sexta-feira, 28 de fevereiro de 2014

OPINIÃO DO DIA: Joaquim Barbosa

Inventou-se, inicialmente, um recurso à margem da lei. Agora inventou-se um novo conceito de formação de quadrilha. Um conceito discriminatório. Só aqueles que praticam crimes de sangue participariam. Ouvi argumentos espantosos que se basearam apenas em cálculos aritméticos e em estatísticas totalmente divorciadas das provas dos autos, da gravidade dos crimes.

Esta é uma tarde triste para este Supremo Tribunal Federal, porque com argumentos pífios foi reformada, foi jogada por terra, extirpada do mundo jurídico, uma decisão plenária sólida e extremamente bem fundamentada.

Sinto-me autorizado a alertar a nação brasileira de que esse é apenas o primeiro passo. Que essa maioria de circunstância tem todo o tempo a seu favor para continuar na sua sanha reformadora

Peço vênia à maioria, e voto pela rejeição dos embargos infringentes ora impetrados

Joaquim Babosa, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) em seu voto no julgamento dos embargos infringentes

STF muda critério e absolve réus por crime de quadrilha

Por 6 a 5, ministros livram Dirceu e Delúbio de prisão em regime fechado

Carolina Brígido e André de Souza

BRASÍLIA - Com o resultado da votação desta quinta-feira no plenário do Supremo Tribunal Federal (STF), absolvendo oito réus do crime de formação de quadrilha, pelo menos cinco dos condenados já poderão voltar para casa este ano. Delúbio Soares, ex-tesoureiro do PT, ganhará esse direito no Natal, quando passa a ter direito à progressão do regime semiaberto de prisão para o aberto. O ex-presidente do PT José Genoino, ainda provisoriamente em prisão domiciliar em função de sua saúde, poderá garantir o benefício definitivamente no dia 24 de agosto deste ano. Já o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu poderá dormir com a família dentro de um ano, a partir de 10 de março de 2015, seis dias antes de seu 69º aniversário.

Na data indicada, o juiz analisará se o detento tem bom comportamento e pode usufruir do benefício. As datas da progressão foram calculadas pela Vara de Execução Penal (VEP) do DF, órgão que fiscaliza o cumprimento das penas dos condenados. Segundo a VEP, em julho de 2016 Dirceu terá direito ao livramento condicional, um benefício concedido ao preso que cumpre mais da metade da pena.

Para ter esse direito, o condenado precisa conseguir ocupação lícita, comunicar ao juiz periodicamente a ocupação e não mudar de cidade sem autorização judicial. O juiz também pode fixar outras condições, como voltar para casa em horário certo e não frequentar determinados lugares. A pena de Dirceu termina por completo em outubro de 2021. A condicional de Genoino será em junho de 2015 e a de Delúbio, em fevereiro de 2016.

A legislação penal determina que, no regime semiaberto, o detento tem o direito de sair para trabalhar durante o dia e voltar para a cadeia à noite, para dormir. A proposta de trabalho do preso deverá ser analisada pelo juiz da VEP, que poderá ou não concordar com o emprego sugerido. No regime aberto, é preciso se apresentar em uma casa do albergado no fim do dia e nos finais de semana. Como em Brasília não existe esse tipo de instituição, a praxe é mandar os condenados para prisão domiciliar. Cabe ao juiz da VEP determinar as condições do regime.

Os ex-deputados Bispo Rodrigues (PL-RJ) e Romeu Queiroz (PTB-MG) e o ex-tesoureiro do PL Jacinto Lamas também passarão ao regime aberto em 2014.

Já a progressão do regime para quem pegou regime fechado, mesmo com a absolvição do crime de quadrilha, é mais demorada. A maior pena foi dada ao operador do mensalão, Marcos Valério. Ele ficará preso em regime fechado até fevereiro de 2020, quando terá direito a ir para o semiaberto. Só em maio de 2026 Valério terá direito ao livramento condicional. A pena de Valério só termina em abril de 2051.

A ex-presidente do Banco Rural Kátia Rabello, que está no regime fechado, vai poder migrar para o semiaberto em abril de 2016. A condicional dela está marcada para setembro de 2018. O fim da pena é só em abril de 2028. Dos 19 condenados que já estão cumprindo pena, a situação é nebulosa apenas no caso do ex-diretor do Banco do Brasil Henrique Pizzolato. Como a pena não começou a ser cumprida, a VEP ainda não calculou as datas de benefícios para ele.

Fonte: O Globo

Celso de Mello rebate ataques de advogados e defende atuação do STF

Ministro não economizou nos adjetivos para desqualificar críticas

BRASÍLIA- Celso de Mello não utilizou seu voto apenas para rechaçar o entendimento de que não houve quadrilha ou que as penas impostas para este crime tenham sido aplicadas em dose desproporcional. O decano da Suprema Corte tomou a frente da defesa institucional do STF, diante de ataques de advogados e réus. Sem citar nomes, o mais antigo ministro não economizou adjetivos para desqualificar as críticas. O primeiro alvo foi Luiz Fernando Pacheco, defensor do ex-presidente do PT José Genoino. Na sessão de 20 de fevereiro, Pacheco disse que o julgamento foi injusto, representando "a maior farsa da História política brasileira".

- Absurda, esdrúxula e inaceitável a afirmação de que esta Corte agiu como tribunal de exceção. Importante informar que o Supremo Tribunal Federal decidiu o presente litígio penal com apoio em prova validamente produzida nos autos, respeitando sempre os direitos e garantias fundamentais que a Constituição da República assegura a qualquer acusado.

Afirmou ainda que a maior farsa da História política brasileira não foi o julgamento, mas a conduta dos julgados:

- A maior farsa da História política brasileira residiu nos comportamentos moralmente desprezíveis, cinicamente transgressores da ética republicana e desrespeitadores das leis criminais do país, perpetrados por delinquentes travestidos então na condição de altos dirigentes governamentais, políticos e partidários, cuja atuação ludibriou acintosamente o corpo eleitoral, fraudou os cidadãos dignos de nosso país, fingindo cuidar ardilosamente dos interesses políticos quando na verdade buscavam, por meios escusos, mediante condutas criminosamente articuladas, ultrajar a dignidade das instituições republicanas.

O ministro também disse que vitórias em eleições não autorizam o uso de meios criminosos:

- A conquista e preservação temporária do poder não autorizam quem quer que seja, mesmo quem detenha a direção do Estado, ainda que evocando expressiva manifestação eleitoral, a utilizar meios criminosos ou expedientes juridicamente marginais e repudiados pela legislação do país e pelo sentimento de decência que deve sempre permanecer no trato da coisa pública.
Na primeira etapa do julgamento, Mello deu um dos votos mais críticos. E hoje manteve a convicção sobre a quadrilha:

- Pena inteiramente compatível com a inquestionável gravidade com a pena de quadrilha, legítima, impregnada da fundamentação. Nesse caso registrou-se a existência de um vínculo associativo permanente com o propósito de viabilizar, no contexto delinquencial, a prática de uma série de crimes.

Fonte: O Globo

Supremo descarta quadrilha do mensalão

Juliano Basile e Fábio Brandt

BRASÍLIA - Numa reviravolta que se tornou possível com a nomeação de dois novos ministros pela presidente Dilma Rousseff, o Supremo Tribunal Federal (STF) concluiu, ontem, que o mensalão não foi uma quadrilha, mudou sua decisão de 2012 e absolveu oito réus que vão ser beneficiados com redução de pena, inclusive o petista José Dirceu, ex-ministro-chefe da Casa Civil no governo de Luiz Inácio Lula da Silva.

A pena de Dirceu cairá de 10 anos e 10 meses de prisão para 7 anos e 11 meses. Ele passará do regime fechado para o semiaberto, no qual poderá trabalhar de dia e deverá retornar para dormir na prisão durante pelo menos um sexto dessa pena (1 ano e 3 meses). Além disso, acabou, pelo menos oficialmente, a simbologia de que o mensalão foi uma quadrilha liderada por Dirceu. O caso permanece como esquema de corrupção, desvio de dinheiro e compra de apoio político no Congresso.

A decisão do STF de retirar as condenações por formação de quadrilha foi tomada por seis votos a cinco, no julgamento dos embargos infringentes. Os protagonistas da reviravolta foram os ministros que a presidente Dilma Rousseff indicou a partir do segundo semestre de 2012, quando o tribunal começou a julgar o mensalão: Luís Roberto Barroso e Teori Zavascki. Ambos concluíram que as penas por quadrilha foram exacerbadas.

Barroso apontou que o STF elevou essas punições em até 75% a partir da pena base, enquanto outros crimes tiveram aumento de 15% ou 30%. Zavascki foi além e disse que, no julgamento do mensalão, em 2012, o STF confundiu quadrilha com coautoria de crimes diversos. "É difícil afirmar que Dirceu e José Genoino tivessem se unido a outros agentes com interesse comum de cometer crimes contra o sistema financeiro. Da mesma forma, não parece verossímel afirmar que Kátia Rabello e José Roberto Salgado, dirigentes de instituição financeira, tenham se unido àqueles dirigentes partidários e a outros agentes com objeto e interesse comum de cometer crimes de corrupção ativa e passiva. Nada indica que eles se uniram para cometer crimes", disse Zavascki.

Os ministros Ricardo Lewandowski, Dias Toffoli, Cármen Lúcia e Rosa Weber também defenderam a tese de que não houve quadrilha no mensalão. Rosa proferiu o sexto e decisivo voto pela derrubada das penas por esse crime. "Não se configurou a formação de quadrilha", disse a ministra. Para ela, uma quadrilha só existe quando pessoas se associam especificamente para praticar crimes. Esse não seria o caso do mensalão, enfatizou Rosa. "A lei exige, na minha concepção, que a reunião dessas pessoas seja qualificada pela intenção especifica de cometer crimes", defendeu. "Há diferença marcante entre pessoas que se associam para cometer crimes e pessoas que se associam com finalidade outra, mas, no âmbito dessa associação, cometem crimes", diferenciou a ministra.

Com a formação dessa maioria no STF, a pena de José Genoino, ex-presidente do PT, caiu de 6 anos e 11 meses para 4 anos e 8 meses. No caso de Delúbio Soares, ex-tesoureiro do partido, a punição passou de 8 anos e 11 meses para 6 anos e 8 meses de prisão. Salgado e Kátia saíram de 16 anos e 8 meses para 14 anos e 5 meses. O publicitário Marcos Valério passou de 40 anos e 4 meses para 37 anos e 5 meses. Seu ex-sócio Ramon Hollerbach saiu de 29 anos e 7 meses para 27 anos e 4 meses. Cristiano Paz, outro ex-sócio de Valério, foi de 25 anos e 11 meses para 23 anos e 8 meses.

No dia 13, o STF vai retomar o julgamento para analisar três embargos infringentes que contestam as penas impostas aos condenados por lavagem de dinheiro. A tendência é que a Corte aceite os recursos e reduza a condenação do ex-deputado João Paulo Cunha de 9 anos e 4 meses para 6 anos e 4 meses. Já o ex-assessor do PP João Claudio Genu e o ex-sócio da corretora Bônus Banval Breno Fischberg devem ficar livres de qualquer condenação caso esses recursos sejam aceitos - diferentemente dos outros envolvidos que foram condenados por mais de um crime, eles só foram condenados por lavagem de dinheiro.

A reviravolta nas condenações do mensalão foi marcada por protestos dos ministros que tiveram a posição vencedora, em 2012, mas, ontem, foram derrotados no julgamento dos infringentes.

Indignado, o presidente do STF e relator da ação penal do mensalão, ministro Joaquim Barbosa, disse que a Corte inventou um conceito discriminatório para o crime de quadrilha. Ele se referiu ao entendimento adotado pela maioria de que a quadrilha só se configura quando existe associação entre pessoas especificamente para cometer crimes. "Sob esse prisma, esse crime só poderia ser cometido por desempregados ou indivíduos à margem da sociedade", afirmou Barbosa.

"Essa é uma tarde triste para o Supremo porque, com argumentos pífios, foi reformada, foi jogada por terra, extirpada do mundo jurídico, uma decisão plenária sólida, extremamente bem fundamentada que foi aquela tomada por este plenário no segundo semestre de 2012", continuou o presidente. Para ele, as condenações foram derrubadas através de uma "maioria formada sob medida para jogar por terra um trabalho primoroso levado a cabo por esta Corte". "Sinto-me autorizado a alertar a nação brasileira de que esse é apenas o primeiro passo. Que essa maioria de circunstância tem todo o tempo a seu favor para continuar na sua sanha reformadora."

O decano do STF, ministro Celso de Mello, negou excesso na aplicação de penas de quadrilha. "A exacerbação foi plenamente compatível e revela-se plenamente legítima, pois é impregnada de adequada justificação", enfatizou. "Houve um vínculo entre os réus de 2002 e 2005 para a prática de crimes deliquenciais. Os membros dessa quadrilha, reunidos em empresa criminosa que se apropriou do governo, agiram com dolo de planejamento e divisão de trabalho, como uma sofisticada organização criminosa."

O decano rebateu as críticas de que o STF criminalizou a atividade política. "O STF não condenou atores ou dirigentes políticos, mas autores de crimes", diferenciou. "São meros e ordinários criminosos."

Celso também refutou as acusações de que o julgamento se deu num "tribunal de exceção". "Essa acusação gravíssima há de ser repelida", disse. "Na realidade, o STF, como órgão de cúpula do Judiciário nacional, garantiu de modo real, pleno e efetivo às partes desse processo, tanto ao Ministério Público quanto aos réus, o direito a um julgamento justo, imparcial, isento e independente."

O ministro repeliu ainda as alegações de réus de que o julgamento foi uma farsa. "Nessa sucessão organizada de golpes proferidos contra nosso país é que reside sim a maior farsa da história política brasileira", ressaltou.

Gilmar Mendes afirmou que, ao longo do mensalão, houve a tentativa de reduzir o Supremo a uma Corte bolivariana. "Foi um julgamento acidentado, que se alongou. Dois colegas deixaram de integrar a Corte", disse Mendes, referindo-se a Cezar Peluso e Carlos Ayres Britto, que votaram por condenações e se aposentaram no meio do julgamento, em 2012, sendo substituídos posteriormente por Zavascki e Barroso, que absolveram os réus. "Quem sabe a Corte será recomposta para a revisão criminal", continuou Mendes, citando um possível novo recurso dos condenados. "Mas o tribunal manteve a sua posição e esse é o dado positivo nesse quadro de práticas reprováveis. As instituições são mais fortes do que aqueles que a integram. O Brasil saiu forte desse julgamento porque o projeto era reduzir essa Suprema Corte a uma Corte bolivariana."

Para Marco Aurélio Mello, a resposta dada pelo STF nos embargos "é negativa". "Devemos honrar até mesmo os dois colegas que já não integram o colegiado", disse, lembrando-se de Britto e Peluso. "O Supremo de ontem assentou a condenação. O fez por seis votos a quatro. O Supremo de hoje, dando o dito pelo não dito, inverte o placar", lamentou.

Marco Aurélio ressaltou que as penas por quadrilha tinham "um simbolismo incomum" e, por isso, as defesas insistiram em afastá-las. "Insistência incentivada pelo fato de um Supremo de hoje não ser o de ontem", insistiu.

Ao fim, os vencidos seguiram o relator dos embargos, Luiz Fux, que votou pela manutenção das condenações.

Fonte: Valor Econômico

Maioria do STF absolve mensaleiros do crime de formação de quadrilha

Placar final ficou 6 a 5 a favor dos réus do mensalão que vão ter as penas reduzidas

Cássio Bruno, Bruno Góes e Letícia Fernandes

RIO - O Supremo Tribunal Federal (STF) retomou na manhã desta quinta-feira o julgamento dos recursos do processo do mensalão do PT. Seis dos 11 ministros votaram pela absolvição de oito condenados pelo crime de formação de quadrilha, entre eles o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu, que está preso. Na prática, as penas serão reduzidas. O placar foi de 6 a 5 a favor dos condenados, o que gerou críticas do presidente do STF, Joaquim Barbosa. Segundo ele, foi uma “tarde triste” para o Supremo. (Veja aqui como foi o julgamento). No retorno do intervalo da sessão, os ministros decidiram votar os embargos infringentes referentes à lavagem de dinheiro no próximo dia 13, após o carnaval. Três réus entraram com embargos infringentes no caso de lavagem de dinheiro: o ex-deputado João Paulo Cunha; o ex-assessor parlamentar do PP, João Cláudio Genu, e o doleiro Breno Fischberg.

Houve apenas as sustentações orais das defesas e do Ministério Público Federal. O procurador-geral Rodrigo Janot pediu que o STF negue os embargos para os réus.

Os embargos para formação de quadrilha analisados na primeira parte da sessão, pela manhã, foram de Delúbio Soares (ex-tesoureiro do PT), José Genoino (ex-presidente nacional do partido), José Roberto Salgado (ex-dirigente do Banco Rural), Kátia Rabello (dona do Banco Rural), Marcos Valério (operador do mensalão), Ramon Hollerbach e Cristiano Paz (ambos ex-sócios de Marcos Valério), além de Dirceu.

Votaram a favor da absolvição os ministros Dias Toffoli, Luis Roberto Barroso, Ricardo Lewandowski, Cármen Lúcia, Teori Zavascki e Rosa Weber. Negaram os embargos os ministros Joaquim Barbosa, presidente do STF; Luiz Fux, relator; Gilmar Mendes, Marco Aurélio de Mello e Celso de Mello.

Último a votar nesta quinta-feira, o ministro Joaquim Barbosa criticou a decisão da maioria da Corte.

Segundo ele, o trabalho do STF, em 2012, foi desperdiçado. Para o magistrado, a nova maioria do Supremo agiu com o “objetivo de anular, de reduzir a nada, o trabalho que fora feito”.
- Inventou-se, inicialmente, um recurso à margem da lei - disse ele, referindo-se aos embargos infringentes.

Em seguida, Joaquim Barbosa falou sobre a absolvição por formação de quadrilha:

- Sinto-me autorizado a alertar a nação brasileira que esse é apenas o primeiro passo.
E completou:

- Agora inventou-se um novo conceito de formação de quadrilha. Um conceito discriminatório. Só aqueles que praticam crimes de sangue participariam. Ouvi argumentos espantosos que se basearam apenas em cálculos aritméticos e em estatísticas totalmente divorciadas das provas dos autos, da gravidade dos crimes.

No fim, Joaquim Barbosa lamentou:

- Esta é uma tarde triste para este Supremo Tribunal Federal, porque com argumentos pífios foi reformada, foi jogada por terra, extirpada do mundo jurídico, uma decisão plenária sólida e extremamente bem fundamentada. Peço vênia à maioria, e voto pela rejeição dos embargos infringentes ora impetrados.

O ministro Teori Zavascki foi o primeiro ler o voto. Ele se posicionou a favor da absolvição:
- A posição majoritária (primeira decisão do STF) é que a quadrilha é formada contra a administração pública e contra o sistema financeiro. Embora não se negue a ocorrência de todos essa variedade delituosa, (...) não está precisamente caracterizado o dolo específico do crime de quadrilha
- disse Zavascki. - É difícil sustentar que o objetivo comum, que a essência dos interesses dos acusados tenha sido a prática daqueles crimes. Voto pelo acolhimento dos embargos infringentes - finalizou.

A ministra Rosa Weber, segunda a votar, também favoreceu os condenados:

- Continuo convencida de que não se configurou crime de formação de quadrilha.

Para Rosa Weber, “não basta que mais de três pessoas unidas pratiquem delitos, é necessário que esta união se faça para específica prática de crimes”.

O ministro Gilmar Mendes, por sua vez, negou os embargos:

- Não tenho dúvida, presidente, que está caracterizado, de forma clara, o crime de formação de quadrilha.

Segundo Gilmar Mendes, “houve quadrilha”:
- O Brasil saiu forte desse julgamento, porque o projeto era reduzir a Suprema Corte a uma Corte bolivariana.

Em seguida, o ministro Marco Aurélio de Melo classificou o mensalão de “quadrilha armada de muito dinheiro”. Ele também negou os embargos aos réus.

- A quadrilha se mostrou armada, mas não de arma propriamente dita, de fogo ou branca, mas armada de muito dinheiro - disse o ministro.

Marco Aurélio afirmou que, no caso do mensalão, as práticas foram “inerentes à máfia”.

- Não tivesse a mazela sido escancarada pelo delator, (ex-deputado federal) Roberto Jefferson (PTB-RJ)... Não fosse esse fenômeno, o governo atual seria outro. Haveria a continuidade da prática dos crimes.

O ministro Celso de Mello acompanhou o relator Luiz Fuz, ou seja, contra a absolvição dos réus. O magistrado apontou para a “existência de vínculo associativo permanente entre os anos de 2002 e 2005, vínculo estabelecido com propósito de viabilizar, em um programa delinquencial, a prática de uma série de crimes cometidos por esse bando criminoso”.

Para Celso de Mello, o crime de quadrilha, “pela simples existência de sua formação, constitui um estado de agressão permanente contra a sociedade civil, e quadrilha ou bando é punida independentemente dos malefícios que produza”.

Na quarta-feira, o relator dos embargos infringentes do mensalão no STF, ministro Luiz Fux, manteve em seu voto a proposta de condenação dos oito réus. Quatro ministros - Luís Roberto Barroso, Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski e Cármen Lúcia -, no entanto, votaram a favor da absolvição pelo crime de formação de quadrilha.

Fonte: O Globo

Condenação de políticos por formação de quadrilha pode ficar mais difícil, dizem especialistas

Para juristas, artigo do Código Penal que trata do crime é vago e será preciso provas mais
contundentes para condenar réus de forma unânime

Decisão, para jurista da FGV-SP, no entanto, não mancha ‘rigor técnico’ com o qual o julgamento do mensalão foi conduzido

Mariana Timóteo da Costa
Silvia Amorim
Bruno Goés

SÃO PAULO e RIO - O novo entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF) para a configuração do crime de formação de quadrilha pode dificultar a punição de políticos por esse delito daqui para frente, avaliaram criminalistas, com base no resultado do julgamento dos recursos no processo do mensalão. Professor de Direito Penal da PUC-Rio e conselheiro da OAB-RJ, Breno Melaragno explicou que, de acordo com o entendimento da maioria dos ministros, somente fica configurado o crime de quadrilha quando houver uma “associação estável, permanente e duradoura que só exista para o fim de cometimento de crimes”.

— Fica muito difícil provar a existência disso em grupos que praticam crimes mais complexos e sofisticados. Nisso concordo com o ministro Joaquim Barbosa: somente será possível condenar por formação de quadrilha crimes violentos, como roubo e tráfico, e praticados por grupos de baixo poder aquisitivo.

Melaragno ponderou, entretanto, que não se trata de um entendimento imutável e que, com a troca de ministros em razão de aposentadorias, um novo posicionamento pode ser firmado pela Corte.

Para o jurista da FGV-SP e da PUC-SP Carlos Ari Sundfeld, a norma penal é “vaga, muito aberta e, por isso, dá margem à arbitrariedade”. Segundo ele, para a condenação de grupos mais sofisticados, é preciso investigações mais aprofundadas e provas mais contundentes.

— Do jeito que é, cada juiz pode interpretar de uma maneira diferente. O artigo diz somente que constitui formação de quadrilha um grupo de três ou mais pessoas se associarem para cometer crimes — avaliou o especialista, para quem, no entanto, a decisão dos ministros não significa uma mancha no julgamento do mensalão, uma vez que o julgamento foi conduzido com rigor técnico.

O jurista considerou “exageradas” as declarações do presidente do Supremo Tribunal Federal, Joaquim Barbosa, que, ao criticar a decisão de absolver os réus por formação de quadrilha, disse que o caso abria um precedente para que “apenas crimes de sangue” sejam julgados assim.

— Nada impede que, com investigações rigorosas, essas quadrilhas sejam desmanteladas. O que precisa no Brasil é se acabar com a precariedade em se investigar crimes, sejam eles de corrupção ou segurança.

Para Cláudio José Pereira, professor de Processo Penal da PUC-SP, não só as investigações, mas também a Justiça, precisam se aprimorar. Para ele, houve “falhas em esclarecer com provas o crime de formação de quadrilha”.

— (Isso) Reflete uma dificuldade para o Brasil entender, e consequentemente condenar, os criminosos de quadrilhas mais sofisticadas e autoras de crimes difíceis de comprovar, como os de colarinho branco — disse Pereira.
Para o advogado e professor da FGV Direito Rio Thiago Bottino, a decisão tomada pelo STF não muda a realidade jurídica do país.

— Se esses oito réus tivessem sido condenados por formação de quadrilha, isso não mudaria a realidade reclamada pelo ministro Joaquim Barbosa. Não há uma mudança de interpretação sobre a lei. O julgamento já tinha ficado dividido lá atrás, em 6 a 4.

Sistema punitivo mais eficiente para pobres
O advogado, especialista em direito penal, reconhece que, no Brasil, há um sistema que pune com mais eficiência as pessoas mais pobres. Porém, isso ocorreria por causa da deficiência do Estado durante as investigações de casos mais complexos.

— O problema do nosso Estado, que pune mais o pobre, é que está programado para identificar, investigar e punir condutas simples. E esses crimes são mais complexos. Mas não é jogando a responsabilidade no Judiciário para que haja a condenação contra a convicção do juiz que as coisas vão mudar.

— A reunião do (José) Dirceu em Portugal: pode ser uma prova de quadrilha ou pode não ser uma prova — exemplifica Bottino.

Fonte: O Globo

Barbosa insinua que colegas manobraram contra julgamento

Presidente do Supremo deu a entender que Teori Zavascki e Luis Roberto Barroso foram nomeados por Dilma para reverter sentenças no mensalão

Felipe Recondo, Mariângela Gallucci e Ricardo Brito

O presidente do Supremo Tribunal Federal, Joaquim Barbosa, insinuou nesta quinta-feira, 27, que os ministros Teori Zavascki e Luís Roberto Barroso, nomes que passaram a integrar a Corte após a primeira fase do julgamento, em 2012, foram indicados ao cargo pela presidente Dilma Rousseff para reverter as sentenças do mensalão. Os dois ministros votaram pela aceitação dos embargos infringentes dos condenados e garantiram sua absolvição do crime de formação de quadrilha.

Barbosa começou a se mostrar indignado quando o placar já estava formado. "Temos uma maioria formada sob medida para lançar por terra o trabalho primoroso levado a cabo por esta Corte no segundo semestre de 2012", afirmou. "Sinto-me autorizado a alertar a Nação brasileira de que esse é apenas o primeiro passo. É uma maioria de circunstância que tem todo tempo a seu favor para continuar sua sanha reformadora", atacou.

Ao defender a manutenção da condenação, Barbosa tentou desqualificar os argumentos dos ministros contrários à sua tese. "Esta é uma tarde triste para este Supremo Tribunal Federal, porque, com argumentos pífios, foi reformada, jogada por terra, extirpada do mundo jurídico, uma decisão plenária sólida, extremamente bem fundamentada, que foi aquela tomada por este plenário no segundo semestre de 2012", disse.

Desmonte. Para Barbosa, a etapa inicial do desmonte do julgamento ocorreu em 2013, quando o tribunal, por maioria, resolveu aceitar os embargos infringentes - quando um réu é condenado com pelo menos quatro votos pela absolvição, pode pedir um novo julgamento. "Inventou-se um recurso regimental totalmente à margem da lei com o objetivo específico de anular e reduzir a nada um trabalho que fora feito", disse.

Fonte: O Estado de S. Paulo

Fernando Gabeira*: A encruzilhada brasileira

"Hey! Matilda, Matil-da, she take me money and run Venezuela." Se invertemos as frases desse calipso celebrizado por Harry Belafonte nos anos 1950, talvez tenhamos uma boa visão das relações do Brasil com a Venezuela.

As relações comerciais quadruplicaram com a ascensão do chavismo, com saldo brasileiro. O País tornou-se o terceiro parceiro comercial da Venezuela, perdendo apenas para os EUA e a China. Não só os alimentos da chamada cadeia proteica, principalmente carne bovina, são vendidos por lá, também a água mineral nos restaurantes de Caracas costuma ser brasileira. A Embraer vende aviões, a Odebrecht e a Camargo Corrêa buscam se consolidar associando-se ao setor petroleiro. Enfim, tudo parece correr bem para os nossos negócios.

Até na fronteira, em Santa Helena do Uairen, fiquei sabendo que as compras foram recordes nos grandes feriados. O real valia 2,8 bolívares e nossos turistas levavam tudo o que podiam nos seus carros abastecidos com gasolina subsidiada pelo governo de lá. Na estrada entre Boa Vista e Santa Helena podem ser vistos os traços de um grande comércio formiguinha, o do contrabando de gasolina. Várias carcaças de carros marcam o curso da estrada, de modo geral queimadas e abandonadas por contrabandistas fugindo da polícia.

Neste momento pós-Chávez, em que a Venezuela entra numa crise, o governo endurece a repressão aos opositores, compactua com grupos armados que atiram na multidão, prende e tortura manifestantes, o que o Brasil pode dizer? Laços comerciais não impediram que o maior parceiro da Venezuela condenasse a política de Nicolás Maduro e o aconselhasse a considerar o que pedem os seus opositores. Mas os americanos são los americanos. O nó que nos ata à Venezuela não é apenas comercial, mas ideológico.

Existe um medo de condenar os erros da política de Maduro porque, desde os primórdios do tempo, um princípio aterrador domina a esquerda: não mencionar os fatos que possam fortalecer o campo adversário. Nesse processo, a omissão ou mesmo a distorção dos fatos passam a ser vividas como um mais alto dever, o de preservar a experiência revolucionária. Isso vale para Cuba e para a Venezuela, uma vez estão entrelaçados e o próprio know-how repressivo cubano foi transplantado para o chamado socialismo do século 21.

O general Angel Vivas, entrincheirado com um fuzil na sua casa em Prado del Este, afirmou no Twitter que estava para ser presos por cubanos e gente da Guarda Nacional Bolivariana. Vestindo camisa vermelha, motociclistas armados atiraram na multidão. Atingiram a cabeça da Miss Turismo de Carabobo. Que perigo Génesis Carmona, de 22 anos, representava para o tal socialismo do século 21? Que perigo representam todos os estudantes que estavam com ela protestando contra o governo?

São golpistas, diz Maduro. Mas Nicolás Maduro é uma rara espécie de visionário. Ele vê Hugo Chávez transfigurado num passarinho, vê o rosto de Chávez numa escavação de metrô e sua visão mais cômica se deu na cela onde está preso Leopoldo López. Maduro afirma que um desconhecido foi preso tentando entrar na cela de López com inúmeros mapas das instalações petrolíferas do país. Mesmo um roteirista de cinema teria dificuldades de dar um toque de realidade a essa versão. Como ter acesso à cela de López? De que adiantariam para ele os mapas na prisão? Por que não estudaram esses mapas nos longos anos de liberdade?

Maduro é condutor de um processo que arrebata ainda a simpatia de alguns europeus e de uma faixa da juventude de esquerda. O único fator a que se apegam seus defensores é o apoio popular. Mas mesmo esse apoio começa a ser corroído. Ao ler mais atentamente os textos do Tal Cual, percebi que ao mencionar a oposição o jornal diz também que alguns chavistas discordam da repressão de Maduro. Horas depois constatei que falava de algo real: o governador de Táchira, José Vielma Mora, criticou a prisão de López e condenou os métodos do governo. Vielma Mora é chavista.

Num momento tão dramático para o continente, estamos atados a dois nós. Para desatar o primeiro, o econômico, é preciso introduzir um visão de médio prazo. A economia venezuelana está em decadência e muito provavelmente os negócios não serão tão sedutores nem os pagamentos, pontuais. Sempre teremos relações com a Venezuela: é preciso pensar nisso, antes de embarcar na canoa de Maduro.

Para desatar o segundo nó, o ideológico, é preciso levar o governo ao debate, saber o que está vendo na crise venezuelana. Se confiar só em Maduro, verá passarinhos durante o dia e carneirinhos antes de dormir. Como é possível identificar-se com um projeto que melhorou as condições imediatas dos pobres, mas está se mostrando insustentável em termos econômicos, mata misses, sufoca a imprensa, prende estudantes, aterroriza a oposição?

Não tenho esperança de convencê-los, como não tinha de convencer as pessoas de que o mundo não acabaria em 2012. Mas quando se trata de uma questão política que envolve a imagem internacional do Brasil é preciso buscar um mínimo de convergência. É preciso que o governo compreenda que criticar a violação dos direitos humanos na Venezuela não é dar munição aos adversários de Nicolás Maduro. Ela foi dada pelo próprio Maduro quando viu uma tentativa de golpe num movimento de protesto. A munição nasce dos fatos e quando começamos a negá-los por um dever de consciência alguma coisa está errada com o próprio sentido da palavra.

Compreendo que o governo tem ganho as eleições e, no momento, desfruta o apoio da maioria. Mas isso o autoriza a vestir uma camisa partidária em nosso peito juvenil e outros peitos de idade mais avançada?

Traçamos uma linha imaginária no século passado e continuamos a nos orientar por ela. Esquerda ou direita? E estamos levando o nosso rigor geométrico para os cemitérios: mortos de esquerda ou de direita?

Diante de nós, a Venezuela em transe.

*Fernando Gabeira é jornalista.

Fonte: O Estado de S. Paulo

Luiz Felipe Lampreia: O que diz o Brasil?

Silêncio em relação à Venezuela é um erro

Regimes opressivos e violentos, que desservem às aspirações do povo, acabam um dia colhendo o que semearam: a revolta. É o caso da Ucrânia, onde o que era uma disputa administrável tornou-se confronto sangrento. Mais próxima de nós, está a tragédia da Venezuela.

Sob a presidência de Nicolás Maduro, a quem falta o enorme carisma de Hugo Chávez, o país está descendo às profundezas do desgoverno e da brutalidade. Quando as prateleiras dos supermercados estão vazias, a moeda nacional derrete, a inflação está em alta vertiginosa — é natural que haja manifestações de protesto. Qualquer regime democrático as aceita, sob regras publicamente definidas de local, hora e não violência. O regime de Maduro, ao contrário, alegou que se tratava de uma conspiração fascista financiada pelos EUA e começou a baixar o porrete. 

As forcas policiais usaram fartamente cassetetes e gás lacrimogêneo, a Sebin (a Gestapo venezuelana) usou armas de fogo contra a multidão. Os relatos de tortura, espancamentos e ameaças de morte são numerosos. A imprensa tem sido reprimida na cobertura dos choques e, segundo relatos confiáveis, muitos jornalistas têm sido presos ou agredidos na tentativa de encobrir a repressão. A violência de atirar contra os manifestantes é também levada a cabo pelos esquadrões chamados colectivos, em tudo semelhantes às tropas de choque nazistas da SS ou os squadristi de Mussolini, inclusive por terem sido lançados pelo governo de Maduro.

Prognosticar se o governo de Maduro vai cair não é o escopo deste artigo. O tema principal aqui é a posição do governo brasileiro sobre o massacre que está em curso na Venezuela. Em primeiro lugar, coloca-se a questão de saber se o governo da Venezuela viola seus compromissos jurídicos internacionais. Vale lembrar que, nas normas jurídicas continentais, consta o Compromisso Democrático da OEA, assinado por todos os países membros, que coloca com clareza o que é uma democracia, bem como o Protocolo de Ushuaia do Mercosul (tive a honra de assiná-lo como chanceler brasileiro em 1998), que contém a cláusula democrática e prevê inclusive a suspensão do país que a viole.

Por que o governo brasileiro se omite nessas condições? Por que, por muito menos e de forma altamente discutível e prejudicial aos interesses nacionais, castigou o Paraguai em nome da referida cláusula democrática? E agora, em face das atitudes antidemocráticas do governo venezuelano, nada diz.

O respeitado jornal “La Nación”, de Buenos Aires, publicou matéria no dia 21 de fevereiro em que afirma: “Silêncio cúmplice. Erro estratégico. Postura inadmissível de um suposto líder regional com aspirações globais. Ante a crise que se vive na Venezuela, são cada vez mais numerosas as vozes que condenam a falta de ação do Brasil no conflito que sangra seu vizinho e mais recente sócio no Mercosul.”

Creio, com a maior convicção, que o silêncio do Brasil face à repressão violenta sobre a oposição que está sendo praticada pelo governo Maduro é um erro que afeta a credibilidade de nosso país em sua tradicional defesa dos direitos humanos e dos valores democráticos. É uma mancha para o atual governo, que espero seja apagada por uma postura mais definida .

Fonte: O Globo

Rogério Furquim Werneck: Autoengano e realismo

Lula parece bem mais realista do que certos analistas econômicos

A taxa anual média de crescimento da economia nos três primeiros anos de mandato da presidente Dilma mal chegou a 2%. E é bem possível que, ao fim do mandato, a taxa média dos quatro anos se mostre ainda mais baixa. A sete meses das eleições e com desempenho tão pífio para mostrar, o governo vem enfrentando rápido estreitamento do espaço de manobra para condução da política econômica.

As contas de anos de inconsequência e improvisação parecem ter chegado todas ao mesmo tempo. A política econômica vem sendo dominada pela recorrente necessidade de encobrir efeitos de medidas equivocadas tomadas no passado, com outras medidas equivocadas cujos efeitos terão de ser encobertos mais adiante. Um exemplo emblemático é a política populista de preços de energia, que redundou em deplorável castelo de cartas que hoje tem como pilares centrais o Tesouro e a Petrobras.

Na semana passada, em meio a esse quadro tão adverso, o país, mais uma vez, teve de assistir ao tradicional espetáculo de pirotecnia fiscal de fevereiro, em que o governo renova suas juras de compromisso com a austeridade e promete que os excessos do ano anterior jamais se repetirão. Nesse ano, as cores foram mais dramáticas pois, como deixou claro o próprio ministro da Fazenda, o espetáculo foi inteiramente motivado pela urgência de evitar os danos de um rebaixamento da dívida brasileira pelas agências de avaliação de risco, em pleno ano eleitoral.

O que, afinal, se viu foi uma proposta de ajuste fiscal, baseada em hipóteses róseas acerca da arrecadação e das possibilidades de contenção de gastos, que prevê geração de um superávit primário da ordem de 1,9% do PIB em 2014, mesmo com aumento substancial do dispêndio federal em relação a 2013. Entre outras falhas já bem ventiladas na mídia, a proposta passa ao largo de duas questões cruciais. Como serão financiados os custos de operação das usinas térmicas que o governo vem espetando no Tesouro, para não ter de repassá-los aos consumidores de energia? O que, afinal, deverá acontecer, em 2014, com as gigantescas transferências de recursos provenientes de emissão de dívida pública que o Tesouro vem fazendo ao BNDES, por fora do orçamento e sem registro adequado nas estatísticas de resultado primário e de dívida líquida do setor público?

Apesar dessas omissões e demais falhas, houve quem se apressasse em concluir que, com a proposta, o governo havia conseguido recuperar a credibilidade perdida e afastar o risco de um rebaixamento da dívida em 2014. O despropositado grau de autoengano que tal conclusão requer só pode ser explicado pela demanda quase desesperada por cenários otimistas que hoje se vê no País.

É curioso que, depois de tantos anos, ainda haja quem não perceba que, sem mudança da equipe econômica, tais promessas não são mais críveis. É ingênuo esperar que Mantega, Arno e Coutinho, a linha de ataque que tanto se destacou no lamentável processo de demolição institucional que teve lugar na gestão das contas públicas nos últimos anos, possa agora mostrar seu valor na defesa, levando adiante um programa de austeridade fiscal em pleno ano eleitoral.

Visão bem mais lúcida da real extensão das dificuldades da política econômica do governo é a que agora revelou ter o ex-presidente Lula. No início da semana, Lula deixou vazar que achava que a atual equipe econômica estava com “prazo de validade vencido” (“Folha de S.Paulo”, 24 de fevereiro). É claro que, nessa alusão à perda de validade, Lula não estava incluindo o comando supremo da equipe econômica. Mas dois dias depois, em artigo no “Valor Econômico”, deixou mais do que claro seu desalento com a possibilidade de que os feitos do governo Dilma possam ser vendidos ao eleitorado. Sugeriu que a estratégia mais promissora será tentar vender um pacote fechado de três mandatos, em que as mazelas dos quatro anos de Dilma possam ficar diluídas nos oito de Lula. O que ainda terá a vantagem de não exigir mudança de discurso, caso o PT tenha de partir para o Plano B.

Rogério Furquim Werneck, economista e professor da PUC-Rio

Fonte: O Globo &O Estado de S. Paulo

Campos diz que PIB é medíocre; Aécio não vê retomada

Ricardo Della Coletta, Daiene Cardoso e Débora Álvares

BRASÍLIA - O desempenho da economia no ano passado, que surpreendeu positivamente o mercado financeiro e a equipe econômica do governo, foi recebido com críticas pelos principais pré-candidatos ao Palácio do Planalto nas eleições de outubro. O presidente nacional do PSDB, senador Aécio Neves, destacou que o resultado mostra o crescimento brasileiro como o "menor entre as principais economias emergentes". Já o governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB), considerou "medíocre" o avanço de 2,3% do Produto Interno Bruto (PIB).

Segundo Aécio Neves, o índice "não representa uma efetiva recuperação ou retomada do crescimento da economia brasileira". "Ao contrário do que acusa o governo, os analistas sempre foram menos pessimistas do que os fatos", afirmou o tucano. O senador mineiro argumenta ainda no texto que o desempenho da indústria no período "mal compensou" a queda do PIB industrial em 2012. "O quadro geral é de estabilidade, em um patamar muito aquém do que o país poderia e deveria estar", acrescentou.

Aécio Neves disse que o potencial de crescimento da economia foi reduzido e que isso "não pode ser mais terceirizado e debitado na conta da crise internacional". "Representa queda estrutural do potencial de nossa economia em produzir um futuro melhor para os brasileiros, em função dos erros de política econômica que se acumulam nos últimos anos."

O governador de Pernambuco, Eduardo Campos, usou as redes sociais para criticar o desempenho da economia. "O IBGE acaba de divulgar o medíocre PIB de 2013. Não adianta vir com o velho truque de selecionar outros países mal das pernas e dizer que estão piores do que nós. O povo brasileiro merece coisa melhor", escreveu, em sua página no Facebook.

O presidenciável disse que falta "trabalho duro". "O Brasil não precisa de governantes dedicados unicamente a explicar por que estamos mal. Precisa de um governo que jogue limpo, que seja transparente, que trabalhe duro para fazer o Brasil crescer de verdade, para ressuscitar nossa indústria, para reanimar nossas exportações, para defender nossa economia, que é a base da nossa soberania nacional", acrescentou.

"O Brasil precisa parar de festejar a mediocridade, precisa parar de pensar pequeno. Nossa vocação é pensar grande, é trabalhar para que os grandes sonhos e projetos do povo brasileiro virem realidade", finalizou.

Fonte: O Estado de S. Paulo

Aécio diz que avanço do PIB não exprime retomada do crescimento

Senador comentou resultado do Produto Interno Bruto, divulgado nesta quinta-feira pelo IBGE

O presidente nacional do PSDB, senador Aécio Neves (MG), divulgou nota nesta quinta-feira, 27, na qual afirma que o avanço do Produto Interno Bruto (PIB) em 2013, de 2,3% segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), "não representa uma efetiva recuperação ou retomada do crescimento da economia brasileira". Aécio, provável candidato tucano ao Palácio do Planalto, também destaca que o desempenho brasileiro é, no acumulado de três anos, "o menor entre as principais economias emergentes".

O IBGE divulgou na manhã desta quinta que a economia brasileira avançou 0,7% nos três últimos meses do ano passado, ante o trimestre imediatamente anterior. O resultado anual (2,3%) é maior do que a evolução do PIB em 2012 (1%) e menor do que o primeiro ano da presidente Dilma Rousseff (2,7%).

Na nota, Aécio também rebateu a afirmação do Planalto de que os analistas são muitas vezes pessimistas ao avaliar o cenário econômico brasileiro. "Ao contrário do que acusa o governo, os analistas sempre foram menos pessimistas do que os fatos", afirma o tucano. O senador mineiro argumenta ainda no texto que o desempenho da indústria no período "mal compensou" a queda do PIB industrial em 2012. "O quadro geral é de estabilidade, em um patamar muito aquém do que o país poderia e deveria estar", acrescentou.

Na mesma linha, ele diz que o avanço dos investimentos "quase não contrabalança" a queda registrada em 2012. "É ainda importante destacar que, quando se olha os números trimestrais, o crescimento do investimento se concentrou na primeira metade de 2013 e já perdeu fôlego no segundo semestre do ano", diz.

Aécio afirma ainda que o potencial de crescimento da economia foi reduzido e que isso "não pode ser mais 'terceirizado' e debitado na conta da crise internacional". "Representa queda estrutural do potencial de nossa economia em produzir um futuro melhor para os brasileiros, em função dos erros de política econômica que se acumulam nos últimos anos", conclui o senador.

Fonte: Estado de Minas

Eliane Cantanhêde:"Tarde triste"

Depois da reviravolta de ontem no Supremo, que agora não reconhece mais o crime de quadrilha no mensalão, o foco está em dois personagens principais e antagônicos: o condenado José Dirceu e o algoz Joaquim Barbosa.

Dirceu foi citado pela Procuradoria Geral da República, pelo então relator Barbosa e pela maioria do antigo Supremo (aquele que condenou) como "chefe de quadrilha" --e condenado como tal pelos indícios e pelo conjunto da obra, mesmo sem provas factuais. E agora? Se não existiu quadrilha, como Dirceu pôde ter sido chefe de quadrilha?

Além da redução de pena e da troca do regime fechado pelo semiaberto, Dirceu está em condições de dar um outro drible na condenação, aproveitando o novo equilíbrio interno no Supremo: a "revisão criminal".

Significa entrar com recurso para uma nova apreciação das outras condenações, mesmo depois de tramitado em julgado. Está previsto no Código do Processo Penal e no Regimento Interno do STF. Você aí, então, pode ir se preparando para a absolvição e, da absolvição, para a santificação.

Vitória de Dirceu, derrota de Joaquim Barbosa. Visivelmente abatido, trocando a arrogância de outros tempos pelo ar de desânimo, ele disse que foi "uma tarde triste para o Supremo" e considerou que "todo o trabalho foi lançado por terra".

Joaquim conquistou amor e ódio como relator do mensalão e depois como primeiro presidente negro do Supremo. Virou um personagem nacional, despertou a cobiça de partidos políticos, achou que estava fazendo história --e talvez estivesse, e esteja, mesmo. Mas vale para ele a mesma pergunta feita para Dirceu, às avessas: e agora? Como conviver como minoria num tribunal onde foi maioria? Pior: como deixar de presidir e passar a ser presidido justamente por Lewandowski em novembro?

Assim como Dirceu é candidato a ex-condenado, Joaquim Barbosa bem pode se tornar candidato a senador, presidente... E a luta continua.

Fonte: Folha Online

Dora Kramer: Nada é para já

A mesma voz do bom senso que aconselharia o ministro Joaquim Barbosa a ficar longe da política eleitoral ao menos até esfriarem os ânimos do mensalão diria ao ex-presidente Luiz Inácio da Silva que disputar a Presidência da República de novo não seria um bom negócio.

Em 2014, em 2018 nem nunca mais. O mesmo se aplica ao ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, guardadas algumas proporções. FH ganhou duas no primeiro turno, saiu na segunda gestão mais para lá do que para cá em termos de popularidade e vive uma ótima vida de homenagens sem deixar de fazer política. Para que concorrer a uma eleição e ainda se arriscar a perder?

Lula saiu consagrado da Presidência. Com popularidade altíssima depois de dois mandatos, capital político mais que robusto, o comandante incontestável de seu partido em plena posse de suas atividades. Em português claro: manda e desmanda, com mandato ou sem.

Porém, governou com céu de brigadeiro e a situação mudou. Por que arriscar esse patrimônio concorrendo a uma eleição se a vida está ótima assim? Para quem saiu com mais de 80% de aprovação, qualquer 75% é perda. Ademais, o horizonte não se desenha risonho e franco para o próximo período.

Ocorre, contudo, que o PT precisa manter o poder. Não tem outro nome além de Lula e se aflige com a possibilidade de não conseguir com Dilma Rousseff. Daí o que o secretário-geral da Presidência, Gilberto Carvalho, chama de "fofocas" sobre a possibilidade de o ex-presidente vir a se candidatar agora no lugar da sucessora.

Há apostas do lado do "sim" e do lado do "não". Hoje a balança pesa mais para a primeira hipótese. Mas, seja qual for a decisão, não seria tomada agora. O ex-presidente tem tempo e razões de sobra para postergar.

Vamos à lista dos motivos: 1.Dilma está na frente nas pesquisas; 2. A oposição ainda não se configura uma ameaça que justifique movimentos radicais; 3. Seria uma precipitação, pois as candidaturas só precisam ser oficialmente definidas em junho; 4. Assumir a candidatura agora equivaleria a dizer que Lula considera Dilma incapaz de ganhar e que, portanto, o governo dela é um fracasso; 5. Fracasso dele, o fiador de gestora tão competente como nunca antes aparecera neste País.

O essencial. Com todos os senões que se possam enxergar no fato de uma decisão do Supremo Tribunal Federal ser reformulada pelos votos de dois ministros que não participaram do julgamento, contrariando a maioria que acompanhou passo a passo o processo, um dado é fundamental.

O projeto do partido no poder de que os réus, ou pelo menos aqueles do chamado núcleo político, fossem absolvidos de maneira a prevalecer a tese de que o mensalão foi uma farsa, não teve êxito.

A ideia de que uma Corte majoritariamente nomeada por governos do PT poderia se submeter aos interesses do partido não vingou. Do ponto de vista institucional na comparação com outros países em que o Poder Executivo eleito de forma democrática, mas exercido de forma autoritária, o Brasil saiu-se muito bem.

Nessa perspectiva tanto faz se altos dirigentes partidários tenham formado uma quadrilha ou um "concurso de agentes" para o cometimento de crimes.

O importante é o reconhecimento de que os cometeram e que, mesmo poderosos e providos de costas quentes, estão pagando por isso. Não foram declarados inocentes nem se podem dizer vítimas de injustiças. Tiveram todas as chances.

Inclusive a oportunidade de um novo julgamento em instância superior, em tese única. Se o enredo não saiu como previam, deve-se à solidez dos homens e mulheres que não deixaram o Supremo Tribunal Federal se curvar às conveniências do Planalto.

Breve pausa. A política se recolhe durante o carnaval, voltando a abrir alas e a pedir passagem na próxima sexta-feira, dia 7.

Fonte: O Estado de S. Paulo

Merval Pereira: Marco positivo

Então fica combinado assim. José Dirceu não é o chefe da quadrilha do mensalão. É simplesmente o mais graduado dos co-autores de crimes como corrupção ativa, corrupção passiva, peculato, lavagem de dinheiro (por enquanto), evasão de divisas.

Os petistas estão eufóricos com a decisão do novo plenário do Supremo Tribunal Federal de absolver os condenados por formação de quadrilha, que sem dúvida tinha um valor simbólico no caso do mensalão. E é o fim desse simbolismo que fez com que os petistas vibrassem tanto, juntamente com a possibilidade de reduzir o tempo de reclusão, em alguns casos saindo da cadeia até mesmo este ano.

A prisão semi-aberta, sabe-se agora, é uma punição bastante rigorosa quando os controladores do sistema prisional não são subordinados a governos petistas. O mais grave dessa decisão é se ela corresponder a uma tentativa de transformar o Supremo em um órgão “bolivariano”, como acusou o ministro Gilmar Mendes.

Tanto ele quanto Joaquim Barbosa advertiram que haverá outras tentativas de reverter o resultado do julgamento à medida que ministros forem sendo substituídos, até a revisão criminal.

É verdade que desde o início do julgamento houve claras manobras, em plenário e por parte dos advogados, para retardá-lo como maneira de fazer com que os ministros Ayres Britto e Cezar Peluso se aposentassem antes do seu final, o que realmente aconteceu.

Peluso, por exemplo, não nem chegou a votar em formação de quadrilha nem em lavagem de dinheiro. A saída dos dois deu margem a que, com os novos ministros, a minoria se transformasse em maioria. Nem ele nem Britto participaram da votação sobre a existência dos embargos infringentes, o que abriu condições de rever o julgamento nos quesitos formação de quadrilha e lavagem de dinheiro.

A revisão criminal, no entanto, é bastante difícil de conseguir, e depende de se provar que a condenação foi feita com base em documentos ou depoimentos falsos, ou de aparecer novas provas de inocência.

Mas se este for mesmo “apenas o primeiro passo”, como alertou o ministro Joaquim Barbosa, pode acontecer que se forme no plenário do STF ao longo dos próximos dois anos (prazo máximo para pedir a revisão) outra "maioria de circunstância” para reformar as sentenças já formuladas. Nesse prazo devem sair do Supremo por aposentadoria os ministros Celso de Mello e Marco Aurélio Mello, e o ministro Joaquim Barbosa.

Espera-se que as piores previsões não se confirmem e que os próximos presidentes continuem enviando ao STF juízes capazes de serem independentes em seus votos. A simples desconfiança de que o plenário seja manipulável, atendendo aos interesses do governo da ocasião, coloca em risco a democracia brasileira, que tem no julgamento do mensalão, apesar de tudo, um marco positivo.

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Não há dúvidas de que quando um crime prescreve o acusado não vai nem a julgamento, como é o caso do ex-ministro de Lula Walfrido Mares Guia que, por ter feito 70 anos, teve reduzido pela metade o tempo de prescrição do crime de que era acusado no mensalão mineiro.

Mas, no caso do mensalão do PT, se tratava de um julgamento já realizado, e, portanto, a prescrição só poderia acontecer se os réus fossem condenados a menos de 2 anos de prisão. Raciocinar, como fizeram os ministros Luis Roberto Barroso e Teori Zavascki, como se as penas não tivessem sido dadas não tem sentido técnico, na opinião de muitos juristas.

Apenas sentido político, isto é, denunciar que as penas foram agravadas com o objetivo de colocar o condenados em regime fechado.

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A coluna volta a ser publicada no próximo dia 5 de março. Bom Carnaval a todos.

Fonte: O Globo

Sandro Vaia: Samba do Arnesto

Arnesto morreu aos 99 jurando que nunca convidou Adoniran Barbosa para um samba. Mas, como ensinou John Ford, quando a lenda fica melhor que a realidade, publique-se a lenda. Ou, no caso, cante-se a lenda. A lenda diz que o Arnesto convidou para um samba na casa dele - no Brás - e quando os convidados chegaram ele não estava lá.

Não importa agora se é verdade ou não. O importante é que a canção virou um clássico da música popular brasileira e continuará sendo cantarolada até o fim dos tempos, o que devemos agradecer eternamente a Adoniran e ao Arnesto.

A política é um terreno fértil para o nascimento, florescimento e propagação das lendas, e geralmente o
exercício do poder faz com que seus manipuladores nao se importem muito em lançar mão delas para conseguir seus objetivos.

Governos populistas extraem grande parte de suas criações das lendas que eles mesmo criam.

Na semana passada, o ministro Gilberto Carvalho, a quem incumbe a missão de ser “interlocutor dos movimentos sociais”, seja o que isso for, conseguiu compor o seu samba do Arnesto.

Participantes do 6º Congresso dos Trabalhadores Rurais Sem Terra fizeram uma manifestação na Esplanada dos Ministérios onde entraram em choque com a Polícia Militar, tentaram invadir à força o prédio de um dos Três Poderes da República - o Judiciário - e deixaram 32 feridos entre os policiais e 2 entre seus próprios manifestantes.

Se fosse uma daquelas manifestações contra a Copa, eles poderiam ser enquadrados como terroristas, se já estivesse em vigor uma lei que se prepara para isso.

Mas como era fogo amigo, nao só foram recebidos com todas as gentilezas pela presidente Dilma, no dia seguinte, que em troca recebeu uma cesta de orgânicos, como foram financiados com dinheiro público: 200 mil reais da Caixa, 350 mil do BNDES (financiamento de produção?) e 448 mil do Incra.

No dia seguinte, Gilberto Carvalho cantou o seu samba do Arnesto e disse que o governo é “democrático”, sim, e financia “movimentos sociais” mesmo que se manifestem contra ele, o governo.

Como o MST considera o governo Dilma “bundão” (palavras de seu líder Stédile) e “o pior da história em termos de reforma agrária”, o mistério do dinheiro público doado a ele se desfaz em uma poça de cinismo.

Ou será que basta abrir um “movimento social” e protestar com violência diante das sedes do poder e depois entrar na fila onde o dr. Gilberto Carvalho distribui dinheiro público - como se fosse dele e não do contribuinte?

A mistificação, infelizmente sem o lirismo de Adoniran, chegou ao STF que compôs o seu samba do Arnesto e revogou como que por milagre a existência de uma quadrilha condenada por crimes de corrupção ativa, passiva, peculato e lavagem de dinheiro. Como a quadrilha desapareceu, devemos presumir que tudo foi obra de um zeloso e bem sucedido empreendedorismo individual.

Sandro Vaia é jornalista. Foi repórter, redator e editor do Jornal da Tarde, diretor de Redação da revista Afinal, diretor de Informação da Agência Estado e diretor de Redação de “O Estado de S.Paulo”. É autor do livro “A Ilha Roubada”, (editora Barcarolla) sobre a blogueira cubana Yoani Sanchez e "Armênio Guedes, Sereno Guerreio da Liberdade"(editora Barcarolla).

Fonte: Blog do Noblat

Maria Cristina Fernandes: À nascente do Atlântico

No Recife, chineses formam uma bolha dentro de outra

De cada dez sombrinhas de frevo vendidas neste carnaval do Recife, oito viajaram 50 dias do porto de Guangdong, na província chinesa de Cantão, até Suape.

Grande parte delas é vendida em lojinhas do bairro de São José, um dos primeiros núcleos urbanos do país que ainda conservam o traçado holandês do início do século 17.

Muitos dos trabalhadores desse comércio moram a três quadras dali, nas torres de 42 andares voltadas para o que o folclore local denomina de nascente do oceano Atlântico, formado a partir da junção dos rios Capiberibe e Beberibe.

São apartamentos de 247 metros quadrados onde moram as famílias de dois ex-governadores do Estado, deputados federais, desembargadores e empresários. Imobiliárias locais chegam a pedir R$ 2,5 milhões por um apartamento naquelas torres.

Esses prédios, chamados de 'torres gêmeas', foram erguidos sob protestos de urbanistas e do Instituto de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) por ocuparem área preservada do cais do porto sem qualquer traço de ocupação residencial.

Pela tocaia que o repórter André Duarte, do 'Diário de Pernambuco' fez nas torres, descobriu-se o mal estar provocado pelo convívio de parte da elite local com a terceira leva migratória de chineses na cidade, protagonistas do 'boom' de consumo popular que marcou a região nos últimos anos.

A primeira é da década de 1950, iniciada por famílias de engenheiros chineses trazidos por Agamenon Magalhães para obras de reformulação urbana da capital. A segunda, da década de 1970, deriva da diáspora de famílias chinesas instaladas em Ciudad del Este e em São Paulo.

A terceira iniciou-se na década de 1990, impulsionada pelas reformas liberalizantes na China e pela conclusão do Porto de Suape. Além de porta de entrada dos investimentos industriais que mudaram o perfil econômico do Estado nos últimos anos, Suape passou a ser a principal via de acesso de mercadorias da China ao mercado consumidor do Nordeste.

Ao contrário das outras duas levas, onde predominavam famílias de Taiwan, com costumes mais ocidentalizados, e que montaram restaurantes, lavanderias e clínicas de acupuntura, os novos chineses de Pernambuco têm origem rural. Muitos deles integram redes de trabalho temporário que se deslocam por Chinatowns do mundo inteiro.

O antropólogo da Universidade Federal de Pernambuco, Marcos de Araújo, autor de uma dissertação de mestrado sobre o tema, vê como característica dessa terceira leva migratória o 'guanxi', compromisso de quem deve favores na cultura chinesa. Muitos de seus entrevistados, submetidos a regime de semiescravidão, foram trazidos por parentes endividados.

O antropólogo pernambucano entrevistou 66 chineses de uma comunidade de 658 na contagem oficial mas, de fato, estimada em três mil. À época de sua dissertação (2008), tocavam 52 estabelecimentos no Recife e 15 em Caruaru. Além de vendedores, atuam no abastecimento das lojas, feito de madrugada em carrinhos de mão, a partir de depósitos próximos, para driblar a fiscalização.

Os relatos colhidos sugerem que o comércio prospera graças a um esquema de sonegação que começa em Suape e é acobertado pela polícia local. Das desavenças desse esquema já resultou uma batida policial num dos apartamentos das torres e um assassinato, no centro do Recife, de um comerciante chinês que tentou furar a máfia local de sombrinhas baixando o preço de R$ 5 para R$ 3.

Um dos chineses que entrevistou, trazido por tia endividada, morava num dos seis apartamentos das torres gêmeas ocupados pela comunidade. Dois casais ficavam em duas das suítes e as outras duas eram divididas por ele e mais quinze, empilhados em beliches.

A convivência dessas repúblicas de trabalhadores semiescravizados com famílias locais abastadas tem gerado um conflito surdo. Tem nuances e cheiros distintos daqueles captados pelo cineasta Kleber Mendonça que, em seu 'Som ao Redor', mostra a transposição para um bairro de classe média recifense das relações de poder estabelecidas na vizinhança por um decadente senhor de engenho.

Com variado grau de tolerância, os moradores das torres ouvidos pelo repórter André Duarte, revelam o incômodo da convivência com esses migrantes responsáveis pela face menos glamourosa da globalização da economia local.

Sinais do incômodo estariam espalhados desde a pista de cooper, onde se veem restos dos peixes fisgados a partir dali, em pier improvisado, até a piscina, onde alguns tomam banho de roupa. A fritura dos peixes espalha seu cheiro por outros apartamentos às 5 da manhã, hora em que tomam café para abrirem as lojas às 7h. Divergentes hábitos de higiene também fariam com que os moradores do prédio passassem a evitar o elevador quando percebem a presença dos chineses.

Os chineses do Recife são uma fatia minúscula em comparação com aqueles que vivem em São Paulo. O Estado abriga 80% de uma comunidade hoje calculada em 200 mil no país, mais permeada pelo novo perfil do investimento chinês no país.

A paulatina liderança da China no investimento estrangeiro no Brasil somou entre 2007 e 2012 R$ 24,4 bilhões, segundo os cálculos do Conselho Empresarial Brasil-China. No ano passado a esses investimentos somou-se a presença chinesa no leilão do campo de Libra, do pré-sal. Mas a quase totalidade desses investimentos está concentrada no Centro-Sul.

No Recife, a entrada de imigrantes se dá pelas franjas daquela que é a maior parceria comercial do Brasil. Ao escolherem as torres gêmeas para instalar sua mão de obra mutante, os chineses do Recife formaram uma bolha dentro de outra. Como não há farmácias, padarias ou escolas por perto, todo o deslocamento dos brasileiros é feito de carro. Os únicos moradores que saem a pé ali são os chineses, que custam a atravessar a larga avenida sem faixa de pedestre, para trabalhar.

Fonte: Valor Econômico

Diário do Poder – Cláudio Humberto

• Dilma anuncia ‘autossuficiência’, como Lula em 2006
Assim como ontem (27), quando o governo Dilma Rousseff anunciou que em 2015 o Brasil será “autossuficiente em petróleo”, o ex-presidente Lula prometeu exatamente o mesmo nesta época, no ano eleitoral de 2006, quando se preparava para a campanha de reeleição. Ele jurou que a Petrobras conquistaria a definitiva autossuficiência na produção de petróleo. Oito anos depois, a promessa não foi cumprida.

• Sabido, ele
Lula adotou a estratégia de tentar ofuscar denúncias contra seu governo com “descobertas” frequentes de novas reservas petrolíferas.

• Produção fraca
Em março de 2006, o Brasil produzia 1,75 milhão de barris/dia. Pouco mudou: em dezembro de 2013 a média não passou de 1,96 milhão/dia.

• A culpa é sua
A explicação do governo para a perda da “autossuficiência” supostamente conquistada em 2006 foi “aumento do consumo”.

• Detalhes
Chance de autossuficiência só mesmo no ano de 2020, quando novas refinarias começarem a operar. Até lá o Brasil continuará importando.

• Ministério do Trabalho prepara novo escândalo
Essa turma não aprende: um novo escândalo de corrupção pode estar em gestação no Ministério do Trabalho, alvo de duas operações da Polícia Federal em 2013, com a prisão de funcionários ligados ao ex-ministro Carlos Lupi. Agora, uma licitação de R$ 10 milhões para contratar uma agência que cuide de sua assessoria de imprensa tem chamado a atenção pelas suspeitas de cartas marcadas.

• Cecelândia
Yoani Sánchez, famosa dissidente cubana, confirma por linhas tortas no Twitter: além de desodorante, também falta sabonete em Cuba.

• Traíras
Caciques do PT insatisfeitos com Dilma incentivam a rebelião da base aliada, por meio do “blocão”, e pregam a volta de Lula.

• Sem discussão
Segundo o líder do PSB, Beto Albuquerque (RS), se o partido lançar candidato em São Paulo, o nome hoje é o do deputado Márcio França.

• Suprema pizza
A absolvição dos mensaleiros por formação de quadrilha rendeu uma declaração grave do presidente do STF. Joaquim Barbosa soltou o verbo: “É apenas o primeiro passo (…) da sanha reformadora”.

• A comédia da vida
Com a absolvição dos condenados por formação de quadrilha, o Supremo inaugura uma nova tese jurídica, o inciso de Chaves, do personagem da TV: cometeram crimes “sem querer querendo”.

• Eles merecem
O deputado Alfredo Kaefer (PSDB-PR) requereu à Câmara moção de louvor ao sargento Angelus e ao cabo Pamplona, que protegeram o opositor Roger Pinto Molina durante sua fuga da Bolívia para o Brasil.

• Radical governista
Após aderir ao governo, deixando a oposição para trás, a senadora Kátia Abreu (PMDB-TO) tem sido ironizada por ex-companheiros de trincheira. “Virou uma dilmista radical”, desdenha um senador do DEM.

• Aviso na popa
Os petistas deveriam avaliar melhor a escolha: o saguão do prédio Embassy Tower, na região central de Brasília onde deverá se instalar o QG de campanha de Dilma, lembra o salão de festas do Titanic.

• Desarranjo
É periclitante a ação intestina da Câmara dos Deputados, que após analisar a compra com potes para exames de fezes, contrata a SFDK Laboratório para analisar o açúcar cristal ao custo de R$ 843,50.

• Sem pê
Patrício, deputado distrital que tirou Cabo do nome, corre o risco de ficar sem a legenda do PT pelo apoio ao motim da Polícia Militar contra o governo Agnelo Queiroz. Agora pode ficar sem partido e sem apoio.

• Alô, Anatel
A TIM encontrou uma forma marota para burlar a regra que limita o tempo de espera nas ligações para seu 0800: diferentes gravações atribuem seus problemas, inclusive de falta de atendentes, a greves nos transportes ou nos Correios. E o serviço continua muito ruim.

• Pensando bem…
… “de onde menos se espera é que não sai mesmo coisa nenhuma”, diria do julgamento do mensalão Apparício Torelly, o Barão de Itararé.

Fonte: Diário do Poder

Panorama político - Ilimar Franco

O não de Bernardinho
O desportista Bernardinho vai formalizar hoje sua decisão de não concorrer ao governo do Rio pelo PSDB. Ele fará uma visita ao presidente tucano, senador Aécio Neves (MG), para dar sua palavra final. E vai se colocar à disposição para participar da formulação do programa de governo e, também, viajar pelo país e pedir votos para o tucano na propaganda eleitoral na TV.

Correndo atrás do prejuízo
O ministro Aguinaldo Ribeiro (Cidades) foi quem mais participou de reuniões no Planalto nos dois primeiros meses deste ano. Ele, mais os ministros da Casa, tentam encontrar uma fórmula para pagar R$ 140 milhões em emendas de 2013, que não foram liberadas por ele. No final do ano passado, cada ministério recebeu um limite de liberações, mas, apesar disso, Cidades não fez esses empenhos. Os parlamentares da base governista, inclusive os do partido de Ribeiro, o PP, ficaram na mão. A equipe da ministra Ideli Salvatti está procurando uma brecha para honrar os compromissos firmados, mas ainda não encontrou um instrumento para atender à base.

“A condução política equivocada acabou maximizando uma reforma ministerial de um governo que vai acabar em cinco meses”
Renan Calheiros
Presidente do Senado (AL)

A escolinha do professor Vicentinho
O ex-presidente da CUT e novo líder do PT na Câmara, o Vicentinho, reuniu todos os ex-líderes do partido esta semana. Ele ouviu relatos das experiências dos antecessores e conselhos sobre como agir no período da campanha eleitoral.

O piloto sumiu
Chama a atenção, no governo e na sociedade, a omissão da Secretaria da Igualdade Racial no caso da prisão do ator Vinícius Romão de Souza. No site do órgão, somente há registro das violências cometidas contra o jogador de futebol Tinga, vítima de preconceito no Peru, e da manicure que foi alvo de discriminação de uma mulher australiana.

Olho vivo em São Paulo
A presidente Dilma pediu ao ministro Gilberto Carvalho (Secretaria-Geral) que fique no cargo, pelo menos, até o fim da Copa. Quer vê-lo dialogando com os movimentos sociais. Gilberto pode assumir a campanha de Alexandre Padilha.

A luta pelo poder
Candidato a substituir o ministro Gastão Vieira (Turismo), o secretário de Políticas de Turismo da pasta, Vinicius Lummertz, foi excluído de comitiva que viajou até Lençóis (MA), pelo programa Parques da Copa. Determinado, após arrumar uma carona para participar, ele foi informado que sua presença não era bem vinda.

Bate e volta
O senador Roberto Requião (PMDB-PR) foi condenado a indenizar o ministro Paulo Bernardo (Comunicações) em R$ 67 mil. Mas a guerra continua na área criminal. O ministro Dias Toffoli é o relator do processo no STF.

Flagrante
Antes da sessão no STF, o ministro Marco Aurélio Mello brincou com a colega Rosa Weber, conhecida pela serenidade e por não alterar o tom de voz. "Ministra, vou pedir à senhora. Não bata boca com o Joaquim Barbosa". Ela sorriu.

O presidente do PDT, Carlos Lupi, vai concorrer a um mandato em outubro. Ontem, ele pediu demissão da função que ocupava no Conselho do BNDES.

Fonte: O Globo

José Casado:Um argumento para Dilma

Ninguém soltou fogos. Salvo o tom habitualmente recalcado do presidente do Partido dos Trabalhadores, Rui Falcão, para quem "caiu a farsa da formação de quadrilha", no governo Dilma Rousseff e na cúpula petista houve opção preferencial pela alegria comedida.

Há razões para tanto, neste início de campanha presidencial. O motivo básico está naquilo que Joaquim Barbosa, relator do processso do mensalão, evitou dar nome, mas insinuou, com ressentimento:

"Sinto-me autorizado a alertar a nação brasileira de que esse é apenas o primeiro passo" - ele disse, acrescentando: "Porque essa maioria circunstancial [no plenário do STF] tem todo o tempo a seu favor para continuar na sua sanha reformadora".

No tapete jurídico, o nome do jogo agora passa a ser "ação de revisão criminal", instrumento pelo qual a defesa dos mensaleiros poderá recorrer para tentar alterar ou modificar a pena, reclassificar a infração penal e, no extremo, até pedir a absolvição dos réus ou anulação dos processos.

A decisão do STF, dando o dito pelo não dito, nas palavras do ministro Marco Aurélio Mello, abriu essa nova trilha jurídica.

Sua adoção, possibilita ao governo e ao PT uma leitura aplicada à disputa presidencial: se um adversário sacar a "espada" do mensalão, Dilma Rousseff poderá argumentar que o caso ainda está "sub judice", em análise no STF.

Pode parecer frágil, mas já é algo concreto para quem sentia falta de argumentos para entrar na disputa presidencial tendo sobre a cabeça a "lâmina" da condenação e prisão de parte da cúpula petista. E por corrupção.

No palácio e no PT os mais otimistas achavam, ontem, que passou a existir até a possibilidade de José Dirceu sair livre da Papuda a tempo de participar da cerimônia de posse de Dilma, caso ela vença a eleição - coisa que muitos petistas ainda duvidam.

José Casado é jornalista

Fonte: O Globo