Não houve casos em que o tribunal aceitou registro de fichas-sujas
Reynaldo Turollo Jr. / Folha de S. Paulo
BRASÍLIA - Uma análise sobre candidaturas questionadas no TSE (Tribunal Superior Eleitoral) com base na Lei da Ficha Limpa aponta que a jurisprudência da corte é desfavorável a uma eventual postulação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, condenado criminalmente pela segunda instância da Justiça Federal.
A pedido da Folha, a área técnica do TSE listou precedentes relevantes nas eleições gerais de 2010 e 2014. Segundo o tribunal, sete casos formam um "rol exemplificativo" de sua jurisprudência.
Em seis deles, o TSE indeferiu os registros de candidatura. Somente em um o registro foi deferido porque, conforme o cálculo temporal empregado pelo tribunal, o período de inelegibilidade de oito anos, previsto na Lei da Ficha Limpa, se esgotou antes da eleição e o candidato voltou a ser elegível.
Não houve casos em que o TSE aceitou o registro de candidatura de fichas-sujas.
Em todos os cinco casos de 2010 listados, referentes aos candidatos Cássio Cunha Lima (PSDB-PB), Natan Donadon (MDB-RO), João Pizzolatti (PP-SC), Marcelino Fraga (MDB-ES) e Marcelo Miranda (MDB-TO), o TSE negou os registros de candidatura. Porém, eles conseguiram participar da disputa sub judice (com recursos sobre o pedido de candidatura pendentes).
À época, a discussão era se a Lei da Ficha Limpa, aprovada em 2010, valia ou não para as eleições daquele ano, principal argumento que segurou as candidaturas dos que se enquadravam nas hipóteses de inelegibilidade.
Excetuando Miranda —que concorria ao Senado e hoje é governador do Tocantins—, os demais candidatos sub judice que foram eleitos puderam assumir os mandatos. Isso porque, em março de 2011, o STF (Supremo Tribunal Federal) decidiu que a aplicação da Lei da Ficha Limpa àquele pleito era inconstitucional.
A maioria do Supremo considerou que, para ter valido em 2010, a lei precisava ter entrado em vigor pelo menos um ano antes da eleição.
Já Miranda foi barrado porque a Justiça entendeu que mesmo sem a Lei da Ficha Limpa ele estava inelegível. Ele havia sido condenado em 2009 pelo TSE por abuso de poder e compra de votos na eleição de 2006, quando foi reeleito governador do Tocantins. Teve o mandato cassado e perdeu o direito de disputar eleições por três anos —prazo que atingia 2010.
FALSO PRECEDENTE
O caso de Donadon é citado ocasionalmente como precedente de que condenados por crimes em segunda instância podem disputar eleições. De todo o rol exemplificativo apontado pelo TSE, ele era o único sentenciado na esfera criminal, por peculato e formação de quadrilha.
Entretanto uma comparação entre o caso de Donadon e o de Lula desconsidera a peculiaridade do pleito de 2010, para o qual a Ficha Limpa não valeu. De lá para cá, a aplicação dessa lei se consolidou.
Em 2014, José Roberto Arruda, pelo PR, tentou voltar ao governo do Distrito Federal. Condenado pelo Tribunal de Justiça do DF por improbidade administrativa e enriquecimento ilícito relativos ao tempo em que foi governador (2007-2010), ele teve os recursos negados pelo TSE e não apareceu nas urnas.
Já o senador Cunha Lima --que assumiu uma cadeira no Senado após o STF invalidar a Ficha Limpa para 2010-- conseguiu decisão favorável no TSE em 2014 para concorrer ao governo da Paraíba.
O problema dele remontava à eleição de 2006, quando se reelegeu governador. Em 2008, o TSE cassou seu mandato de governador por abuso de poder econômico e político e conduta vedada a agente público naquele pleito.
Contrariando adversários e o Ministério Público Eleitoral, que impugnaram o registro do tucano em 2014, o TSE decidiu que o prazo de oito anos de inelegibilidade começou a contar no primeiro turno da eleição de 2006 (que havia sido em 1º de outubro). Assim, na data do primeiro turno de 2014 (5 de outubro), já teriam transcorrido os oito anos e ele estava liberado.
A discussão sobre a Ficha Limpa ganhou relevância por causa da condenação de Lula pelo Tribunal Regional Eleitoral da 4ª Região, em janeiro. Condenados por órgãos colegiados, como o tribunal, ficam inelegíveis. Ele é pré-candidato à Presidência.
Especialistas consultados pela reportagem afirmaram que as chances dele não estão na Justiça Eleitoral, mas na esfera penal. Para ter seu registro de candidatura deferido pelo TSE, Lula precisa de uma decisão de tribunal superior (STJ ou STF) que suspenda a condenação imposta pelo TRF-4 —o que, por consequência, suspenderia a causa da inelegibilidade.
FICHA LIMPA NO TSE
Corte superior destaca casos relevantes para a jurisprudência