a punição. Então, é de se perguntar, a mais recente resolução do Diretório do PT não atinge o "pratrasmente", como diria o prefeito Odorico Paraguaçu, personagem inesquecível de Dias Gomes? É claro que não, assim como não atingir á os atuais envolvidos no petrolão . A resolução petista é mais uma daquelas para ganhar tempo e tentar reassumir a pose de virgem pura, que, com a complacência, finge ser o que nunca na verdade foi.

Dora Kramer - Deixa que digam

- O Estado de S. Paulo

Se você acredita que Dilma Rousseff e Luiz Inácio da Silva estão dando grande importância aos reclamos de petistas indignados com a virada na economia ou às críticas de "estelionato" feitas pela oposição devido aos atos contrários às palavras ditas na campanha, é porque não está com a memória em dia.

Não lembra que há 12 anos o PT percebeu que para chegar ao poder, e nele conseguir se manter, seria indispensável abrir mão da coerência e aderir sem restrições ao mais absoluto pragmatismo? Sob todos os aspectos. Para o bem e para o mal. A parte boa disse respeito à economia. Como agora. Não faz muito tempo o ex-presidente Lula andou dizendo que assinou contrariado a Carta aos Brasileiros.

Pois sim. Foi a fiança que o permitiu se eleger, governar e ser celebrado pelo bom senso de ter esquecido tudo o que o PT tinha escrito e dito anteriormente. O País não lhe cobrou satisfações. Ao contrário, respirou de alívio. E, na ocasião, deixou barato o fato de aquele bom legado ser chamado de "herança maldita".

Houve aqui e ali inquietações. Inesquecível o dia em que, logo no início do governo, o marqueteiro recentemente vitorioso, Duda Mendonça, diante da indagação sobre a aparente contradição de ter feito uma campanha baseada na promessa de mudança da política econômica saiu-se com esta: "E você (esta aqui que vos fala) quer mudança maior do que essa?". Ou seja, mudando de posição estava cumprida a promessa.

Mas quase ninguém estava ligando para esse tipo de detalhe. Quando veio a adesão do governo à reforma da Previdência (setor público) que tanto combatera enquanto oposição, tampouco me esqueço. Cobrado, o então chefe da Casa Civil, José Dirceu, em entrevista ao Estado, respondeu secamente que o governo não devia explicações.

Um dos únicos a reconhecer que seria necessário o partido ao menos fazer uma autocrítica, a fim de rever posições, reconhecer os erros do passado e tocar a vida em frente com transparência foi Aloizio Mercadante. Falou no assunto só uma vez e calou-se para sempre. Já um grupo de deputados e militantes continuou inconformado e logo deixou o partido. Daí surgiu o PSOL, embora nem todos tenham aderido ao projeto.

Como também a crítica não era só essa. Incluía a exacerbação do pragmatismo nas alianças feitas com figuras notórias da pior qualidade, em nome de uma política que segundo Lula, ainda na Presidência, dizia ser a única possível de ser exercida no País. Resumiu à época numa frase: "No Brasil, Jesus teria de fazer aliança com Judas".

E assim foi o partido perdendo-se em seus desvãos, dando o dito pelo não dito, desqualificando a crítica, a oposição e até mesmo a opinião dos seus. Até que uma voluntariosa tentativa de volta às origens na área econômica juntou-se à vocação autoritária e o governo da presidente Dilma Rousseff quase pôs ao chão o projeto de poder.

Fez-se o diabo e mais um pouco para segurar aquela cadeira no Palácio do Planalto. Uma campanha tão obviamente sustentada em mentiras que nem mesmo a candidata conseguia desenvolver os raciocínios. Não faziam sentido, pois uma vez que as premissas eram falsas não havia lógica que conseguisse carregar ideia alguma até o fim do caminho.

Nada do que se vê agora é estranho. A não ser a estranheza. Vai se repetindo a toada: deixa que digam, que pensem, que falem, deixa isso para lá, vamos lá, o que é que tem. A esquerda reclama e cobra que o governo insista nos erros; a oposição denuncia uma incoerência que ao governo serve muito bem quando necessita dos quadros oposicionistas.

Enquanto isso, Lula e Dilma ganham tempo para acalmar o centro e reconquistar-lhe a confiança com as armas de 2003. Há, porém, um detalhe: as circunstâncias são outras.

Luiz Carlos Azedo - Crime de responsabilidade

• A presidente da República tornou-se refém de sua própria base. A tese petista do "golpismo" também é uma vacina contra isso

Correio Braziliense

O governo vai à luta hoje, outra vez, para a alteração da meta do superavit primário para este ano. Não é uma votação trivial, pois se trata de uma manobra legal para evitar que a presidente Dilma Rousseff seja acusada de descumprir a Lei de Responsabilidade Fiscal. Isso é crime tipificado, cuja implicação poderia ser até a cassação do seu mandato.

São crimes de responsabilidade contra a lei orçamentária: exceder ou transportar, sem autorização legal, as verbas do orçamento; infringir, patentemente, e de qualquer modo, dispositivo da lei orçamentária; deixar de ordenar a redução do montante da dívida consolidada, nos prazos estabelecidos em lei, quando o montante ultrapassar o valor resultante da aplicação do limite máximo fixado.

Qualquer cidadão pode oferecer denúncia contra a presidente da República. Cabe à Câmara aprovar por maioria simples a acusação; ao Senado, julgar o pedido de destituição do cargo e cassação dos direitos políticos. A lei que define os crimes de responsabilidade das autoridades do Executivo, Judiciário e Ministério Público e regula o seu julgamento é originária do governo Dutra, na década de 1950, mas foi atualizada no segundo mandato do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, pela Lei nº 10.028, de 2000.

Representou uma grande mudança de costumes políticos, no esforço de blindagem da política de estabilização da moeda, com objetivo de impedir que maus gestores quebrassem a administração para garantir vantagens eleitorais. Foi o que aconteceu no governo de Orestes Quércia (PMDB), em São Paulo, na eleição do seu ex-secretário de Segurança Luiz Antônio Fleury (PMDB à época), em 1990; e na Prefeitura de São Paulo, na gestão de Paulo Maluf (então no PDS), que conseguiu eleger seu ex-secretário da Fazenda Celso Pitta (PDS), em 1997. E poderia se repetir ainda mais com a aprovação do dispositivo da reeleição.

O rombo
Nada disso impediu, porém, que a presidente Dilma Rousseff, com maquiagens e malabarismos fiscais durante todo o ano, para se reeleger, provocasse o maior rombo nas contas públicas desde 1997, quando a União securitizou as dívidas de estados e municípios. O governo havia se comprometido a alcançar, neste ano, um superavit de R$ 99 bilhões nas contas públicas do setor público consolidado, que abrange União, estados, municípios e empresas estatais.

Até setembro, contudo, o resultado alcançado foi um deficit primário de R$ 15,3 bilhões, evidenciando que a meta não será cumprida, mesmo com a utilização dos mecanismos legais previstos: a LDO permite que o Executivo abata dos resultados até R$ 67 bilhões de gastos com desonerações de tributos e investimentos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).

Diante da situação, a alternativa que restou ao governo foi mudar a Lei de Diretrizes Orçamentárias para evitar o enquadramento da presidente Dilma Rousseff. O PLN 36, de autoria do relator Romero Jucá (PMDB-RR), o maior safa-onça do governo no Senado, anula a obrigatoriedade de a presidente Dilma Rousseff entregar o superavit primário (economia para o pagamento dos juros da dívida pública) neste ano.

Para que Dilma Rousseff não seja acusada de descumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal, é obrigatório que a manobra no Congresso seja feita. A oposição esperneia, mas esse não é o maior problema. Foi derrotada nas urnas e já sinalizou que não vai apostar num confronto dessa envergadura, isto é, na destituição da petista. A presidente da República ganhou as eleições com o discurso de que se recusou a gerar desemprego e reduzir renda para enfrentar a crise mundial. Esse é o eixo do discurso do Palácio do Planalto para rasgar a Lei de Responsabilidade Fiscal.

Ocorre que a base do governo resolveu chantagear a presidente Dilma Rousseff. Na semana passada, nem o PMDB nem o PT compareceram ao plenário para votar. Os parlamentares da base querem a liberação das suas emendas ao orçamento da União e cargos, muitos cargos. Ou melhor, ministérios. Só o PMDB reivindica meia dúzia, três para os senadores e três para os deputados.

Ontem à noite, Dilma chamou os líderes da base para uma conversa, a primeira desde a reeleição. Hoje saberemos se deu os resultados que esperava. A presidente da República tornou-se refém de sua própria base. A tese petista do "golpismo" também é uma vacina contra isso, mas não se restringe ao problema da responsabilidade fiscal, cuja solução depende apenas de reunir a tropa governista e mudar a legislação. Tem muito mais a ver com o escândalo da Petrobras e a Operação Lava-Jato, mas essas já são outras emoções.

Gustavo Patu - Que imposto aumentar

- Folha de S. Paulo

Boas frases se propagam sem certezas sobre seus autores. O ideólogo do neoliberalismo Milton Friedman, por exemplo, já foi apontado, por engano, como o criador da sentença segundo a qual "não existe almoço grátis", que aplicou à generosidade estatal.

A ele também é atribuída, aparentemente com mais propriedade, a afirmação de que "o Congresso consegue elevar impostos porque consegue persuadir uma parcela considerável da população de que outras pessoas é que vão pagar".

Vê-se essa estratégia de convencimento entre defensores da CPMF, o exótico imposto sobre os débitos em conta corrente cuja ressurreição mobiliza alguns governadores eleitos. Pelo argumento, só a minoria que movimenta somas mais vultosas seria afetada --ainda que o encarecimento das transações financeiras atinja toda a sociedade.

A nova equipe de Dilma Rousseff, noticia-se, busca outras fontes de dinheiro, como a taxação da gasolina, de importados e de cosméticos, que fariam parte da tributação recorde escondida no preço das mercadorias e serviços. Mais difícil, como sabe o prefeito Fernando Haddad, é cobrar o IPTU, cuja conta cada contribuinte paulistano sabe exatamente qual é.

Há razões de sobra para questionar a elevação da carga tributária nacional, já muito acima dos padrões do mundo emergente, excessivamente complicada e inibidora do crescimento econômico.

Mas, após sucessivas eleições mostrarem amplo apoio à expansão do gasto social, chega a hora de os governantes informarem ao público que a melhor alternativa de financiamento é a tributação --as outras, em curso, são endividamento e inflação.

Se adotasse também na receita o modelo social-democrata seguido na despesa, o governo brasileiro proporia uma elevação do Imposto de Renda, com alíquotas mais altas e faixa de isenção menor. Seria, pelo menos, mais didático e transparente.

Raymundo Costa - Dilma dá o tom da governabilidade

• A lógica da presidente rebaixou equipe de governo

- Valor Econômico

Constituída a equipe econômica, a presidente Dilma Rousseff se dedica à composição partidária do ministério, a ser dividido entre as forças que a apoiaram na eleição. Para assegurar maioria confortável no Congresso, a presidente pode seguir a mesma lógica que imprimiu na formação do gabinete do primeiro mandato, quando as bancadas partidárias indicaram os nomes de sua preferência. Neste caso, estará condenada a repetir a escalação de um ministério medíocre e sem representatividade. Mas a presidente dá indícios de que pode mudar e formar uma equipe com mais representatividade nacional.

A lógica que Dilma seguiu nas indicações do ministério, no atual governo, inovou na autonomia dada às bancadas dos partidos aliados. Ao termo, eram mais ministros que defendiam os interesses das bancadas no governo do que ministros que falavam em nome do governo e da presidente para a sociedade e desta para o governo. O atual mandato da presidente Dilma é o de um governo com uma equipe sem voz e sem representação. A não ser em casos excepcionais, não há ministros que façam esse diálogo de mão dupla em nome do governo. Guido Mantega (Fazenda) e Alexandre Tombini (Banco central), por exemplo. Mas equipes econômicas sempre falam, por necessidade.

Algumas exceções: Marta Suplicy (Cultura), que já não está mais no governo, Aldo Rebelo (Esportes), a esta altura um nome praticamente insubstituível na coordenação dos jogos olímpicos do Rio, Alexandre Padilha, que deixou a Saúde para disputar o governo de São Paulo, e Moreira Franco (Aviação Civil), autor do discurso de que os aeroportos ficariam prontos a tempo apesar e não por causa da Copa. Aloizio Mercadante (Casa Civil) já falou mais que hoje.

A lógica da presidente, no primeiro mandato, rebaixou o ministério. Não havia outra maneira de um Pedro Novaes (PMDB-MA) chegar a ministro do Turismo não fosse por indicação da bancada de seu partido. A não ser o baixo clero da Câmara, ninguém mais sabia quem era e o que representava Pedro Novaes. Mesmo como ministro Novaes só foi notado quando se revelou a farra que patrocinara em um motel de São Luís. Quem se lembra de Aguinaldo Ribeiro? É o substituto de Mário Negromonte, um deputado federal lambuzado na investigação do petrolão, que acabou ministro de Cidades por escolha da bancada do PP.

Na Previdência, o senador Garibaldi Alves (RN) ainda tentou dar uma ou outra ideia, mas logo percebeu que não estava ali para pensar mas para representar o PMDB. Relaxou e aproveitou para usufruir o prestígio de ser ministro e poder viajar nas asas da FAB. A questão da Previdência chama a atenção para outra característica de Dilma: a presidente deixa a indicação para as bancadas partidárias, mas em geral tem alguém na estrutura do ministério, como o secretário-executivo, de sua confiança e com linha direta com o Palácio do Planalto.

Essa lógica que deixou a presidente à mercê de uma chantagem da bancada do PR na Câmara: a sigla só dava para Dilma seu tempo de televisão no horário eleitoral gratuito, se a presidente tirasse o ex-senador César Borges do comando do Ministério dos Transportes. Borges hoje despacha na Secretaria de Portos. Para seu lugar Dilma nomeou Paulo Passos, técnico de sua confiança que já passara pelo comando dos Transportes, quando Dilma fez a faxina ética, no primeiro ano de seu governo.

No Ministério do Trabalho, Dilma trocou o PDT de Brizola Neto (RJ) pelo PDT de Carlos Lupi (RJ). Só os iniciados sabem o nome do ministro.

Mesmo em um presidencialismo forte como o brasileiro, os governos, em geral, falam por meio de seus ministros, cada um na sua área. É por meio deste diálogo que se cumpre ou faz uma agenda. No primeiro governo Dilma, os ministros políticos não tiveram voz, seja pelo centralismo da presidente ou por serem apenas advogados de defesa dos interesses de suas bancadas. Os primeiros movimentos de Dilma em relação à composição da equipe do segundo mandato sinalizam que a presidente pode ter mudado. A ver. Mas a indicação da equipe econômica já é algo novo. Ministros como Joaquim Levy, indicado para a Fazenda, têm voz própria, sabe-se muito bem o que ele representa. Pode-se não gostar dele, mas Levy fala e tem opinião.

A dúvida é se Dilma vai manter o padrão para a escolha do resto da equipe. Parece que sim, quando se observa a escolha da senadora Kátia Abreu (PMDB-TO) para o Ministério da Agricultura. Não há dúvida de que o nome seria outro, se a presidente deixasse a indicação para a bancada do PMDB. Basta olhar o histórico da pasta: os deputados Mendes Ribeiro (RS) e Antônio Andrade (MG). E o atual ministro, Neri Geller, se articulava com a bancada, quando um esquema criminoso de venda de terras públicas desbaratado pela Polícia Federal bateu às portas de seu gabinete.

Vale para Kátia Abreu o que vale para a equipe econômica: suas ideias e sua atuação no setor agrícola podem ser criticados, mas não há como negar que a senadora tem o que falar sobre políticas públicas em sua área e é representativa de boa parte do agronegócio. Atende o PMDB, sem ser um instrumento exclusivo da bancada junto ao governo. A mesma lógica pode ser encontrada na indicação do senador pernambucano Armando Monteiro para a Indústria e Comércio. Monteiro segurou a bandeira de Dilma em Pernambuco, na eleição presidencial. Mas não deixa de ser um nome reconhecido na indústria, uma vez que já presidiu a CNI, e preenche com sobras a cota destinada ao PTB no novo governo.

Um caso de ministro certo no lugar certo, no primeiro mandato de Dilma, é Guilherme Afif Domingos. É um dos fundadores do PSD, mas tem uma história inteira ligada à microempresa.

Quem define o perfil dos ministros e dá o tom da governabilidade é a presidente da República e não as bancadas. Dilma pode encontrar nomes representativos politicamente para fazer a mediação entre a sociedade e o governo, e ao mesmo tempo atender à expectativa dos políticos. Ministros que tenham o que dizer e que possam falar sobre o que pensa e faz o governo.

Uma visão unilateral da Lei da Anistia – O Globo / Editorial

• Não será positivo se a Comissão da Verdade divulgar um relatório que não considere o sentido da negociação entre generais e a oposição no fim dos anos 70

A Comissão da Verdade, constituída em 2012 para reconstituir o que se desenrolou na "guerra suja" durante a ditadura militar, se prepara para apresentar o relatório final sobre fatos que eram mantidos em sigilo, e com a definição de responsabilidades por uma série de crimes, como torturas, homicídio, ocultação de cadáver etc.

Mas, infelizmente, não se espera um relatório equilibrado, embora possa atender a um dos seus objetivos, o de dar respostas a famílias e a toda a sociedade sobre o paradeiro de vítimas do regime. Um dos casos mais conhecidos é o do deputado Rubens Paiva, tema de reportagens de O GLOBO.

O viés que deverá ter o relatório deriva da própria contaminação ideológica do processo de criação da Comissão. Deve-se recordar a forma como a proposta foi incluída na terceira versão do Programa Nacional de Direitos Humanos, no final do segundo governo Lula.

Ficava visível a intenção de se aproveitar a oportunidade para mais um ataque contra a Lei da Anistia — concedida de forma recíproca em 1979 —, a fim de permitir o indiciamento judicial de militares e outros agentes públicos, não previsto na lei, por óbvio. A manobra criou tensão no governo, entre o Ministério da Defesa e o Planalto, mas a ação do ministro Nelson Jobim e do próprio Lula evitou uma crise de razoáveis dimensões.

Mas os grupos mobilizados para rever o alcance da Lei da Anistia, confirmada pelo próprio Supremo, continuam a agir. É fato que se perdeu o sentido de apaziguamento que teve a bem-sucedida negociação entre generais e a oposição, àquela época, sancionada livremente pelo Congresso. Tanto que o STF já precisou garantir a amplitude da anistia, concedida ainda no governo de João Baptista Figueiredo, o último da ditadura militar.

Se a ideia da reciprocidade, adotada nas negociações por Tancredo, Ulysses, Thales Ramalho, Petrônio Portella, Figueiredo, entre outros, subsistisse até a instituição desta Comissão da Verdade, crimes cometidos pela chamada esquerda armada também teriam sido investigados. Como o do assassinato do tenente Mendes a coronhadas de fuzil, por um grupo da Vanguarda Popular Revolucionária (VPR) comandado pelo capitão Carlos Lamarca, desertor do Exército. Ele foi promovido depois de morto a coronel, com proventos de general de brigada. Já a família do tenente nada recebeu. O mesmo aconteceu no caso da morte do soldado Mario Kozel Filho, num atentado contra o Comando Militar de São Paulo, de autoria da mesma VPR. Ou de outro militar, Orlando Lovecchio, ferido por bomba no consulado paulista dos Estados Unidos.

A História costuma ser escrita pelos "vencedores". No caso da "guerra suja" brasileira, não será positivo que o relato a ser apresentado pressuponha que houve "vencidos", quando aquela transição surgiu de um pacto entre contrários. Se isso acontecer, e a depender da reação do Planalto, ficará configurada a tentativa de se reescrever o passado.