Numa nota enviada por sua assessoria aos líderes partidários, o ministro da Casa Civil, Antonio Palocci, justificou sua atividade como consultor privado, no período em que era deputado, citando ex-ministros e ex-presidentes do Banco Central que fizeram o mesmo, alem de 273 parlamentares que têm atividades empresariais fora do Congresso. Palocci listou ex-ministros que deram consultorias, como ele, e ganharam "enorme valor" no mercado: "Muitos se tornaram em poucos anos banqueiros como ex-presidentes do Banco Central e do BNDES Pérsio Arida e André Lara Resende, diretores de instituições financeiras como o ex-ministro Pedro Malan ou consultores de prestígio como ex-ministro Maílson da Nóbrega." O ministro não revelou os nomes de seus clientes e disse que as informações sobre seu patrimônio e a atuação da Projeto foram enviadas à Receita Federal. O procurador-geral da República, Roberto Gurgel, disse que, até agora, os dados disponíveis sobre o caso são insuficientes para formar qualquer juízo e que quer informações mais detalhadas:
"Qualquer fato que envolva autoridades merece um olhar mais cuidadoso."
Palocci diz que agiu como todos
CONSULTORIAS
Ele cita ex-ministros e ex-presidentes do BC para justificar consultoria e evolução patrimonial
Maria Lima
Com sua situação política dominando os debates do Congresso, por causa da evolução de seu patrimônio, o ministro da Casa Civil, Antonio Palocci, enviou ontem aos líderes partidários, por e-mail, uma nota assinada pela assessoria com esclarecimentos sobre sua atividade como consultor em que são citados ex-ministros que fizeram o mesmo, além de 273 parlamentares que têm atividades empresariais fora da Casa. Mas não evitou que a sessão do Senado fosse tomada pelo assunto, com a oposição e até aliados cobrando explicações sobre as consultorias que fez quando era deputado e que lhe permitiram comprar, em nome da empresa Projeto, um apartamento de R$6,6 milhões e um escritório de R$882 mil em São Paulo, ano passado.
A nota cita que muitos ex-ministros, alguns do governo Fernando Henrique Cardoso, fizeram consultoria como ele, e que alguns se tornaram banqueiros e consultores de prestígio, citando os economistas Pérsio Arida, Pedro Malan, Mailson da Nóbrega e André Lara Rezende. Palocci evitou contato com a imprensa e, à noite, saiu pela porta de serviço do Alvorada após reunião com a presidente Dilma Rousseff.
No e-mail, a assessoria de Palocci informa que ele prestou serviços a empresas privadas e que os dados sobre evolução patrimonial e informações fiscais e contábeis da Projeto são regularmente enviados à Receita. A nota repete medidas tomadas por ele junto à Comissão de Ética Pública para prevenir conflito de interesses.
"A matéria não traz qualquer indício de irregularidade na conduta do ministro Palocci nem na atuação da empresa Projeto", diz a nota assinada pelo assessor Thomas Trauman, que lembra que não há vedação a que parlamentares exerçam atividade empresarial: "Levantamento recente mostrou que 273 deputados federais e senadores da atual legislatura são sócios de estabelecimentos comercial, industrial, de prestação de serviços ou de atividade rural".
"Experiência que dá enorme valor"
Ao citar exemplos de consultoria, a nota diz que, no mercado de capitais e outros setores, "a passagem por Ministério da Fazenda, BNDES ou Banco Central proporciona uma experiência única que dá enorme valor a estes profissionais". E acrescenta que muitos se tornaram em poucos anos "banqueiros como os ex. presidentes do Bacen e do BNDES Pérsio Arida e André Lara Rezende, diretores de instituições financeiras como o ex-ministro Pedro Malan ou consultores de prestígio como o ex-ministro Mailson da Nóbrega".
Cita ministros que fizeram o caminho inverso, do setor privado para o governo, "como o ex-ministro Alcides Tápias, ex-diretor de importante instituição financeira, os ex-presidentes do BC Armínio Fraga, antes gestor de um grande fundo de investimentos internacional, e Henrique Meirelles, com longa trajetória no mercado financeiro. Os mecanismos utilizados pelo ministro Palocci para impedir qualquer conflito de interesses foram os mesmos adotados pelos citados", diz a nota.
Mas a oposição fez um debate acalorado no plenário do Senado, cobrando que Palocci venha a público provar que não enriqueceu com tráfico de influência, divulgando o nome das empresas, o responsável pela busca dos clientes e a função do ministro na empresa Projeto. Os governistas, por outro lado, alegavam que os nomes das empresas não podem ser divulgado por causa da cláusula de confidencialidade.
- O que está todo mundo pensando é que o ministro Palocci enriqueceu ilicitamente, porque é muito difícil um enriquecimento tão rápido. Comer uma bolada dessas em seis anos? Tem que ter garganta de pirarara, um peixe que engole até homem. Com o perdão da palavra, mas o ministro vai ter que rebolar para explicar. Que venha à baila e não fique só soltando notinhas - disse Demóstenes Torres (DEM-GO).
A senadora Marta Suplicy (PT-SP) foi a primeira a falar para defender Palocci. Disse que aumento rápido de patrimônio não é raro e citou o que aconteceu com os ex-presidentes Lula e Fernando Henrique Cardoso, com suas palestras:
- Estão falando de uma pessoa que foi caluniado, injuriado, difamado e depois absolvido. Foi um dos três coordenadores da campanha da presidenta Dilma e é o ministro mais importante do governo. Olhem o exagero que estamos vivendo. Não estamos falando de uma pessoa qualquer!
Na tribuna, o líder do PT, Humberto Costa (PE), fez a leitura das explicações dadas por Palocci na nota e frisou a questão da cláusula de confidencialidade de sua empresa:
- Só com a anuência das partes poderia se revelar o nome dessas empresas. Se o ministro infringir essa cláusula, pode responder pela quebra da confidencialidade. Todos os dados estão na Receita, que tem o registro das declarações de renda.
- Existe cláusula de confidencialidade, sim, e a divulgação pode levar a constrangimentos para essas empresas. A base e o PT estão confiando e solidários com o ministro Palocci, que vai sair desse processo fortalecido - completou Lindbergh Farias (RJ).
Em sua primeira aparição pública desde que foi divulgado o crescimento do patrimônio de Palocci, a presidente Dilma Rousseff fez uma breve declaração de apoio a seu subordinado. Tentou dar ar de normalidade à vida palaciana ao se reunir com vários ministros, inclusive Palocci. Momentos antes de receber o primeiro-ministro da Suécia, Fredrik Reinfeldt, foi abordada por repórteres sobre sua saúde - Dilma recupera-se de uma pneumonia:
- Uma pneumonia tem que se cuidar. Já não tenho a doença. Estou na reta final.
Os jornalistas quiseram saber sobre "a saúde" de Palocci.
- A saúde do ministro Palocci vai bem. Ele está inteiro ali, vocês não estão vendo? Todos estamos saudáveis. Todos estamos bem neste país.
Os repórteres insistiram, perguntando se a "saúde política" do ministro estava em dia. Dilma não respondeu. Palocci não deu entrevista.
Colaborou: Chico de Gois
FONTE: O GLOBO