Por Raphael Di Cunto, Thiago Resende, Vandson Lima, Fabio Murakawa, Daniel Rittner, Murillo Camarotto, Fábio Pupo, Edna Simão e Rafael Bitencourt - Valor Econômico
BRASÍLIA - A Câmara dos Deputados autorizou ontem à noite, por 367 votos a favor, 137 contra e 7 abstenções, a abertura de processo de impeachment contra a presidente da República, Dilma Rousseff. A denúncia aceita pelos deputados, que será encaminhada ao Senado, sustenta que Dilma cometeu crime de responsabilidade pela edição de decretos orçamentários não autorizados pelo Congresso e pelas "pedaladas fiscais", reveladas pelo Valor em janeiro de 2014. Se os senadores entenderem que a denúncia é pertinente e deve, portanto, ser julgada, o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Ricardo Lewandowski, presidirá a fase final do processo no Senado.
O desânimo de petistas e aliados do governo ficou evidente ao longo do dia de ontem. A articulação promovida pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Dilma e governadores aliados surtiu pouco efeito e foi anulada pelo vice-presidente Michel Temer (PMDB), pelo grupo do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e por empresários descontentes com a falta de perspectivas do atual governo.
Se aceita a abertura do processo pelo Senado, Michel Temer, segundo interlocutores próximos, deve iniciar seu governo enviando proposta ao Congresso para a desvinculação parcial das receitas do Orçamento a despesas pré-definidas. Cerca de 92% do Orçamento são consumidos por gastos obrigatórios, comprometidos com vinculações constitucionais. A partir do reconhecimento de que o centro da crise econômica decorre do desequilíbrio fiscal, vai
Câmara abre processo de impeachment contra Dilma
Pela segunda vez na história do Brasil a Câmara dos Deputados autorizou a abertura de processo de impeachment contra um presidente da República. Por 367 votos a 137, com 7 abstenções e duas ausências, foi aceita a denúncia de que a presidente Dilma Rousseff cometeu crime de responsabilidade pelas "pedaladas fiscais" e edição de decretos orçamentários que não teriam autorização do Congresso. O processo vai ao Senado 23 anos e seis meses após o impeachment contra o ex-presidente Fernando Collor.
Ao longo do dia, o desânimo de petistas e aliados do governo era evidente. Cabisbaixos, contavam que, se ganhassem, seria por "três ou quatro votos". Eram necessários apenas 172, insuficientes até para aprovar projetos de lei. O clima no plenário já mostrava, porém, a dificuldade. Apenas oposicionistas cercavam o microfone onde os parlamentares eram chamados para anunciar seus votos.
A articulação promovida pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Dilma e governadores aliados surtiu pouco efeito e foi praticamente anulada pelo vice-presidente Michel Temer (PMDB), pelo grupo do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ) e por empresários descontentes com a falta de perspectivas do atual governo.
Um dos votos conquistados no dia anterior pelo governador do Maranhão, Flávio Dino (PCdoB), reverteu-se no plenário. "Não posso passar por cima das perseguições contra mim, do bloqueio do governo federal ao meu governo. Assim governador que admiro e respeito, desculpe, mas meu voto é sim", afirmou o deputado José Reinaldo (PSB). No Maranhão, um dos poucos Estados onde o PT é bem avaliado e Dilma é aliada dos dois grupos que disputam o poder, o impeachment venceu por 10 a 8.
A investida dos governadores do Nordeste nos dois dias anteriores à votação não teve efeito prático. Na sexta-feira, a planilha do ex-ministro Eliseu Padilha (PMDB) contabilizava 366 votos pela destituição, projeção que aumentou para pelo menos 370 ontem. O pemedebista errou por poucos votos. No Sul, Goiás, Mato Grosso, Distrito Federal, Roraima, Rondônia, Amazonas, Espírito Santo e São Paulo, a rejeição ao PT alcançou mais de 80% dos deputados.
"A gente não contava com a taxa de canalhice", afirmou o vice-líder do governo na Câmara, Silvio Costa (PTdoB-PE), um dos mais estridentes na defesa de Dilma. Segundo Costa, o governo dependia de exatos 172 votos para tentar vencer o impeachment, mas logo no começo parlamentares que entravam nesta conta apoiaram o impeachment. Quando o placar ainda registrava 296 a 102, o líder do governo, José Guimarães (PT-CE), já concedia entrevista para declarar "que os golpistas venceram".
O PDT foi um dos partidos em que mesmo as constantes ameaças de expulsão e destituição do diretório não convenceram os parlamentares que defendiam o impeachment a votarem pela permanência do PT, de quem são aliados desde 2007. Seis dos 19 pedetistas não tinham seguido a orientação.
O governo só teve os votos completos de PT, PSOL e PCdoB. No PMDB, apenas oito apoiaram o PT, com o qual estão formalmente aliados há seis anos. Um dos pemedebistas que fazia juras de amor ao governo semanas antes, o deputado Washington Reis (RJ) deixou o hospital onde está internado com H1N1 para declarar apoio impeachment de Dilma - ele foi o primeiro a votar.
Mauro Lopes (MG), nomeado ministro da Aviação Civil já depois de o PMDB alardear que romperia, votou a favor da destituição. "Guardarei a gratidão comigo. Mas, honrando nosso PMDB, eu voto sim", disse. Ao lado de Dilma ficaram os outros ministros. "Isso aqui não é processo de eleição indireta", afirmou Castro, que deixou o Ministério da Saúde para votar.
Como esperado, partidos do "centrão" embarcaram em peso no impeachment. O PP, que negociou a indicação do ministro da Saúde após o impeachment e centenas de cargos federais com o PT, debandou após conversas com o PMDB. Até a noite anterior à votação, o governo esperava que de 8 a 12 dos 45 pepistas apoiassem Dilma. Com o placar já sinalizando a derrota da petista, restaram apenas 7 no PP.
No PR, alvo das últimas esperanças do Palácio do Planalto, 25 dos 40 votaram contra o PT, a quem estão aliados desde 2002, na primeira eleição de Lula. A orientação do partido, por ordem de seu mandatário Valdemar da Costa Neto, era apoiar o governo até o fim. Mas até aliados próximos do ex-deputado condenado no mensalão apoiaram o afastamento de Dilma.
Um dos principais beneficiados da aliança com o PT o ex-ministro dos Transportes, Alfredo Nascimento (AM), demitido por Dilma em 2011 na "faxina ética", renunciou à presidência do partido para votar contra a orientação de Valdemar. "Meu voto não pertence ao meu partido, não pertence ao governo ou a oposição e sequer pertence a mim. Meu voto pertence ao povo do Amazonas. Meu voto é sim", disse.
O PSD do ministro das Cidades Gilberto Kassab, que hoje deverá deixar o cargo, também não foi diferente. Apenas parlamentares ligados a governadores aliados, como da Bahia e Ceará, permaneceram apoiando o governo.
Dois vice-líderes do governo na Câmara também traíram: Hugo Leal (PSB-RJ) e Ricardo Barros (PR), que seguiu a orientação do PP.
Mesmo com posições diferentes sobre o impeachment, deputados do PT, PSOL, PSB, PDT e Rede foram ao microfone criticar o presidente da Câmara. De frente para o pemedebista, acusavam Cunha de não ter legitimidade para conduzir o processo. "Deputado, o que dá sustentação à sua cadeira cheira a enxofre. Voto com aqueles que nunca escolheram o lado fácil da história", afirmou Glauber Braga (RJ).
Cunha, que comandou pessoalmente grande parte das 51 horas de debates e votação, entregará pessoalmente no Senado hoje o parecer. Ao terminar a votação disse que continuará na presidência da Câmara e irá participar do próximo governo. Afirmou ainda: " não estou feliz, presidente perdeu condições de governar e chegou ao fundo do poço". Em mais uma estratégia para enfraquecer o governo, ele decidiu que a segunda chamada para os parlamentares votarem ocorreria ao fim de cada Estado, e não ao final de toda a lista, como ocorreu em 1992. Com a mudança, calculava, quem aguardava o resultado estar consolidado para decidir o voto tenderia ao impeachment. Apenas dois se ausentaram, ambos por razões médicas.
encaminhar proposta de reforma com iniciativas como a desindexação dos programas sociais que são atrelados à variação do salário mínimo e a reforma da Previdência Social.
A contrapartida à aprovação dessas mudanças seria a adoção do orçamento impositivo, que garante liberação automática de emendas parlamentares e não no balcão de negociações do Planalto.
Para o Ministério do Trabalho e Previdência, o nome mais cotado é o do ex- deputado Roberto Brant, que terá por missão aprovar a flexibilização do mercado de trabalho. O ex-presidente do STF, Nelson Jobim, que teve participação decisiva nas articulações pelo impeachment, vai para o Ministério da Defesa, posição que ocupou no primeiro mandato da presidente Dilma. Advogado por trás da estratégia de defesa das empreiteiras apanhadas na Operação Lava-Jato, não poderia assumir, como se cogitou, a Justiça ou a Casa Civil.