segunda-feira, 29 de dezembro de 2014

Opinião do dia - Zander Navarro

Na história do campo petista, as relações entre os religiosos, os intelectuais e os sindicalistas produziram a vitória inconteste dos últimos. Como estão amarrados ao presente, o PT jamais poderá ser de esquerda, pois esse é ideário que supõe o porvir. Por isso, o desenvolvimento do campo petista, desde meados dos anos 90, nada tem de distinto, se comparado com os demais partidos. E nem terá no futuro. Por quê? É simples: o futuro é antevisto e antecipadamente construído com exercícios sistemáticos de reflexão sobre os fatos e a produção de cenários possíveis. O PT não faz mais esse esforço estratégico há quase 20 anos nem tem mais quadros técnicos à disposição para essa operação. Rendeu-se à razão pragmática do presente, e por isso nada tem de inovador a propor, recorrendo, cada vez mais, à empulhação para justificar-se.

Não obstante a complexidade da tarefa, não é difícil, portanto, de prever o futuro do PT. Será o mesmo dos demais partidos, imersos na mesmice mistificadora que todos já conhecem. Desta forma, a pergunta passa a ser outra: algum outro campo político reavivará as esperanças dos brasileiros?

Zander Navarro é sociólogo e professor aposentado da UFRGS (Porto Alegre). O futuro do PT. O Estado de S. Paulo, 28 de dezembro de 2014.

'Tarifaço' apertará famílias em janeiro

• Dependendo da renda e da cesta de consumo, aumento de custo em SP pode chegar a 10%, segundo professor

• Luz, água e transporte mais caros se somam, no começo deste ano, aos usuais desembolsos com escola e tributos

Joana Cunha – Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - O consultor de TI Felipe Frederigh, 36, e sua mulher, a arquiteta Taianna Sant"Ana, 36, já apontam o lápis para as contas de início de ano.

Só na última semana foram anunciados aumentos de energia elétrica, água e transporte público em São Paulo, valendo a partir de janeiro.

Os aumentos vão agravar o tradicional aperto de começo de ano, que traz IPTU, IPVA e material escolar.

Além disso, as perspectivas são que a inflação siga pressionada em 2015.

Para o orçamento de Felipe, uma das piores notícias é o aumento da gasolina: ele vai trabalhar de carro e usa o veículo para levar à escola os filhos Teodoro, 5, e Maria Carolina, 9. Mas a alta do ônibus encarecerá o transporte da doméstica.

A educação dos filhos, item de maior peso no orçamento da família, vai ser reajustada. "Trocamos a Maria Carolina de escola. Nem foi por causa do preço. Mas vamos aproveitar que essa nova escola é um pouco mais barata e usar a diferença para ajudar no curso de inglês", diz Taianna.

O gasto frequente com veterinário devido a uma doença crônica de Tom, o gato de estimação, também será equacionado. "Estou pensando em tirar do veterinário particular e levar a uma clínica de universidade pública."

A economia de água não será tão difícil de atingir, segundo Felipe, porque a família já aprendeu a evitar desperdícios. "Mas a economia de energia é algo que a gente ainda não começou a praticar. Vamos esperar ao longo do ano para entender melhor o impacto desses aumentos."

Em uma simulação realizada pelo professor da FGV e colunista da Folha Samy Dana, um paulistano que tem renda líquida de R$ 7.000 e gastos mensais de R$ 800 com gasolina, R$ 300 de energia, R$ 70 de transporte público, R$ 150 de água e R$ 2.000 em matrículas escolares terá um impacto adicional de quase 7,3% em seu orçamento a partir das próximas semanas, quando os reajustes entrarem em vigor.

Se a renda mensal for de cerca de R$ 5.000, o reflexo inflacionário no bolso sobe para 10%.

O impacto varia conforme a renda e a cesta de consumo, lembra a consultora financeira e colunista da Folha Marcia Dessen. "Cada família tem uma cesta de consumo, que pode ficar muito distante da média."

Dessen diz que, quando a inflação começa a corroer o poder de compra, as famílias têm duas reações: consumir menos ou fazer substituições por itens mais baratos, como trocar carne por frango.

Para Mauro Calil, especialista em investimentos do Banco Ourinvest, o ajuste no orçamento de cada família depende de suas prioridades.

Segundo Calil, principalmente nos três primeiros meses do ano, muitos paulistanos terão de abrir mão de gastos ligados a conforto e lazer.

"Também vai sobrar menos recurso para formar poupança, o que é muito importante em termos macroeconômicos", diz o consultor. "Isso, em última instância, acelera a inflação."

Energia sobe no dia 1°

• Alta, de R$ 3 por cada 100 kWh consumidos, reflete o início do sistema de bandeiras tarifárias na conta de luz

Mariana Mainenti – Brasil Econômico

BRASÍLIA - Antes mesmo dos pedidos de revisão extraordinária das tarifas de energia, as contas de luz já terão o primeiro aumento de 2015, com o início da vigência das bandeiras tarifárias. A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) confirmou, na sexta-feira, que o ano começará com a bandeira mais cara: a vermelha, que repassa ao consumidor parte do custo com a geração de energia térmica. Por outro lado, 2015 começa também com um alívio no caixa das distribuidoras, com o Preço de Liquidação das Diferenças (PLD, praticado no mercado livre de curto-prazo) no novo teto regulamentado pela Aneel: R$ 388,48, ou seja, 20% mais baixo do que o registrado na semana anterior.

"A bandeira tarifária para o mês de janeiro de 2015 é vermelha para os consumidores brasileiros — o que significa um acréscimo de R$ 3,00 a cada 100 quilowatts-hora (kWh) consumidos — exceto para os estados do Amazonas, Amapá e Roraima", anunciou a agência. Pelo sistema de bandeiras tarifárias, as cores verde, amarela e vermelha indicam se a energia custará mais ou menos em função das condições de geração de eletricidade, para os quatro subsistemas do Sistema Interligado Nacional (SIN): Norte, Nordeste, Sul e Sudeste/Centro-Oeste.

A bandeira vermelha indica condições mais caras de geração. Por isso, o acréscimo na conta é mais alto. Já a bandeira verde reflete condições favoráveis de geração de energia e a tarifa não sofre nenhum acréscimo. A amarela indica condições de geração menos favoráveis, requerendo adicional de R$1,50 para cada 100 quilowatts-hora (kWh) consumidos.

A bandeira vermelha sinaliza que, apesar do início das chuvas, o nível dos reservatórios ainda permanece baixo, sendo necessário o acionamento de termelétricas para suprir a demanda por energia do país. "A estação chuvosa, verificada desde o final de novembro, continua atuando em dezembro, de modo que a previsão das afluências para o mês de janeiro está na faixa de 90% da sua média histórica, que é cerca de 35% maior que a média de dezembro", afirmou a Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE), em comunicado, ao divulgar o PLD para a primeira semana de 2015.

Segundo a CCEE, esta elevação, que está prevista para acontecer progressivamente ao longo das próximas semanas, sobretudo no submercado Sudeste, reflete-se também na expectativa de recuperação dos reservatórios, fato que reduz o PLD. "Contudo, os níveis de armazenamento dos reservatórios se recuperam numa taxa ligeiramente abaixo do previsto na semana anterior, resultando em uma diferença de 470 MW médios abaixo do esperado", alertou.

Na opinião do consultor Alan Henn, da Thymos Energia, o PLD está mais baixo, com a mudança de metodologia regulamentada pela Aneel, mas é importante constatar que ele começará 2015 no teto permitido. "O PLD já bateu no teto logo no início do novo cálculo, o que significa que o teto baixou mas as térmicas estão operando. Na prática, isso significa que aumenta o encargo para o consumidor", afirmou Henn, ressaltando que os reservatórios chegaram a níveis tão baixos que é premente que se faça economia. "O ONS (Operador Nacional do Sistema Elétrico) tem que continuar despachando energia das térmicas, porque, se gastarmos água hoje, não teremos amanhã", destacou. "Se não chover o suficiente, teremos bandeira vermelha o ano inteiro", acrescentou.

O presidente da Associação Brasileira das Companhias de Energia Elétrica (ABCE), Alexei Vivan, avalia que as distribuidoras de energia ainda terão exposição ao mercado livre no primeiro semestre de 2015. "Enquanto as distribuidoras estiverem expostas, haverá influência na tarifa do consumidor final. Mas é um impacto menor", ponderou. "O regime de bandeiras tarifárias também vai impactar a conta de luz, mas tem um efeito positivo porque mostra à população a dificuldade que temos para gerar energia, levanto o consumidor a ter uma preocupação maior em economizar energia, porque está mais cara."

PT mobiliza militantes para posse de Dilma

• Partido espera levar 800 ônibus para Brasília; 4 mil agentes das Forças Armadas e policiais farão a segurança

Luiza Damé – O Globo

BRASÍLIA - O Palácio do Planalto conta com a vinda de pelo menos 800 ônibus de militantes do PT para a posse da presidente Dilma Rousseff, na próxima quinta-feira, o que representaria ao menos 32 mil pessoas na Esplanada dos Ministérios. O PT quer transformar a posse em um ato de apoio à presidente e, além de mobilizar os participantes nos estados, o partido está oferecendo em Brasília estrutura para hospedagem no Parque da Cidade e no Ginásio Nilson Nelson.

Para garantir a segurança do evento, um efetivo de quatro mil agentes das Forças Armadas, das Polícias Federal, Civil e Militar, dos Bombeiros e do Departamento de Trânsito do Distrito Federal vai trabalhar no evento. Para evitar tumultos, haverá barreiras de controle da população na Rodoviária do Plano Piloto, que dá acesso à área, observadores nos ministérios, além de helicópteros para monitorar à distância o movimento da multidão.

O esquema de segurança e o roteiro da posse foram testados ontem à tarde, no ensaio organizado pelo governo federal, pelas Forças Armadas, pelo Congresso e pelo Governo do DF. O coordenador do Escalão Avançado da Presidência, coronel Flávio Lucena, disse que a área de segurança está tomando providências para garantir a tranquilidade. O treinamento seguiu o roteiro a ser cumprido dia 1e de janeiro, mas com cerca de 30 minutos de atraso.

— A segurança da presidente é formada por diversos núcleos. Em eventos externos, a preocupação é maior, mas são tomadas providências para resguardar a integridade da presidente — disse.

O militar afirmou que as forças estão preparadas para a hipótese de haver manifestações contrárias à presidente. A única preocupação é não permitir atos de violência — os protestos pacíficos são livres.

— As manifestações democráticas são sempre bem-vindas. Nossa expectativa é baixa em relação a manifestações na posse, mas estaremos prontos para evitar violência — acrescentou o coronel.

Grades para evitar que pista seja invadida
Além dos efetivos de segurança, ao longo da Esplanada serão colocadas grades para evitar que a população invada a pista por onde circularão os carros da comitiva presidencial. O controle dos acessos ao local será feito pela PM, mas não haverá revista das pessoas, exceto dos que levarem bolsas grandes, instrumentos que possam ser usados como armas ou estiverem em situação suspeita.

O roteiro repassado ontem prevê que Dilma saia às 14h30m do Alvorada, em direção à Catedral de Brasília. Nesse trajeto a presidente gastará dez minutos. Em frente à Catedral, Dilma troca de carro e segue para o Congresso no Rolls-Royce presidencial. Ainda não está definido se sua filha, Paula Araújo, irá junto, como aconteceu em 2010. Se não estiver chovendo, o trajeto é feito com a capota aberta, e a presidente poderá acenar para o público.

Dilma sobe a rampa do Congresso, onde será recebida pelas lideranças parlamentares. Às 15h será aberta a sessão de posse no Parlamento. Na primeira fila do plenário estarão os ex-presidentes e parentes de Dilma e do vice Michel Temer. Em sessão presidida pelo senador Renan Calheiros (PMDB-AL), a presidente faz o juramento, assina o termo de compromisso e discursa. Na saída do Congresso, a ela recebe honras militares, com salva de 21 tiros de canhão. Segue para o Planalto, onde sobe a rampa e depois fala à nação. No parlatório, cumprimenta as autoridades estrangeiras, empossa os ministros e faz a foto oficial com a equipe. Às 18h30m, oferece um coquetel no Itamaraty. Entre os estrangeiros que confirmaram presença estão o vice-presidente dos EUA, Joe Biden, e os presidentes José Mujica (Uruguai) e Michelle Bachelet (Chile).

PT busca compensação a redução de ministérios

• Partido vê propostas como regulação da mídia, defendida por cotado para Comunicações, como troca por menor espaço no próximo mandato de Dilma

Débora Bergamasco - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA Na expectativa de ver o atual ministro da Secretaria de Relações Institucionais, Ricardo Berzoini, ser anunciado hoje como novo titular das Comunicações, o PT espera compensar a perda de espaço na equipe do segundo mandato da presidente Dilma Rousseff emplacando propostas que fazem parte da agenda do partido. A escolha de Berzoini, defensor público da regulação da mídia, é um desses casos - o ex-titular da pasta, Paulo Bernardo, não se engajou pela proposta como o partido esperava.

Por se tratar de medida polêmica, Berzoini pretende promover um debate amplo antes de elaborar uma proposta oficial. A ideia é discutir o assunto com representantes da sociedade civil e ganhar tempo até que o clima seja propício para enviar o projeto ao Congresso - o que deve ocorrer só depois do primeiro ano do novo mandato.

O modelo defendido por Berzoini assemelha-se ao adotado em Portugal e na Inglaterra. Haveria, por exemplo, um comitê para analisar pedidos de pessoa ou empresa que se sentissem ofendidas por uma reportagem. Seria possível obter direito de resposta ou multar o veículo, como ocorre no exterior. Hoje, é possível recorrer à Justiça para casos assim - as novas regras visariam dar agilidade ao processo.

Até terça-feira, estava sacramentado que Berzoini permaneceria em seu atual cargo ao longo da segunda gestão de Dilma. Mas, naquela noite, a presidente o chamou para conversar: estava "seriamente pensando na possibilidade de nomeá-lo chefe das Comunicações".

O ministro já havia demonstrado à presidente o desejo de comandar um ministério de gestão, em que pudesse desenvolver trabalhos com começo, meio e fim, distante do que vem fazendo na SRI. Respondeu que estaria disponível para qualquer que fosse a escolha dela.

Publicidade. Ao que tudo indica, ao contrário do que se cogitava, a pasta das Comunicações - que hoje controla ou exerce poder sobre Correios e Anatel - não vai incorporar a gestão de verbas publicitárias. A competência de administrar R$ 800 milhões de propaganda do governo, mais R$ 1,5 bilhão de publicidade das estatais, continuará a cargo da Secretaria de Comunicação da Presidência. Dilma não escolheu quem substituirá o ministro Thomas Traumann, que pediu para deixar a pasta por motivos pessoais.

Com PT insatisfeito, Dilma anuncia nomes

• Presidente deve aumentar hoje lista de ministros do segundo governo; correntes petistas reclamam espaço

Luiza Damé e Júnia Gama – O Globo

BRASÍLIA - A três dias de sua posse para um novo mandato, a presidente Dilma Rousseff deve anunciar hoje mais nomes que irão compor seu futuro Ministério. Dilma saiu de cena nos últimos dias e aproveitou o feriado prolongado para deixar decantarem os problemas surgidos nas negociações com o PT. Um dos principais motivos da formação da equipe não estar concluída ainda é a insatisfação da principal tendência da legenda, a Construindo um Novo Brasil (CNB), com as escolhas que Dilma sinalizou que irá fazer.

Integrantes da CNB têm manifestado nos bastidores contrariedade com a perda de espaço no novo desenho ministerial para uma ala petista de menor expressão. Eles já admitem, no entanto, que dificilmente poderão fazer a presidente mudar de opinião. A intenção da presidente é levar para o Palácio do Planalto dois petistas gaúchos, Pepe Vargas e Miguel Rossetto, ligados à Democracia Socialista (DS).

O mal-estar maior é com a escolha de Vargas para a Secretaria de Relações Institucionais (SRI), cargo estratégico na articulação política do governo com o Congresso. Em várias decisões do PT, a DS atua em conjunto com a segunda maior corrente petista, a Mensagem ao Partido, considerada mais crítica aos desmandos da cúpula do partido, inclusive tendo reconhecido a existência do mensalão. Além de acreditarem que Pepe não tem o perfil adequado para a vaga, a CNB vê a perda da SRI, até então ocupada por Ricardo Berzoini, como uma demonstração clara da desidratação de seu grupo no núcleo palaciano. Berzoini deverá ser confirmado no Ministério das Comunicações, para tocar a proposta de regulação da mídia, defendida por Dilma na campanha.

Um parlamentar da corrente interna Mensagem ao Partido — da qual fazem parte o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, e o governador do Rio Grande do Sul, Tarso Genro — acredita que as pressões no partido não devem provocar mudanças de última hora na composição que Dilma planeja fazer. E recomenda que os petistas da CNB, incluindo o ex-presidente Lula, evitem expressar contrariedades.

— É muito difícil enfrentar escolhas já feitas a essa altura do campeonato. E não acho que fazer uma reclamação vai alterar os rumos dessas escolhas. Melhor que os insatisfeitos guardem para si mesmos suas insatisfações — defende o petista.

A expectativa é que o anúncio seja feito após o retorno da presidente a Brasília. Ela passou o feriadão de Natal na Base Naval de Aratu, em Salvador. Atual ministro do Desenvolvimento Agrário, Rossetto deve ir para a Secretaria Geral da Presidência, para cuidar da articulação do governo com os movimentos sociais. Vai substituir o mais lulista dos ministros de Dilma, Gilberto Carvalho, futuro presidente do Conselho do Sesi. Tanto Rossetto quanto Gilberto entraram na campanha de Dilma na reta final das eleições.

O ex-ministro e deputado eleito Patrus Ananias (PT-MG) deverá assumir o Desenvolvimento Agrário, com a missão de melhorar a qualidade dos assentamentos e ampliar o processo de reforma agrária no país, que andou a passos lentos no governo Dilma. Patrus é um nome que agrada o partido.

Petistas tentam reaver o trabalho
O PT tentou retomar o Ministério do Trabalho, que comandou no governo do ex-presidente Lula. Dilma até se dispôs a atender o partido nesse aspecto, mas o PDT não abriu mão da pasta. A presidente ofereceu ao PDT o Ministério da Previdência Social, mas o partido aliado não quis. Assim, a tendência é que o ministro Manoel Dias seja mantido em seu cargo na Esplanada.

Apadrinhado do PP, o ministro Gilberto Occhi também deve continuar no governo, mas no Ministério da Integração Nacional. Embora o partido pretendesse manter o Ministério das Cidades, Dilma argumentou que gostaria de privilegiar o PP do Norte e do Nordeste — regiões mais dependentes dos projetos da Integração Nacional — que estiveram ao seu lado na campanha. As alas de Sul e Sudeste trabalharam para Aécio Neves na eleição. O Ministério dos Transportes continuará na cota do PR, mas Paulo Sérgio Passos deverá ser substituído pelo vereador Antonio Carlos Rodrigues.

Economia é foco de Dilma no Congresso

• Petista agrada a base com ministérios para tocar votação de temas delicados, como valorização do salário mínimo

• Outra prioridade é a prorrogação da DRU, mecanismo que permite gastar 20% das contribuições sociais

Márcio Falcão – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - A estratégia da presidente Dilma Rousseff de lotear a composição dos ministérios entre aliados, para reforçar o controle de sua base no Congresso, tenta blindar a petista de potenciais turbulências políticas e econômicas na largada de seu novo governo.

A lista reúne os desdobramentos políticos do escândalo na Petrobras, uma definição sobre os conselhos populares e a reforma política.

A agenda econômica está repleta de temas delicados, como a prorrogação de um mecanismo que permite à União gastar livremente 20% das receitas de contribuições sociais (exceto previdenciárias), a chamada DRU (Desvinculação das Receitas da União), e até a política de valorização do salário mínimo.

A principal preocupação do Planalto é com o avanço da Operação Lava Jato, que apura os desvios na Petrobras. A ideia é evitar a adesão de aliados para a instalação de uma nova CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito), o que ampliaria o desgaste da estatal e do governo.

A equipe de Dilma prefere restringir as investigações à Justiça para barrar o fortalecimento de um novo palco para a oposição.

Cultura
Apesar de os deputados terem derrubado o decreto que incentivava a criação de conselhos populares, o texto ainda está travado no Senado.

No início do mês, o Ministério da Cultura enviou aos senadores pedido para suspenderem a tramitação. Governistas admitem que a proposta pode ser desengavetada diante de insatisfações na base.

O projeto que pede a derrubada do decreto está na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) com parecer favorável. O decreto estabelece diretrizes para criação dos conselhos e prevê que eles sejam ouvidos na formulação de políticas públicas.

Primeira promessa de Dilma após ser reeleita, a reforma política só deve sair se houver vontade do Congresso. A petista defendeu uma mudança no sistema político e acabou chamando para si, na avaliação de aliados, a responsabilidade sobre o desenrolar do tema, parado há mais de dez anos no Legislativo.

Ajuste
Em meio a um ano econômico difícil, uma das prioridades será garantir a prorrogação da DRU no Congresso.

O Planalto também deve começar a discutir com os congressistas a nova política de valorização do salário mínimo. As regras atuais sobre os dois temas perdem a validade em dezembro de 2015.

As discussões devem começar logo em fevereiro, na posse do Congresso. A expectativa é de que a equipe econômica anuncie nas próximas semanas as primeiras medidas --algumas dependeriam do crivo do Legislativo.

Na tentativa de reconstruir pontes com os aliados no Congresso, Dilma distribuiu 11 ministérios entre PMDB, PSD, PRB, Pros, PTB e PC do B.

Turbinado após as eleições, passando de 10 para 21 deputados, o PRB inclusive já trabalha para ampliar a base da petista na Câmara.

O partido, que terá o Ministério do Esporte, tenta consolidar um bloco de 11 nanicos (PTN, PHS, PSL, PSDC, PRTB, PMN, PTC, PRP, PEN e PT do B), com 45 deputados.

Dilma deve deixar nesta segunda (29) a Base Naval de Aratu, na Bahia, onde descansa com a família, e voltar a Brasília para finalizar a formação do novo ministério.

Prioridades
O foco do governo Dilma nas votações no Congresso
1
A prorrogação da DRU (Desvinculação das Receitas da União), que permite que o governo gaste livremente 20% das contribuições sociais (exceto previdenciárias)
2
Nova política de valorização do salário mínimo --o governo federal enviou ao Congresso Nacional uma proposta de salário de R$ 788,06 em 2015
3
Impedir a derrubada do decreto de criação dos conselhos populares, que estabelece que eles sejam ouvidos na formulação de políticas públicas

Dilma Rousseff resistirá?

• Talvez. Para melhorar sua articulação política e, no limite, blindar-se contra um pedido de impeachment, ela manterá sua dependência de Lula

Alberto Bombig – Época

No início de 2014, quando a presidente Dilma Rousseff liderava com folga as pesquisas eleitorais, assessores dela gostavam de dizer reservadamente, a jornalistas e a empresários, que o segundo mandato de Dilma no Palácio do Planalto sepultaria a sombra de seu padrinho político e antecessor, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Em julho, com o início oficial da campanha eleitoral, a reeleição de Dilma mostro use mais complicada. As dificuldades da campanha se agravaram com o mau momento da economia, e o PT começou a trabalhar com um cenário provável de derrota de Dilma, fosse para Marina Silva (PSB) ou para Aécio Neves (PSDB). Em meio ao desespero, a solução foi recorrer justamente a ele, Lula, para bater pesado nos adversários do petismo e se transformar, pela segunda vez, no fiador de sua afilhada.

Essa "dívida de gratidão" já seria suficiente para manter Lula como uma peça importante do segundo mandato de Dilma . Há ainda outro fator determinante na relação do padrinho com a afilhada. O petrolão colocou sob alerta a base de apoio ao governo no Congresso . Vários políticos foram citados pelo ex-diretor e delator Paulo Roberto Costa como beneficiários do esquema de desvios de verbas. Entre eles, líderes de partidos. Já no início de 2015, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, deverá enviar ao Supremo Tribunal Federal (STF) a lista oficial com os pedidos de abertura de inquérito. A oposição planeja entrar com pedidos de cassação de mandato assim que esses inquéritos forem instaurados. Dilma terá de evitar a aproximação do escândalo da rampa do Planalto (h á ministros e ex-ministros citados) e o esfacelamento do bloco de apoio ao governo no Legislativo. No limite, o risco máximo para Dilma é a oposição, liderada pelo PSDB, reunir forças e estofo jurídico para um pedido de impeachment. Tanto esse cenário causa temor a Dilma que, na última segunda-feira, dia 22, ela declarou que "essa história de impeachment não cabe no Brasil nesta década", uma referência ao processo que em 1992 afastou Fernando Collor.

É justamente esse contexto de turbulência e incerteza que duplica o poder de Lula. Dilma jamais foi uma grande articuladora política – nem fez questão de ser. O primeiro mandato dela apresentou uma série de trapalhadas nessa área e, a julgar pela dificuldade dela para montar o novo ministério, o segundo mandato tem tudo para repetir o desastre. O PMDB, parceiro preferencial do PT, está mais fortalecido por ter sido determinante, no início de dezembro, pela aprovação da Medida Provisória que, na prática, alterou a meta de superavit primário e salvou o balanço final das contas públicas. Os petistas, liderados por Lula, consideram ter sido fundamentais para a reeleição de Dilma, pois não pouparam esforços para defender sua candidatura nas ruas, nas redes sociais, nos sindicatos e nas empresas públicas. Em privado, líderes desses dois partidos reclamam do tratamento que receberam do Planalto nos últimos quatro anos e querem mais interlocução e mais espaço.

O problema central é que o petrolão atingiu em cheio PT e PMDB, além do PP, nos últimos anos uma espécie de sigla satélite do Planalto, disposta a tudo em troca de cargos e de verbas. Muitos dos nomes indicados por esses partidos para compor o novo governo podem estar, direta ou indiretamente, ligados ao esquema de corrupção. Começar um novo mandato e logo ser obrigada a demitir um ministro ou um chefe de estatal por causa de suspeitas de irregularidades mergulharia a nova gestão numa crise logo de cara.

As nomeações de Dilma podem travar ainda mais sua articulação política. Ciente das dificuldades dela e também de olho n a possibilidade de ser o candidato do governo e do PT à sucessão em 2018, Lula passou o final de 2014 em atividade. Nos próximos meses, somente ele será capaz de acalmar os aliados, que ainda suspiram de saudades, e de manter os petistas sob controle. Lula esteve em Brasília para reuniões com a afilhada e interferiu de maneira decisiva na escolha de Joaquim Levy para a Fazenda. Divulgou um vídeo na internet dando conselhos a Dilma e dizendo que "o povo quer ser mais ouvido". Essa deverá ser a maneira de Lula capitalizar a dependência que Dilma terá dele no início do novo mandato, ora se aproximando para defendê-la dos inimigos, ora passando "pitos" públicos nela, para manter certa distância regulamentar de um eventual fracasso de Dilma II.

A oposição continuará nas ruas?

• Sim. Denúncias de corrupção na Petrobras, mais força no Congresso e a maior votação já obtida pelo PSDB inflamam o combate ao governo Dilma

Leopoldo Mateus - Época

A votação alcançada pelo senador Aécio Neves (PSDB¬MG) na eleição presidencial deste ano - a maior de um candidato derrotado após a redemocratização - revigorou a oposição. Os 48,36% dos votos obtidos por Aécio aproximaram os oposicionistas de parcela da sociedade descontente com o governo . O encontro de ressonância n as ruas e o desenrolar das denúncias relacionadas à Petrobras deverão estimular Aécio e companhia a adotar um a postura mais combativa que no primeiro mandato da presidente Dilma Rousseff (PT). "A oposição tem de ser proporcional à indignação da sociedade com a corrupção e com a baixíssima qualidade da gestão do PT. Faremos oposição com muita intensidade", diz Duarte Nogueira, deputado federal e presidente do PSDB paulista.

A aposta para tornar real a promessa de confronto permanente está n a nova composição do Congresso Nacional. No Senado, a oposição contará com reforços renomados a partir de fevereiro. Três ex-governadores de grandes Estados do país - José Serra (PSDB-SP), Tasso Jereissati (PSDB-CE) e Antonio Anastasia (PSDB-MG) - chegarão à Casa, com o atual deputado federal Ronaldo Caiado (DEM-GO), conhecido pelo estilo combativo. Ao lado de Aécio Neves, Aloysio Nunes (PSDB-SP), Álvaro Dias (PSDB) e José Agripino (DEM-RN), eles formarão um grupo que pretende mostrar seu cartão de visitas já na CPI da Petrobras. Ela protagoniza rá os trabalhos do Congresso no primeiro semestre. Na Câmara, Casa em que o PSDB cresceu 22%, a ideia é aproveitar a alta taxa de renovação para adaptar a estrutura do partido às mudanças de uma sociedade mais conectada e engajada na política. "Fomos o único grande partido que cresceu, de 44 para 54 deputados. Dos que chegam, 29 são novos na Câmara. A maior parte tem entre 25 e 40 anos. Eles contribuirão com sangue novo e ajudarão nessa nova linguagem de comunicação com a sociedade", diz o deputado federal Mar¬ cus Pestana (PSDB-MG).

Impressionados com o poder das redes sociais na mobilização popular durante as eleições presidenciais, os tucanos pretendem criar um comitê para tentar manter a interlocução cria¬ da com movimentos sociais. É algo que sempre faltou ao PSDB, não só durante a eleição. "Este novo momento que o PSDB vive se deve à vitalidade que a campanha de Aécio deixou como herança. Sou fundador do partido e não me lembro de um momento recente em que estivéssemos tão animados. Recuperamos a autoestima dos tuca¬ nos, que andaram anos acuados", diz Pestana. A outra ideia do PSDB para os próximos quatro anos é criar um governo paralelo . Mesclando nomes técnicos e políticos, o partido organizará dez grupos para verificar o cumprimento dos compromissos firmados pelo PT durante a campanha.

A chegada de partidos como o PSB à oposição deverá ajudar PSDB, DEM e PPS a aprovar pedidos de CPI e causar problemas ao governo. Algo que, no primeiro mandato de Dilma Rousseff, dependeu de rachaduras na própria base aliada. A última grande vitória da oposição no Congresso aconteceu no distante dezembro de 2007. Numa sessão histórica, o Senado derrubou a prorrogação da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF). O fim do tributo tirou R$ 40 bilhões do orçamento às vésperas da enorme crise econômica internacional que se avizinhava. Nas eleições seguintes, em 2010, os principais nomes da oposição no Senado foram derrotados e, na Câmara, PSDB e DEM minguaram. O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, embalado por um a popularidade na casa dos 80%, além de eleger a presidente Dilma, conseguiu fortalecer o governo no Congresso e trabalhou contra as reeleições de adversários, como os senadores Arthur Virgílio (PSDB-AM), Tasso Jereissati (PSDB¬ CE) , Marco Maciel (DEM-PE) e Herádito Fortes (DEM-PI). Desde então, a oposição nunca mais conseguiu impor ao governo petista derrotas contundentes no Parlamento.

Se parecem animados com a chegada de fortes quadros no Senado e com o crescimento na Câmara a partir do ano que vem, os oposicionistas já apresentam as primeiras dificuldades para permanecer unidos. Na disputa pela presidência da Câmara, em fevereiro, enquanto PSDB, PV e PPS apoiarão a candidatura do deputado Júlio Delgado (PSB-MG) ao comando da Casa, o DEM anunciou que estará ao lado de Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Caminhar unida deve ser um dos principais desafios da oposição em 2015, caso queira mesmo encarar a forte máquina governista.

Oposição dá como certa instalação de nova CPI

• Parlamentares apostam em chance de aprofundar denúncias com Congresso que toma posse em fevereiro

André de Souza – O Globo

BRASÍLIA - O ano de 2015 começa com uma certeza para a oposição: será inevitável a instalação de uma nova CPI mista, com a participação de deputados e senadores, para investigar as irregularidades na Petrobras. A base aliada, por sua vez, não tem tanta certeza: tudo dependerá do novo Congresso, que tomará posse em fevereiro. Uma nova CPI faz parte dos planos da oposição para desgastar o governo Dilma Rousseff, que já foi ministra de Minas e Energia entre 2003 e 2005 e presidente do Conselho de Administração da Petrobras entre 2003 e 2010, durante o governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Para isso, os oposicionistas contam com a ajuda das circunstâncias do momento: o crescimento da oposição na última eleição e a avalanche de denúncias na Petrobras.

Entre as novidades que deverão aparecer em 2015 está a divulgação do conteúdo dos acordos de delação premiada firmados com investigados que resolveram colaborar com a Justiça. Isso inclui a lista de parlamentares que tiveram seus nomes citados como envolvidos no esquema de desvios de recursos na Petrobras. Uma lista com políticos de vários partidos — principalmente de PMDB, PP e PT, mas também de PSB e PSDB — já foi vazada para a imprensa.

Se depender da oposição, não só a Petrobras será investigada. Para justificar a devassa das contas de outras obras públicas, o deputado Onyx Lorenzoni (DEM-RS) citou o depoimento, na CPI, do ex-diretor da Petrobras, Paulo Roberto Costa — que está colaborando com a Justiça em troca de diminuição da pena. Ele disse no início do mês que o que acontecia na Petrobras acontece no Brasil todo: em rodovias, ferrovias, portos, aeroportos e hidrelétricas. Lorenzoni comparou uma nova CPI à CPI dos Correios, que investigou o mensalão em 2005 e foi a última Comissão Parlamentar de Inquérito importante instalada no Congresso.

—Na minha visão, ninguém vai segurar. Como Paulo Roberto Costa disse, aqui que são dezenas de parlamentares (envolvidos no esquema), vai ter uma pressão social brutal. E a relação numérica entre governo e oposição é melhor para a gente — afirmou Onyx.

Para petista, ainda é cedo para prever a posição do Congresso

• Líder do partido crê que CPI já finalizada teve resultado satisfatório

- O Globo

BRASÍLIA - O líder do PT no Senado, Humberto Costa (PE), não descarta nova CPI em 2015, mas não demonstra a mesma certeza da oposição em relação à inevitabilidade de uma nova comissão para investigar as irregularidades na Petrobras. Enquanto a oposição critica os resultados da CPI de 2014, tachando-a de chapa-branca, Humberto Costa diz que ela teve resultado positivo.

— A CPI conseguiu dar uma resposta ao Brasil dentro da capacidade de investigação do Congresso. Agora temos que aguardar a última etapa, que é a que diz respeito aos agentes políticos, para que no ano que vem o Parlamento se posicione. É uma decisão do futuro Congresso. Não podemos falar em nome de tantos senadores e deputados que foram eleitos agora. Será uma decisão mais à frente — disse Costa, em 18 de dezembro, dia em que foi aprovado o relatório da CPI mista de 2014.

Em 2014, foram instaladas duas CPIs no Congresso, mas parte de seus trabalhos se desenrolou em plena campanha eleitoral. A primeira funcionou apenas no Senado. A segunda, a CPI mista, instalada em 28 de maio, contou com a participação de senadores e deputados e foi mais crítica ao governo. A CPI mista acabou esvaziando a CPI exclusiva do Senado, mas, ainda assim, a correlação de forças foi mais favorável ao governo. Tanto que o relatório final não avançou em relação ao que já era investigado pela Polícia Federal e pelo Ministério Público Federal (MPF).

Não é só a avalanche de notícias sobre irregularidades na Petrobras e em outros setores do governo que anima a oposição para instalar uma CPI em 2015. Em fevereiro, assumem os deputados eleitos em outubro, e haverá a renovação de um terço do Senado. A nova correlação de forças será mais favorável à oposição. Os oito partidos que deverão ter uma postura de oposição em 2015 — PSDB, PSB, DEM, SD, PSC, PPS, PV e PSOL — têm, hoje, 23 dos 81 senadores e 147 dos 513 deputados federais. Em fevereiro, sem considerar as mudanças que poderão ocorrer com a ocupação de cargos no governo por parlamentares, serão 25 senadores e 160 deputados.

Apesar do crescimento no Congresso, a oposição ainda será minoritária. Mas os deputados e os senadores desses partidos contam com a ajuda de parlamentares da base aliada insatisfeitos com o governo, a começar pelo deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), favorito na disputa pela presidência da Câmara. A CPI mista deste ano só foi possível graças à assinatura de parlamentares da base. O PMDB foi o segundo partido que mais aderiu ao requerimento de criação da comissão, com 37 deputados, entre eles, o próprio Cunha.

Pela reforma política e tributária

• Os primeiros entre os deputados: Antônio Imbassahy (PSDB/BA) e Marcus Pestana (PSDB/MG)

Adriano Ceolin – Veja

Desde que foi criado, em 2011, o Ranking do Progresso jamais havia registrado um empate no primeiro lugar. Aconteceu agora: os deputados An-tonio Imbassahy (BA) e Marcus Pestana (MG), ambos do PSDB, chegaram juntos ao degrau mais alto do levantamento. Eles se destacaram na Câmara Federal como os parlamentares que tiveram a melhor performance na defesa de propostas capazes de transformar o Brasil num país mais competitivo e moderno. "De fato, nós temos muita afinidade em temas fundamentais, como o combate à corrupção e as reformas política e tributária", afirma Imbassahy. Entre outras semelhanças, ele e Pestana estão no seu primeiro mandato e foram reeleitos para mais uma legislatura, que tem início em fevereiro de 2015. Apesar de novatos no Legislativo, os dois já passaram pelo Executivo. Imbassahy foi prefeito de Salvador, entre 1997 e 2004. Quanto a Pestana, ocupou a Secretaria de Saúde do governo do Estado de Minas Gerais de 2003 a 2010. "A experiência no Executivo nos ajuda a enxergar melhor quais são os problemas e como se pode tentar resolvê-los", acredita o deputado mineiro.

A corrupção, claro, é um dos entraves para o desenvolvimento do país. Por esse motivo, a ação dos parlamentares para combatê-la foi incluída entre os nove quesitos que servem de critério para a elaboração do ranking. O ano de 2014 ficou marcado pelo escândalo que envolve a maior empresa do Brasil, a Petrobras. Antonio Imbassahy teve papel decisivo no esclarecimento do estarrecedor caso do petrolão. Foi dele o requerimento de informações sobre a compra da refinaria de Pasadena, nos Estados Unidos. A resposta confirmou oficialmente que a Petrobras havia desembolsado 1,2 bilhão de dólares por uma refinaria comprada um ano antes ao preço de apenas 42,5 milhões de dólares. A apresentação de requerimentos de informação é uma das ferramentas do Congresso para fiscalizar o governo. Como se trata de um pedido formal, a resposta tem de ser dada em, no máximo, trinta dias. Foi utilizando esse artifício que Imbassahy conseguiu informações preciosas sobre a Petrobras. Ele revelou a VEJA que obteve êxito porque contou com a ajuda de funcionários da petrolífera.

A dupla ressalta que o país precisa melhorar sua governabilidade. "As coisas só vão mudar com a reforma política", diz Imbassahy. "Nossa democracia está consolidada, mas não há dúvida de que o atual modelo mostrou seu esgotamento. Dois anos depois das eleições, 70% dos brasileiros não sabem sequer o nome do deputado em que votaram", comenta Pestana.

O fim da História

J.R. Guzzo - Veja

É possível que 2014 acabe entrando para a memória política brasileira como o ano em que o Partido dos Trabalhadores morreu. Morreu por suicídio involuntário ou. então, por ter inoculado em si mesmo uma doença prolongada, progressiva e incurável chamada corrupção — enfermidade que degenerou suas células e o transformou em algo que não tem mais nada a ver com aquilo que sonhava ser quando nasceu. O PT continua vivo, aliás, vivíssimo, como máquina de ocupação do Estado. Mas não é mais, como pretendeu ser um dia, o partido dos brasileiros que vivem do seu trabalho; ou, menos ainda, um movimento que chegou a se imaginar como alternativa para o capitalismo no Brasil. Hoje, tragicamente, o PT da vida real é apenas o partido das empreiteiras de obras públicas, dos vendedores de bens e serviços para o Estado e de todos os que têm como ramo de negócio o assédio permanente ao Erário. É coisa que vem de longe — desde que o PT começou a tomar gosto pelo desfrute do governo. Agora, neste fim de 2014, está reduzido a um empreendimento comercial. É o que comprovam os fatos indiscutíveis revelados na presente investigação judicial sobre a corrupção na Petrobras — a roubalheira sem limites, sem controle e sem paralelo na História do Brasil que ganhou o título de petrolão e passou a ser a marca mais notável dos 34 anos de existência do PT.

Como um partido político pode sobreviver se perdeu a honra? Talvez pudesse haver alguma esperança se o ex-presidente Lula, a presidente Dilma Rousseff e a maioria das lideranças do PT decidissem romper com a estratégia de corrupção serial que hoje é a principal razão de ser do partido, e o centro vital de seu programa como organização política. Mas nenhum deles dá o menor sinal de querer alguma coisa parecida com isso. Ao contrário, o partido se mantém amarrado pelos quatro cantos com a corrupção — como prova, dia após dia, seu compromisso de defender a todo custo a conduta central da Petrobras e do seu alto-comando. Em vez de condenar os crimes cometidos ali durante os últimos doze anos, ou pelo menos tomar distância deles, o PT mergulhou de cabeça na cumplicidade com os ladrões. Chegou a ponto de conduzir no Congresso uma CPI que concluiu, em 900 páginas de relatório, que não havia nada de errado na Petrobras do petrolão; teve de voltar atrás, depois, ao perceber o tamanho da insensatez. A situação de Dilma, que desde 2003 é a pessoa mais influente na empresa, não é melhor que a do partido. Para ter certeza disso, basta fazer uma pergunta bem simples: a presidente pode ir hoje à televisão, em cadeia nacional, e jurar que durante esse tempo todo nunca soube de nenhum problema sério nos negócios mais importantes da Petrobras? Não pode. Xeque-mate.

Ao deixar-se contaminar pela corrupção, logo depois de ganhar suas primeiras eleições municipais, há cerca de trinta anos, o PT certamente não queria se matar. Na verdade, imaginava que roubar um pouco não faria mal a ninguém. (O ex-presidente Lula não admitiu, pouco tempo atrás, que achava razoável assaltar um banco aqui ou acolá, pois banqueiro tem dinheiro de sobra? Eis aí o espírito da coisa.) Mas esses cálculos, na melhor das hipóteses, eram puro auto-engano. Como se sabe muito bem, não há vício que leve à virtude, e, no caso do PT, roubar um pouco só levou a roubar mais — das prefeituras para cima, da propina paga peia companhia de ônibus do município às pilhas de dinheiro ofertadas pelas maiores construtoras do país, do mundinho da merenda escolar ao mundão dos negócios de cachorro grande. Ali se fala inglês. Vai-se do real aos milhões de dólares depositados em contas no exterior. Do outro lado do balcão estão multinacionais, fundos de pensão, a carteira do BNDES — e, como se vê no petrolão, o saco sem fundo da Petrobras. É onde estamos. Hoje, quando se fala em PT, é raro ouvir alguma coisa ligada ao mundo do trabalhador. Pelo que se ouve, o PT virou um partido obrigado a explicar o tempo todo coisas como sobrepreço, obra sem licitação, "aditivo contratual" e outras maravilhas parecidas.

O PT de Lula, do governo Dilma e da "base aliada" no Congresso continua existindo, é claro, com toda a sua capacidade para fazer o mal — e até o bem, se quisesse. Continua sendo o maior partido político deste país. Continua nomeando gente que manda. Tem, pelos seus cálculos, quase 1,5 trilhão de reais para gastar no Orçamento de 2015. Mas virou outra coisa. Depois de andar durante três décadas com a carteirinha de autoridade no bolso, principalmente nos últimos doze anos, o PT perdeu a fé. Não foi capaz de trazer para o debate nacional, durante esse tempo todo, uma única ideia que prestasse, ou que pudesse ser chamada de ideia. Não conseguiu formar nenhuma liderança real em toda a sua história, uma só que fosse — continua, exatamente como na sua fundação, em 1980, só tendo Lula e, abaixo dele, um abismo. Alguém poderia citar um nome remotamente parecido para desempenhar seu papel no partido? Na última campanha eleitoral, o PT teve cerca de 350 milhões de reais, mais que qualquer outro competidor, para reeleger a sua candidata à Presidência. Partido dos Trabalhadores? Está na cara que uma organização com mais de 350 milhões para torrar numa campanha não pode ser o partido dos trabalhadores; pode ser qualquer coisa, menos isso.

É incompreensível, da mesma forma, que esteja do lado da população brasileira, para valer, um grupo político que causou tanta destruição no patrimônio popular quanto o PT. Nunca antes, desde a fundação da Petrobras, em 1953, um governo foi capaz de provocar tantas perdas em seu valor, em seus cofres e em sua reputação. As ações da Petrobras, cotadas a mais de 50 reais em 2008, quando chegaram a seu preço mais alto, estão fechando este ano abaixo de 10; o valor da empresa, então acima de 730 bilhões, caiu hoje para 115. A tenebrosa Refinaria Abreu e Lima, em construção desde 2007, em Pernambuco, e a grande estrela das atuais investigações de corrupção, é um dos maiores desastres da história da indústria brasileira; orçada inicialmente em 2,5 bilhões de dólares, pode acabar custando até oito vezes mais, e continua sem data de entrega após sete anos em obras. Desde que o PT chegou ao governo, cerca de 800 000 contratos sem licitação foram assinados pela Petrobras. Tanto Lula como Dilma sabiam perfeitamente disso — mas hoje, depois que a casa caiu, dizem que jamais perceberam irregularidade alguma nos negócios da empresa. Esperavam o quê?

Há muito mais a dizer, e a História certamente dirá — a esta altura, por sinal, não existe mais nenhuma possibilidade de que a calamidade geral da Petrobras deixe de ter um peso decisivo no julgamento final da passagem de Lula, Dilma e PT pelo governo do Brasil. A alegação de que a roubalheira se limitava ao quintal da arraia-miúda da companhia, longe dos excelsos olhos de Suas Excelências, tornou-se comprovadamente inverossímil diante dos fatos — é uma "fabulação", como diria a presi-dente Dilma. Um único episódio, ocorrido cinco anos atrás, é suficiente para deixar isso mais do que claro. Em 2009 o Tribunal de Contas da União informou a existência de indícios sérios de corrupção nas obras da Refinaria Abreu e Lima, e o Congresso, com "base aliada" e tudo, aprovou uma resolução que suspendia o repasse de verbas para o projeto. Lula, muito simplesmente, vetou a decisão. Ela poderia pôr em risco "25 000" empregos, explicou o então presidente — uma repetição ao pé da letra da desculpa mais velha, e mais eficaz, que as empreiteiras utilizam quando a coisa aperta para o lado delas. Dilma, que segundo o delator-mor do petro-lão foi informada, sim, dos desatinos então cometidos na estatal, não pode, obviamente, ter ignorado esse veto — como vem dizer, agora, que o governo "apurou" todas as denúncias?

O que a presidente e Lula fizeram foi exatamente o contrário — sabotaram as investigações, isso sim, enquanto acharam possível esconder a realidade. Dilma, para complicar as coisas, está diretamente envolvida na compra da refinaria americana de Pasadena pela Petrobras, talvez o mais inexplicável de todos os maus negócios já fechados em mais de meio século de existência da empresa. Sua amiga de confiança, braço-direito e alma gêmea Graça Foster, a atual presidente da companhia, mentiu expressamente ao declarar que ignorava denúncias de corrupção em negócios da empresa com pelo menos uma fornecedora estrangeira; tem a seu crédito, também, a ideia de lançar no balanço da Petrobras valores relativos a propinas pagas no processo geral de corrupção ora em apreciação pela Justiça. Como resultado direto de toda a ladroagem já denunciada, a maior empresa do Brasil está encerrando o ano com uma humilhação sem precedentes: não conseguiu fechar até agora o balanço de suas contas do terceiro trimestre de 2014, pois nenhuma firma de auditoria séria está disposta a examinar o documento. Quem teria coragem de acreditar em algum número apresentado pela Petrobras de Dilma & Graça?

O jornalista Fernando Gabeira escreveu há pouco que o PT morreu quando Lula chegou à Presidência, em 2003; a partir dali, continuou morrendo. É precisamente isso. Suas lideranças desistiram de construir o futuro; ficaram 100% absorvidas em desfrutar as atrações do presente. Agora é só isso que têm — e isso só dura enquanto o chefe durar. A história do PT acabou porque o partido não tem mais nenhum interesse em buscar um país diferente desse que está aí, pois descobriu no governo que gosta das coisas exatamente do jeito que elas estão. O partido não resistiu, lá atrás, à primeira mala de dinheiro que jogaram em uma de suas mesas; na verdade, sua resistência aos métodos políticos da "direita" revelou-se, para surpresa geral, de curtíssima duração. Agora não dá para voltar atrás — colocar "a pasta de volta no dentifrício", na imagem da presidente Dilma. Hoje o PT e sua máquina de propaganda estão reduzidos a ficar defendendo empreiteiras de obras — é isso, na prática, que significa seu combate contra as investigações do petrolão — e a organizar rotas de escape para as punições ora em gestação nas engrenagens da Justiça penal. Há um vale de lágrimas pela frente. A corrupção na Petrobras não é só a malfadada Refinaria Abreu e Lima; estende-se às obras do Comperj, no Rio de Janeiro, ao consórcio de empresas montado para fornecer sondas e outros equipamentos pesados à empresa e sabe lá Deus o que mais. Pior ainda, a corrupção no governo não fica só na Petrobras; espalha-se por toda a vasta porção da máquina pública que o PT e a "base aliada" privatizaram em seu benefício. Não adianta grande coisa, aí, atolar-se ainda mais na cumplicidade com as gangues partidárias do Congresso em busca de "blindagem política", ou esperar que "a mídia canse" de falar do assunto. Os políticos podem dar apoio, mas não assinam sentenças. Os fatos podem sair do noticiário, mas não vão sair dos autos.

Ninguém, em toda a história política do Brasil, foi tão longe na estrada do sucesso, nem tão rápido, como o PT. Quem poderia imaginar, na época da fundação, que uma entidade montada por chefes de sindicatos em comícios num estádio de futebol iria se tomar o maior partido político do Brasil? Como prever que esse partido criado no calor de greves operárias, sem nenhuma consulta à "esquerda" que até então se achava a única força autorizada a falar pelos trabalhadores brasileiros, viria a ocupar quatro vezes seguidas a Presidência da República? O triunfo foi realmente imenso — mas não foi duradouro. O PT, enquanto crescia, foi perdendo a alma. Para ganhar cada vez mais, teve de ficar cada vez menos parecido com o que foi, ou quis ser. O resultado é que hoje, quando poderia estar vivendo a sua hora mais brilhante, chega, também ele, ao fim da História.

'Obras de Alckmin terão significado para todo o País'

• Futuro secretário destaca impacto nacional em projetos como rodovias e infraestrutura para portos de Santos e S. Sebastião

Ricardo Chapola - O Estado de S. Paulo

Principal braço político do governador Geraldo Alckmin (PSDB), o futuro chefe da Casa Civil, Edson Aparecido, disse em entrevista ao Estado que as obras que o tucano prometeu entregar no próximo mandato terão "significado para o País", e não só para São Paulo.

Aparecido retornará a uma das pastas mais importantes do governo no mandato que servirá de vitrine para uma eventual candidatura de Alckmin à Presidência em 2018.

Segundo o chefe da Casa Civil, a aliança do PSDB paulista com o PSB, que indicou o vice-governador eleito, Márcio França, é um primeiro passo para "construir uma relação no plano nacional ao longo dos próximos quatro anos".

Na campanha, o governador prometeu inaugurar mais de 100 quilômetros de metrô, obras de combate à crise de abastecimento e monitoramento eletrônico de segurança. Essas obras serão bandeiras de campanha para uma eventual candidatura à Presidência em 2018?

O que o PSDB construiu ao longo do tempo em São Paulo foi uma saúde financeira capaz de fazer com que os grandes investimentos pudessem ser feitos no ritmo das necessidades do Estado. Nesse governo que está se encerrando, o governador conseguiu preparar um conjunto de obras de enorme relevância e que deverão ser entregues ao longo desses quatro anos. Vamos ter sete linhas de metrô sendo construídas ao mesmo tempo. Vamos ter o último trecho do Rodoanel. O governador acabou de assinar o contrato da duplicação da (Rodovia dos) Tamoios no trecho da serra. Deve lançar em janeiro o túnel ligando Santos ao Guarujá, para aumentar a capacidade do porto. Não é só para infraestrutura de São Paulo. É para a infraestrutura do País. Quando você aumenta a capacidade do porto de Santos, quando você duplica uma rodovia para aumentar a capacidade do porto de São Sebastião, você está aumentando a capacidade da infraestrutura do País como um todo. O Ferroanel, que estamos fazendo em parceria com o governo federal, é de importância nevrálgica para a região metropolitana de São Paulo. É evidente que são obras que têm significado não só para São Paulo, mas para o País.

O PSDB perdeu o comando de Estados importantes nas eleições deste ano, em especial Minas. No que isso afeta a construção da candidatura do PSDB à Presidência em 2018?

Foi uma perda importante. Historicamente, os dois maiores Estados, há muito tempo, vinham sendo dirigidos pelo PSDB. São Paulo continua, Minas nós perdemos. É evidente que isso tem impacto, primeiro sob ponto de vista da repercussão no Estado, bem como do ponto de vista da repercussão nacional. Nada que o partido não possa lá se reestruturar. Lá o partido vai se preparar para recuperar o Estado rapidamente. Não tenho dúvida disso.

O que Alckmin tem que Aécio Neves não tem, e vice-versa?

Cada um tem sua formação política, sua visão de mundo. Eu acho que isso é que é importante num partido político. Ter figuras e lideranças do porte do governador e do Aécio. Cada um tem seu estilo, tem seu jeito. Eu acho que eles se complementam. E é isso que fez com que o partido tivesse o resultado eleitoral (em São Paulo).

Aqui em São Paulo, o governador terá um vice do PSB. Com perspectivas futuras, no que isso ajuda para uma nova candidatura tucana à Presidência?

Ajuda o partido nacionalmente. O que a gente fez aqui foi um fato histórico. A gente conseguiu atrair um partido que sempre esteve no campo da oposição, embora sempre tenha tido excelente relação, uma relação respeitosa com o PSDB. Acho que isso abre uma perspectiva de a gente poder construir uma relação com o PSB no plano nacional ao longo dos próximos quatro anos e fazer com que os dois partidos estejam juntos num próximo desafio presidencial.

Como fazer para que o cartel de trens não se torne um ponto de questionamento em 2018?

A gente já passou pelo episódio na eleição estadual. Conseguimos mostrar que o governo foi vítima disso. Se teve alguma articulação do cartel, ela se deu no campo das empresas. Não no campo da articulação do governo com as empresas. Acho que foi tão bem feita, tão verídica e tão contundente a defesa do governo do Estado que esse episódio praticamente não surgiu na eleição estadual. Nós até imaginávamos, no início da campanha, os pontos que mais impactariam na eleição: a questão do cartel, a segurança pública, a crise hídrica e os 20 anos do PSDB no poder. Se for fazer uma comparação de todas essas quatro questões, o que talvez menos tenha afetado ou surgido no debate da campanha foi o cartel.

Qual a diferença do cartel de trens para o da Petrobrás?

São coisas bastante diferentes. Efetivamente, no episódio da Petrobrás, estão surgindo fatos. E esses fatos, de alguma maneira, têm uma comprovação importante, um leque de envolvimento mais amplo. Aqui (em São Paulo) a gente conseguiu dar uma resposta contundente à questão, mesmo quando se tentou politizar, fazer o envolvimento de políticos nessa questão. E a própria Justiça, ao longo do tempo, está se posicionando em relação a isso.

Ricardo Noblat - Já vi esse filme. O bandido vence

- O Globo

"Não há nada melhor para excessos cometidos pela imprensa do que a própria liberdade de imprensa"
Lula

Na campanha da presidente Dilma, ela mesma, Lula e boa parte do PT debocharam do que disse a candidata Marina Silva (PSB) sobre como montaria seu governo, caso se elegesse. Marina afirmou que simplesmente governaria com os melhores elementos de cada partido, sem discriminar nenhuma legenda. É uma boba, garantiram alguns. Uma sonhadora, acusaram outros. Governar com os melhores é impossível, apenas isso.

OU MARINA dominava uma receita que só ela conhecia ou então se pautaria pelo bom senso. E o bom senso lhe aconselhava a procurar gente decente, comprometida com a ética e talentosa para ocupar cargos do primeiro e do segundo escalões da República. E se essa gente fosse incapaz de lhe garantir a maioria dos votos no Congresso? E se por causa disso o governo capengasse? MARINA

CONFIAVA que não passaria sufoco porque, em primeiro lugar, governaria apenas por quatro anos. Descartara a reeleição. O que a seu ver seria o bastante para apaziguar os ânimos no Congresso e refrear as ambições, por suposto. Segundo, porque governaria com transparência, prestando contas aos eleitores de todos os seus passos e discutindo com eles suas dificuldades. FERNANDO

COLLOR se elegeu presidente em 1989 sem maioria no Congresso. Quis cooptar o PSDB e não conseguiu. Chamou de "único tiro" contra a inflação o plano econômico que garfou a poupança dos brasileiros. Por mais estúpido que tenha sido o plano, o Congresso não se negou a aprová-lo. Caso desse certo, o Congresso ficaria bem na foto. Se desse errado, o presidente é que ficaria mal. NÃO

FOI POR falta de apoio do Congresso que Collor acabou deposto. Foi por falta de apoio popular. O Congresso é sensível ao sentimento das ruas. E todo presidente, a princípio, se beneficia de um perí- odo de lua de mel com a opinião pública. Até que o período se esgote, ele pode se comportar com um grau de liberdade que mais tarde se estreitará. A não ser que o sucesso bata à sua porta.

NINGUÉM MAIS do que Lula reuniu condições para governar sem ser obrigado a fazer concessões que por fim o apequenassem, e ao seu partido. Foi o primeiro nordestino ex-pau de arara, ex-líder sindical, ex-preso político a subir a rampa do Palácio do Planalto. Ocupou o principal gabinete do terceiro andar com crédito para gastar por muito tempo. Encrencou-se porque piscou primeiro. SOB

PRESSÃO para lotear o governo, como seus antecessores haviam feito, por hábito ou necessidade, Lula subestimou o apoio das ruas. Preferiu apostar no apoio do Congresso. Logo ele, que no final dos anos 80 do século passado, enxergara ali pelo menos 300 picaretas. Foi atrás dos picaretas. Beijou a cruz — e, de quebra, a mão de Jader Barbalho. O mensalão quase o derrubou. DILMA

ATRAVESSOU a metade do seu primeiro governo resistindo à ideia de ceder ao "pragmatismo político". Em conversa, certo dia, com um amigo, ouviu dele: "Tirando três ou quatro, só tem desonesto no Congresso." Ela respondeu: "E eu não sei?" Para se reeleger, cedeu ao apetite dos desonestos. Beijou a cruz. E, de quebra, a mão de Helder Barbalho, filho de Jader, seu futuro ministro da Pesca.

FOI MEDÍOCRE o primeiro Ministério de Dilma. O governo que resultou disso foi naturalmente medíocre. Pois bem: ela está perto de cometer o prodígio de montar outro Ministério igual ou, talvez, pior. O que a diferenciava dos políticos a quem tanto desprezava é, hoje, o que a torna cada vez mais parecida com eles. Feliz Ano Novo para todos!

Ricardo Melo - O mi(ni)stério de Dilma

• A julgar pelos nomeados, o novo governo oferece um prato cheio para a oposição e vazio para o povo

- Folha de S. Paulo

Quem tem algum compromisso, ou pelo menos preocupação, com as questões sociais fica decepcionado com as escolhas para o novo gabinete. Ao lado de uma equipe econômica alinhada com a banca, a presidente Dilma fez questão de nomear gente cuja trajetória vai no sentido oposto daqueles que garantiram sua vitória.

Gilberto Kassab no Ministério das Cidades é uma bofetada, em todos os sentidos. Um dos políticos mais oportunistas da história recente, Kassab está irremediavelmente associado à máfia do IPTU em São Paulo, à especulação imobiliária e ao desprezo pelos interesses dos cidadãos. Não é só: o filho de Jader Barbalho, novo ministro da Pesca, tem como única credencial a derrota para governador do Estado. E por aí vai: Eliseu Padilha volta à cena, um pastor é empossado para tocar o Esporte, uma agronegocista na Agricultura. E segue o enterro.

Ministério técnico, bem entendido, seria uma quimera: isso não existe. Qualquer técnico está sempre a serviço de uma política. Ainda assim, mesmo considerando o tal "presidencialismo de coalizão", haveria menus mais digeríveis do que o cardápio servido pela presidente reeleita. O simbolismo na política vale muito, às vezes tudo. Ao indicar nomes identificados com interesses que ela combateu durante a campanha, Dilma promove um curto-circuito talvez impossível de consertar antes de a fumaça aparecer.

Pode-se argumentar que grande parte dos ministros, na verdade, não manda nada. Diz-se também que o "núcleo duro" permanece nas mãos do PT. Falso. Mesmo que alguns dos nomeados jamais sejam recebidos em audiência no Planalto, eles fazem parte da face visível do governo. Desprezar isto não é fazer política; é cavar um fosso ainda maior em relação aos movimentos que acreditaram no discurso de campanha.

A receita que a presidente oferece ao público é uma mistura de crise e rame-rame. De que adianta contentar as inúmeras fatias em que o Congresso se divide? Viu-se isto com clareza nas manifestações de junho de 2013. O poder formal e a voz das ruas nem sempre caminham no mesmo sentido. Mas a segunda geralmente costuma determinar como o primeiro deve se comportar.

Ignorar a história é um risco capital. Não que o povo adore passeatas, manifestações diárias, greves, faltar ao trabalho ou atrapalhar o trânsito. Não! Mas ninguém consegue aguentar calado a ameaça de deterioração das condições de vida, a degradação de serviços públicos, a perda de poder aquisitivo e a piora no bem-estar da família. A estes, a maioria, "governabilidade" só interessa quando sinônimo da redução da desigualdade social.

É isto que mantém o mesmo partido no poder até agora. Este compromisso precisa ser renovado nas palavras e, acima de tudo, nos fatos. Mas o que se tem ouvido são notícias de aumento de tarifas, desocupações selvagens nas cidades, corte de gastos para pagar juros dos financistas e concessões conservadoras a granel. Nas páginas ao lado, porém, lê-se também que o número de bilionários no país cresceu; a compra de imóveis no exterior saltou; a taxa de lucro das empresas vai muito bem, obrigado; a corrupção grassa; e aumenta o número de investidores sedentos para aplicar dinheiro no Brasil. Mistério: quais serão os novos programas sociais? Dilma, mostra a sua cara.

Marcus Pestana - O que nos reserva 2015?

- O Tempo (MG)

Todos os anos é a mesma coisa. A magia se repete. É como se a vida não fosse um moto contínuo. O calendário gregoriano cria essa ilusão do eterno recomeço. É como diz o poema: cortar o tempo em fatias foi uma ideia genial, industrializa a esperança, instalando o milagre da renovação, com um novo número e a vontade de acreditar que vai ser diferente.

Cartomantes, jogadores de búzios, videntes fazem profecias. Catástrofes, crimes, guerras, mortes, acontecimentos vários. E os economistas, ah, nós, os economistas, projetamos, no mundo e no Brasil, taxas de crescimento, inflação, crises e prognósticos. Nem uns, nem outros fazem autocrítica, quando, ao fim de mais um ano, a realidade desmente todas as projeções. E com a maior elegância, repetem o exercício de futurologia.

O Brasil de 2015 é outro país. Tivemos a mais polarizada eleição presidencial. A semente plantada nas jornadas de rua de junho de 2013 renasceu revigorada. Hoje temos uma oposição fortalecida e uma opinião pública inquieta e atenta.

A corrupção chegou a um limite insuportável. As instituições, em contrapartida, demonstram sua musculatura. O sistema judiciário age em defesa da ordem constitucional. Polícia Federal, Ministério Público e o Poder Judiciário, com todos os gargalos e problemas, demonstram que as leis alcançam todos, sem privilégios. O Congresso manteve a chama acesa, exigindo a apuração dos desvios em nossa maior empresa e resistindo à desmoralização do conceito de responsabilidade fiscal.

Cassamos o deputado André Vargas (PT-PR) por suas relações com o doleiro pivô da corrupção na Petrobras, em grande parte pela atuação firme das oposições. A sociedade civil e a imprensa livre cumprem seu papel como fiscais e portadores do interesse público no destino nacional.

Mal ou bem, chegamos aqui. Tancredo e Ulysses nos entregaram o país redemocratizado. Apesar de todas as vicissitudes, a democracia brasileira dá mostras de vitalidade. Foram sete sucessões presidenciais livres e democráticas. A liberdade nos dá a rota para a correção de rumos.

O cenário para 2015 é sombrio. Uma combinação explosiva entre crise econômica profunda, o maior escândalo da história brasileira e a população cada vez mais consciente nas ruas.

A inflação namora com o limite superior da meta. A armadilha do crescimento determina taxas pífias, apesar do festival de intervenções desastradas, desonerações pontuais e operações de crédito subsidiadas. A despeito das reservas cambiais abundantes, registramos recordes de déficits na balança comercial e nas transações correntes. A indústria brasileira vai pelo ralo. E, o mais importante, a credibilidade da política econômica é baixíssima, aqui e lá fora. Não é à toa que nossa presidente, que carrega um software anacrônico nacional-desenvolvimentista e intervencionista, foi buscar um ministro da Fazenda formado na ortodoxia de Chicago e do FMI.

Façam suas apostas. Que venha 2015!

Marcus Pestana é deputado federal e presidente do PSDB em Minas Gerais

Ricardo Balthazar - Mais do mesmo

- Folha de S. Paulo

Quando a presidente Dilma Rousseff anunciou Joaquim Levy como seu novo ministro da Fazenda, a escolha soou auspiciosa: encerrada a campanha eleitoral, Dilma parecia convencida da necessidade de tomar medidas duras para consertar o estrago feito na economia em seu primeiro mandato.

Os petistas resmungaram, mas logo os insatisfeitos pararam de questionar a indicação. É cedo para saber se Levy justificará tanta expectativa. O certo é que ninguém veio a público lançar dúvidas sobre o passado do novo ministro ou sua competência profissional.

Na semana passada, quando Dilma anunciou mais 13 ministros, o efeito foi outro. Soube-se que o novo ministro do Esporte, o deputado e pastor evangélico George Hilton, foi apanhado pela polícia há dez anos carregando caixas de dinheiro no aeroporto de Brasília. Indicado para a Ciência e Tecnologia, Aldo Rebelo foi recebido a pedradas pela comunidade científica.

Cinco novos ministros são políticos que ficaram sem emprego após as últimas eleições. Quatro foram derrotados nas urnas. Indicado para a Educação, o governador Cid Gomes passou semanas dizendo que não queria o cargo. Acomodado na Defesa, um ministério politicamente insípido, o petista Jaques Wagner se esforça para convencer a plateia de que nunca desejou outra coisa.

Os assessores de Dilma dizem que as mudanças mostram a disposição da presidente para se reaproximar do Congresso no segundo mandato, abrindo espaço no ministério para políticos influentes nas bancadas de seus partidos. Pode ser. Mas para aprovar o quê mesmo no Congresso? Ninguém tem a menor ideia.

Em outubro, após a confirmação de sua vitória nas eleições, Dilma disse que a reforma do sistema político brasileiro seria uma de suas prioridades. Com a chegada do pastor Hilton ao time, talvez tenha chegado a hora de a presidente esclarecer o que queria dizer com isso.

José Roberto de Toledo - Morte sob a tipuana

- O Estado de S. Paulo

São as tipuanas que fazem os bairros mais caros de São Paulo serem diferenciados - para usar expressão tornada notória por um de seus moradores. Não são os prédios pastilhados ou em falso neoclássico, nem as marcas famosas nas vitrines. São as árvores trazidas pela Companhia City para seus famosos bairros-jardim.

Mais de 70 anos depois de plantadas, essas árvores exóticas (sua origem é a Bolívia) superaram, na maioria dos exemplares, os 15 metros de altura e formaram copas com mais de 20 metros de diâmetro. Dão sombra às ruas e calçadas, conforto térmico e, acima de tudo, uniformidade visual a um conjunto arquitetônico que varia do feio ao duvidoso, com exceções a confirmar a regra.

O tronco rugoso das tipuanas é o ambiente ideal para o crescimento simbiótico de uma samambaia que mais parece uma grama aérea e que dessa característica extrai seu nome. Assim, a casca das árvores, tornada escura pela fuligem paulistana, recobre-se de verde e ajuda a tornar mais suportável um ambiente onde predominam o preto do asfalto e o cinza das fachadas.

Na primavera, parece nevar amarelo em Higienópolis, Pacaembu, Alto da Lapa e nos Jardins. Pequenas flores cor de gema caipira pontuam as copas das tipuanas como flocos que lá tivessem pousado. E depois caem nas calçadas, formando um tapete amarelado que é insistentemente desfeito a jatos de esguicho - mesmo com seca - por funcionários de condomínios defronte.

A batalha do homem com as árvores se repete no inverno, quando elas perdem as folhas e cobrem o chão de folíolos secos e sementes aladas. Há briga também onde os olhos não veem. Entre suas poderosas raízes e o calçamento ou, mais grave, delas com os responsáveis pela manutenção das tubulações subterrâneas. No ar, a luta é entre os imensos e numerosos galhos contra as empresas donas dos fios de eletricidade, telefone e TV a cabo.

De tempos em tempos surge uma equipe com uma motosserra na mão e um capacete na cabeça. Cortam galhos e troncos meticulosamente, deixando copas em improváveis formas de "V", para desimpedir a passagem da preciosa fiação. Na sarjeta, escorre dos troncos serrados das tipuanas uma seiva viscosa e avermelhada.

Essa é a melhor hipótese. Na pior, cortam os galhos só de um lado. Após podas sucessivas, o tronco pende para a rua e a árvore perde equilíbrio. Chuva e vento fortes um dia a derrubam.

Há décadas as tipuanas vêm valorizando os bairros e a cidade, em troca de nenhum cuidado. Em uma dissertação de doutorado apresentada na USP em 2010, o biólogo Sérgio Brazolin descreveu os principais riscos relacionados à queda de árvores em São Paulo. Após estudar 1.109 exemplares, concluiu que, já naquela época, o estado de 16% delas era de "alerta máximo" - exigindo tratamento imediato contra cupins e uma poda na copa que reequilibrasse a árvore, buscando o seu centro de gravidade.

"No caso das tipuanas, embora seja uma espécie muito resistente, o estado geral era crítico, principalmente devido à deterioração provocada por cupins, fungos e broca da madeira", descreveu o pesquisador. Mas as causas não são apenas naturais. "As tipuanas sofrem com o apodrecimento por fungos provocados por injúrias no tronco em podas inadequadas ou ações de vandalismo".

O alerta foi feito quatro anos antes de um jovem administrador de empresas morrer ao ser atingido, dentro de um táxi, pela queda de uma tipuana, durante um temporal em São Paulo. A tragédia é tão rara que nem é descrita entre as centenas de causas de morte da Classificação Internacional de Doenças.

Mais improvável do que ganhar na loteria, vira, mesmo assim, argumento para a troca das tipuanas por alguma espécie menos frondosa e mais burocrática - que atenda à Prefeitura e às empresas concessionárias de serviços públicos. É assim que a cidade mata, por descaso ou interesse, o que a embeleza.

Teresa Cristina & Zezé Gonzaga - Barracão de Zinco

João Cabral de Melo Neto – Auto do Frade

• Trechos – Frei Caneca

Acordo fora de mim
como há tempos não fazia
Acordo claro, de todo,
acordo com toda a vida,
com todos cinco sentidos
e sobretudo com a vista
que dentro desta prisão
para mim não existia.
Acordo fora de mim
como vida apodrecida.
Acordar não é de dentro,
acordar é ter saída.
Acordar é reacordar-se
ao que em nosso redor gira.
Mesmo quando alguém acorda
para um fiapo de vida
como o que tanto aparato
que me cerca me anuncia:
esse bosque de espingardas
mudas, mas logo assassinas,
sempre à espera dessa voz
que autorize o que é sua sina,
esses padresque as invejam
por serem mais efetivas
que os sermões que passam largo
dos infernos que anunciam.
Essas coisa ao redor
Sim me acordam para a vida,
embora somente um fio
me reste de vida e dia.
Essas coisas me situam
e também me dão saída;
ao vê-las me vejo nelas,
me completam convividas.
Não é o inerte acordar
na cela negra e vazia:
lá não podia dizer
quando velava ou dormia.