segunda-feira, 10 de julho de 2023

Fernando Gabeira - Comida para pensar

O Globo

Intensidade de conversas sobre alimentação me leva à conclusão de que isso acabará desaguando na política

Nas vezes em que fui a Londres, costumava comer num restaurante chamado Food for Thought. Infelizmente, fechou. Não sei se pela pandemia ou pelos preços de aluguel em Covent Garden.

Na época, creio que o tema dominante nas conversas sobre comida tratava de alimentos naturais, orgânicos, enfim, tudo isso que estava associado ao movimento ecológico. Tanta coisa mudou, e lembrei-me do nome do restaurante ao constatar a presença maciça de postagens sobre alimentos nas redes sociais. Não me refiro a receitas, mas sim ao debate acalorado sobre o que comer e o que evitar.

O interessante nesse mar de conselhos é ver como cada item é discutido, decomposto em suas múltiplas propriedades. Brócolis têm zinco; o tomate, licopeno; a abóbora, magnésio. Com o crescimento de casos de diabetes, algumas mensagens são proibitivas: corte o pão, o leite, o macarrão, a batata. O pão branco ou integral, um alimento tão popular e mítico, tem fortes adversários nas redes. Em termos de oposição, creio que existe um alimento que realmente só tem detratores: o açúcar.

Demétrio Magnoli - Dois Brasis — e mais alguns

O Globo

Há uma dimensão eleitoral nas dinâmicas demográficas captadas pelo Censo

O pensamento dualista desenhou a antiga imagem dos “dois Brasis”, título da obra do francês Jacques Lambert publicada em 1957. Já se fez a crítica da polaridade modernização/atraso. Contudo o Censo de 2022 ilumina a persistência de dilemas entranhados e, nesse passo, gera novas indagações políticas. Suas tabelas expõem as divisões entre um Brasil dinâmico, que atrai migrantes, e outros (no plural) demograficamente estagnados.

À sombra da transição demográfica, o Brasil exibiu taxa anual de crescimento demográfico de mero 0,52% entre 2010 e 2022. A depressão econômica iniciada em 2014 e a pandemia de Covid-19 provavelmente tiveram impacto na redução da natalidade, mas apenas aceleraram tendências registradas nas décadas anteriores. O “bônus demográfico” — intervalo em que a população adulta cresce a taxas maiores que a de jovens e idosos — vai se fechando. As médias nacionais, porém, ocultam profundas desigualdades entre os estados.

Entrevista | Bernard Appy: Sem exceções, novo imposto teria alíquota inferior a 25%,

Secretário de Haddad, Bernard Appy afirma que gostaria de menos correria com a tramitação e que tarefa com IR e folha será tornar possível o impossível

Alexa Salomão, Idiana Tomazelli e Fábio Pupo / Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - Onde tomar uma cerveja em Brasília por volta das 2h30 de sexta-feira (7) era a dúvida de Bernard Appy, secretário extraordinário da Reforma Tributária do Ministério da Fazenda, após a Câmara dos Deputados aprovar a mais ampla mudança no sistema de impostos em quase seis décadas —tema ao qual ele dedica sua atuação profissional. Sem grandes opções, a comemoração com os colegas de governo aconteceu na loja de conveniência em um posto de gasolina.

A proposta aprovada não foi a ideal, sobretudo pelas flexibilizações de última hora que contemplaram de clubes de futebol a igrejas. Segundo Appy, quanto maior o número de exceções, maior será a alíquota do novo IVA (Imposto sobre Valor Agregado, tributo central do modelo).

"Toda exceção aumenta a alíquota. Essa vai ter que ser uma discussão que, no Senado, espero que seja muito informada", afirma à Folha. "Se não tivesse nenhuma exceção e com essa redução de sonegação, a gente teria uma alíquota bem… Poderia ser inferior a 25%. Claramente inferior a 25%."

A próxima etapa da Reforma deve reacender a discussão em torno do chamado Conselho Federativo, órgão que vai arrecadar e gerenciar a parcela do tributo que cabe a estados e municípios e que foi alvo de resistência de governadores, preocupados com eventual perda de autonomia.

"Estão achando que o Conselho Federativo vai ser uma instância política, vai ter poder político, e não vai. É uma instância técnica", diz o secretário. "Vai ser menos poderoso que qualquer Secretaria de Fazenda."

Agora, a equipe do ministro Fernando Haddad (Fazenda) se volta também à reforma do Imposto de Renda –que terá o desafio de cumprir a promessa do presidente Lula (PT) por mais isenção e também gerar recursos para desonerar a folha de salários. "Nosso trabalho é tornar o impossível possível", diz.

Marcus André Melo* - A geometria política da reforma tributária

Folha de S. Paulo

Por que a reforma tributária demorou tanto para ser aprovada?

Demorou 30 anos. Sim, o diagnóstico e os remédios não foram muito diferentes dos propostos pela Comissão Executiva da Reforma Fiscal e no "emendão" do governo Collor; na revisão constitucional de 1993; nas PECs apresentadas por FHC e retiradas de pauta após longa tramitação; e mais recentemente em 2003 e 2007, como discuti em coluna.

Sim, contextos adversos colaboraram para o malogro: o impeachment de Collor, o aborto da revisão de 1993 e a crise asiática de 1997. No caso em que ela avançou mais, FHC preferiu a manutenção de um sistema ineficiente que garantia arrecadação a um modelo superior em quadro de grave instabilidade fiscal. Como examinei detalhadamente aqui.

Camila Rocha* - Nikolas Ferreira assume o front

Folha de S. Paulo

Deputado reforça investimento em guerra contra opositores, rejeitada por Tarcísio

A divisão dos espólios políticos de Bolsonaro avançou. Ao defender a aprovação da Reforma Tributária, o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), deixou claro que a continuidade da guerra contra opositores não é de seu interesse. Já o deputado federal Nikolas Ferreira (PL) reforçou o investimento no conflito e assumiu a linha de frente.

O fraseado bélico não é mera analogia com o militarismo. Afinal, a ideia de guerra é mobilizada explicitamente por extremistas de direita para se referir ao confronto com inimigos políticos, o qual se estende ao reino espiritual.

Logo após a inelegibilidade de Jair Bolsonaro ter sido declarada pelo Tribunal Superior Eleitoral, Nikolas iniciou um "desafio" em seu Instagram. Para tanto, conclamou pastores, cantores gospel e influenciadores a fazer "21 dias de oração pelo Brasil". O objetivo? Acumular forças na guerra espiritual contra o que percebem ser forças malignas que assolam o país, atitude análoga à adotada por boa parte das pessoas que ficaram acampadas em quartéis à espera de um golpe.

Carlos Pereira* - Congruência atenua a má gerência

O Estado de S. Paulo

Aprovação da reforma é evidência de funcionalidade do presidencialismo multipartidário

Oque explica a aprovação da reforma tributária por uma margem tão confortável (382 votos, muito acima dos necessários 308) na Câmara dos Deputados a despeito dos múltiplos erros na montagem e na gerência de coalizão do governo Lula 3?

Afinal de contas, Lula escolheu montar uma coalizão muito grande, com 14 partidos, extremamente heterogênea e não tem compartilhado poder e recursos de forma proporcional levando em consideração o peso político de cada parceiro no Legislativo.

Além do mais, trata-se de uma reforma que historicamente tem despertado grandes resistências de setores que usualmente tentam proteger seus interesses, levando assim ao fracasso de várias tentativas de governos anteriores de reformar o sistema tributário brasileiro.

Bruno Carazza* - Jabutis e outros riscos no caminho do IVA-dual

Valor Econômico

Barrar a ampliação de benefícios e regulamentar a PEC são os novos desafios da reforma

A festa foi merecida. Afinal, há 35 anos sonhávamos com uma reforma que começasse a colocar ordem no nosso caos tributário. Mas até chegarmos ao ponto de termos um IVA padrão internacional, ainda temos um longo caminho.

Até 01/01/2033, data em que o novo sistema tributário entrará em vigor na sua máxima potência, há muito a ser feito. E nesta jornada não faltam desafios e perigos.

As primeiras batalhas começam a ser travadas agora. Se tivéssemos um Senado Federal responsável, seu principal papel seria eliminar a maioria dos dispositivos estranhos aos objetivos da PEC que foram enxertados em seu texto (os famosos jabutis) e o festival de isenções e deduções acrescentadas na última hora.

Jairo Saddi* - Eu sou você ontem

Valor Econômico

A redução dos custos para estabelecimentos comerciais poderia tornar as refeições mais acessíveis

O Programa de Alimentação do Trabalhador (PAT) foi instituído pela Lei nº 6.321, de 14 de abril de 1976, e é um dos mais importantes programas sociais da atualidade. Regulamentado pelo Decreto nº 10.854, de 10 de novembro de 2021, com instruções complementares estabelecidas pela Portaria MTP/GM nº 672, de 8 de novembro de 2021, o programa busca “atender prioritariamente os trabalhadores de baixa renda e sua gestão é compartilhada entre o Ministério do Trabalho e Previdência, a Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil, o Ministério da Economia e o Ministério da Saúde”.

Os conhecidos instrumentos, “vale-refeição” e “vale-alimentação” são “quase-moedas”. Moeda, como se sabe, tem valor de intermediação de trocas, ou seja, serve de meio para trocar produtos e serviços, além de funcionar como referência de valor, criando uma unidade de medida. De um lado, estão a empresa emissora e credenciadora da moeda eletrônica de pagamento e a empresa beneficiária que concede os benefícios aos trabalhadores (e que pode descontar o valor do seu imposto a pagar) e, de outro, está a fornecedora de alimentação, a empresa que administra o fornecimento de alimentos aos trabalhadores, que pode ser a refeição pronta e/ou a cesta de alimentos ou ainda a possibilidade de compra direta nos supermercados, restaurantes e outros canais de distribuição de gêneros alimentícios.

‘Sempre serei leal e grato a Bolsonaro', diz Tarcísio

Após desgaste entre governador de São Paulo e ex-presidente na semana passada, os dois se encontraram na sexta para apaziguar os ânimos

Por Guilherme Caetano / O Globo

Dois dias após fazer as pazes com o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), por quem foi constrangido na semana passada às vésperas da votação da Reforma Tributária, o governador de São Paulo afirmou neste domingo "não ser possível concordar em tudo" com o ex-chefe. Tarcísio de Freitas (Republicanos), no entanto, prometeu "sempre ser leal" ao ex-presidente.

Tarcísio participou neste domingo de uma solenidade em homenagem aos 91 anos da Revolução Constitucionalista de 1932, data histórica para o estado de São Paulo. O evento foi realizado no Obelisco Mausoléu aos Heróis de 32, no Ibirapuera.

Luiz Gonzaga Belluzzo - De Mussolini a Bolsonaro

Carta Capital

A construção social da mentira como alavanca de comando unifica os dois personagens de egos transtornados

O historiador Mimmo ­Franzinelli, conhecido por seus trabalhos sobre o fascismo, escreveu o livro Mussolini Racconta Mussolini, uma antologia de textos autobiográficos do Duce. Nas linhas e entrelinhas são expostas as deficiências de Mussolini como chefe de Estado e ressaltados os lados sombrios de sua personalidade. Diz Franzinelli que o Duce nunca foi “um grande estadista”, capaz de projetos para o desenvolvimento do país.

A antologia nos dá uma imagem dos humores, exaltações, surtos psicóticos, volúpia e paixões políticas e culturais do Chefe. “Nada a ver com um projeto de nação, mas impulsos irracionais oriundos de um ego sem limites, de uma convicção e de uma autoconvicção da própria ‘­vontade de poder’ que não conhecem limites.”

O historiador fala de personalidades limítrofes – semelhantes à de Hitler – e de um regime esquizofrênico, submetido aos altos e baixos dos “instintos” pelos quais Mussolini se julgava dotado de uma faculdade profética, como ele chamava suas cognições e iluminuras.

O que a mídia pensa - Editoriais / Opiniões

Valor Econômico

Haverá mais barulho e divergências sobre o Conselho Federativo

A primeira reforma tributária feita após a ditadura militar foi aprovada por ampla maioria na Câmara dos Deputados - 382 a 118 no primeiro turno, 375 a 113 no segundo -, um feito extraordinário, quando por décadas desavenças irredutíveis impediram de realizá-la. As mudanças abrem a chance concreta de se consertar, em grande parte, um sistema tributário injusto, desigual, e oneroso e burocrático em demasia para cumprimento de seu cipoal de regras que mudam quase diariamente. Se for conduzida sem mais desvirtuamentos até o fim, a reforma liberará pessoal e recursos das empresas que poderão ser empregados produtivamente. A Proposta de Emenda Constitucional segue para o Senado, onde será examinada após o fim do recesso parlamentar.

Após décadas de discussões, a reforma tributária reuniu um grande consenso, para o qual contaram o empenho do presidente da Câmara, Arthur Lira, a costura política do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e as orientações do governo, sob o comando, na questão, do secretário especial Bernard Appy. É certo que ela passou pelo teste da Câmara não só por suas virtudes inegáveis, mas também devido a amplas concessões em relação ao projeto original e pela liberação recorde de emendas pelo governo, R$ 5,3 bilhões, em apenas um par de dias. Como a reforma reflete a relação de forças políticas existente, ela foi a possível de ser feita. Mesmo assim, alguns de seus pontos fundamentais foram mantidos.

Poesia | Clarice Lispector por Aracy Balabanian - O ato gratuito

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Música | Adoniran Barbosa - Joga a chave