Alimentos, etanol e empregado doméstico puxam reajuste de preços em março.
Em 12 meses, taxa oficial fica em 6,59%, e mercado aposta em alta da Selic na semana que vem.
Em março, o custo de vida subiu 0,47%, puxado pela alta de alimentos. Ficaram mais caros cebola, tomate, açaí, cenoura, feijão-carioca e batata-inglesa. Devido ao aumento do salário mínimo, o item empregado doméstico passou de 1,12% para 1,53%, na maior contribuição para o índice. Em 12 meses, o tomate subiu 122%. O custo de vida furou o teto da meta (6,5%) pela primeira vez desde novembro de 2011. Para os mais pobres, que ganham até cinco salários mínimos, a taxa foi ainda maior: 7,22%. O mercado aposta em alta de juros já na semana que vem.
Acima da meta
Inflação pelo IPCA sobe 0,47% em março, abaixo das previsões. Mas, em 12 meses, supera 6,5%
Clarice Spitz, Eliane Oliveira e Martha Beck
A inflação deu uma leve trégua em março. O IBGE informou ontem que o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA, usado nas metas de inflação do governo) ficou em 0,47%, abaixo do 0,60% registrado em fevereiro e inferior às projeções dos analistas do mercado, que previam uma alta de 0,50%. Mesmo assim, pela primeira vez desde novembro de 2011, o IPCA acumulado em 12 meses estourou o teto da meta de inflação perseguido pelo governo. O índice subiu 6,59% nesta conta - a meta de inflação do governo para este ano é de 4,5%, com margem de tolerância de dois pontos para baixo e para cima, ou seja, no limite, até 6,5%.
No mês passado, os alimentos subiram 1,14% e tiveram o maior impacto na inflação, respondendo por mais de metade do índice (0,28 ponto percentual). Em 12 meses, acumulam alta de 13,48%. O grupo serviços, cujos preços têm subido devido ao mercado de trabalho aquecido, também tem pressionado a inflação e já registra alta de 8,37% nos últimos 12 meses. Em março, a alta dos serviços foi de 0,26%. O custo do empregado doméstico, que em fevereiro subiu 1,12%, teve aceleração, para1,53% no mês passado. Foi o maior impacto individual do mês, correspondendo a 0,06 ponto percentual do IPCA. Também ajudou a puxar a inflação a alta do etanol, de 3,55%.
BC pode adiar alta da selic
Enquanto alguns economistas viram no ligeiro recuo da inflação em março um alento que pode fazer o Banco Central (BC) adiar para maio uma elevação na taxa básica de juros Selic, outros apontam que o IPCA apresenta ainda um grande número de itens com elevação de preços. Em março, 69% dos produtos pesquisados pelo IBGE subiram. Em fevereiro, este índice de difusão havia sido de 72,3%. Para o estrategista chefe do Banco WestLB, Luciano Rostagno, a inflação permanece em patamar ainda elevado.
- Já são três anos de inflação muito acima dos centro da meta, apesar das desonerações que temos visto. O brasileiro está voltando a internalizar um cenário de inflação mais elevada e isso leva a reajustes automáticos de preços e aumenta o esforço necessário para o Banco Central levar a inflação para o centro da meta. O BC tem de agir logo.
O ministro da Fazenda, Guido Mantega, disse ontem que o governo não poupará esforços para combater a inflação. O recado foi dado pouco depois da divulgação do IPCA.
- Não pouparemos medidas para conter a inflação e impedir que ela se propague. Estamos atentos à inflação. Ela é prejudicial à economia brasileira. É prejudicial aos trabalhadores que pagam o produto mais caro, e aos empresários, que têm dificuldades em calcular custos e realizar os seus projetos - disse o ministro, após participar de reunião do Conselho Nacional de Desenvolvimento Industrial (CNDI).
Perguntado se sua declaração estaria relacionada a uma elevação da taxa básica de juro pelo BC, desconversou:
- Não falo sobre juros. Os juros são da responsabilidade do Banco Central e, portanto, principalmente em véspera de Copom, o ministro da Fazenda não fala sobre isso.
Na mesma linha, o BC informou em nota que está observando o comportamento da inflação para decidir de que forma a política monetária será conduzida. Entre os elementos analisados estão não apenas o IPCA fechado, mas os núcleos de inflação e seu nível de disseminação pelos preços. A autoridade monetária não comentou o estouro do teto da meta de inflação provavelmente pela proximidade da reunião do Copom, que ocorrerá nos dias 16 e 17 de abril.
A perspectiva dos analistas é que o IPCA acumulado em 12 meses perca fôlego em abril e maio. Mas, em junho, o índice deve voltar a furar o teto da meta.
Empregado doméstico teve maior peso
No mercado financeiro, depois de as taxas futuras de juros terem recuado pela manhã, com o resultado do IPCA de março abaixo do esperado, esses contratos fecharam em alta. O contrato de Depósito Interfinanceiro (DI) com vencimento em julho subiu para 7,28% ao ano, contra 7,25% registrados na terça-feira. O DI para janeiro de 2014 subiu de 7,86% para 7,89%, enquanto o de janeiro de 2015 foi de 8,46% para 8,47%. Pesou a avaliação de que a inflação continua disseminada. A taxa desses contratos indicam que o mercado está apostando numa alta de 0,25 ponto percentual da Selic na reunião do Copom.
As principais altas dos alimentos em março ficaram com a cebola, que avançou 21,43% frente a fevereiro e que já sobe 76,46% em 12 meses. O feijão carioca avançou 9,08% em relação a março, a batata inglesa e o tomate registram alta de 6,14% frente ao mês anterior. Em 12 meses, o tomate registra alta de 122,13%, a segunda maior variação entre os alimentos e só perde para a farinha de mandioca, que subiu 151,39% na mesma base de comparação.
Segundo Eulina Nunes dos Santos, coordenadora de Índice de Preços do IBGE, ainda não é possível sentir de maneira clara o efeito da desoneração da cesta básica.
- Algum efeito houve, mas é difícil de captar de maneira clara.
Sobre a alta no custo do empregado doméstico, Eulina, do IBGE, afirma que este aumento não tem relação com os novos direitos conquistados pelas domésticas, mas é consequência do aumento do salário mínimo e da redução da oferta de mão de obra nessa categoria. Em 12 meses, os empregados domésticos acumulam a principal alta entre os itens não alimentícios da inflação: 12%.
Entre as pressões esperadas para abril estão os preços administrados, como o reajuste do metrô no Rio, a elevação de ônibus urbanos em Curitiba e o aumento da taxa de água e esgoto em Recife e Curitiba. Os remédios, que tiveram reajuste em abril, também devem impactar o índice. Mas, segundo técnicos da equipe econômica, o cenário futuro é positivo. Isso porque, apesar de o IPCA estar acima de 6,5% no resultado fechado em 12 meses, o índice mensal está caindo. Além disso, os alimentos, considerados o atual vilão da inflação, devem ter uma queda de preços a partir dos próximos meses com a entrada de uma safra recorde no mercado.
Mesmo assim, o governo avalia que não dá para brincar com inflação e, por isso, medidas de combate à alta de preços sempre estão no radar. Além dos juros, fazem parte do arsenal reduções de impostos. Outra ajuda poderia vir da política fiscal por meio de um corte maior no Orçamento para segurar os gastos públicos.
Especialistas ouvidos pelo GLOBO não creem que o Copom elevará os juros na semana que vem. O resultado do IPCA de março mostrou que o índice está desacelerando e tem menor dispersão. Segundo o economista-chefe do ABC Brasil, Luís Otávio Leal, as projeções indicam que o IPCA de abril ficará em torno de 0,4%, trazendo o índice para a meta fixada para o ano:
- O número de abril foi importante pelo lado da dispersão. A inflação está menos disseminada.
Fonte: O Globo