sábado, 8 de outubro de 2022

Oscar Vilhena Vieira* - Por um governo moderado

Folha de S. Paulo

A omissão ou a cegueira deliberada custarão muito às futuras gerações

Caberá aos eleitores que optaram por uma terceira via nestas eleições decidir se o Brasil terá uma nova chance de se reconciliar com a democracia liberal nos próximos anos ou se singrará rapidamente para um regime autocrático. Essas são as opções colocadas frente àqueles que escolheram Simone Tebet ou Ciro Gomes no primeiro turno destas eleições. A omissão ou a cegueira deliberada custarão muito às futuras gerações.

O apoio de adversários históricos, como Fernando Henrique Cardoso, economistas liberais como Arminio Fraga, Pérsio Arida ou Pedro Malan, assim como de juristas não alinhados ao PT, como Miguel Reale Jr., José Carlos Dias e José Gregori, à candidatura do ex-presidente Lula, não me surpreendeu. Afinal, são pessoas historicamente comprometidas com a democracia e com o Brasil, e que têm plena consciência de que o que está em jogo não é apenas a continuidade de um governo desastroso, mas sim a própria sobrevivência do Estado democrático de Direito.

Ascânio Seleme - O antipetista e o falso antipetista

O Globo

Existe um tipo, surgido com a ascensão de Bolsonaro e do bolsonarismo radical, que usa certos argumentos apenas para esconder a essência extremista

Há diversos tipos de motivação para os mais de cerca de 40% dos brasileiros que não votam em Lula em hipótese alguma. Muitos divergem da orientação política do PT, de sua posição ideológica, seu portfólio econômico, seu alinhamento internacional, sua ação preferencial em favor dos mais pobres. Estes são os adversários conceituais do Partido dos Trabalhadores. Dentre eles, há opositores de centro e de direita que acreditam em soluções distintas para os problemas nacionais e pode-se dizer seguramente que estes são intelectualmente honestos.

Como o PT tem sido protagonista de todas as eleições presidenciais desde a redemocratização, seus adversários passaram a ser chamados de antipetistas, não importa qual nem o grau do seu antagonismo com o PT. Os adversários legítimos em quase todos os casos respeitam o partido de Lula. Mas há também os que simplesmente não simpatizam com a agremiação, consideram seus quadros arrogantes e acham que até outro dia eles se comportavam como donos exclusivos da virtude. São majoritariamente aqueles que se magoaram depois de seguidas derrotas.

No largo espectro do antipetismo tem ainda os que dizem ver no partido um antro de ladrões e corruptos que dilapidou o país. Não enxergam, quase sempre de propósito, todos os outros aspectos políticos e programáticos do PT e fazem pouco caso do legado positivo dos 14 anos no comando do país. Estes se dizem intolerantes com a roubalheira, mas apoiam tranquilamente Bolsonaro, com histórico familiar nebuloso no quesito e que cercou-se de pessoas que, todos sabem, representam perigo permanente para os cofres públicos. Existem também os que chamam Lula de comunista, dizem que ele apoia ditaduras esquerdistas, mas ignoram o candidato a autocrata do outro lado.

Carlos Alberto Sardenberg - Tanto pró e tanto contra

O Globo

Movimento da direita é muito maior que o presidente extremista. E ex-presidente é maior que o petismo

Em termos técnicos, pode-se dizer que todos os institutos de pesquisa estão certos, cada um a sua maneira. Quer dizer, conforme os métodos e critérios que utilizam. Mas, se todos estão corretos ao mesmo tempo e mostram resultados diferentes, pode-se dizer também que todos estão errados.

Não é por aí que se vai entender o que se passa no país. E o que se passa? Há um momento ou, se quiserem, uma onda de direita, conservadora, pró-capitalista, muito maior que o bolsonarismo raiz, este sendo a extrema direita.

No caso da eleição presidencial, os maiores institutos e a maior parte dos analistas enxergaram uma onda de voto útil pró-Lula, um forte sentimento para acabar com a coisa no primeiro turno.

Houve esse voto útil, mas não na escala antecipada. O movimento não saiu das elites partidárias e intelectuais.

Pablo Ortellado – É preciso escutar e responder

O Globo

A mensagem não é muito simpática, mas precisamos ouvi-la

O povo se expressou com clareza no 2 de outubro, quando deu votação significativa a Bolsonaro e aos candidatos bolsonaristas. A mensagem não é muito simpática, mas precisamos ouvi-la. Os críticos do bolsonarismo estão hoje tomados por tanta raiva e frustração que não conseguem compreender que se trata de uma resposta a demandas reais da população e que a única maneira de desmontá-la é entender a queixa e apresentar uma resposta alternativa. Em vez disso, o que têm feito é desqualificar o bolsonarismo e, com ele, os amplos setores da população que o apoiam.

Essas formas de desqualificação em geral concebem o bolsonarismo como fruto de algum ardil ou superpoder oculto que, portanto, seria artificial, não tem enraizamento, organicidade ou legitimidade.

Eduardo Affonso - Uma caixinha sem surpresas

O Globo

Afastado o risco de derrubada do alambrado, invasão de campo e sumiço da bola, especula-se que o placar deva ser apertado

Os dois finalistas já estão prontos para entrar em campo, com reforços de peso e dispostos a brigar pelo título de 2023/2026. A janela de transferências ainda não fechou, mas ambas as equipes se movimentaram, com uma série impressionante de contratações.

Luiz Inácio, do Nunca Antes na História Deste País Futebol Clube, conseguiu trazer para o seu elenco as craques Marina Silva e Simone Tebet — esta, grande promessa para a temporada 2027/2030. Outra transação de vulto envolveu o veterano Ciro Gomes — ele já adiantou que ficará no banco de reservas, onde pretende passar o tempo regulamentar de costas para o gramado.

Carlos Góes- Limitando o poder presidencial

O Globo

Fatores externos condicionam o governo. Em tempos de bonança internacional, o governante tem mais espaço para seguir de forma independente

Recentemente, eu ouvi de alguém que eu respeito muito a tese de que, apesar de Lula e Bolsonaro serem ambos ruins, seria mais fácil limitar o poder deste do que daquele. Mas isso é verdade?

Em princípio, a ideia é razoável. De fato, instituições como a mídia, a sociedade civil, os entes federados e o Supremo Tribunal Federal colocaram limites ao radicalismo de Bolsonaro. Ainda que de forma imperfeita, as instituições impediram um golpe, que é o que muitos apostavam que viria no governo do Capitão.

Os analistas mais atentos, contudo, sabiam que a probabilidade de golpe era baixa. O best-seller “Como as Democracias Morrem”, dos cientistas políticos Steven Levitsky e Daniel Ziblatt, explica que o risco para as democracias modernas é uma deterioração gradual das instituições.

O caso clássico é o chavismo. Como já relatado nesta coluna (“Bolsochavismo”, 30/07/2022), uma das características do chavismo foi cumprir requisitos formais da legislação para violar o espírito da lei.

Bruno Boghossian - Duelo de rejeições afunila na largada do 2º turno

Folha de S. Paulo

Disputa tem faixa considerável de eleitores disposta a olhar vitrines antes de decidir

Numa disputa consolidada como um duelo de rejeições, a nova pesquisa Datafolha deve reforçar os apelos de Lula (PT) e Bolsonaro (PL) a quem ainda pode escolher um lado para evitar a vitória do outro.

A concorrência entre os candidatos recomeça relativamente apertada nesse quesito. Segundo o Datafolha, 42% dos eleitores afirmam rejeitar apenas Lula, enquanto 48% dizem que só não votam em Bolsonaro. Outros 3% declaram que não votam em nenhum dos dois, e 6% não rejeitam nenhum.

As cifras sugerem que as campanhas têm um caminho para brigar por 9% dos votos –somados os 6% que estão abertos a ambos e os 3% que recusam os dois, mas podem ser convencidos a optar por um lado.

Nas intenções de voto, boa parte da vantagem de Lula se explica pela votação construída no primeiro turno. O ex-presidente mantém a preferência dos eleitores de baixa renda (54% a 37%) e do Nordeste (66% a 28%) –região em que saiu das urnas com uma frente de quase 13 milhões de votos sobre Bolsonaro.

O novo embate direto com o petista, no entanto, oferece ao atual presidente um clima menos árido do que aquele dos últimos meses. A avaliação do desempenho do governo se tornou um peso menor para a campanha de Bolsonaro, com sua taxa de reprovação caindo de 44% para 40% desde a semana passada.

Hélio Schwartsman – Barbarizando a eleição

Folha de S. Paulo

Em escala global, 80% dos governantes que pleiteiam a recondução têm sucesso

O pleito presidencial deste ano ainda não foi concluído, mas já tem um grande derrotado, o equilíbrio da corrida eleitoral. Em teoria, um presidente não deveria em hipótese nenhuma se servir do cargo que ocupa para obter vantagem na disputa por votos. A teoria não funciona.

O problema é em alguma medida insolúvel, pois a própria democracia já vem com um forte viés situacionista. Em escala global, 80% dos governantes que pleiteiam a recondução têm sucesso. O destaque na mídia, o controle da máquina pública e até a psicologia conspiram a seu favor.

Cristina Serra - Lula, Bolsonaro e o populismo

Folha de S. Paulo

Obra de Thomás Zicman de Barros e Miguel Lago contextualiza categoria política

Está na praça um livro precioso para a discussão de uma categoria política que tem se prestado a muita confusão e distorção: o populismo. A obra é "Do que falamos quando falamos de populismo" (Companhia das Letras), dos cientistas políticos Thomás Zicman de Barros e Miguel Lago.

O livro analisa os contextos em que o termo surgiu no mundo e no Brasil e as mudanças de sentido adquiridas ao sabor de circunstâncias e conveniências (da política, da academia e do jornalismo). Mais importante ainda é o enquadramento contemporâneo do tema, em meio à disputa eleitoral Lula x Bolsonaro. É provocação intelectual das boas.

Alvaro Costa e Silva - No segundo turno, a ordem é bateu, levou

Folha de S. Paulo

Atacar o adversário com a mesma vontade com a qual é atacado

Durante o primeiro turno, a campanha de Bolsonaro se comportou como se estivesse no segundo. Com a desculpa de que precisava aumentar a rejeição a Lula e diminuir a própria, não fez propostas para melhorar o governo (ao contrário, nas poucas vezes em que olhou para o futuro prometeu destruir o país mais ainda). As forças concentraram-se na eliminação do único e temível adversário. É a natureza bolsonarista, que não consegue agir de outra maneira.

Na briga entre os filhos Flávio (que propunha exaltar o que de positivo havia sido feito na Presidência, uma tarefa impossível) e Carlos (o aloprado que comanda o gabinete do ódio e das mentiras), ganhou o segundo. Só para ficar num pequeno exemplo de como funciona a rede de fake news: um dia depois da votação, o TSE determinou a exclusão de 32 publicações que acusavam Lula de "perseguir cristãos" e incentivar a "invasão das igrejas".

Demétrio Magnoli - Canções do exílio

Folha de S. Paulo

Cada um a seu modo, analistas declaram-se estrangeiros na sua própria terra

"Como libertar as pessoas do cabresto religioso? Do cabresto miliciano? Do cabresto midiático?", indagou a filósofa petista Marcia Tiburi. A pergunta certa é outra: de onde ela tirou a ideia de que os eleitores do candidato adversário são menos livres que ela? Ou: como libertar as Marcias Tiburis da torre da autoproclamada superioridade moral?

Missão impossível, talvez. Segundo o colunista da Folha Alvaro Costa e Silva, "quase metade dos eleitores decidiu que a destruição do país deve prosseguir". Seriam, todos eles, "fascistas", "racistas", "misóginos", "genocidas"? Quando foi que o jornalismo político desistiu de investigar o comportamento dos eleitores, entregando-se ao esporte primitivo de insultar os que votam "errado"?

"Estou num país muçulmano; já não falo português, já não entendo o que dizem", confessa Marcelo Coelho, para quem "os eleitores de Bozo são impermeáveis às notícias sobre a corrupção de seus mitos". O problema do Brasil não é a saúva, mas o povinho que o habita, certo?

Bolívar Lamounier* - As urnas fizeram sua parte, só precisamos agora de milagres

O Estado de S. Paulo

Infelizmente, o que ficou demonstrado recentemente foi só a resiliência de nossa democracia, não sua funcionalidade.

É preciso ser muito obtuso para crer que o Brasil pode ser governado fora do regime democrático e que a economia pode crescer sem reformas enérgicas e grandes investimentos no setor privado.

A resiliência da democracia foi claramente demonstrada em dois episódios recentes: o manifesto lido no dia 11 de agosto na Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, em São Paulo, e a própria eleição de domingo passado, disputada num clima de alegria e descontração. Aqueles que até 15 ou 20 dias atrás faziam ameaças não tão veladas de golpe podem, agora, meter a viola no saco.

Infelizmente, o que ficou demonstrado foi só a resiliência de nossa democracia, não sua funcionalidade. Ficou demonstrado que, entre nós, os postos eletivos hão de ser preenchidos mediante eleições limpas e livres, segundo uma periodicidade prefixada. E que o processo eleitoral é a única via legítima para o acesso a tais cargos: the only game in town, como dizia Juan Linz, um dos maiores estudiosos dos regimes democráticos.

João Gabriel de Lima* - A guerra aos piratas da floresta

O Estado de S. Paulo

Podemos ser párias ou protagonistas. Tudo depende de como lidarmos com a Amazônia

Eis um bom roteiro para um filme. Uma frota de navios piratas ataca a região do pré-sal. São bucaneiros com bandeirinha de caveira, espada na cinta e perna de pau – mas numa versão século 21, com celulares, laptops e domínio da tecnologia de águas profundas. Logo assumem o controle da região e começam a extrair petróleo.

Dois dos temas mais importantes do Brasil atual não têm sido suficientemente discutidos no debate eleitoral. O primeiro é a crise econômica que afeta o dia a dia dos brasileiros. O segundo tem a ver com o papel de nosso país no mundo.

Seremos totalmente irrelevantes se não formos protagonistas na economia do futuro, cada vez mais sustentável – e, para isso, temos de ser campeões em preservação ambiental.

Adriana Fernandes - Cobranças e canetadas

O Estado de S. Paulo.

Ministros não podem simplesmente se transformar em garotos-propaganda do candidato

A caneta de presidente do candidato Jair Bolsonaro continua acelerada, e o governo deu provas de que não vai parar por aqui.

É preciso não normalizar o poder da canetada presidencial porque todo esse ativismo de medidas eleitoreiras representa uma afronta à legislação eleitoral e ao equilíbrio da disputa das urnas.

O impacto da PEC Kamikaze, que liberou R$ 41,5 bilhões e tratorou a legislação, foi de tamanha monta que colocou tudo o mais em escala menor. Relativizam-se as outras ações.

Em uma semana, o governo anuncia renegociação de dívidas, mais dinheiro para o Auxílio Brasil, benefício extra para taxistas e consignado para os beneficiários do Auxílio Brasil (adiado estrategicamente para o segundo turno), esconde-se bloqueio de gastos e se segura reajuste dos combustíveis. A Caixa, banco 100% estatal, entrou de cabeça na campanha.

O que a mídia pensa - Editoriais / Opiniões

Editoriais / Opiniões

Cortes em educação são inaceitáveis

O Globo

Após repercussão negativa, ministro recua em bloqueio que poderia levar ao fechamento de universidades

No afã de se reeleger, o presidente Jair Bolsonaro abriu a torneira dos gastos. Ampliou valor e alcance do Auxílio Brasil, criou programas eleitoreiros como bolsa-caminhoneiro e bolsa-taxista, antecipou o pagamento de benefícios e assim por diante. Era inevitável que, para equilibrar as contas, precisasse promover cortes no Orçamento. A questão é a natureza dos cortes. Mais uma vez, na hora de conter despesas, o governo avança sem constrangimento sobre setores essenciais, como educação, comprovando a falta de comprometimento com a melhoria do ensino — prioridade máxima para o desenvolvimento.

Diante da grita generalizada das universidades públicas e dos danos previsíveis à campanha do presidente Jair Bolsonaro à reeleição, o ministro da Educação, Victor Godoy, publicou ontem um vídeo informando o desbloqueio dos recursos de universidades, institutos federais e da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes). Ele não deu detalhes sobre valores. A decisão é correta, mas só foi tomada depois da repercussão negativa, para corrigir um equívoco inaceitável. Na quinta-feira, o próprio ministro havia minimizado o contingenciamento, alegando se tratar apenas de “limitação na movimentação financeira” do MEC. Afirmou ainda que as universidades usavam o tema politicamente.