Em artigo publicado há poucos dias na
revista Política Democrática, n.41 transmiti, de modo sucinto, três
impressões. Primeiro a de que pesquisas recentes indicam que se forma uma nova
conjuntura pré-eleitoral, na qual reacendem-se, para Jair Bolsonaro, algumas
esperanças, ainda que oscilantes, de reeleição; segundo a de que as oposições
(tanto a de esquerda quanto aquela que tenta se colocar como “terceira via”)
ainda não reagiram a esses sinais, seja por uma aproximação entre ambas para formar
uma unidade já no primeiro turno, ou por uma efetiva e resoluta política de
“conquista do centro” por parte de Lula, duas variantes do que poderia ser uma
estratégia voltada a sepultar, no primeiro turno, as chances de reeleição do
presidente. Menos ainda se vê esboço de
sucesso de um sempre ensaiado processo, no chamado centro e na centro-direita, de
entendimentos agregadores com vistas a uma candidatura convergente própria -
cada dia mais improvável – capaz de tirar Bolsonaro do até aqui confortável
segundo lugar, ou pelo menos, de impedir que chegue ao segundo turno em posição
competitiva.
A terceira impressão é a de que a lenta e ainda incerta recuperação de Bolsonaro - combinada à conservação desse “ponto morto” oposicionista na disputa presidencial - aponta a uma consequência que suponho ser a mais temível para forças políticas e sociais comprometidas em salvaguardar o processo eleitoral e a própria democracia. Refiro-me, é óbvio, ao “segundo turno sangrento” entre direita e esquerda, embate de extrema tensão (por falta de um centro moderador influente, mesmo como força coadjuvante) e de resultado imponderável, entre Lula e Bolsonaro, com o país cindido de cima a baixo, isto é, da elite política ao eleitorado. Nessas condições específicas, a vitória de Lula poderia evitar o desfecho, digamos, mais trágico. Mas o imponderável se transferiria ao exercício do governo, tanto na hipótese de Lula tentar cumprir o que tem dito até aqui na pré-campanha, quanto na dele manter esse dito na campanha e tentar fazer o não-dito no governo. A aventura populista e o estelionato eleitoral seriam atitudes igualmente temerárias e conversíveis em fatores tendentes, na melhor das hipóteses (a da célebre habilidade do presidente evitar a pura e simples ingovernabilidade), a prolongar, por mais quatro anos, a crise de múltiplos níveis em que o país foi metido desde 2013/2014.