terça-feira, 8 de setembro de 2015

Opinião do dia – Luiz Werneck Vianna

Há de tudo nessa barafunda em que fomos envolvidos por nossos atuais governantes. Persiste entre eles a influência da social-democracia, embora ninguém a defenda abertamente, assim como a do neoliberalismo – o programa Bolsa Família tem aí sua inspiração – e a do nacional-desenvolvimentismo do regime militar com seu capitalismo politicamente orientado, em certas versões sob maquiagem chinesa.
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*Luiz Werneck Vianna é sociólogo da PUC-Rio – ‘Nó de marinheiro’. O Estado de S. Paulo, 6 de setembro de 2015

Dilma admite reavaliar até mesmo gastos sociais

• ‘ Se cometemos erros, e isso é possível, vamos superá-los’, diz presidente

• Para evitar panelaços, pronunciamento só foi divulgado na internet, em vez de usar cadeia de rádio e de TV; cortes poderão atingir também investimentos e programas para emprego e renda

Com a popularidade em baixa, a presidente Dilma evitou ontem usar uma cadeia de rádio e televisão para o pronunciamento do Dia da Independência. Lançou mão, como no 1 º de Maio, de discurso em vídeo, divulgado na internet, em que abriu a possibilidade de que programas sociais sejam “reavaliados”. Os projetos para garantir emprego, renda e investimentos também poderão ser reduzidos, segundo ela. “Temos que reavaliar todas essas medidas e reduzir as que devem ser reduzidas”, afirmou. Dilma ressaltou ainda que, se cometeu erros (“e isso é possível”, disse ela), vai superálos. Também reconheceu que as soluções necessárias para vencer a crise serão duras. “Alguns remédios para esta situação, é verdade, são amargos, mas são indispensáveis”, disse.

Remédio Amargo

  • Pela internet, em vez do rádio e da TV, Dilma fala em ‘reavaliar’ programas sociais

Geralda Doca, Catarina Alencastro e Cristiane Jungblut - O Globo

- BRASÍLIA- Diante dos índices de popularidade de um dígito, e, para evitar panelaços, a presidente Dilma Rousseff evitou ir à televisão para a tradicional cadeia de rádio e TV. Ainda assim, repetindo o que havia feito no Dia do Trabalho, a presidente gravou um pronunciamento pela internet, no qual tentou explicar os impactos da crise econômica e deixou aberta a possibilidade de programas sociais serem “reavaliados”.

— As dificuldades e os desafios resultam de um longo período em que o governo entendeu que deveria gastar o que fosse preciso para garantir o emprego e a renda do trabalhador, a continuidade dos investimentos e dos programas sociais. Agora, temos de reavaliar todas essas medidas e reduzir as que devem ser reduzidas — disse a presidente.

O ministro da Fazenda, Joaquim Levy, tem defendido internamente no governo que o Orçamento do próximo ano sofra corte profundo, incluindo em programas sociais, para que se cubra o déficit de R$ 30,5 bilhões. Apesar da fala de Dilma, o ministro Edinho Silva ( Secretaria de Comunicação Social) negou que ela tenha sinalizado que cortará recursos dos programas sociais. — Não haverá cortes — afirmou. Para o ministro, a presidente se referia a políticas de benefícios fiscais concedidas pelo governo, como as desonerações da folha de pagamentos de vários setores. Segundo um integrante do governo, o discurso foi mais no sentido de pedir desculpas, reconhecer erros do passado e alertar para a necessidade de buscar uma solução conjunta. Durante seu pronunciamento, Dilma reconheceu que o remédio para superar a crise e retomar o crescimento será “amargo”, e chegou a acenar com um reconhecimento de que pode ter cometido equívocos:

— As dificuldades, insisto, são nossas e são superáveis. O que eu quero dizer com toda franqueza é que estamos enfrentando os desafios, essas dificuldades, e que vamos fazer essa travessia. Se cometemos erros, e isso é possível, vamos superálos e seguir em frente. Quero dizer a vocês: alguns remédios para essa situação, é verdade, são amargos, mas são indispensáveis — explicou.

Recado aos que querem sua saída
Voltando a falar que o país está passando por uma travessia, a presidente afirmou que está ciente da responsabilidade que lhe cabe de apresentar “soluções”. A declaração foi dada após a reação negativa à proposta orçamentária para 2106, enviada ao Congresso com déficit de R$ 30,5 bilhões, que aumentou a chance de o país perder o grau de investimento, uma espécie de selo de bom pagador dado pelas agências internacionais de classificação de risco:

— É verdade que atravessamos uma fase de dificuldades, enfrentamos problemas e desafios. Sei que é minha responsabilidade apresentar caminhos e soluções para fazer a travessia que deve ser feita.

Dilma abriu mão de discursar em rede nacional de rádio e TV — tradição no Dia da Pátria, seguida por ela nos três primeiros anos do seu governo ( com exceção do ano eleitoral, devido a restrições da legislação). A opção foi tomada para evitar protestos como os panelaços registrados nas suas últimas falas na televisão. Ainda assim, as celebrações de ontem foram marcadas por protestos em todo o país. A presidente, no entanto, voltou a pedir a união de todos, independentemente de interesses individuais e partidários e, em referência velada aos que pedem sua saída, disse que o Dia da Independência era o momento de defender a democracia:

— É neste dia que reafirmamos aquilo que uma nação ou um povo tem de melhor, a capacidade de lutar e a capacidade de conviver com a diversidade. Tolerante, em face às diferenças, respeitoso na defesa das ideias, sobretudo, firme na defesa da maior conquista alcançada e pela qual devemos zelar permanentemente, a democracia e a adoção do voto popular como método único e legítimo de eleger nossos governantes e representantes.

Ao fim do desfile do 7 de Setembro, o ministro Edinho Silva justificou a opção pelo pronunciamento via redes sociais. Segundo ele, Dilma não tem medo de se comunicar, mas quer privilegiar outros meios de comunicação. O ministro acredita que pronunciamentos em cadeia nacional de rádio e TV só devem ser convocados quando há um tema fundamental, para não banalizá-los.

— Temos que entender que é importante convocação em rede de televisão, mas isso não pode ser banalizado. Quando é chamado, tem que ser por um motivo fundamental. E nós temos que valorizar outros modais de comunicação. A presidente não tem receio de se comunicar — afirmou.

Dilma admite que ações do 1º mandato levaram à crise

• Em discurso na internet, presidente fala da necessidade de ‘remédios amargos’, mas ‘indispensáveis’

Dilma reconhece erros do primeiro mandato e reavalia gasto social

• Em mensagem divulgada pelo Palácio do Planalto nas redes sociais, presidente fala sobre a crise pela qual o País passa no momento

Ana Fernandes e Gustavo Porto - O Estado de S. Paulo

Em vídeo postado pelas redes sociais, como estratégia para evitar os panelaços, a presidente Dilma Rousseff fez um discurso de mea-culpa, com reconhecimento da gravidade da crise, e ao mesmo tempo já colocando uma argumentação de união e tolerância para fazer a "travessia".

"Se cometemos erros, e isso é possível, vamos superá-los e seguir em frente", diz a presidente, vestida com um terno azul claro e com um quadro em tons azuis ao fundo. "As dificuldades são nossas e são superáveis. O que eu quero dizer, com toda franqueza, é que estamos enfrentando os desafios, essas dificuldades, e que vamos fazer essa travessia."

A presidente lembra que há dificuldades na economia pelo mundo, mas admite também que a crise é consequência da estratégia do governo brasileiro nos últimos anos. "As dificuldades e desafios resultam de longo período em que o governo entendeu que deveria gastar o que fosse preciso para garantir o emprego e a renda do trabalhador, a continuidade dos investimentos e dos programas sociais. Agora temos de reavaliar todas essas medidas e reduzir as que devem ser reduzidas."

Dilma afirma que a situação exige "remédios amargos", mas "indispensáveis". "As medidas que estamos adotando são necessárias para botar a casa em ordem, reduzir a inflação por exemplo", reforça. E, em diversos momentos, destaca que a saída é a união do povo. "O esforço de todos nós é que vai nos levar a superar esse momento", diz em um trecho do discurso. "Devemos, nessa hora, estar acima das diferenças menores, colocando em segundo plano os interesses individuais ou partidários", complementa em outro.

Em dia de novos protestos contra seu governo, tanto de movimentos pró impeachment, como de movimentos sociais que criticam o ajuste fiscal com cortes a programas de moradias, Dilma aparece em um vídeo que não tem vermelho em nenhum ponto, afastando a associação com o PT.

Em sua fala, Dilma se coloca como a liderança adequada para conduzir o País na saída da crise. "Me sinto preparada para conduzir o Brasil no caminho de um novo ciclo de crescimento, ampliando as oportunidades para nosso povo subir na vida, com mais e melhores empregos", afirma.

A presidente reitera as conquistas dos últimos 12 anos, sem contudo citar sua legenda. Lembra que milhões foram tirados da miséria e alçados à classe média, mas lembra que ainda há muito a se fazer, por exemplo, na educação, e que isso passa por correções na economia. Mas frisa que não abrirá mão da "alma e caráter" de seu governo, que é gerar oportunidades via programas sociais. "Nenhuma dificuldade me fará abrir mão da alma e do caráter do meu governo. A alma e o caráter do meu governo é assegurar, neste país de grande diversidade, oportunidades iguais para a nossa população. Sem recuos, sem retrocessos."

Independência. Dilma destaca a celebração da Independência do Brasil e, com o gancho, elogia a capacidade do brasileiro de "lutar e conviver com a diversidade, tolerante em face às diferenças e respeitoso na defesa de ideias". A fala funciona como uma vacina contra manifestações de volta à ditadura militar que, apesar de minoritárias pelo País, ganham destaque nos desfiles da data de hoje. Segundo a presidente, a população deve permanecer "firme na defesa da maior conquista alcançada e pela qual devemos zelar permanentemente: a democracia e a adoção do voto popular" - referência também à legitimidade de seu mandato, conquistado nas urnas.

Dilma encerra a mensagem dizendo que a independência "acontece todos os dias" e exaltando a autoestima do povo. "Hoje, mais do que nunca, somos todos Brasil."

Refugiados na Europa. A presidente aproveitou o pronunciamento divulgado nas redes para falar da "tragédia humanitária" envolvendo refugiados. Dilma lembrou a imagem do menino sírio Aylan Kurdi, de apenas três anos, cujo corpo foi encontrado em uma praia turca, dizendo que comoveu a todos e deixou um desafio para o mundo. A presidente reiterou disposição do governo brasileiro "de receber aqueles que, expulsos de suas pátrias, para aqui queiram vir, viver, trabalhar e contribuir para a prosperidade e a paz do Brasil".

"Nós, o Brasil somos uma nação que foi formada por povos das mais diversas origens, que aqui vivemos em paz. Mesmo em momentos de dificuldade, de crise, como a que estamos passando, teremos os nossos braços abertos para acolher os refugiados", afirmou, destacando uma posição política do País e também mostrando em paralelo que a situação do Brasil não é tão grave em face a tragédias que acontecem pelo mundo.

Edinho. O ministro da Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República, Edinho Silva afirmou que a divulgação do pronunciamento de Sete de Setembro da presidente da República Dilma Rousseff ter sido divulgado apenas pela internet em redes sociais é uma forma de valorizar outros modais de comunicação que não seja a televisão. "Eu e a presidente Dilma concordamos que temos de valorizar todos os modais e as redes sociais são importantes".

Edinho evitou comentar que a falta de um pronunciamento em rede nacional de rádio e televisão durante o feriado esteja relacionada aos possíveis protestos e panelaços que pudessem ocorrer. "É importante a convocação de rede de tevê, mas isso não pode ser banalizado. E também não significa que não terão novos pronunciamentos", concluiu

'Remédio amargo' é necessário, diz Dilma

• Presidente ensaia novo 'mea-culpa', dizendo que é preciso superar os erros

Dilma pede união na crise e defende 'remédios amargos'

• Presidente diz que, se houve erro no primeiro mandato, irá 'superá-los' agora

• Forças políticas deveriam pôr de lado 'interesses individuais ou partidários', afirma petista nas redes sociais

Marina Dias, Débora Álvares, Fábio Monteiro e Flávia Foreque – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - A presidente Dilma Rousseff ensaiou mais uma vez nesta segunda (7) reconhecer que cometeu erros na condução da economia em seu primeiro mandato e disse que precisou administrar "remédios amargos" para enfrentar a crise que o país atravessa.

Isolada politicamente, e agora com dois ministros palacianos investigados sob suspeita de envolvimento com a corrupção na Petrobras, Dilma pediu que as forças políticas colaborem com a superação da crise pondo em "segundo plano interesses individuais ou partidários".

O pronunciamento da presidente, que substituiu o tradicional discurso de 7 de Setembro na televisão, foi divulgado nas redes sociais da internet, numa tentativa de evitar panelaços como os que ocorreram nas últimas vezes em que ela apareceu em cadeia nacional de rádio e TV.

"Se cometemos erros, e isso é possível, vamos superá-los e seguir em frente", disse Dilma. "Alguns remédios para essa situação, é verdade, são amargos, mas são indispensáveis", acrescentou.

Esta foi a segunda vez que a presidente ensaiou fazer o mea-culpa que a oposição e até aliados reivindicam desde o início do ano, quando ela se afastou do discurso da campanha eleitoral para mudar sua política econômica.

Em entrevista há três semanas, Dilma disse que demorou a perceber a gravidade da crise econômica em 2014. Desta vez, ela afirmou que as políticas adotadas em seu primeiro mandato contribuíram para as dificuldades atuais, mas justificou-se dizendo que seu objetivo era preservar empregos e investimentos.

"As dificuldades e os desafios resultam de um longo período em que o governo entendeu que deveria gastar o que fosse preciso para garantir o emprego e a renda do trabalhador, a continuidade dos investimentos e dos programas sociais", disse a presidente. "Agora, temos que reavaliar todas essas medidas e reduzir as que devem ser reduzidas."

A presidente defendeu as medidas de austeridade adotadas pelo governo, que incluíram cortes de despesas e aumento das taxas de juros, como necessárias para conter a inflação e recuperar a economia, que está em recessão.

Na semana passada, o governo enviou ao Congresso sua proposta de Orçamento para 2016 com um inédito deficit primário de R$ 30,5 bilhões, mesmo depois de aumentar impostos e cortar despesas de vários programas.

"As medidas que estamos adotando são necessárias para botar a casa em ordem, reduzir a inflação, por exemplo, nos fortalecer diante do mundo e conduzir o mais breve possível o Brasil à retomada do crescimento", afirmou.

A presidente se disse "preparada" para "conduzir o Brasil no caminho de um novo ciclo de crescimento", retomando o discurso que adotou na campanha do ano passado, e afirmou que não haverá "recuos" nem "retrocessos".

Em mais um recado indireto para a oposição, que a ameaça com um processo de impeachment, a presidente disse que o país deveria aproveitar o 7 de Setembro para "[lutar] firme na defesa da maior conquista alcançada e pela qual devemos zelar permanentemente: a democracia e a adoção do voto popular como método único e legítimo de eleger nossos governantes e representantes".

Pouco antes do vídeo com o pronunciamento entrar no ar, a presidente participou, ao lado do vice-presidente Michel Temer, do desfile cívico-militar de 7 de Setembro em Brasília. Dos seis ministros do PMDB, o partido de Temer, só um compareceu, Helder Barbalho, da Pesca.

Sob forte esquema de segurança, Dilma passou as tropas em revista e ouviu o som das bandas militares abafar vaias de manifestantes que estavam perto da rodoviária de Brasília, a poucos quilômetros dali. Nas arquibancadas em frente ao palanque das autoridades, uma claque simpática ao governo aplaudia e gritava timidamente palavras de ordem.

Dilma fala em 'remédios amargos' para crise

Por Carmen Munari – Valor Econômico

SÃO PAULO - Em pronunciamento veiculado em redes sociais pelo Dia da Independência, comemorado ontem, a presidente Dilma Rousseff afirmou que o país passa por dificuldades na economia em consequência de gastos para garantir salários e investimentos. Reconheceu, em um momento em que o país passa por inflação e juros em alta e baixo crescimento, que erros foram cometidos pelo governo.

"É verdade que atravessamos uma fase de dificuldades. Sei que é minha responsabilidade apresentar caminhos e soluções para fazer a travessia que deve ser feita", disse Dilma no discurso na internet. Com baixa popularidade, a presidente optou pelas redes ao invés do tradicional pronunciamento em cadeia de TV.

Dilma admitiu um longo período de gastos realizados pelo governo para garantir o emprego, a renda, os investimentos e os programas sociais. "O governo gastou o que foi preciso", afirmou, ao prever que "agora temos que avaliar todas essas medidas e reduzir as que devem ser reduzidas". Admitiu que "se cometemos erros, e isso é possível, vamos superá-los e seguir em frente". Disse ainda que "nossos problemas também vieram lá de fora" e previu que os remédios para esta situação "são amargos, mas indispensáveis".

"Me sinto preparada para conduzir o Brasil no caminho de um novo ciclo de crescimento. Nenhuma dificuldade me fará abrir mão da alma e do caráter do meu governo", previu.

No discurso, ela também se referiu à crise dos refugiados que buscam asilo na Comunidade Europeia e disse que o país tem disposição de receber os imigrantes. "Mesmo em momentos de dificuldade, de crise como estamos passando, teremos nossos braços abertos para acolher os refugiados. Aproveito para reiterar a disposição do governo para receber os que, expulsos de suas pátrias, para aqui queiram vir viver, trabalhar e contribuir para a prosperidade e a paz do Brasil", declarou.

Comentou ainda a foto do menino sírio morto em uma praia da Turquia. "A imagem do menino Aylan Kurdi, de apenas 3 anos, comoveu a todos nós e deixou um grande desafio para o mundo."

Citando o 7 de setembro, Dilma defendeu a democracia e, sem mencionar a crise política e os pedidos de impeachment, disse que o voto popular "é método único e legítimo de eleger nossos governantes". Também pregou a união, defendendo que fiquem em segundo plano os interesses individuais e partidários.

Desemprego é pior no Nordeste

Na região, taxa já supera os 10%. Houve alta em 22 dos 27 estados, e alguns tiveram recorde, mostra Lucianne Carneiro 

Desemprego por todo lado

• Taxa cresce em 22 dos 27 estados em 1 ano e já supera os 10% na Região Nordeste

Lucianne Carneiro - O Globo

Diante de uma economia que não cresce há cinco trimestres, a piora do mercado de trabalho é disseminada por todo o país. O desemprego aumentou em 22 dos 27 estados e unidades da federação no segundo trimestre deste ano, em comparação ao mesmo período de 2014. No Nordeste, o desemprego cresceu em sete dos nove estados e já ultrapassa os dois dígitos na média da região. No Sudeste e no Sul, todos os estados registraram alta da desocupação. Na Região Norte, isso ocorreu em cinco dos seis estados; no Centro- Oeste, houve alta em três dos quatro estados.

A deterioração dos números fez com que, em muitos casos, o desemprego chegasse ao maior nível da série histórica da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua ( Pnad Contínua), do IBGE, iniciada em 2012. Na média nacional, a taxa foi de 8,3% entre abril e junho, o maior nível da série. O mesmo fenômeno ocorre em quatro estados: São Paulo, Paraná, Rio Grande do Sul e Goiás.

Bahia sofre com cortes na construção civil
No Nordeste, a taxa, que é historicamente mais alta, subiu de 8,8% para 10,3% na comparação entre os segundos trimestres de 2014 e de 2015. O nível é menor que o recorde de 10,9% do primeiro trimestre de 2013, mas é o mais alto desde então.

Três estados da região têm desocupação acima dos 10%: Rio Grande Norte ( 11,6%), Alagoas ( 11,7%) e Bahia ( 12,7%, a mais alta taxa no país). O Amapá, na Região Norte, é o quarto e último estado com taxa de dois dígitos ( 10,1%).

— Apesar dos esforços de investimentos em infraestrutura e educação, que permitiram um crescimento maior do Nordeste, a taxa de desemprego ainda é maior que em outras regiões do país. Agora, em um momento de ajuste, com contingenciamento de recursos, o Nordeste acaba sentindo mais — explica a professora de Economia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte ( UFRN) Valdenia Apolinario, estudiosa do mercado de trabalho.

Glacivaldo Correia Lima, de 27 anos, é um dos nordestinos que atualmente estão em busca de trabalho. Morador de Jaboatão dos Guararapes, na Região Metropolitana de Recife, ele foi demitido da fábrica de cerâmicas onde trabalhava em julho, junto com pelo menos mais 40 colegas. Em Pernambuco, a taxa de desemprego já chega a 9,1%, frente aos 8,8% do segundo trimestre do ano passado. A crise da economia, conta Glacivaldo, foi a justificativa para as demissões. Agora, ele busca uma vaga na área de sistemas de informação.

— Estou no quinto período da faculdade e vou aproveitar que fui demitido para procurar algo no que estou estudando. É uma área com mais chances de crescimento, mas está difícil encontrar emprego — lamenta Glacivaldo, que mora com os pais.

Na Bahia, que amarga o maior desemprego do país, os setores de construção civil e serviços têm contribuído para o momento ruim do mercado de trabalho. A construção absorvia 8,9% da população ocupada no segundo trimestre de 2014, mas essa fatia caiu para 8,4% no segundo trimestre deste ano.

— A Bahia é um estado em que a agricultura tem uma presença maior que no resto do país, assim como o setor de serviços. Além disso, a informalidade também aumentou — explica Cimar Azeredo, coordenador de Trabalho e Rendimento do IBGE.

Os únicos estados do país em que não houve aumento do desemprego entre o segundo trimestre do ano passado e o mesmo período de 2015 foram Acre, Tocantins, Rio Grande do Norte, Sergipe e Distrito Federal.

— O mercado de trabalho está piorando em ritmo muito rápido e de forma muito intensa. O que a Pnad Contínua mostra é a generalização dessa piora, que é mais ampla do que vinha sendo registrada pela Pesquisa Mensal do Emprego ( PME), que acompanha apenas as regiões metropolitanas brasileiras — afirma o professor do Instituto de Economia da UFRJ João Saboia.

Falta de vagas além das metrópoles
A avaliação de Saboia é que os dados não chegam a ser uma surpresa diante do que vem sendo observado no mercado de trabalho. Para ele, o mérito da Pnad Contínua é justamente mostrar o cenário em escala nacional, muito além da realidade das grandes cidades.

— A economia está em contração desde meados de 2014, e ainda há muita incerteza sobre sua retomada. O mercado de trabalho, que é a última ponta a sentir o reflexo da crise, agora passa por um ajuste generalizado. A Pnad Contínua é mais abrangente e mostra isso — explica o economista da Tendências Consultoria Rafael Bacciotti, que ainda espera uma piora no emprego.

Cimar Azeredo, do IBGE, explica que o aumento do desemprego ocorreu em “praticamente quase todos os estados da federação”, e os dados confirmam que a economia “não está favorável”. Os números apontam uma maior busca por trabalho, segundo ele:

— O mercado de trabalho entrou em um processo de perda do que tinha conquistado nos últimos anos, tanto em termos de patamar da taxa de desocupação quanto no nível da ocupação e na perda dos empregos com carteira de trabalho.

Falta caixa para o Minha Casa 3

• Programa entra em sua terceira fase, mas governo já tem R$ 1 bilhão em desembolsos atrasados e dívida de R$ 8,3 bilhões com FGTS.

Falta de recursos do governo põe em dúvida fase 3 do Minha Casa

• Atraso em desembolsos soma R$ 1 bi. Lançamento está previsto para quinta- feira

Geralda Doca - O Globo

- BRASÍLIA- Diante da necessidade de cortar gastos, a presidente Dilma Rousseff decide hoje, em reunião com os ministros do Planejamento, Nelson Barbosa, e das Cidades, Gilberto Kassab, como ficará a terceira etapa do Minha Casa Minha Vida — uma das principais bandeiras do governo. O lançamento oficial da nova fase do programa, com meta de mais três milhões de moradias, está previsto para quinta- feira, mas falta dinheiro, resumiu uma fonte da equipe econômica. A data do lançamento consta da agenda dos empresários do setor, que têm dúvidas se o evento vai acontecer mesmo nesta semana, diante do agravamento da crise.

O governo não tem recursos nem para colocar em dia os desembolsos às construtoras do atual programa e está virando o mês devendo entre R$ 800 milhões e R$ 1 bilhão. Além disso, tem uma dívida de R$ 8,3 bilhões com o FGTS na parte de concessão de subsídios aos beneficiários do Minha Casa Minha Vida ( dados de junho).

Aperto no orçamento é obstáculo
Para o próximo ano, o Orçamento da União reserva ao programa R$ 15,6 bilhões, mas a peça orçamentária foi enviada ao Congresso Nacional com inédito déficit de R$ 30,5 bilhões e, diante da reação negativa de parlamentares e do mercado, o governo se comprometeu em encontrar alternativa para cobrir o rombo, via corte de gastos e criação de tributos.

— A presidente Dilma terá de decidir se vai cortar o Minha Casa e outros programas sociais, qual será a extensão do corte e em que medida isso vai reduzir o ritmo das execuções — explicou uma fonte da equipe econômica.

O aperto orçamentário é um obstáculo, mesmo que a própria presidente tenha dito na última sexta- feira, em viagem ao Nordeste, que vai se esforçar para contratar as três milhões de unidades até 2018 — o que significa que a conta deverá ser transferida para o próximo governo. Neste ano, o governo já foi obrigado a negociar com as empresas redução no ritmo das obras por falta de recursos em caixa.

O Ministério das Cidades argumenta que há ainda cerca de 1,5 milhão de casas a serem entregues em diversas etapas de construção e que, por isso, o programa não perdeu continuidade — apesar da paralisação de obras em vários estados, devido ao atraso nos repasses da União. Mas, desde o fim do ano passado, não são contratadas novas obras para a faixa 1 ( com renda familiar de até R$ 1,6 mil), em que a casa é praticamente doada, com recursos da União. O programa está funcionando, basicamente, nas faixas 2 e 3 ( entre R$ 1,6 mil e R$ 5 mil), em que os beneficiários ganham subsídios e assumem o financiamento habitacional com a Caixa Econômica Federal.

A tendência é que a terceira etapa do Minha Casa Minha Vida seja instituída via medida provisória, com mudanças nos parâmetros do programa ( renda, valor máximo dos imóveis por regiões e nos subsídios), o que vai exigir recursos adicionais. A ideia é criar uma faixa de renda familiar intermediária ( entre R$ 1,6 mil e R$ 2,2 mil); reajustar o valor máximo dos imóveis, atualmente entre R$ 90 mil e R$ 190 mil, para algo entre R$ 105 mil e R$ 235 mil; e elevar o limite de renda para ser incluído no programa, de R$ 5 mil para R$ 6 mil. Também está em discussão elevar o teto do subsídio ( desconto no contrato, a fundo perdido), atualmente em R$ 25 mil.

O setor privado argumenta que essas alterações são importantes para incluir mais gente no programa, diante do preço dos terrenos e de perdas decorrentes do processo inflacionário. O último reajuste nos parâmetros ocorreu em 2012.

— A definição dos novos parâmetros é importante para que o setor possa se planejar. Vai permitir também a inclusão de mais gente no programa — disse o presidente da Câmara Brasileira da Indústria da Construção ( CBIC), José Carlos Martins. Procurado, o Ministério das Cidades informou que trabalha com o lançamento oficial da terceira etapa do programa na quinta- feira. Ao ser indagado sobre a realização do anúncio sem que o governo esteja em dia com as obrigações, a pasta informou que a União já liberou este ano R$ 9,3 bilhões para o Minha Casa Minha Vida e “trabalha no sentido de manter o cronograma negociado com o setor para as liberações futuras”.

“O Ministério das Cidades efetuou a liberação do valor de R$ 730 milhões no dia 01/ 09, referente a setembro. Em agosto foram liberados R$ 920 milhões, e em julho o valor foi de R$ 800 milhões. Todos esses valores referem- se à Faixa 1. Desde 2009, ano do lançamento do MCMV, já foram aplicados cerca de R$ 270 bilhões com a contratação de mais de 4 milhões de unidades. Destas, 2,341 milhões de unidades já foram entregues”, diz a nota do ministério.

A primeira versão do Minha Casa Minha Vida tinha como meta entregar um milhão de casas; na segunda fase, a meta subiu para 2,750 milhões, e na terceira, para três milhões de moradias. O programa utiliza recursos do Orçamento da União e do FGTS, na concessão de subsídios diretos ( desconto no valor do contrato) e indiretos ( taxa de juros e seguro em condições mais acessíveis).

Governo encara desafio na relação com PMDB

Por Andrea Jubé – Valor Econômico

BRASÍLIA - A coordenação política do Palácio do Planalto vai enfrentar uma prova de fogo nas próximas semanas. No dia 11, o vice-presidente, Michel Temer, embarca em viagem oficial à Rússia e Polônia, levando com ele os ministros do partido, inclusive dois "bombeiros" frequentes na relação com o Congresso: Eliseu Padilha (Aviação Civil) e Eduardo Braga (Minas e Energia).

Essas ausências, que se estenderão por oito dias, testarão a capacidade de articulação política do governo, que ficará a cargo do ministro-chefe da Casa Civil, Aloizio Mercadante, e do assessor especial da presidente, Giles Azevedo.

Ontem, ficou evidente o desconforto do PMDB com o governo, quando apenas um dos sete ministros da sigla - Hélder Barbalho (Pesca e Aquicultura) - assistiu ao desfile do Dia da Independência no palanque oficial, com a presidente Dilma Rousseff.

O Planalto receia um possível desembarque do PMDB do governo, o que será discutido na convenção nacional do partido, em novembro. Hoje, Temer vai comandar uma reunião no Palácio do Jaburu com os governadores do PMDB e os presidentes da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), para discutir o papel do partido no combate à crise, bem como eventual apoio a um imposto de transição, como querem Dilma, Mercadante e a equipe econômica.

Viagem de Temer testa peso da ausência do PMDB na relação com o Congresso

Por Andrea Jubé - Valor Econômico

BRASÍLIA - O PMDB submeterá o Palácio do Planalto a uma prova de fogo nas próximas semanas. No dia 11, o vice-presidente Michel Temer embarca para uma viagem oficial à Rússia e à Polônia, levando com ele os ministros do partido, inclusive dois bombeiros frequentes na relação com o Congresso Nacional: Eliseu Padilha (Aviação Civil) e Eduardo Braga (Minas e Energia). Essa saída estratégica, que se estenderá por oito dias, testará a coordenação política de Dilma sem Temer, que tem agora o ministro-chefe da Casa Civil, Aloizio Mercadante, e o assessor especial Giles Azevedo, na interface direta com os parlamentares.

A viagem ganhou uma simbologia que não tinha meses atrás, quando foi programada: indicará o peso da ausência do PMDB, num momento de máxima fragilidade da presidente. Apesar dos esclarecimentos de Temer em nota oficial sobre as recentes declarações que constrangeram o Planalto - de que o governo não chega até 2018 -, as palavras não correspondem aos gestos.

Ontem ficou evidente o desconforto do PMDB com o governo quando apenas um dos sete ministros da sigla subiu ao palanque com Dilma pelo Dia da Independência: o titular da Pesca e Aquicultura, Hélder Barbalho, que pode sair fortalecido da reforma ministerial depois de ser um dos cotados para a extinção de pastas. Um dos ausentes disse ao Valor que não foi um ato combinado, mas o episódio serviu para mostrar que a maioria dos pemedebistas não estava disposta a sair na foto da presidente.

No comunicado divulgado no domingo para explicar suas declarações, Temer afirma que "trabalha e trabalhará junto à presidente" e que a hora é de "união". Mas um aliado do vice ressalta o trecho que delimita o horizonte do vice: "Seu limite é a lei", ou seja, esbarra no Congresso e no Judiciário, aos quais submetem-se os atos de Dilma, como as pedaladas fiscais.

O Planalto receia o possível desembarque do PMDB do governo, que será discutido na convenção do partido em novembro, e atuou no fim de semana para jogar água fria na fervura. No domingo, Mercadante voltou de São Paulo no avião com Temer para discutir a relação. O ministro da Secretaria de Comunicação Social, Edinho Silva, telefonou para o vice.

Hoje Temer comanda uma reunião no Palácio do Jaburu com os governadores do PMDB e os presidentes da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), para discutir como o partido pode ajudar o governo a superar a crise, bem como o eventual apoio a um imposto de transição, como quer Dilma e Joaquim Levy.

Mas o PMDB é um pote de mágoas, desde que Dilma desautorizou Temer, determinando que Mercadante e Giles deflagrassem uma articulação política paralela, por meio da qual desfizeram acordos firmados pelo vice. Dilma também atropelou Temer ao abrir um canal direto de interlocução com o lider do PMDB na Câmara, Leonardo Picciani (RJ) (ver matéria abaixo).

Aliados de Temer responsabilizam a trinca de ministros palacianos - Mercadante, Edinho e Miguel Rossetto (Secretaria-Geral) - pelos movimentos para indispor o vice e a presidente. Com a Rússia no radar, o trio ganhou de pemedebistas o apelido de "troika palaciana". A "troika" é um trenó russo, conduzido por três cavalos lado a lado.

É nesse contexto que o PMDB quer fazer falta no Congresso, onde Dilma já sentiu que poderá sofrer revezes sem Temer na retaguarda. Na quarta-feira, já sem os pemedebistas na linha de frente, o Planalto agiu para derrubar às pressas a sessão plenária que analisaria o veto ao reajuste dos servidores do Judiciário, que implica rombo bilionário ao orçamento. O Palácio detectou que seria derrotado e ganhou tempo. Nova sessão foi remarcada para 22 de setembro.

Deputados e senadores seguem insatisfeitos com a negociação dos cargos e o congelamento das emendas, além do constrangimento de apoiarem uma presidente impopular às vésperas do pleito municipal, que ainda mais não os reconhece como aliados.

É preciso votar, em sessão conjunta da Câmara e do Senado, um projeto de lei que libera R$ 4,6 bilhões em restos a pagar de anos anteriores, que serão revertidos para o pagamento de emendas. Antes, contudo, é preciso liberar a pauta, trancada por 26 vetos presidenciais, inclusive o aumento do Judiciário e o fim do fator previdenciário. Mas enquanto o palácio não contabilizar os votos necessários à manutenção dos vetos, não será possível liberar os recursos para as emendas, o que fomenta a insatisfação dos aliados.

Em outra frente, a negociação dos cargos segue engessada. Prolongam-se, há meses, duelos emblemáticos, como entre o PP e o PSD pela presidência da Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU), e entre o PMDB e o PSD pelo comando da Superintendência da Zona Franca de Manaus (Suframa), que o governo não consegue arbitrar.

Os pemedebistas estão azedos e deliberarão, em novembro, a possível retirada do apoio a Dilma. Uma liderança nacional da sigla disse ao Valor que não duvida da eventual saída de Dilma do cargo, refletindo a declaração de Temer na quinta-feira de que a presidente, com baixa popularidade, pode não completar o mandato. "O PMDB não fará nada pelo impeachment. Quem derrubará Dilma são as ruas ou a economia", completou. Já um dirigente do PMDB, questionado se o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva poderia ajudar na repactuação com o partido, devolveu: "Lula não tem varinha de condão."

Vice reúne cúpula do PMDB em jantar

• Peemedebistas alegam que o encontro tratará de dificuldades fiscais nos Estados; Planalto segue desconfiado de Temer

Carla Araújo, Gustavo Porto e Tânia Monteiro - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - O vice-presidente Michel Temer reencontrou nesta segunda-feira, 7, em público a presidente Dilma Rousseff pela primeira vez desde quinta-feira, quando afirmou que a petista não permaneceria no cargo até o fim do mandato se mantiver a popularidade em 7%. A declaração provocou tamanho constrangimento que nem a nota em prol da “união” e do “trabalho”, divulgada anteontem pelo peemedebista, amenizou a desconfiança no Planalto. É com esse espírito que o governo vê o jantar que reunirá hoje o vice, governadores e ministros do PMDB, Eduardo Cunha (RJ) e Renan Calheiros (AL), presidentes da Câmara e do Senado.

No palanque montado para o desfile de Sete de Setembro, Dilma e Temer trocaram beijinhos na chegada e na saída, ficaram lado a lado, mas pouco conversaram. Era visível que ambos não estavam à vontade. Ao fim do desfile, cada um tomou seu rumo. Hoje, presidente e vice e se reencontraram em um compromisso de trabalho: a reunião de coordenação política do governo, no Palácio do Planalto, às 9h.

À noite, Temer receberá no Palácio do Jaburu, sua residência oficial, os seis ministros e os sete governadores do PMDB, além de Cunha e Temer. Oficialmente, o tema será uma extensão da reunião realizada na quinta-feira pelo governador do Rio, Luiz Fernando Pezão (PMDB), para formular uma política de consenso dos governadores peemedebistas sobre a crise econômica e seus efeitos sobre os Executivos estaduais. No entanto, é voz corrente dentro do partido que a crise política e a tensa relação entre PT e PMDB será um dos pratos principais do jantar.

Pedido. Um parlamentar próximo a Temer disse que ele está “tranquilo” e que o jantar foi pedido pelos governadores, e não pelo vice. O governador do Espírito Santo, Paulo Hartung (PMDB), informou que o jantar servirá para retomar uma agenda de reformas – trabalhista, previdenciária e tributária – que está parada.

No Planalto, a avaliação de que Temer havia dado declarações “desastrosas” sobre a permanência de Dilma no cargo persiste, mesmo após o vice negar conspiração contra a presidente. Em público, os petistas tentam arrefecer a tensão. “O vice-presidente Michel Temer é o maior símbolo dessa união do PT com o PMDB, da construção de um governo de coalizão de muitos partidos”, disse o ministro da Comunicação Social, Edinho Silva, após o desfile de Sete de Setembro.

Dilma e Temer têm encontro protocolar e pouco conversam

• Dos 7 ministros do PMDB, 1 foi ao desfile; petistas minimizaram ausências

Catarina Alencastro e Cristiane Jungblut - O Globo

- BRASÍLIA- Um beijinho ao chegar no palanque e poucas palavras. O encontro da presidente Dilma Rousseff com o vice Michel Temer durante o desfile do 7 de Setembro foi protocolar. O clima meramente formal entre a petista e o presidente do PMDB ficou evidente não apenas pela linguagem corporal dos dois, ao longo das quase duas horas em que permaneceram lado a lado assistindo à apresentação militar, mas também pela ausência de ministros peemedebistas. Dos sete ministros da legenda, apenas um compareceu: Hélder Barbalho, da Pesca.

Até sexta- feira, Michel Temer não havia definido se iria ao 7 de Setembro. Durante o fim de semana, no entanto, o vice decidiu comparecer para explicitar a imagem de que não está rompido com a presidente. Ele chegou a Brasília no fim da tarde de domingo. Ontem, depois de acompanhar o desfile ao lado de Dilma, o vice foi para o Palácio do Jaburu, sua residência oficial, e não falou mais com a presidente.

Ministros petistas tentaram minimizar as ausências de peemedebistas e o distanciamento da presidente e seu vice durante o evento. Temer foi o primeiro a beijá- la, logo que Dilma desceu do Rolls- Royce que a levou ao palanque. Mas, depois disso, os dois só conversaram duas vezes ao longo do desfile, ambas rapidamente. Primeiro, Dilma dividiu com ele o programa da apresentação e eles trocaram algumas palavras. Depois, ela comentou com o vice algo sobre a pirâmide humana que o batalhão de polícia do Exército de Brasília formava sob a arquibancada onde estavam.

Ao lado de Temer, o ministro da Defesa, Jaques Wagner, intercedeu algumas vezes, puxando os dois para uma conversa. Dilma, no entanto, parecendo ignorar o vice, passou o braço por cima dele e cutucou Wagner para comentar algo.

Após o desfile, o ministro das Comunicações, Ricardo Berzoini, não quis polemizar sobre a relação de Dilma com Temer, afirmando que o vice é leal e comprometido com o governo.

— A relação é boa. O vice soltou uma nota muito firme, muito explícita de qual é a sua postura em relação ao governo e à presidente Dilma e o respeito que o presidente Temer tem à institucionalidade do país. Tem tido ao longo de todos esses anos a postura de compromisso, lealdade e diálogo com o conjunto das forças políticas que integram o governo — declarou.

Ao lado da presidente estavam também dois ministros que estão sendo investigados pelo Supremo Tribunal Federal: Edinho Silva ( Comunicação Social) e Aloizio Mercadante ( Casa Civil). Edinho disse que Temer é o símbolo da união do PT com o PMDB e que a relação do governo com o seu maior aliado é honesta e transparente.

— ( Temer) tem sido muito correto com a presidente Dilma, muito leal e tem trabalhado muito para a construção de um ambiente político para que o Brasil supere as dificuldades e que a gente volte a fazer a economia crescer o mais rapidamente possível — afirmou Edinho.

Dos sete ministros do PMDB, não compareceram Katia Abreu ( Agricultura), Eduardo Braga ( Minas e Energia), Henrique Eduardo Alves ( Turismo), Eliseu Padilha ( Aviação Civil), Mangabeira Unger ( Secretaria de Assuntos Estratégicos) e Edinho Araújo ( Portos). Também não estavam presentes os presidentes da Câmara, Eduardo Cunha ( PMDB- RJ), e do Senado, Renan Calheiros ( PMDB- AL).

“Clima bom para melhorar”
Jaques Wagner foi ainda mais longe na defesa da relação com o PMDB. Tentando cumprir o papel de bombeiro, o ministro saiu em defesa até da afirmação feita por Temer no fim da semana passada de que seria difícil Dilma resistir a mais três anos de governo com uma popularidade tão baixa.

— Pessoalmente, não tenho constrangimento e continuo assinando embaixo das declarações dele. (...) As pessoas quiseram dar conotação diferente. A fala dele foi o óbvio. Se alguém lhe pergunta: é tranquilo ter 7%. 8% de popularidade? Não, não é — disse o ministro, acrescentando:

— É óbvio que nós, todas as pessoas que estão no governo, estamos trabalhando para que a popularidade e a aceitação do governo cresça. Ninguém acha bom ter 7%,8%, 9% ( de popularidade). Tenho certeza de que dá para terminar ( o governo), porque já, já a gente começa o processo de recuperação.

Ao ser perguntado como estava o clima entre o PMDB e o governo, o ministro brincou:

— Acho que ( o clima) está bom para melhorar.

Presidente aproxima-se de pemedebista do Rio

Por Raphael Di Cunto e Thiago Resende - Valor Econômico

BRASÍLIA - Com a saída do vice-presidente Michel Temer (PMDB) da articulação política, a presidente Dilma Rousseff utilizou a proximidade com o governador do Rio de Janeiro, Luiz Fernando Pezão (PMDB), para abrir um canal direto de interlocução com os deputados do PMDB - e que passa à margem do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), seu desafeto.

Segundo o Valor apurou, Dilma reuniu-se com o líder do PMDB, Leonardo Picciani (RJ), duas vezes desde a volta do recesso, conversou com o pemedebista por telefone sobre a CPMF (que ele foi um dos poucos no partido a defender na semana passada), o envio do Orçamento com déficit e prometeu atender as demandas da bancada pessoalmente.

A interlocução foi intermediada por Pezão em meados de agosto, logo depois da Procuradoria-Geral da República denunciar Cunha ao Supremo Tribunal Federal (STF) e Temer avisar que deixaria a articulação política. Apoiador de Aécio Neves (PSDB) na eleição presidencial de 2014, Picciani jantou com Dilma há duas semanas, que destacou o assessor especial Giles Azevedo para ouvir as insatisfações da sigla.

"No caso do PMDB eu que vou resolver", teria dito a presidente, segundo contou o líder a quatro deputados ouvidos pelo Valor.

Até agora as conversas não deram resultado prático para os deputados da legenda e os cargos e emendas continuam travados, mas os dois encontros serviram para fomentar comentários de traição a Cunha, que lhe ajudou na eleição para a liderança do partido. A bancada se divide entre a versão de que os gestos do líder são de afastamento do presidente da Câmara e a de que Picciani busca se fortalecer como interlocutor, sem ter que passar por Cunha ou Temer.

Os adversários do líder citam dois pontos de divergência com Cunha logo após as conversas com Dilma: a pedido de Temer, Picciani votou por adiar por um dia a análise de uma proposta de emenda constitucional (PEC) que o presidente da Casa queria aprovar naquele dia, e passou - ao lado de Pezão - a defender a CPMF criticada por Cunha e Temer.

Aos pemedebistas que o questionaram, o líder negou desentendimentos com o presidente da Câmara, com o vice-presidente ou com o ministro Eliseu Padilha, responsável pela interlocução com o Congresso. Cunha, sustenta Picciani, encontrou com Dilma pouco tempo depois para falar do Orçamento e Temer e Padilha "são experientes o suficiente" para entenderem que o líder da bancada pode falar diretamente com a presidente da República.

Aliados do líder lembram que ele foi eleito em fevereiro por apenas um voto para comandar a bancada, depois de uma disputa acirrada com os parlamentares do Nordeste e Sul do país, e que precisa atender aos pedidos dos colegas para se sustentar nesta posição no próximo ano ou sonhar com pretensões maiores na Câmara.

Uma das principais queixas é a demora para indicar os cargos. "O segundo mandato já tem nove meses e até agora não concluíram as nomeações. É um processo que precisa ter fim, ou não termina a instabilidade no Congresso", reclama um pemedebista. A reforma ministerial só tende a agravar este quadro, afirma, com mudanças nos ministérios.

O PMDB da Câmara não se sente representado na Esplanada. Padilha, titular da Aviação Civil, e o ministro dos Portos, Edinho Araújo (PMDB-SP), são mais próximos de Temer. E o único que teve aval da bancada foi o ex-presidente da Câmara Henrique Eduardo Alves (PMDB), que mantém bom relacionamento com os correligionários, mas está engessado com o corte de 80% em seu orçamento.

Dos três, a bancada não tem dúvidas de quem rifar na reforma: Edinho Araújo. Deputado licenciado, ele teria arbitrado quase todas as decisões sobre os cargos da Pasta em favor do PMDB do Senado, que ficou com a presidência das docas do Ceará, Pará e Espírito Santo, em detrimento de indicações dos deputados.

Araújo, reclamam os pemedebistas, também disse que não mudaria os principais postos do ministério e não autorizou nenhuma indicação para as secretarias - teria ignorado até o pedido do deputado Baleia Rossi, presidente do PMDB de São Paulo, ao qual o ministro é filiado. Os deputados receberam apenas a presidência das Docas do Rio de Janeiro - Estado de Picciani e Cunha. "Se o Edinho sair na reforma ministerial já vai tarde", diz um deputado.

Campanha de Dilma é o alvo, dizem tucanos

• Para Aécio e Alckmin, investigação sobre ex-tesoureiro alça financiamento da reeleição da petista ao centro da Lava Jato

• Governador paulista diz que gestão petista não é 'a solução, mas o início da crise' e defende investigação 'rápida'

Daniela Lima – Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - Dois dos principais expoentes nacionais do PSDB disseram nesta segunda-feira (7) que a campanha da presidente Dilma Rousseff (PT) à reeleição em 2014 se tornou um alvo da Operação Lavo Jato, agora que o ex-tesoureiro e atual ministro Edinho Silva (Comunicação Social) passou a ser investigado no caso.

Para o senador Aécio Neves (PSDB-MG), "o pedido de investigação" de Edinho é, "na verdade, a apuração do financiamento da campanha da presidente da República".

"Não apenas as oposições, mas a sociedade aguarda que, em face às reiteradas graves denúncias de utilização de propina na campanha da presidente, as investigações ocorram. Até para que ela possa se defender", disse.

"A lei foi feita para ser cumprida por todos, em especial por quem deveria dar o exemplo", afirmou Aécio, em nota enviada à Folha.

O mesmo tom foi adotado pelo governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, que falou sobre as investigações após o desfile de 7 de Setembro na capital paulista.

Alckmin usou a data como deixa para afirmar que "a República não aceita rapinagem e não aceita mentira". Questionado pelos jornalistas se o fato de o STF (Supremo Tribunal Federal) ter autorizado a investigação de Edinho Silva e do ministro da Casa Civil, Aloizio Mercadante, implicava a campanha de Dilma na Lava Jato, ele concordou.

"Entendo que sim. O que eu tenho defendido é investigar, de maneira profunda, seriamente, rapidamente", respondeu, para logo em seguida acrescentar: "E, depois, cumprir a Constituição".

Além de Edinho e Mercadante, o STF também autorizou a abertura de inquérito sobre o senador tucano Aloysio Nunes (SP), sob a suspeita de que teria recebido recursos desviados da Petrobras em sua campanha em 2010.

Assim como Aécio, Alckmin defendeu o correligionário: "Investigação é para todos, mas ele já se defendeu. Não faz nenhum sentido que um dos líderes da oposição tivesse ascendência sobre os negócios da Petrobras".

O governador fez críticas à condução do país, na política e na economia, e afirmou que o governo "é o início e não a solução para a crise".

Sem citar o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, Alckmin avaliou que "não tem política monetária e política cambial que funcione com uma política fiscal errada". "É o momento de grandes reformas e de se repensar o Estado, que não cabe no PIB". Alckmin tem subido o tom de suas críticas ao PT com o objetivo de se firmar como alternativa para os tucanos na próxima eleição presidencial.

Num momento em que figuras influentes do Congresso trabalham pelo impeachment de Dilma, que abriria caminho para um governo sob liderança do vice-presidente Michel Temer (PMDB), Alckmin foi cauteloso. Disse que o vice tem "todas as qualificações", mas ressaltou que a crise é "governista" e demanda "reformas estruturais".

Cardozo diz ter 'absoluta certeza' que ministros petistas não serão denunciados

• 'Conheço os dois há muitos anos e minha convicção é de que jamais se envolveriam em qualquer tipo de ato ilícito', afirmou o ministro da Justiça em relação a Edinho Silva e Aloizio Mercadante

Beatriz Bulla, Carla Araújo, Gustavo Porto e Tânia Monteiro - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Chefe da Polícia Federal, o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, disse nesta segunda-feira, 7, ter "absoluta certeza" de que os ministros da Comunicação Social, Edinho Silva, e da Casa Civil, Aloizio Mercadante, "não serão denunciados" pelas acusações do empreiteiro Ricardo Pessoa, que disse em delação premiada ter repassado dinheiro ilícito para os dois. "Conheço os dois há muitos anos e minha convicção é de que jamais se envolveriam em qualquer tipo de ato ilícito", completou. O ministro da Justiça disse ter conversado rapidamente com a presidente Dilma sobre o assunto e tem posição que expressa "a de todos".

Questionado se devem permanecer no governo mesmo após o pedido da procuradoria-geral da República para que sejam investigados, Cardozo afirmou que ainda não há condenação e que não cabe "prejulgamento". "A presidente é quem decide a composição de seu ministério a qualquer tempo, então não cabe a ministro fazer juízo de valor sobre isso. O que posso afirmar é que não há indicador objetivo que leve à condenação ou ao prejulgamento de ninguém", disse o ministro, ao deixar o desfile em comemoração ao 7 de setembro, na Esplanada dos Ministérios.

Nesta segunda, com um discurso afinado com Cardozo e com outros colegas, o ministro da Defesa, Jaques Wagner, afirmou que as investigações contra Edinho e Mercadante não constrangem o governo, mas afirmou que caso eles sejam de fato denunciados a situação pode mudar. "Não tem prejulgamento, então não há constrangimento", disse. "Vamos esperar a investigação. Se fosse uma denúncia seria diferente", disse. Questionado se caso os ministros forem denunciados, ele seria a favor do afastamento, Vagner afirmou que "se eles forem denunciados é outra questão, por enquanto vamos ficar na investigação", reforçou.

A mesma opinião foi compartilhada pelo ministro das Comunicações, Ricardo Berzoini, que disse não ver nenhuma hipótese de os dois deixarem o governo. "Temos confiança total nos dois ministros. Eles são plenamente corretos. Essa é uma investigação. Não é uma denúncia", declarou o ministro, ao lembrar que os fatos "serão esclarecidos". "Todo esse momento deve ser encarado com tranquilidade, objetividade e dando direito deles se defenderem", acrescentou o ministro.

No início de seu primeiro mandato, Dilma realizou o que ficou conhecido como "faxina ministerial" ao afastar ministros suspeitos de envolvimento em irregularidades como o então comandante da Casa Civil, Antonio Palocci. Na época, Palocci era responsável pela articulação política do Palácio do Planalto, mas não suportou a onda de denúncias sobre seu patrimônio pessoal e pediu demissão, alegando que assim sua permanência prejudicaria a 'continuidade do debate político'. No seu lugar, assumiu Gleisi Hoffmann.

Além da investigação que recai sobre Edinho, com base em doações eleitorais para a campanha de 2010, a PGR solicitou apurações sobre campanhas presidenciais do PT dos anos de 2010 e 2006, também mencionadas por Pessoa.

Os casos foram encaminhados à Justiça Federal do Paraná, pois os nomes citados pelo delator não possuem foro privilegiado perante o STF. Cardozo destacou que o Ministério Público quer investigar "várias situações, não só do PT, mas também da oposição". A PGR também pediu para investigar o senador Aloysio Nunes (PSDB-SP), com base nos depoimentos do dono da UTC. Todas as investigações são mantidas em absoluto sigilo.

Alckmin: campanha de Dilma no centro da Lava- Jato

• Tucano defende Aloysio Nunes e afirma que crise é culpa do governo

Tiago Dantas - O Globo

- SÃO PAULO- A abertura de investigações contra os ministros petistas Edinho Silva e Aloizio Mercadante colocaram a campanha da presidente Dilma Rousseff no centro da Operação Lava- Jato, segundo o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin ( PSDB).

Após acompanhar o desfile de 7 de Setembro, ontem, na capital paulista, o governador de São Paulo subiu o tom das críticas ao governo federal. Alckmin disse que a República não aceita “rapinagem”, “mentira” nem aumento da desigualdade e do desemprego. Ele colocou no governo a culpa pela crise econômica e criticou o ajuste fiscal.

Ao ser perguntado se a abertura das investigações contra Edinho e Mercadante leva a campanha da presidente Dilma para o centro das investigações da Lava- Jato, Alckmin respondeu que sim:

— Entendo que sim. É investigar de maneira profunda, seriamente, rapidamente e, depois, cumprir a Constituição.

Quando a pergunta foi sobre o inquérito contra Aloysio, Alckmin afir mou que não tem como alguém da oposição ter influência sobre a Petrobras:

— Todos são iguais perante a lei. Ele ( Aloysio) já se defendeu, e não tem nenhum sentido um dos principais líderes da oposição ter ascendência sobre a Petrobras ou o governo.

“Falência política”
Alckmin declarou, ainda, que a crise que o país atravessa mostra a “falência da política” e defendeu reformas no sistema político brasileiro, que, em sua opinião “está totalmente esgotado”. Por outro lado, disse estar animado com o fato de que o país esteja investigando crimes de colarinho branco:

— Há uma enorme de uma insatisfação, uma crise gravíssima, porque é uma “policrise”: você tem uma crise ética, econômica, política.

Ao ser questionado se Michel Temer ( PMDB) ser ia uma opção para reunificar o país, Alckmin declarou que o vice- presidente “tem todas as qualificações”, mas lembrou que, em sua opinião, a crise é governista e também estrutural:

— Uma grande crise econômica, ocasionada pelo governo, onde o governo não é a solução. Ele é o início da crise.

Dilma tira poderes de comandantes militares

• Decreto transfere ao ministro da Defesa competência sobre atos relativos a pessoal, como reforma de oficiais

Tânia Monteiro - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Como se já não bastassem as crises política e econômica que atingem o governo, o Palácio do Planalto, agora, resolveu criar problemas com a área militar. Na quinta-feira da semana passada, a presidente Dilma Rousseff assinou decreto 8.515, que estava na gaveta da Casa Civil há mais de três anos, tirando poderes dos comandantes militares e delegando ao ministro da Defesa competência para assinar atos relativos a pessoal militar, como transferência para a reserva remunerada de oficiais superiores, intermediários e subalternos, reforma de oficiais da ativa e da reserva, promoção aos postos de oficiais superiores e até nomeação de capelães militares, entre outros.

Hoje, estes atos são assinados pelos comandantes militares. A medida foi recebida com "surpresa", "estranheza" e "desconfiança" pela cúpula militar, que não foi informada que ela seria assinada pela presidente e publicada no Diário Oficial de sexta-feira.

A responsabilidade pela decisão de o decreto ter saído do fundo da gaveta para o DO estava sendo considerada um mistério. No final do dia, no entanto, a Casa Civil informou que o envio do decreto à presidente atendeu a uma solicitação da Secretaria-geral do Ministério da Defesa, comandada pela petista Eva Maria Chiavon. Mas todos ainda buscam explicações claras sobre o que realmente aconteceu neste processo.

O comandante da Marinha, almirante Eduardo Bacellar Leal Ferreira, que estava ocupando o cargo de ministro interino da Defesa, e que viu seu nome publicado no DO endossando o decreto, disse que não sabia da existência dele. "O decreto não passou por mim. Meu nome apareceu só porque eu era ministro da Defesa interino. Não era do meu conhecimento", resumiu o comandante, ao deixar o desfile de 7 de setembro, sem querer polemizar sobre o seu teor.

O ministro da Defesa, Jaques Wagner, que estava na China quando o decreto foi editado, também demonstrou surpresa com a publicação durante sua ausência do País. "Posso assegurar que não há nenhum interesse da presidente Dilma tirar poderes naturais e originais dos comandantes", afirmou ao Estado. "Ainda não estudei o decreto, mas ele visa normatizar as prerrogativas de cada instância com a criação do Ministério da Defesa e não tirar o que é da instância dos comandantes", justificou. Wagner lembrou que o decreto só entra em vigor em 14 dias e que, portanto, "qualquer erro ainda pode ser corrigido". O texto fala ainda que a competência prevista nos incisos do decreto podem ser subdelegadas pelo ministro da Defesa aos comandantes.

Os militares se mostraram bastante "incomodados" com o ocorrido.

O decreto gerou "uma histeria geral", pela maneira como foi feita a publicação, sem que a cúpula militar fosse sequer avisada. "Há uma preocupação de que este decreto, que estava dormindo há anos, foi resgatado por algum radical do mal ou oportunista, com intuito de criar problema", observou um oficial-general consultado pelo Estado, ao lembrar que a publicação do texto agora, foi "absolutamente desnecessária".

Outro militar observou que "faltou habilidade política de quem tirou o decreto da cartola, em um momento em que o governo já enfrenta tantas dificuldades, criando uma nova aresta, pela forma como foi feita". Este mesmo militar comentou que, mesmo o ministro da Defesa podendo delegar aos comandantes os poderes previstos no decreto, a medida é uma retirada de atribuição dos chefes das três forças e que, no mínimo, a boa regra de relacionamento, ensina que você avise a quem será atingido. O decreto anterior dizia que os ministros do Exército, da Marinha e da Aeronáutica eram os responsáveis pela edição de atos relativos ao pessoal militar. A delegação continuou com os comandantes, mesmo depois da criação do Ministério da Defesa, há 16 anos.

Governo cogita subir imposto por decreto

• Sem CPMF, equipe econômica estuda aumento de tributos que não dependem do Congresso, como Cide, IPI e IOF, para cobrir rombo

Adriana Fernandes - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Diante da dificuldade de fechar as contas de 2016 sem a recriação da CPMF, a área econômica do governo já admite a possibilidade de recorrer à elevação das alíquotas de tributos que não precisam de aprovação do Congresso para tentar reduzir o rombo no Orçamento da União. Estão nessa lista a Cide, incidente sobre combustíveis; o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI); e o sobre Operações Financeiras (IOF).

Esses tributos dependem apenas da “caneta” do Executivo e são usados como instrumento regulatório de política econômica para enfrentar determinadas situações conjunturais da economia. Nenhum aumento precisaria de aprovação de deputados e senadores – basta um decreto presidencial para a entrada em vigor.

Há consenso no governo sobre a necessidade de elevação da carga tributária. Caberá à presidente Dilma Rousseff decidir sobre o tributo com menor efeito colateral na economia ou um “mix” de alta das alíquotas de todos eles.

Os estudos mais avançados no Ministério da Fazenda são o que envolvem a alta da Cide-Combustíveis, segundo fontes. Um aumento dos atuais R$ 0,22 por litro para algo em torno de R$ 0,60 representaria uma arrecadação extra para a União de cerca de R$ 12 bilhões. O aumento menor para R$ 0,40 é outra opção em estudo. A dificuldade para a Fazenda é calibrar a alíquota sem fazer um estrago gigantesco na inflação.

Uma fonte da equipe econômica reconheceu ao Broadcast, da Agência Estado, que nenhum dos tributos que podem ser elevados pela presidente tem capacidade de garantir sozinho uma arrecadação em torno de R$ 64 bilhões. Esse é o tamanho do rombo que o governo precisa cobrir no Orçamento de 2016 para fechar as contas com superávit de R$ 34,4 bilhões e, somando-se ao resultado previsto de Estados e municípios de R$ 9,4 bilhões, fechar o ano dentro da meta de 0,7% do PIB.

A defesa do cumprimento da meta de 0,7% foi assumida pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy, e pelo presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, nas reuniões internas do G-20, na Turquia. Um recuo nesse compromisso comprometerá de vez a permanência de Levy no cargo. O governo tem um mês para enviar ao Congresso um adendo à proposta de Orçamento.

IR. Ainda assim, o governo dependerá de mudanças que terão de ser feitas pelo Congresso para fechar as contas. Uma das propostas em estudo é a criação de uma alíquota mais alta do Imposto de Renda da Pessoa Física para os mais ricos. Hoje, o índice máximo é de 27,5%. Cálculos indicam que uma nova faixa de cobrança, em 35% dos rendimentos, traria mais R$ 7 bilhões à União. Também se estudam a tributação de lucros e dividendos recebidos de empresas e o fim do benefício de Juros de Capital Próprio para grandes empresas.

O espaço de cortes de despesas no curto prazo permanece muito restrito. Nas despesas discricionárias (não obrigatórias), o máximo que poderá ser cortado é de cerca de R$ 2 bilhões, mesmo assim com grande prejuízo para a administração da máquina e dos programas de governo. A previsão de R$ 250,4 bilhões de despesas discricionárias incluída no Orçamento de 2016 é em nível semelhante ao que foi pago em 2012.

Mercado projeta inflação de 9,29% e retração de 2,44% no PIB em 2015

• Segundo o boletim Focus do Banco Central, mercado está mais pessimista com o País; expectativa é de mais inflação e retração maior da economia brasileira tanto em 2015 como no próximo ano

Célia Froufe - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - O mercado está mais pessimista com o Brasil, com previsão de mais inflação e retração maior da economia tanto em 2015 como em 2016, de acordo com dados do boletim Focus do Banco Central, divulgado nesta terça-feira.

Ainda em reação à divulgação dos dados oficiais sobre o Produto Interno Bruto (PIB), a mediana das previsões de analistas do mercado financeiro no relatório Focus voltaram a mostrar piora.

De acordo com o documento, fruto de pesquisa com instituições financeiras, a perspectiva de retração da economia este ano passou de 2,26% para 2,44% - um mês antes estava em queda de 1,97%. Para 2016, a mediana das previsões passou de -0,40% para -0,50% ante estabilidade de quatro semanas atrás.

No caso da inflação de 2015, depois de duas semanas de queda das previsões no boletim Focus, a mediana para esse indicador passou de 9,28% para 9,29%. Há quatro semanas, estava em 9,32%. Nos cálculos de junho, o BC havia apresentado estimativa de 9% no cenário de referência e de 9,1% usando os parâmetros de mercado. Na última ata do Copom, porém, o BC informou que suas projeções para 2015 também subiram mais. Uma atualização deste documento será divulgada depois de amanhã, quinta-feira.

Segundo o IBGE, o PIB brasileiro caiu 2,6% no segundo trimestre deste ano na comparação com o primeiro e 1,9% ante o mesmo período de 2014. O BC, apesar de também ter revisado para pior sua projeção para este ano, de queda de 0,6% para retração de 1,1%, segue mais otimista que o mercado. No Relatório Trimestral de Inflação de junho, a instituição informou que a mudança ocorreu em função de piora nas perspectivas para a indústria, cuja expectativa de PIB recuou de -2,3% para -3,0%. Uma nova edição do documento será apresentada no fim deste mês.

No boletim Focus desta terça-feira, a projeção para a produção industrial também mostrou piora significativa: saiu de uma baixa de 5,57% para um recuo de 6,00%. Já para 2016, a mediana das estimativas foi reduzida de uma alta de 0,89% para +0,72%. Há quatro semanas, as medianas destas previsões eram de, respectivamente, -5,21% e +1,15%.

Para a relação entre a dívida líquida do setor público e o PIB, a projeção dos analistas também passou por ajustes. Para 2015, caiu de 36,20% para 36,15% de uma semana para outra - a mediana estava em 36,20% há quatro edições da Focus. Para 2016, a taxa saiu de 38,60% para 38,90%. Há quatro semanas, estava em 38,50%.

Inflação. Pela quinta semana consecutiva, a mediana das projeções para o IPCA do ano que vem, justamente onde está o foco de atuação do Banco Central neste momento, apresentou elevação. A taxa subiu de 5,51% para 5,58% - há um mês, estava em 5,43%. Neste fim de semana, o presidente do BC, Alexandre Tombini, falou que, apesar do dólar e dos preços administrados, a instituição vem conseguindo ancorar as expectativas.

O BC promete levar a inflação para a meta de 4,5% no fim do ano que vem, mas recentemente, a autarquia vem chamando a atenção para "novos riscos" que surgiram para o comportamento dos preços. Pelos cálculos da instituição revelados no Relatório Trimestral de Inflação (RTI) de junho, o IPCA ficará em 4,8% em 2016 no cenário de referência e em 5,1% no de mercado. Uma nova edição desse documento será divulgada no fim deste mês.

No caso da inflação de 2015, a mediana para o indicador passou de 9,28% para 9,29%. Já no Top 5, grupo dos economistas que mais acertam as estimativas, o BC sentiu algum alento. A mediana para o IPCA de 2015 permaneceu em 9,41%, abaixo da projeção de um mês atrás, quando estava em 9,53%. No caso de 2016, o movimento foi mais evidente: a previsão desse grupo caiu de 5,40% para 5,28%. Quatro semanas antes estava em 5,42%.

Para a inflação de curto prazo, a projeção para este mês permaneceu em 0,25%. Um mês antes estava em 0,30%. No caso de setembro, porém, a taxa esperada passou de 0,37% para 0,39% - estava em 0,40% quatro semanas atrás. As expectativas para a inflação suavizada 12 meses à frente permaneceram inalteradas na pesquisa Focus de hoje, em 5,65%. Há quatro semanas, estavam em 5,59%.

Câmbio. Com alta de 45% neste ano, as projeções para o dólar dispararam no Relatório de Mercado Focus. Para 2015, a mediana das estimativas subiu de R$ 3,50 para R$ 3,60. Há quatro semanas, o ponto central da pesquisa estava em R$ 3,40. Para o próximo ano, a mediana para o câmbio ao final do período também subiu de forma significativa, passando de R$ 3,60 para R$ 3,70 agora. Há quatro edições do Focus a taxa era de R$ 3,50.

Estas projeções do mercado foram atualizadas antes de o BC anunciar um novo leilão de linha, para esta terça-feira, com recursos novos para o mercado. Serão ofertados, de acordo com a instituição, R$ 3 bilhões. Esta ação do BC se soma à retomada da rolagem integral dos contratos de swap cambial, e de um anúncio de rolagem uma semana atrás dos leilões de linha. Na Turquia, o presidente do BC, Alexandre Tombini, disse apenas que a instituição concluiu pela necessidade de leilões de linha neste momento.

Selic. Logo depois da decisão do Comitê de Política Monetária (Copom) demanter os juros em 14,25% ao ano, as previsões do mercado financeiro para a Selic seguiram inalteradas no Relatório de Mercado Focus. Para este ano, as expectativas ficaram congeladas em 14,25% ao ano pela sexta semana seguida. Com isso, a mediana para a Selic média de 2015 também se manteve em 13,63% pela sexta edição consecutiva.

Para 2016, o documento trouxe estabilidade da mediana das previsões em 12,00% ao ano, patamar aguardado há um mês no mesmo documento. A Selic média do ano que vem seguiu em 13,06% - estava em 13,16% quatro semanas atrás.

Entre os economistas que mais acertam as projeções para o rumo da taxa básica de juros, o grupo Top 5 no médio prazo, não houve mudanças: a Selic deve encerrar 2015 em 14,25% - previsão apontada já há 11 semanas e a mediana das previsões permaneceu em 12,13% ao ano pela quarta semana consecutiva para 2016, o que denota uma divisão de opinião entre os componentes desse grupo entre um encerramento em 12,00% ou 12,25% no fechamento de ano.

Para economista, crise pode destruir duas décadas de avanço

• André Lara Rezende, um dos pais do Plano Real, alerta em livro para urgência de se repensar
o papel do Estado e pede “desenvolvimento com qualidade de vida e cidadania”

Por Sonia Racy – O Estado de S. Paulo

Não é o crescimento em alto ritmo, em si, mas a estabilidade, com regras adequadas, que pode conduzir um país ao desenvolvimento. Receitas inspiradas no “Consenso de Washington” ou no “neodesenvolvimento estatal” não resolvem. O que pode ser útil, na atual situação brasileira, é um “reformismo modernizador” – que passa, sim, pelo Estado, pela Previdência, pelos tributos. E no mundo de hoje qualidade de vida não depende mais, necessariamente, de crescimento material. O desenvolvimento tem de incluir “a valorização da cidadania e do espírito público”.
É de ideias assim, entre tantas, que se compõem as 200 páginas deDevagar e Simples, o novo livro do economista André Lara Rezende, recém-lançado pela Cia. das Letras. Avesso a declarações definitivas sobre certos e errados de um mundo que não para de mudar, ele admite, nesta entrevista a Sonia Racy e Gabriel Manzano, que “não está claro quão longa e profunda será a crise brasileira, e muito menos como dela sairemos”. Mas deixa a advertência: “Tudo o que se avançou em duas décadas pode regredir se ela não for superada o quanto antes.”

De mudança para Nova York, onde será sênior visiting professor da School of International and Public Affairs da Universidade Columbia, o filho de Otto Lara Resende (e, talvez, seu maior admirador) André, carioca de 64 anos, ex-banqueiro, ex-integrante de governos brasileiros, está hoje voltado às letras e à reflexão.

O economista também gosta de disputar corridas de carro, está pedalando 240 quilômetros de bicicleta por semana e já praticou salto a cavalo. Um dos pais dos planos Cruzado e Real, ex-presidente do BC que também comandou o BNDES, Lara Rezende avisa: “Não gosto de falar de coisas já feitas e vividas. O que passou, passou. Não sou mais ator de nada”. O que lhe interessa – e ele o diz com ênfase – “é o que temos pela frente.”

Nos 13 capítulos do livro – uma compilação de textos publicados nos últimos 15 anos – seu olhar sobre a economia se entrelaça com história, sociologia e até ciência para, no conjunto, harmonizar uma visão de macroeconomia com um amplo quadro da sociedade e suas circunstâncias.
Muitos títulos dos ensaios falam por si. Como este: Não há lugar para velhos remédios. Ou ainda O otimismo cético: 15 anos de século 21. Há conceitos recorrentes – como o de que “é preciso repensar o papel do Estado”. E o olhar é sempre rigoroso. Ao abordar o medo de se assumir reformas, diz que o preço é “uma mediocridade cautelosa, uma política de pequenos curativos sucessivos, que é frustrante”.

Em um capítulo inédito, Em busca do heroísmo genuíno, Lara Rezende passeia o olhar pelos limites do conhecimento e da percepção, para afirmar: uma possível receita para a vida humana “é ter esperança, apesar de não se saber o que esperar”. Aqui vão os melhores momentos da “conversa” por e-mail. “Falo melhor escrevendo”, justifica. O economista não quis falar sobre a atual situação econômica ou dar receitas para se sair dela. Tampouco se dispôs a discorrer sobre política passada, atual ou futura.

Armínio Fraga e José Roberto Mendonça de Barros mencionaram o “fim de uma era” – ao falar sobre o papel do Estado e a atual crise brasileira. Concorda?

O fim de um ciclo parece mais correto. Um ciclo político, que teve início com o fim do regime militar, consolidou-se em torno de dois partidos, o PSDB e o PT, representantes de propostas alternativas para a condução do país, e com o PMDB, como o partido essencialmente sem proposta, pragmático, mas sem o qual é difícil governar.

Mendonça fala em um “modelo heterodoxo que fracassou espetacularmente”. Isso se deveria ao peso da ideologia na formação de muitos economistas?

Não me parece que classificar propostas de condução macroeconômica como ortodoxas ou heterodoxas ajude na compreensão dos problemas. Ao contrário, na maioria das vezes é uma simplificação esquemática para que se possa, preguiçosamente, tomar partido sem analisar. Classificar de forma caricatural é um artifício recorrente dos que professam crença ideológica. Ideologia e fé têm em comum o horror à análise racional dos fatos.

Que tipo de cenário tem em mente, diante da ideia, admitida por muitos estudiosos, de que nos próximos 12 meses o País vai piorar antes de melhorar?

É evidente que estamos numa crise séria, com dimensões políticas, econômicas e morais. Ainda não está claro quão longa e profunda será. Muito menos, como dela sairemos.

Em um dos artigos de seu livro, sobre as manifestações de junho, você elegeu a crise de representação e o projeto de Estado que não mais servia à sociedade como causas do mal-estar do País. Seu diagnóstico hoje é o mesmo? Ou a crise econômica, mais as Lava Jatos, pedaladas e panelaços tornaram o quadro mais grave?

As manifestações de meados de 2013 foram a expressão de um mal-estar, quando o País, ainda que aos trancos e barrancos, tinha progredido, superado a inflação crônica, conseguido avanço nos indicadores sociais e queria mais. Queria melhor qualidade de vida, mais mobilidade urbana, mais segurança, melhor educação e serviços públicos de qualidade. Queria também a melhora da representatividade política. Eleições livres são apenas um dos pilares da democracia representativa, mas para que a sociedade se sinta adequadamente representada o Estado e as instituições não podem ser patrimonialistas e arbitrários, criadores de dificuldades de toda ordem. Hoje, infelizmente, a situação é diferente, não progredimos, ao contrário, regredimos e muito. Estamos no início de uma recessão econômica que pode vir a ser profunda e da perspectiva de uma longa estagnação. Tudo o que se avançou nas últimas duas décadas pode regredir se a crise não for superada o quanto antes.

De que modo você compara os desafios de arrumar a economia hoje com os que viveu (com toda a equipe) em 1994, pré-Plano Real? Em termos de espaço político para propor soluções, dificuldades para criá-las, e força para impô-las?

Os ensaios do meu livro foram escritos nos últimos quinze anos, durante os quais meu objetivo foi tentar compreender e ajudar a compreender os desafios da economia, do Estado e da vida contemporânea. Para isso, tenho certeza, é preciso um distanciamento das pressões da conjuntura, de tudo aquilo que é a matéria-prima do dia a dia da política e do jornalismo. Embora eu considere a verdadeira ação política da mais alta relevância, não sou mais, nem tenho intenção de voltar a ser, ator – no sentido de quem participa diretamente – da vida política. Faltam-nos atores competentes. Assim como diagnosticou Ortega Y Gasset, em A Espanha Invertebrada, sobre a Espanha na primeira metade do século 20, também hoje no Brasil, há uma dramática falta dos “melhores” na política e na vida pública.

Na apresentação do livro, você junta três precondições para o Brasil de hoje: repensar o Estado, valorizar a vida pública e assumir o crescimento como um imperativo. Qual partido, ou qual força social levaria isso adiante hoje?

Repensar o Estado e valorizar a vida pública são duas questões essenciais no mundo contemporâneo. No Brasil, como em toda parte. Quanto ao crescimento, ao contrário, o que sustento é que é preciso deixar de considerar o crescimento econômico como um imperativo, como a solução de todos os problemas. A qualidade de vida, na grande maioria dos países, mesmo nos de renda média como o Brasil, não está mais necessariamente vinculada ao crescimento material. Não é a maior produção de automóveis que irá aumentar a qualidade de vida – para usar um exemplo gritante – mas sim a qualidade da segurança, da educação, da saúde e da mobilidade urbana.

Ainda em seu livro: em um mundo que respira alta tecnologia e muda a toda hora, “a democracia representativa e o próprio Estado-nação serão questionados e precisarão se adaptar”. No Brasil de hoje, acha que o poder e a sociedade estão se adaptando?

Aqui, como em toda parte, seremos todos obrigados a nos adaptar. A questão é saber se essa adaptação será inteligente e natural, ou traumática, imposta pela nova realidade.

Você define nos ensaios uma visão velha de mundo, marcada por nacionalismos, crescimento material, consumo supérfluo, embates ideológicos. Considera “possível que o modelo de representação democrática constituído há mais de dois séculos, para sociedades menores e mais homogêneas, tenha deixado de cumprir o seu papel e precise ser revisto”. O que imagina que se poderia pôr no lugar? Tem esperança de que o mundo, em 2050, esteja melhor?

A menos que venhamos a passar por algum grande cataclismo, ou um novo e agora verdadeiramente mundial conflito armado, o mundo será cada vez mais integrado pela tecnologia da comunicação. O mundo da internet é globalizado, mais do que nunca, um mundo de massas. Os Estados nacionais e a democracia representativa precisam ser repensados e revistos para não ficarem definitivamente anacrônicos.

Em um de seus textos, Em busca do heroísmo genuíno, você repensa os últimos 500 anos do Ocidente e afirma que uma possível receita de vida para os homens “é ter esperança, apesar de não saber o que esperar”. Quanto pesa, nessa percepção, o fato de vivermos em um planeta cujo clima vai piorar e onde os recursos têm prazo de validade?

Em busca do heroísmo genuíno é um texto diferente, por ser mais filosófico. É uma reflexão pessoal, que procura sintetizar as ideias de muitos autores que li, ao longo de muitas décadas, sobre a questão primeira, que é a dos valores e dos objetivos na vida. Não se pode dele nada inferir sobre otimismo ou pessimismo, especialmente sobre a sociedade e a humanidade. São reflexões sobre o caminho individual de cada um de nós, um caminho que não pode ser delegado, que deve ser necessariamente percorrido só consigo mesmo.

O que quis dizer ao sentenciar que o planeta chegou ao seu limite? Como o mundo deve proceder em relação a esse tema? E o Brasil em particular?

Não tenho a pretensão de sentenciar nada. Parece-me evidente – pois não exige mais do que alguns minutos de análise dos dados – que não poderemos continuar a crescer e utilizar os recursos escassos, como fizemos nos últimos séculos, sem esbarrar nos limites físicos do planeta. Simplesmente isso.