terça-feira, 25 de outubro de 2011

Opinião do dia – Luiz Werneck Vianna: República democrática

A República democrática tem seus custos sociais e políticos e um dos mais elementares deles é o de criar e preservar as condições para a auto-organização do social, com a sociedade e suas instituições empenhadas na solução dos seus problemas e desafios, forma com que nem sempre se chega mais rapidamente ao objetivo, mas, como o demonstra sobejamente a nossa já longa experiência republicana, é muito melhor e mais segura.

Luiz Werneck Vianna, professor-pesquisador PUC-Rio. O pêndulo, a centralização e a República. O Estado de S. Paulo, 22/10/2011.

Manchetes de alguns dos principais jornais do Brasil

O GLOBO
Delator articula com 7 ONGs novas denúncias no Esporte
Reeleição de Cristina gera temor de reforma política
União quer nova licitação para Ponte
Relator do Código Florestal revê anistia para desmatador

FOLHA DE S. PAULO
Ministro ajudou ONG de delator acusado de fraude
Dilma recebe hoje FHC no Alvorada para um jantar
Reeleita, Cristina consegue maioria no Legislativo
Fifa diz aceitar meia-entrada só para idosos na Copa - 2014
Ibama multa em R$ 6 mi importadora de lixo hospitalar

O ESTADO DE S. PAULO
Centro olímpico que Esporte prometeu para 2007 não existe
Conversa entre caciques
Vitória ampla dá início ao ‘cristinismo’ na Argentina
Dilma quer mais 50 anos de Zona Franca de Manaus

VALOR ECONÔMICO
Selic deve indexar a poupança
INB descobre mais urânio em Caetité
Cristina pode tomar medidas econômicas antes da posse
Governista, o PSD de Kassab terá mais prefeitos que o PT
Petrobras vai produzir mais estireno
Ao lado de Lula, Dilma anuncia mais 50 anos de incentivos a Manaus
Data-base antecipada
Batalha do Madeira
HRT busca alternativas no AM
Cade de olho no cimento

BRASIL ECONÔMICO
JBS compra Assim da Hypermarcas para se tornar a ‘Unilever brasileira’
Dilma dá mais 50 anos de benefícios para a Zona Franca de Manaus
Nova classe média resiste à crise

CORREIO BRAZILIENSE
Puxadinho da Câmara custará R$ 270 milhões
Pajelança para um ministro em apuros
Dívidas podem acabar com a Unimed Brasília
Sem IPI maior, cresce a procura por importado
Farra dos ingressos

ESTADO DE MINAS
Sem educação para dirigir
Sem endereço para morar
Correios na farra do rock
Caciques

ZERO HORA (RS)
Fifa tenta regular diária de hotéis para a Copa
Cristina Kirchner elege maioria no Congresso
Por que Dilma mantém Orlando Silva

JORNAL DO COMMERCIO (PE)
Dia sem médicos no SUS
Pivô do escândalo do lixo multada
Prova de policial não atinge ministro
Feras criticam o tamanho das questões do Enem

O que pensa a mídia - editoriais dos principais jornais do Brasil

http://www.politicademocratica.com.br/editoriais.html

Delator articula com 7 ONGs novas denúncias no Esporte

João Dias entrega à PF gravações de conversas com servidores da pasta

Em novo depoimento à Polícia Federal, o policial militar João Dias Ferreira disse que já entrou em contato com sete organizações não governamentais (ONGs) que, segundo ele, também denunciarão o esquema de cobrança de propina no Ministério do Esporte. João Dias, ele próprio investigado por desviar recursos destinados às suas duas ONGs, disse que outros dirigentes de entidades que firmaram convênios com o ministério deverão procurar a Polícia Federal. "Ao todo, vinte donos de ONGs vão lá entregar tudo", afirmou. Ontem, João Dias entregou aos policiais 14 áudios de conversas que teve com dirigentes do ministério, além de um outro envolvido acusado de arrecadar dinheiro para o PCdoB. Já o Ministério do Esporte anunciou que abriu sindicância para investigar a denúncia de que dois servidores da pasta, Fábio Hansen e Charles Rocha, orientaram João Dias a burlar a fiscalização em suas entidades, acusadas de desviar R$ 3,2 milhões. Essas conversas fazem parte das gravações feitas pelo denunciante e divulgadas no fim de semana. A oposição apresentou ontem no Congresso convite para que Hansen e Rocha sejam convidados a depor na Câmara dos Deputados e no Senado. Em Manaus, onde inaugurou ponte ao lado do ex-presidente Lula, a presidente Dilma demonstrou preocupação com o ministro Orlando Silva e disse, segundo relatos, que ele não resistiria a uma nova denúncia.

Na PF, delator promete mais provas

Depois de entregar áudios, João Dias diz que 20 ONGs denunciarão propina no Esporte

Jailton de Carvalho

Em novo depoimento à Polícia Federal, sem a presença de seus advogados, o policial militar João Dias Ferreira, ex-militante do PCdoB, informou que outras sete ONGs também vão denunciar o esquema de propina no Ministério do Esporte. Ao todo, o policial espera arregimentar representantes de 20 ONGs que teriam cometido fraudes no programa Segundo Tempo por sugestão de altos funcionários do ministério.

- Eu já conversei com sete ONGs. Vamos conversar com outras. Ao todo, 20 donos de ONGs vão lá (na Polícia Federal) entregar tudo - disse João Dias ao GLOBO.

Segundo o PM, um grupo de servidores saía a campo em buscas de ONGs, oferecia convênios e, em contrapartida, exigia a contratação de algumas empresas aliadas da organização. Algumas empresas forneciam parte dos estoques de alimentos, equipamentos e uniformes. Outras cediam notas fiscais falsas. A partir dos contratos com empresas reais ou fictícias, parte do dinheiro dos convênios destinados a estimular a prática de esporte entre crianças do Distrito Federal retornava para o caixa de dirigentes do PCdoB. As verbas eram usadas para financiamento de campanhas eleitorais e enriquecimento ilegal.

No interrogatório, João Dias entregou ainda aos delegados Fernando de Sousa e Jackson Rimac os 14 áudios de duas comprometedoras conversas que teve com quatro dirigentes do ministério e com o ex-jogador Tony Mattos, supostamente um dos principais arrecadadores de dinheiro do PCdoB em Brasília. A denúncia mais grave foi dirigida a um ex-secretário nacional de Esporte Educacional do Ministério. Segundo João Dias, esse ex-secretário teria usado uma ordem de prisão falsa para tentar extorquir dele R$200 mil. João Dias entregou a cópia do suposto mandado de prisão que teria sido expedido em 13 de julho de 2007.

Em julho de 2007, o PM foi chamado para uma conversa com este ex-secretário, na sala dele, no segundo andar do prédio sede do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transporte (Dnit).

Ordem de prisão pressionaria o PM

Segundo o policial, durante a conversa, o ex-secretário exibiu a ordem de prisão contra Eduardo Pereira Tomaz, coordenador das ONGs do policial, a Federação Brasiliense de Kung Fu (Febrak) e Associação João Dias de Kung Fu e Fitness. O mandado "teria sido usado para pressionar o declarante ao recebimento de propina", disse Dias, conforme depoimento do policial ao qual O GLOBO teve acesso. Em tom de cumplicidade, o interlocutor teria dito que era preciso fazer algo para livrar Tomaz da prisão. A detenção dele poderia atingir duramente os negócios do policial.

- Ele deve ter feito alguma coisa errada sem você saber, João - disse o ex-secretário, conforme relato do policial.

João Dias disse que ficou atordoado diante do mandado de prisão supostamente assinado pelo juiz Nelson Ferreira Júnior. O ex-secretário teria pedido então R$200 mil. O dinheiro seria para pagar advogados. Mais tarde, o policial descobriu que a ordem de prisão era falsa. Naquele momento, auxiliares do ministro Orlando Silva estariam fazendo pressão para demover o policial de levar adiante as denúncias contra fraudes no Segundo Tempo.

O policial disse que não pagou a propina e, desde então, partiu para o confronto com militantes do PCdoB e dirigentes do ministério que, depois de convidarem-no a participar do proama Segundo Tempo, teriam resolvido transferir para ele responsabilidades sobre eventuais irregularidades nos convênios. O ex-secretário não foi localizado ontem pelo GLOBO.

FONTE: O GLOBO

Governo teme que crise ameace votações

Para evitar traições na base, Dilma quer acelerar pagamento de emendas parlamentares

Cristiane Jungblut e Adriana Vasconcelos

BRASÍLIA. A presidente Dilma Rousseff pôs seu time político em campo desde ontem para evitar que a crise no Ministério do Esporte e a insatisfação da base aliada com o atraso no pagamento das emendas parlamentares ao Orçamento ameace a votação da DRU (Desvinculação das Receitas da União), amanhã no plenário da Câmara. Líderes governistas temem que o governo Dilma sofra sua primeira grande derrota no Congresso, com votos dos aliados. A oposição, por sua vez, aposta em novas convocações de envolvidos no escândalo do Esporte e no depoimento de João Dias Ferreira, o delator do esquema.

A despeito do esforço do Palácio do Planalto e da base aliada para desqualificar as acusações de João Dias - os governistas pretendem esvaziar a sessão de amanhã em que ele será ouvido numa comissão da Câmara -, a pressão pela demissão do ministro Orlando Silva ganhou ontem apoio de um parlamentar petista: o deputado Francisco Praciano (AM), presidente da Frente Parlamentar de Combate à Corrupção.

O Planalto corre contra o tempo porque tem dois meses para aprovar, na Câmara e no Senado, a prorrogação da DRU até dezembro de 2015. Assim, poderá mexer livremente em 20% do Orçamento.

Ontem, a ministra de Relações Institucionais, Ideli Salvatti, conversou com secretários-executivos dos ministérios que detêm a maioria das emendas para acelerar o seu pagamento, uma vez que há a decisão política de liberá-las. Depois, ela convocou líderes aliados no Congresso para traçar novas estratégias.

Orientada por Dilma, Ideli tenta adiar novos contenciosos para o final de novembro ou dezembro. Ainda que a bancada do PCdoB, com 15 deputados, não consiga impedir uma votação, o clima de insatisfação dos comunistas podem contaminar outros aliados, caso Orlando seja demitido já.

O líder do governo na Câmara, Cândido Vaccarezza (PT-SP), confirmou a intenção de votar a DRU amanhã. A ideia, no entanto, é insistir na votação apenas se houver garantia de que a base votará unida, sem traições.

Reforçando o discurso da oposição contra a permanência de Orlando no ministério, o petista Francisco Praciano disse que as denúncias são graves e deveriam levar o próprio ministro a pedir exoneração:

- Precisamos de ações estruturais, no sentido de organizar e estruturar os órgãos fiscalizadores deste país. Devemos promover o aperfeiçoamento das leis de combate à corrupção - disse ele, propondo o "PAC da moralidade".

Já os líderes do PSDB na Câmara, Duarte Nogueira (SP), e no Senado, Álvaro Dias (PR), apresentaram novos requerimentos convidando o assessor especial Fábio Hansen e o ex-chefe de gabinete da Secretaria Executiva do Ministério do Esporte Charles Rocha para depor nas duas Casas. Os dois foram flagrados em áudio, orientando João Dias a se livrar das irregularidades de um convênio firmado entre a pasta e um de suas ONGs, acusadas de desviar R$3,2 milhões do ministério.

"Posição de ministro não é definitiva", diz líder do PCdoB

Para Álvaro Dias, o mais importante é descobrir para onde foram os recursos:

- Esse escândalo vai muito além desse confronto (entre João Dias e Orlando). O que importa verdadeiramente nesse caso é saber se recursos foram desviados e qual foi o seu destino - afirmou.

- O denunciante João Dias já confirmou que virá à Câmara trazer mais dados. O mínimo que devemos esperar dos demais envolvidos é que também compareçam para explicar o conteúdo das gravações divulgadas - emendou Nogueira, que defende a convocação do ministro da Controladoria Geral da União, Jorge Hage.

O líder do PCdoB na Câmara, Osmar Júnior (PI), minimizou as declarações do ministro da Secretaria Geral da Presidência, Gilberto Carvalho, para quem a situação de Orlando não é definitiva:

- A posição de um ministro de Estado não é definitiva, independentemente de haver crise ou não. Esse foi o sentido da afirmação. Dentro de um tempo, a presidente vai fazer uma reforma administrativa: pode ser que um ministro que não esteve em crise, por exemplo, não permaneça.

FONTE: O GLOBO

Dilma: Orlando não resistiria a nova denúncia

Em inauguração de ponte no Amazonas, presidente demonstra preocupação com ministro; Lula participa de solenidade

Gerson Camarotti* e Natália Lucas**

BRASÍLIA E MANAUS. Numa conversa reservada ontem, em Manaus, a presidente Dilma Rousseff demonstrou preocupação com a situação política do ministro do Esporte, Orlando Silva. Ao lado do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e de outros interlocutores, ela admitiu, segundo relato de presentes, que o surgimento de novas denúncias poderia inviabilizar a permanência do ministro no governo.

- Ele não resistiria a mais uma denúncia nova - constatou Dilma, segundo relato de interlocutores que estavam em Manaus.

Em outro momento, foi o próprio Lula quem demonstrou preocupação com a quantidade de denúncias envolvendo o Ministério do Esporte e assessores de Orlando. Mas ressaltou que era preciso ter cautela com a veracidade das denúncias.

- Lula está preocupado com o volume de acusações envolvendo Orlando. Mas ele alertou: "Tem que saber até onde tudo isso é verdade" - revelou ao GLOBO um integrante da comitiva presidencial.

Nos bastidores, o ex-presidente Lula tem sido um dos maiores defensores da permanência de Orlando Silva no governo Dilma, mesmo depois das denúncias. Para surpresa de vários integrantes da comitiva, Lula viajou no avião presidencial com Dilma de Brasília para Manaus e conversaram reservadamente. Ele se deslocou de São Paulo para Brasília para acompanhar a presidente.

Os dois participaram ontem da inauguração da Ponte Rio Negro, que vai ligar Manaus à cidade vizinha de Iranduba. Na cerimônia oficial, Lula também foi cauteloso, evitando ofuscar a presidente. E fez um rápido discurso. Segundo relatos, chamou a atenção o tratamento atencioso que Dilma dispensou ao ex-presidente.

Dilma pede a Lula para que ele "não desapareça"

No aeroporto, ela fez questão de andar com Lula por cerca 800 metros até a porta do jato que o levaria para o México, onde ele receberia o prêmio Amalia Solórzano, concedido por ter se destacado no trabalho pelo desenvolvimento do seu país. Durante todo o tempo, em Manaus, Dilma só tratava o antecessor por "presidente". Na despedida, a presidente Dilma comentou:

- Não desapareça! Você está viajando demais.

Em Manaus, Dilma e Lula foram abordados pela senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM). Segundo a senadora, a presidente teria dito que "gostou muito da conversa com Orlando e que ele pareceu estar muito firme". De Lula, ela ouviu que, se os comunistas estiverem seguros da inocência do ministro, que continuassem resistindo.

- Se vocês têm segurança, têm que ir em frente - disse Lula, segundo Vanessa.

Ao GLOBO, o ministro Gilberto Carvalho (Secretaria Geral) afirmou, na edição de ontem, que não há posição definitiva e que Dilma ainda avalia a situação para decidir se mantém Orlando Silva. Interlocutor frequente do ex-presidente, foi Carvalho que fez o convite para que Lula fosse a Manaus.

Ontem, o ministro Orlando Silva tentou sair da agenda negativa, e pelo Twitter passou informações de que já está cuidado das demandas da pasta. Uma das principais preocupações no Palácio do Planalto é com a paralisia do Ministério do Esporte. Ele já esteve ausente do evento da Fifa, em Zurique, na semana passada, para o anúncio dos jogos da Copa de 2014.

"Encerrei há pouco uma reunião do Comitê de Responsabilidades, que reúne as cidades da Copa. A pauta foi acessibilidade", escreveu Orlando Silva no Twitter.

Em Manaus, na inauguração da ponte, que começou a ser construída em 2007, a presidente discursou para um público de mais de 50 mil pessoas. O discurso foi interrompido duas vezes por conta da aglomeração da multidão. Alguns grupos aproveitaram a oportunidade do evento para protestar, entre eles o Greenpeace, contra o Código Florestal. O movimento S.O.S. Encontro das Águas também fez protesto no evento contra a construção do Porto das Lajes no encontro das águas no Rio Negro. O grupo pedia da presidente a homologação do tombamento definitivo do Encontro das Águas como patrimônio da Humanidade.

Ex-presidente justifica presença em inauguração

Ao falar também na cerimônia de inauguração da ponte, o ex-presidente Lula fez questão de explicar o motivo de sua presença no ato oficial:

- Quando a Dilma tomou posse, eu falei que faria questão de participar da inauguração da ponte, porque sei dos benefícios que ela vai trazer para o povo desta região, assim como vocês souberam do compromisso dela com o estado - disse.

Lula disse ainda que eleitores vão descobrir, ao fim do mandato de Dilma, que valeu a pena ter dado o voto de confiança na presidente, em 2010.

(*) Colaboraram Cristiane Jungblut e Maria Lima

(**) Especial para O GLOBO

FONTE: O GLOBO

Ministro ajudou ONG de delator acusado de fraude

O ministro Orlando Silva (Esporte) autorizou de próprio punho medida que beneficiou ONG do policial João Dias Ferreira, delator de supostas fraudes na pasta. Documento assinado por Orlando em 2006 reduziu a contrapartida exigida da entidade para receber verbas. O policial obteve o convênio mesmo com as irregularidades detectadas pelo próprio ministério em outra ONG comandada por ele

Ministro ajudou ONG sob suspeita em novo contrato

Ato assinado por Orlando beneficiou entidade de policial que hoje o acusa

Ministério reduziu exigência mesmo após identificar desvio em convênio; Orlando diz que seguiu área técnica

Filipe Coutinho e Fernando Mello

BRASÍLIA - O ministro do Esporte, Orlando Silva, autorizou de próprio punho uma medida que beneficiou uma organização não governamental do policial militar que hoje o acusa de comandar um esquema de desvio de dinheiro público.

Em julho de 2006, Orlando assinou um despacho que reduziu o valor que a ONG de João Dias Ferreira precisava gastar como contrapartida para receber verbas do governo, permitindo que o policial continuasse participando de um programa do ministério.

A medida foi autorizada mesmo depois de auditorias internas terem apontado os primeiros indícios de fraude nos negócios do policial com o ministério, num período em que ele ainda mantinha relação amistosa com o governo.

Os documentos obtidos pela Folha são os primeiros a estabelecer uma ligação direta entre Orlando e o policial.

O ministro está no centro de uma crise há dez dias, desde que Ferreira afirmou que os desvios nos convênios das ONGs com o Esporte serviam para alimentar os cofres do PC do B, partido que controla o ministério desde 2003.

Orlando diz que não conhece o policial e o acusa de mentir para se defender contra as cobranças que passou a sofrer mais tarde para devolver os recursos que suas ONGs receberam do governo.

Em julho de 2006, Orlando assinou um ofício que reduziu exigências e fixou em 6% a contrapartida da Associação João Dias num convênio com o ministério do Esporte.

O percentual era inferior ao que vinha sendo exigido pela pasta nos contratos com outras ONGs do Distrito Federal, que na época tinham que entrar com 30% em média, de acordo com levantamento feito pela Folha.

Era mais baixo, até mesmo, do que a contrapartida exigida pelo Esporte no primeiro convênio assinado com outra ONG do policial (Federação Brasiliense de Kung Fu). Firmado um ano antes, em 2005, esse contrato previa índice de aplicação de recursos, por parte da entidade, de 22%.

O primeiro convênio do policial com o ministério foi reprovado pela área de fiscalização da pasta em abril de 2006, três meses antes de Orlando assinar o despacho que ajudou o policial a ganhar outro convênio com o governo.

A fiscalização do ministério constatou várias irregularidades na execução do primeiro convênio e vetou sua renovação. Para contornar o problema, o policial reapresentou o projeto com outra ONG, a Associação João Dias.

O documento obtido pela Folha mostra que Orlando liberou o novo convênio e definiu a contrapartida menor, de 6%. É uma prerrogativa do ministro conceder ou não esse tipo de benefício para as ONGs nesses casos.

Em seu despacho, Orlando argumenta que fixou a taxa em 6% para atender a uma sugestão da área técnica do ministério, mas o parecer dos técnicos não faz nenhuma sugestão e diz apenas que o ministro tinha autoridade para decidir o que fazer.

Em dezembro de 2007, vistorias feitas pelo ministério descobriram que a Associação João Dias também fraudou o segundo convênio. Foi aí que o policial começou a brigar com o ministério.

Em abril de 2008, Ferreira se reuniu com assessores de Orlando Silva para tentar resolver os problemas com suas prestações de contas.

Depois disso, o ministério demorou mais de um ano para enviar informações solicitadas pela Polícia Militar do Distrito Federal para subsidiar uma sindicância aberta para investigar os negócios do policial.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Lula e Dilma ainda discutem futuro de Orlando

Preocupado com crise no Esporte, ex-presidente muda discurso e agora critica o PC do B: "Não me falam a verdade"

Christiane Samarco

BRASÍLIA - Depois de comandar uma campanha de bastidor pela permanência de Orlando Silva à frente do Ministério do Esporte e de pedir ao PC do B que resistisse às pressões para abandonar o posto, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva mudou o discurso, passou a criticar o partido e o ministro e admitiu que o desfecho da crise "está em aberto".

Em conversa com um correligionário ontem, Lula confessou que está preocupado e desabafou: "Não tenho mais convicção de nada. Esses caras não me falam a verdade". Também foi este o tom do encontro reservado com sua sucessora Dilma Rousseff.

A convite da presidente, ele a acompanhou na viagem de Brasília a Manaus para a inauguração da Ponte do Rio Negro ontem. Segundo um dos interlocutores do ex-presidente, o tema da conversa foi a situação de Orlando.

Diante de mais uma notícia de fraude em programa do ministério, conforme notícias publicadas ontem pelo Estado, Lula reclamou dos dirigentes do PC do B que não lhe contam a história por inteiro. A mais de um interlocutor, ele admitiu ter sido surpreendido pelas denúncias e pela sequência de suspeitas levantadas. E não escondeu o incômodo causado pela situação.

Nessas conversas, Lula deixou claro que está "muito preocupado", e que não tem convicção formada sobre as denúncias, "nem para o bem, nem para o mal". Sua única certeza é a de que ele não vem recebendo as informações por completo. "Só me contam o que interessa. O que não interessa, eu fico sabendo pelos jornais", queixou-se.

Durante as 2 horas e 40 minutos de voo até a capital amazonense, Lula e Dilma fecharam-se na área reservada do avião presidencial para tratar da crise que envolve o ministério do Esporte. A comitiva da presidente, que incluiu o líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RO), e o ministro do Desenvolvimento, Fernando Pimentel, mal viu Dilma e Lula a bordo.

Tensão. Diferentemente do habitual, a presidente dedicou todo o seu tempo e sua atenção a Lula, e não conversou com nenhum dos ministros convidados a acompanhá-la. Mesmo depois de o avião aterrissar, a comitiva que a aguardava no aeroporto, incluindo o governador Omar Aziz (PSD), ainda teve que esperar cerca de 20 minutos, até que o encontro reservado terminasse.

Integrantes da comitiva presidencial que acompanharam Lula e Dilma na inauguração da ponte Rio Negro dizem que ambos procuraram disfarçar o clima tenso da conversa. Mas os que conhecem bem o ex-presidente dizem que encontraram um Lula bem mais sério do que o normal, e abatido por conta dos problemas no Esporte.

Ele confessou não saber mais o que é real e o que é jogo político na crise com o PC do B. Deixou a impressão de que fatos novos contra o ministro na imprensa acabam tornando sua situação insustentável. Lula avalia que o problema vai muito além da denúncia de corrupção no governo e que a crise é política.

O que difere esta crise das anteriores que envolveram denúncia de corrupção no governo é precisamente o PC do B. Afinal, os demais partidos, como o PMDB de Wagner Rossi, e o PR de Alfredo Nascimento, têm divisões internas, enquanto os comunistas integram um partido monolítico. Além disso, Lula não tem o PC do B na conta de uma legenda aliada, mas de um parceiro de projeto de poder, o que dificulta ainda mais o descarte de um ministro da sigla.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Charge do dia - Cláudio de Oliveira

FONTE: http://chargistaclaudio.zip.net/

Dilma recebe hoje FHC no Alvorada para um jantar

Convidado por Dilma, FHC retorna ao Alvorada

Presidente faz jantar para líderes mundiais

Valdo Cruz e Ana Flor

BRASÍLIA - Quase nove anos depois de deixar a Presidência, Fernando Henrique Cardoso voltará hoje ao Palácio da Alvorada como convidado da presidente Dilma Rousseff.

Ela receberá para jantar o grupo conhecido como The Elders (os anciãos, em português), que reúne líderes mundiais em torno de uma agenda de promoção da paz.

Estão confirmados o arcebispo sul-africano Desmond Tutu; o ex-presidente norte-americano Jimmy Carter; o ex-presidente da Finlândia Martti Ahtisaari; a ex-primeira-ministra da Noruega Gro Brundtland; e a ex-alta comissária da ONU para Direitos Humanos Mary Robinson.

O grupo foi criado em 2007 pelo ex-presidente sul-africano Nelson Mandela, que não participará do jantar por motivos de saúde.

Em fevereiro, FHC pediu a Dilma que os recebesse em audiência. À época, a presidente confirmou o desejo de encontrar os líderes. Eles estão reunidos no Rio.

Será a primeira vez que FHC voltará ao Alvorada, residência oficial da Presidência, desde o final de seu governo (1994-2002).

Depois de um convívio difícil com Lula, FHC tem mantido relações cordiais com Dilma. Ele chegou a irritar o PSDB com declarações elogiosas à ação da presidente no combate à corrupção.

Já Dilma desagradou o PT ao fazer elogios a FHC em seu aniversário de 80 anos.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Médicos do SUS param hoje em 21 estados

Não serão realizadas consultas, cirurgias e exames; categoria reivindica melhores salários e condições de trabalho

Carolina Brígido e Adauri Antunes Barbosa

BRASÍLIA. Em 21 estados, não serão realizadas hoje consultas, exames e cirurgias marcados pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Os médicos cruzarão os braços durante todo o dia em protesto contra as más condições de trabalho e a baixa remuneração. Os atendimentos de emergência, no entanto, serão mantidos. O movimento é organizado pelo Conselho Federal de Medicina (CFM), pela Associação Médica Brasileira (AMB) e pela Federação Nacional dos Médicos (Fenam), que calculam a adesão de pelo menos metade dos 195 mil profissionais do SUS.

Ontem, a paralisação estava confirmada nos seguintes estados: Acre, Alagoas, Amapá, Amazonas, Bahia, Ceará, Espírito Santo, Goiás, Maranhão, Mato Grosso, Minas Gerais, Pará, Paraíba, Pernambuco, Piauí, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul, Rondônia, São Paulo, Santa Catarina e Sergipe. Em Santa Catarina, a manifestação ocorrerá por apenas uma hora, à tarde. Em São Paulo, ocorrerá o dia todo, mas em apenas algumas unidades. E no Piauí, o movimento se estenderá por três dias.

Nas demais unidades da federação, haverá manifestações e protestos públicos, mas as atividades não devem ser interrompidas. O segundo vice-presidente do CFM, Aloísio Miranda, garantiu que a população não será prejudicada com a paralisação:

- Todos os atendimentos serão remarcados e manteremos o atendimento de emergência, como sempre o médico faz nesses momentos. Queremos dizer à população que estamos do lado dela. Esse movimento é a favor do SUS, cuja assistência hoje está bem atrás daquilo que nós, médicos, desejamos, e daquilo que a população espera.

Movimento luta por piso salarial de R$9.188,22

Segundo os organizadores do movimento, o salário médio de um médico com jornada de 20 horas semanais, sem considerar gratificações, é de R$1.946,91. Dependendo da unidade da federação, o valor varia de R$723,81 a R$4.143,67. As entidades de classe defendem piso salarial nacional de R$9.188,22 para a categoria. As entidades também alertam para a falta de leitos hospitalares. Entre 1990 e 2008, o país teria perdido 188.845 leitos. Outras reclamações são a ausência de um plano de carreira para a categoria e contratações sem concurso.

- Com a mobilização, queremos chamar a atenção das autoridades para a necessidade de mais recursos para a saúde, melhor remuneração e melhor assistência à população - disse Aloísio Miranda.

Em São Paulo, o ministro da Saúde, Alexandre Padilha, disse que acredita na responsabilidade das entidades médicas e que elas não vão permitir que haja paralisação dos serviços de emergência e de urgência.

- Os médicos têm seus dias nacionais de luta, é uma ação tradicional, os médicos sempre tiveram. O Ministério da Saúde quando souber quais são as propostas desse dia nacional de luta vai ter opinião sobre isso. O ministério tem visto como dia nacional de mobilização e não acredita em paralisação de serviços de urgência e emergência, acredita na responsabilidade das entidades médicas, torcemos para isso - disse Padilha, depois de participar de um almoço-debate com empresários do Grupo de Líderes Empresariais (Lide).

Falando sobre a importação irregular dos Estados Unidos de lixo hospitalar contaminado, o ministro disse que o governo, em parceria com a polícia, está empenhado em esclarecer o caso.

- As medidas todas já foram tomadas, tanto do ponto de vista da Vigilância Sanitária aqui no Brasil, quanto também da Polícia Federal brasileira, que está investigando o caso detalhadamente, e já tem nessa investigação a parceria da polícia federal americana, da polícia internacional, para que se descubra claramente quem são os responsáveis por esse crime - disse Padilha.

FONTE: O GLOBO

Projeção de crescimento recua para 3,3%

Pesquisa mostra o efeito interno dacrise internacional

Gabriela Valente

BRASÍLIA. A projeção dos economistas ouvidos na pesquisa semanal Focus, realizada pelo Banco Central (BC), é de que o crescimento econômico continuará a desabar. Para este ano, caiu de 3,42% para 3,3%, e para o ano que vem passou de 3,6% para 3,51%. Em outubro, o índice do BC que antecipa o crescimento do país já mostrava queda de 0,53%. E o cenário internacional aumenta essa retração daqui para a frente.

"A redução das perspectivas de crescimento global, o aumento da incerteza e a piora das condições financeiras internacionais começaram a impactar negativamente o crescimento do Brasil. Estimamos que o efeito das mudanças já ocorridas no cenário internacional são relevantes para a economia doméstica, diminuindo o crescimento no fim dos terceiro e quarto trimestres", diz o comunicado do Itaú, divulgado ontem.

A instituição prevê um crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) de 3,2% para este ano e de 3,7% para 2012, mas "entendemos que os dados recentes elevaram as chances de taxas menores de crescimento para os dois anos". Em especial pela desaceleração da indústria e do comércio varejista. Segundo a pesquisa do BC, a produção industrial se expandirá apenas 2% neste ano. Essa estimativa despenca há dois meses seguidos e, mesmo assim, é considerada otimista pelo Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi).

- Vai ter de melhorar muito para crescer 2% - diz Júlio de Almeida, do Iedi.

O Natal pode ajudar e reaquecer a produção, freada pela alta dos juros e pela crise internacional. A projeção de crescimento da indústria em 2012 cai há duas semanas e está em 3,9%.

FONTE: O GLOBO

Dívida pública subiu para R$1,8 trilhão

Aumento em setembro foi de R$40,3 bilhões. Com maior procura, taxa exigida por investidor caiu

Martha Beck

BRASÍLIA. A dívida pública federal subiu 2,28% - ou R$40,3 bilhões - em setembro e fechou o mês em R$1,808 trilhão. O aumento ocorreu devido a uma emissão líquida de títulos (de R$11,67 bilhões) e também à incorporação de juros que corrigem o estoque da dívida (R$28,67 bilhões). Segundo o coordenador-geral de Operações da Dívida, Fernando Garrido, a equipe econômica tem conseguido administrar o endividamento público sem dificuldades. Ele afirmou que, apesar da crise, a demanda dos aplicadores pelos papéis do governo não caiu.

Garrido explicou que, embora setembro tenha registrado o menor volume de emissões do ano - R$23,8 bilhões - a procura pelos títulos brasileiros fez com que a taxa exigida pelos investidores para comprar esses papéis também caísse.

O coordenador destacou que, no primeiro leilão de setembro, os títulos prefixados com vencimento em janeiro de 2014 (principal papel usado pelo governo para financiar a dívida) foram vendidos com taxa de 11,16% ao ano. Já em 20 de outubro, o percentual baixou para 10,91%.

Os estrangeiros reduziram sua participação na dívida. Enquanto em agosto eles detinham R$198,95 bilhões (ou 11,75% do total), em setembro, o montante foi de R$194,65 bilhões, ou 11,29%. Essa foi a primeira queda desde fevereiro de 2011.

FONTE: O GLOBO

Gilberto Alves - E Você... Não Dizia Nada (1962).

Tranquila e infalível como Bruce Lee:: Luiz Eduardo Soares

Enquanto a taxa nacional média de esclarecimento de homicídios dolosos é de 8%, o país entope penitenciárias de jovens pobres, não violentos

Os primeiros nove meses do governo Dilma, na segurança pública, foram decepcionantes.

A decepção decorre do contraste entre as expectativas suscitadas pelos excelentes nomes escalados para enfrentar o desafio e a postura da presidente, que prefiro descrever a qualificar, por respeito ao cargo e à sua biografia.

O começo foi alvissareiro, com a nomeação do ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, que encheu de esperança até os céticos.

O primeiro ato do novo ministro justificou o otimismo. Foram convidados Regina Mikki e Pedro Abramovay para as secretarias de segurança e de políticas para as drogas.

Escolhas irretocáveis, cujos significados prenunciavam avanços. Some-se a isso uma vitória do ministro ao obter o deslocamento da secretaria responsável pela política sobre drogas para o Ministério da Justiça. Ainda que o ideal fosse inseri-la no Ministério da Saúde, tratava-se de um passo positivo da maior importância.

Na sequência, mais um alento: em entrevista ao "O Globo", Pedro mostrava quão perversa vinha sendo a escalada do encarceramento no Brasil, cujas taxas de crescimento já eram campeãs mundiais: desde 2006, o tipo penal que concentrava o foco das ações repressivas correspondia à prática da comercialização de drogas ilícitas sem armas, sem violência, sem envolvimento com organizações criminosas.

De meados dos anos 90 até hoje, passamos de 140 mil a mais de 500 mil presos. Em termos absolutos, só perdemos para a China e para os Estados Unidos. Era preciso mudar a abordagem do problema.

Por aí ficou Pedro, mas já era suficiente para disseminar o entusiasmo em tantos de nós.

Enquanto a taxa média nacional de esclarecimento de homicídios dolosos é de 8% (92% dos homicidas permanecem impunes, nem sequer são identificados nas investigações policiais), o país entope penitenciárias de jovens pobres, com baixa escolaridade, não violentos, que negociavam drogas no varejo.

Ao condená-los à privação de liberdade em convívio com grupos profissionais e organizados, que futuro estamos preparando para eles e para a sociedade?

Não há uso mais inteligente para os R$ 1.500 mensais gastos com cada jovem preso que não cometeu violência? É preciso impor limites, mas também ampará-los na construção de alternativas.

Veio a primeira frustração: a presidente ordenou ao ministro que desconvidasse Pedro Abramovay. A ordem presidencial caiu como um raio, fulminando a confiança que se consolidava e expandia.

Enquanto isso, o Brasil continua sendo o segundo país do mundo em números absolutos de homicídios dolosos -em torno de 50 mil por ano-, atrás apenas da Rússia.

Para reverter essa realidade dramática, uma equipe qualificada do ministério trabalhou todo o primeiro semestre na elaboração de um plano de articulação nacional para a redução dos homicídios dolosos, valorizando a prevenção mas com ênfase no aprimoramento das investigações.

Um plano consistente e promissor, que não transferia responsabilidades à União, mas a levava a compartilhar responsabilidades práticas. Em meados de julho, chegou a data tão esperada: o encontro com a presidente. O ministro passou-lhe o documento, enquanto o técnico preparava-se para expô-lo.

Rápida e eficaz, tranquila e infalível como Bruce Lee, a presidente antecipou-se: homicídios? Isso é com os Estados. Pôs de lado o documento e ordenou que se passasse ao próximo ponto da pauta.

Luiz Eduardo Soares é antropólogo, autor de "Justiça" (Nova Fronteira, 2011). Foi secretário nacional de Segurança Pública (2003).

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

A verdade sempre liberta :: José Serra

"Tendo encarado a besta do passado olho no olho, tendo pedido e recebido perdão e tendo feito correções, viremos agora a página - não para esquecê-lo, mas para não deixá-lo aprisionar-nos para sempre."
Desmond Tutu

Está na reta final o debate no Congresso sobre a Comissão da Verdade, cuja missão será também elucidar o destino dos brasileiros que desapareceram na resistência, armada ou não, à ditadura. É justo que suas famílias e amigos recebam do Estado a explicação definitiva sobre os fatos, a ser registrada pela história. Pois, se governos mudam, o Estado é um só, há uma linha de continuidade institucional.

O projeto da Comissão da Verdade ficou empacado por um bom tempo, por causa de erros cometidos pelo governo anterior. Misturaram-se três assuntos: o direito à verdade propriamente dita, o sacrifício de pessoas inocentes em ações das organizações armadas que contestavam o regime e o desejo de responsabilizar criminalmente os agentes desse regime envolvidos na violência contra a oposição da época. Um desejo que não encontra sustentação legal. Neste caso, o impasse só foi superado depois que o Supremo Tribunal Federal decidiu pela vigência da Lei de Anistia de 1979, considerando que ela foi recepcionada pela Constituição.

A Lei de Anistia foi uma conquista das forças democráticas, foi arrancada do regime militar após uma ampla mobilização política e social. E é também produto da sua época e da correlação de forças daquele momento. O STF julgou bem, ao não desfazer aquele acordo, que, no balanço final, foi positivo para o Brasil, permitindo uma transição menos atribulada para a democracia. No trade-off, o país saiu ganhando.

A anistia acabou permitindo uma reconciliação verdadeira. Diferentemente de outros países, evitamos aqui alargar o fosso entre o corpo militar e a sociedade. E Forças Armadas respeitadas, coesas e integradas à institucionalidade democrática são um pilar fundamental da estabilidade e da afirmação nacionais. É importante que a Comissão da Verdade, agora em debate no Senado, com a competente relatoria do senador Aloysio Nunes, do PSDB, cujo substitutivo melhora o projeto saído da Câmara, parta das premissas certas.

Seu objetivo não deve ser promover um ajuste de contas parajudicial com personagens do passado. Isso, aliás, cairia facilmente na Justiça. Muito menos deve se deixar atrair pela tentação de produzir uma história oficial. Ou uma narrativa oficial. Precisará, isto sim, concentrar todas as energias na investigação isenta e objetiva. E não na interpretação.

Para tanto, é preciso garantir a ela uma composição pluralista, o que deveria ser de interesse do próprio Executivo, pois seria péssimo se a Comissão da Verdade tivesse seu trabalho questionado por abrir as portas ao facciosismo, à parcialidade e ao partidarismo. É ilusão imaginar que um assunto assim poderia ficar livre de olhares político-partidários, mas é importante minimizar o risco. E para isso a pluralidade é essencial.

Tampouco será o caso de transformar a comissão em órgão certificador de papéis históricos. Não caberá a ela fazer o juízo de valor sobre cada personagem. Seria uma espécie de crueldade pretender realizar a posteriori o julgamento histórico-político de cada ator da época. Sabe-se que o homem é ele mesmo e suas circunstâncias. O comportamento sob tortura, apenas como exemplo, jamais poderá ser objeto de juízo moral posterior. Sob pena de estimular a inversão de papéis e a execração das vítimas.

No fim dos anos 60 e começo dos anos 70 do século passado, o Brasil foi palco de variadas formas na luta contra o regime. Cada um de nós é livre para olhar aquele período e concluir o que foi certo e o que não foi na resistência à ditadura. É um olhar político. E é natural que cada um enxergue o passado à luz de suas convicções atuais. O complicador aparece exatamente aqui: as convicções atuais são também fruto da experiência acumulada, incluindo os erros passados.

Não se trata aqui de ceder ao relativismo, mas deixar cada um com o seu papel. As instituições fazem o seu trabalho e os historiadores fazem o deles. Parece-me uma boa divisão de tarefas.

Por último, reitero uma convicção que já expressei em público. É fundamental para qualquer país não ter medo do passado. A transparência sobre acontecimentos recentes é importante para construir uma sociedade ainda mais democrática. O exemplo a seguir poderia ser o da Comissão de Verdade e Reconciliação da África do Sul. As palavras do grande bispo Desmond Tutu, presidente dessa comissão, deveriam servir de guia para todos que queiram, com sinceridade, enfrentar os desafios do presente.

José Serra foi deputado federal, senador, prefeito e governador de São Paulo, pelo PSDB.

FONTE: O GLOBO

As piores razões:: Dora Kramer

O ministro do Esporte foi mantido no cargo e, segundo reza a versão oficial, sua permanência depende da capacidade dele de estancar a enxurrada de denúncias sobre as atividades do ministério e substituir o noticiário negativo por uma agenda positiva, cujo primeiro item seria debater com o Congresso a Lei Geral da Copa.

Quer dizer, se o assunto corrupção sair de cena, tudo bem: fica o dito pelo não dito. O problema não é a notícia, mas o efeito que ela produz ou deixa de produzir.

Os convênios fantasmas, o descontrole na distribuição de recursos, o favorecimento a empresa da família, os assessores que ensinam o denunciante qualificado como "bandido" o caminho das pedras para se safar de punições por fraudes cometidas no próprio ministério, os repasses de verbas para beneficiar correligionários do PC do B, a assinatura de contratos com gente inidônea, nada disso é levado em conta.

Na ótica do governo, expressa pelo secretário-geral da Presidência, Gilberto Carvalho, a presidente Dilma Rousseff não pode "entrar na onda" nem embarcar no "clima de histeria".

Vai analisar as coisas com calma e esperar que surjam provas (um recibo de próprio punho?) contra o ministro para decidir se Orlando Silva é, ou não, uma pessoa ética, profissional, moral e tecnicamente capaz de conduzir o ministério que estará à frente da organização da Copa de 2014 e da Olimpíada de 2016. Essas são as razões oficiais. No paralelo, são outros e mais variados os motivos pelos quais Orlando Silva por ora fica.

Fica porque a presidente não quer atritos com a "base", reabrindo a temporada de demissões de ministros.

Fica porque Lula aconselhou o PC do B a vestir a "casca grossa" e deu aval como defensor junto a Dilma.

Fica porque não interessa ao governo ver explodir uma briga de "famiglias" entre PT e PC do B, por conta das digitais do governador petista Agnelo Queiroz (DF) - antecessor e ex-chefe de Orlando Silva - nas atividades suspeitas do Ministério do Esporte que fizeram o procurador-geral da República pedir ao Supremo Tribunal Federal uma investigação conjunta.

Fica porque o PC do B é, considerando a questão sob o aspecto ideológico, "da casa", diferentemente de partidos como PMDB e PR.

Fica porque os atritos com a Fifa e a CBF servem como um ótimo álibi na construção de uma tese conspiratória.

Fica, sobretudo, porque o governo aposta na possibilidade - bastante plausível - de que o assunto canse a caia no vazio.

Em resumo, Orlando Silva fica pelas piores razões: não por suas qualidades, mas pelos defeitos de um sistema torto e viciado. De uma sistemática de alianças que captura as melhores intenções que porventura tenha um governante para torná-lo refém (na hipótese mais generosa) de uma lógica, em si, corrupta.

Sendo assim, é difícil conferir credibilidade e confiabilidade à dita disposição da presidente da República de, a partir de janeiro, montar uma equipe à semelhança da imagem de eficiência administrativa e rigor ético que ela busca transmitir ao público.

Se Lula tem hoje liberdade para afiançar a permanência de ministros sob o argumento da luta de preservação de espaços políticos, por que deixaria de ter daqui a três ou quatro meses?

Se ameaças entre partidos valem agora, deixariam de valer a partir da virada do ano?

Se a presidente receia desagradar a seus aliados com imposição de regras mais limpas em outubro, em que bases sustentar a veracidade de um presumido destemor a ser adquirido em janeiro?

Se critérios de competência e idoneidade não prevaleceram na escolha do primeiro ministério da presidente, difícil crer que prevalecerão para o segundo em condições exatamente iguais.

Tempo ao tempo. O governador Geraldo Alckmin está batendo o martelo com os pré-candidatos tucanos à Prefeitura: as prévias no PSDB serão no primeiro trimestre de 2012.

A escolha inicialmente seria no fim deste ano, mas Alckmin acha que o cenário político, notadamente de alianças, estará mais nítido em janeiro ou fevereiro.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Porteira fechada :: Eliane Cantanhêde

"Verticalidade", "porteira fechada" e "feudo" significam que um partido se apossa de um determinado ministério (e até mesmo de um setor inteiro) de cima a baixo, ou de cabo a rabo, e tudo vira sinônimo de "caixa-preta".

O PR nos Transportes, o PC do B no Esporte, o PMDB no Turismo e na Agricultura, o PDT no Trabalho e o partido do Sarney no Minas e Energia passam a ser células independentes dentro do governo. Nem o presidente, ou a presidente, têm real controle do que se passa na pasta.

É como se uma fatia do Orçamento, às vezes até bastante polpuda, ganhasse vida e destino próprios, usada ao bel-prazer dos ministros e dos seus assessores "verticalizados". Daí à corrupção é um pulo.

Como chefe da Casa Civil do governo Lula, Dilma sabia ou deveria saber disso como ninguém. Nem ela, a gerentona, escancarava as "porteiras fechadas". O resultado está aí, quase aritmético: dos cinco ministros que caíram (até o fechamento desta edição...), quatro foram acusados de desvios para partidos, empresas-fantasmas, parentes, ONGs. A sensação é a de que cada um fazia o que queria. Ficou tão fácil que todos foram afrouxando os pudores e cuidados e acabaram flagrados.

Para tentar "horizontalizar", "abrir as porteiras" e dizimar "os feudos", Dilma tem se valido das denúncias que saem aos borbotões na imprensa e reage com um expediente infalível: enfraquece o ministro aos poucos, retira-lhe poderes, exige a demissão de assessores.

O foco está agora no Esporte, mas quem olhar em volta vai ver que Trabalho, entre outros, não está passando incólume. Toda a Esplanada dos Ministérios está de barbas de molho.

"Verticalidade", "porteira fechada" e "feudo", afinal, contrariam frontalmente o que se espera -ou se exige- da administração pública: legalidade, probidade e impessoalidade. Além de competência, que é elementar, mas o que menos se busca e vê.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Partidos desconhecem o que Dilma quer:: Raymundo Costa

O anúncio da reforma do ministério no início de 2012 deixou intrigados os partidos que compõem a base de sustentação política do governo no Congresso. Reformas no fim do primeiro trimestre de ano eleitoral são comuns. É o prazo para a saída dos ministros que pretendem concorrer às eleições de outubro. Mas a ministra Ideli Salvatti (Relações Institucionais) foi específica, quando revelou as intenções da presidente da República: a reforma ocorreria no máximo até o mês de fevereiro de 2012.

A dúvida dos partidos é sobre o que Dilma quer mudar e para o quê? Em dez meses de governo, a presidente já mudou sete ministros de lugar - dois trocaram de Pasta e cinco foram demitidos. Não se espera que Dilma mexa na área econômica, do Ministério da Fazenda ao Banco Central. Também não se acredita que ela pretenda fazer um governo de amigos. O que esperam da presidente é a definição dos objetivos da mudança e quais os critérios que pretende estabelecer para a escolha dos nomes e a consolidação da base de apoio governista.

Até meados da semana passada, havia em alguns partidos da coalizão a avaliação de que Dilma iria abrir mão das indicações das bancadas partidárias, caso de todos os ministros atingidos por crises políticas, no atual governo, à exceção de Nelson Jobim, ex-ministro da Defesa. A nova crise no Ministério do Turismo sinalizou em outra direção.

Ao arbitrar a disputa por um cargo no ministério, Dilma preferiu acatar indicação da bancada do PMDB da Câmara à escolha feita pelo ministro Gastão Vieira. Mais especificamente, uma indicação dos irmãos Vieira Lima, donatários do PMDB baiano.

A indicação das bancadas aliadas para a composição de governo não é um privilégio do atual governo, mas com Dilma Rousseff ela foi ao limite. O Palácio do Planalto pode argumentar que Carlos Lupi (Trabalho), ministro do ex-presidente Lula, é uma indicação do PDT. Certo. Mas não pode dizer que ele tem o controle da bancada do partido.

Na realidade, Lupi domina a máquina pedetista, apesar de contestado pelo deputado Brizola Neto (RJ). O senador Alfredo Nascimento, ex-ministro dos Transportes, presidente do PR e também oriundo do governo Lula, tinha uma aliança com o PR da Câmara, por meio do deputado Valdemar da Costa Neto (SP). Mas a bancada do Senado atuava independentemente de sua orientação.

Graças ao controle que tinha da bancada do partido na Câmara é que o deputado Mário Negromonte (BA), líder de um partido de médio porte como o PP, conseguiu ficar com um ministério do tamanho da Pasta de Cidades. Contribuiu também o "nada contra" do governador da Bahia, Jaques Wagner (PT), que tem poder de veto sobre as indicações partidárias da Bahia.

O ministro anterior de Cidades, Márcio Fortes, era o preferido de Dilma e do presidente do PP, o senador Francisco Dornelles (RJ). Oriundo do governo anterior, não era um nome imposto a Lula, mas que Lula fez o PP engolir usando como barriga de aluguel o deputado Severino Cavalcanti (PE), eleito em 2005 presidente da Câmara por causa da divisão do PT na eleição da Mesa.

Pedro Novais, o ministro que antecedeu Gastão Vieira no Turismo, também foi uma indicação da bancada do PMDB, articulada por dois de seus nomes mais fortes - o líder Henrique Eduardo Alves (RN) e o deputado Eduardo Cunha (RJ) - e avalizada por José Sarney (PMDB-AP). Novais já entrou manco, sobreviveu à pirotecnia da "Operação Voucher", da Polícia Federal, mas sucumbiu quando se revelou que o motorista de sua mulher e a governanta de sua casa eram pagos com o dinheiro do contribuinte.

Ex-ministro da Agricultura, Wagner Rossi também foi uma escolha da bancada do PMDB na Câmara, desta vez com o aval do vice-presidente da República, Michel Temer. Os dois são aliados na política paulista. Mendes Ribeiro, o atual ministro, é deputado do PMDB, mas sua escolha deve-se a Dilma Rousseff.

Remanescente do governo Lula, o ministro do Esporte, Orlando Silva, recebeu o crisma da bancada do PCdoB. A presidente, conforme à época foi pedido ao partido, preferiria nomear uma mulher. O nome cogitado era o da deputada Luciana Santos (PE), que na sexta-feira discursou em defesa de Orlando Silva. O ministro pode agora se tornar o sexto nome a ser substituído no governo da presidente Dilma.

Ficha limpa e conhecimento técnico são requisitos sempre anunciados pelos presidentes para a escolha de seus ministros. Desta vez não deve ser diferente. O que a presidente precisa dizer é onde quer chegar em 2014, ao final de seu mandato. Lula, quando assumiu, deixou logo claro que fora eleito para tocar um programa de distribuição de renda e combater a fome.

Como a própria presidente já fez questão de dizer, as indicações políticas não são necessariamente um mal. Mas o destempero do fisiologismo é que tomou o anfiteatro. Combater a inflação e patrocinar o desenvolvimento são obrigações de todo governante. O que a presidente Dilma precisa deixar claro é quais são os seus objetivos políticos e como pretende envolver os partidos da base aliada em sua execução.

Está de volta ao cenário político e jurídico de Brasília a tese segundo a qual a tendência do Supremo Tribunal Federal (STF) é enviar para a primeira instância o processo do mensalão. Ou pelo menos a maior parte do processo. Restaria ao Supremo o julgamento de apenas dois dos indiciados com mandato parlamentar, os deputados João Paulo Cunha (PT-SP) e Valdemar da Costa Neto (PT-SP). A tese já foi defendida por alguns mensaleiros, preocupados com a suposta tendência do STF de condenar todos os acusados. O Supremo está em condições de julgar a "Quadrilha dos 40" em 2012. Quase todos dizem que querem ser julgados já, mas o fato é que jogam com a possibilidade de o julgamento ficar para 2013, mas distante das paixões eleitorais.

FONTE: VALOR ECONÔMICO

Lula para sempre :: Marco Antonio Villa

Luiz Inácio Lula da Silva não é um homem de palavra. Proclamou diversas vezes que, ao terminar o seu mandato presidencial, iria se recolher à vida privada e se afastar da política. Mentiu. Foi mais uma manobra astuta, entre tantas que realizou, desde 1972, quando chegou à diretoria do sindicato de São Bernardo, indicado pelo irmão, para ser uma espécie de porta-voz do Partidão (depois de eleito, esqueceu do acordo).

A permanente ação política do ex-presidente é um mau exemplo para o país. Não houve nenhuma acusação de corrupção no governo Dilma sem que ele apoiasse enfaticamente o acusado. Lula pressionou o governo para não "aceitar as pressões da mídia". Apresentou a sua gestão como exemplo, ou seja, nunca apurou nenhuma denúncia, mesmo em casos com abundantes provas de mau uso dos recursos públicos. Contudo, seus conselhos não foram obedecidos.

Não deve causar estranheza este desprezo pelo interesse público. É típico de Lula. Para ele, o que vale é ter poder. Qualquer princípio pode ser instrumento para uma transação. Correção, ética e moralidade são palavras desconhecidas no seu vocabulário. Para impor a sua vontade passa por cima de qualquer ideia ou de pessoas. Tem obtido êxito. Claro que o ambiente político do país, do herói sem nenhum caráter, ajudou. E muito.

Ao longo do tempo, a doença do eterno poder foi crescendo. Começou na sala de um sindicato e terminou no Palácio do Planalto. E pretende retornar ao posto que considera seu. Para isso, desde o dia 1 de janeiro deste ano, não pensa em outra coisa. E toda ação política passa por este objetivo maior. Como de hábito, o interesse pessoal é o que conta. Qualquer obstáculo colocado no caminho será ultrapassado a qualquer custo.

O episódio envolvendo o ministro do Esporte é ilustrativo. A defesa enfática de Orlando Silva não dependeu da apresentação de provas da inocência do ministro. Não, muito pelo contrário. O que contou foi a importância para o seu projeto presidencial do apoio do PCdoB ao candidato petista na capital paulista. Lula sabe que o primeiro passo rumo ao terceiro governo é vencer em São Paulo. 2014 começa em 2012. O mesmo se repetiu no caso do Ministério dos Transportes e a importância do suporte do PR, independentemente dos "malfeitos", como diria a presidente Dilma, realizados naquela pasta. E, no caso, ainda envolvia o interesse pessoal: o suplente de Nascimento no Senado era o seu amigo João Pedro.

O egocentrismo do ex-presidente é antigo. Tudo passa pela mediação pessoal. Transformou o delegado Romeu Tuma, chefe do Dops paulista, onde centenas de brasileiros foram torturados e dezenas foram assassinados, em democrata. Lula foi detido em 1980, quando não havia mais torturas. Recebeu tratamento privilegiado, como mesmo confessou, diversas vezes, em entrevistas, que foram utilizadas até na campanha do delegado ao Senado. Nunca fez referência às torturas. Transformou a casa dos horrores em hotel de luxo. E até chegou a nomear o filho de Tuma secretário nacional de Justiça!!

O desprezo pela História é permanente. Estabeleceu uma forte relação com o símbolo maior do atraso político do país: o senador José Ribamar da Costa, vulgo José Sarney. Retirou o político maranhense do ocaso político. Fez o que Sílvio Romero chamou de "suprema degradação de retrogradar, dando, de novo, um sentido histórico às oligarquias locais e outorgando-lhes nova função política e social". E pior: entregou parte da máquina estatal para o deleite dos interesses familiares, com resultados já conhecidos.

O desprezo pelos valores democráticos e republicanos serve para explicar a simpatia de Lula para com os ditadores. Estabeleceu uma relação amistosa com Muamar Kadafi (o chamou de "amigo, irmão e líder") e com Fidel Castro (outro "amigo"). Concedeu a tiranos africanos ajuda econômica a fundo perdido. Nunca - nunca mesmo - em oito anos de Presidência deu uma declaração contra as violações dos direitos humanos nas ditaduras do antigo Terceiro Mundo. Mas, diversas vezes, atacou os Estados Unidos.

Desta forma, é considerável a sua ojeriza a qualquer forma de oposição. Ele gosta somente de ouvir a sua própria voz. Não sabe conviver com as críticas. E nem com o passado. Nada pode se rivalizar ao que acredita ser o seu papel na história. Daí a demonização dos líderes sindicais que não rezavam pela sua cartilha, a desqualificação dos políticos que não aceitaram segui-lo. Além do discurso, usou do "convencimento" financeiro. Cooptou muitos dos antigos opositores utilizando-se dos recursos do Erário. Transformou as empresas estatais em apêndices dos seus desejos. Amarrou os destinos do país ao seu projeto de poder.

Como o conde de Monte Cristo, o ex-presidente conta cada dia que passa. A sua "vingança" é o retorno, em 2014. Conta com a complacência de um país que tem uma oposição omissa, ou, na melhor das hipóteses, tímida. Detém o controle absoluto do PT. Usa e abusa do partido para fortalecer a sua capacidade de negociação com outros partidos e setores da sociedade. É obedecido sem questionamentos.

Lula é uma avis rara da política brasileira. Nada o liga à nossa tradição. É um típico caudilho, tão característico da América Hispânica. Personalista, ególatra, sem princípios e obcecado pelo poder absoluto. E, como todo caudilho, quer se perpetuar no governo. Mas os retornos na América Latina nunca deram certo. Basta recordar dois exemplos: Getúlio Vargas e Juan Domingo Perón.

Marco Antonio Villa é historiador e professor da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar).

FONTE: O GLOBO

Cá e lá corruptos há :: Rubens Barbosa

Análises comparativas entre países são sempre relevantes, porque oferecem perspectiva para melhor se observar a evolução por que passam e trazem parâmetros para avaliação. A crescente projeção externa do Brasil e da Índia justifica uma rápida apreciação do cenário interno dos dois países.

A Índia, como o Brasil, tem um sistema político disfuncional, que força uma política de alianças e de coalizão entre os principais partidos. Os dois países enfrentam o desafio de conter a inflação e de tentar manter uma alta taxa de crescimento. Os problemas de inclusão social são idênticos, embora a escala seja muito desfavorável à Índia. Enquanto o Brasil tem 16 milhões de pessoas abaixo do nível de pobreza, a Índia tem 950 milhões. A agenda de reformas estruturais é praticamente idêntica: reformas tributária, trabalhista, da previdência social e política há muitos anos estão na agenda, mas não avançam na Índia pelas mesmas circunstâncias que impedem o Brasil de levá-las adiante.

Não se podem passar em revista os acontecimentos mais recentes nos dois países sem examinar a questão da corrupção, pois é outro fator interno que apresenta problemas muito semelhantes.

O tema "corrupção" na Índia ganhou uma dimensão, na imprensa e na sociedade, que corresponde à magnitude e à profundidade do fenômeno em todos os níveis da sociedade. Mesmo documentos oficiais, como carteira de motorista, não se conseguem retirar sem o pagamento de propinas. Nada funciona sem aquela taxa "extra", que vai para o bolso do agente governamental ou mesmo do empregado de empresas privadas prestadoras de serviços. Para instalar uma linha de internet ou para que seja feita a sua manutenção é necessário pagar propina. A corrupção é um problema com raízes culturais e históricas, que vem adquirindo proporções alarmantes.

O governo do primeiro-ministro Manmohan Singh está investigando as irregularidades e passou a responsabilizar os infratores, como demonstrado pelo número sem precedentes de demissões, prisões e investigações de ministros e altos funcionários. A imprensa, cortes de Justiça e grupos da sociedade civil estão cada vez mais ativos na exposição das mazelas administrativas e da corrupção desenfreada.

Pressionado pela opinião pública, o governo indiano reagiu de duas maneiras: para demonstrar que está tomando medidas contra a corrupção apresentou ao Congresso uma lei que cria a figura do Ombudsman, um poderoso órgão contra a corrupção existente no governo, no Legislativo e no Judiciário, e decidiu modificar lei do século 19 relativa à aquisição de terras, para evitar a corrupção e a expulsão de agricultores dos arredores das grandes cidades.

O assunto ganhou tais proporções que começou a haver reação espontânea da sociedade. É bem verdade que também com o envolvimento de gurus, gandhianos e políticos de reputação duvidosa. Como a reação pública à prisão de mais de 4 mil seguidores de Anna ("irmão mais velho") Hazare, militante anticorrupção, aparentemente com telhado de vidro, que começou uma greve de fome - proibida pela Justiça - contra os graves desvios de conduta. Preso por essa manifestação de contestação pacífica, Hazare foi solto pela pressão da opinião pública.

Assim, algo está sendo feito e a sociedade civil indiana vem aos poucos saindo da inércia e do imobilismo diante de uma situação que passou a afetar não só o governo, mas a toda a população. Sua reação vem forçando o governo a tomar medidas punitivas concretas contra os corruptos.

Enquanto isso acontece na Índia, o que vemos no Brasil?

O governo Dilma esboçou reação às irregularidades, com o endosso da opinião pública, o que se refletiu de imediato nos altos níveis de popularidade da presidente, sobretudo no sul do País. Os ministros da Agricultura, da Casa Civil, do Turismo e dos Transportes, além de 30 funcionários deste ministério, foram demitidos. No Turismo, o secretário executivo e o chefe de gabinete foram presos e algemados, mas ficaram no cargo vários dias até serem demitidos. O corporativismo prevalece no Judiciário e no Legislativo, dificultando a ação do Conselho Nacional de Justiça e dos Conselhos de Ética.

Embora proliferem prisões e demissões, mesmo comprovada a prática desonesta raro é ocorrer uma condenação. Até hoje, nem Waldomiro Diniz, do escândalo dos Correios em 2003, nem o malfadado mensalão foram julgados. Os demitidos nos Ministérios do Turismo, da Agricultura, dos Transportes não foram sequer indiciados. Expressivas lideranças do PT criticaram os ministros por não terem sabido reagir às acusações e terem preferido demitir-se.

A prometida faxina tornou-se apenas uma limpeza superficial que colocou a sujeita debaixo do tapete. Ao contrário da Índia, no Brasil prevalece a impunidade para os crimes de corrupção, que adquiriu características sistêmicas nos últimos anos. A pouca vontade de apurá-los e a lentidão da Justiça explicam em grande parte a dificuldade de pôr na cadeia os que violam a confiança do eleitor.

E a sociedade como está reagindo? A opinião pública assiste, bestificada, à crescente onda de casos de corrupção no governo e fora dele, mas poucos são os sinais de reação.

Recentemente, em diversas capitais, mesmo sem foco e com pouca repercussão, as redes sociais organizaram-se e promoveram passeatas de protesto anticorrupção. Na Esplanada dos Ministérios foram colocadas vassouras formando um corredor até o Congresso Nacional, tendo algumas sido roubadas...

Os partidos de oposição, que poderiam liderar o movimento de indignação da sociedade, estão desorganizados, amorfos e sem liderança capaz de mobilizar a reação pela punição dos corruptos.

Falta um Robespierre (o Incorruptível) para galvanizar a opinião pública nacional.

Presidente do Conselho de Comércio Exterior da Fiesp

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

O mundo:: Graziela Melo

As ansiedades que nos atormentam, as dúvidas quanto ao futuro do mundo, de ver tantos países em um verdadeiro processo de ebulição, são, acho, mais do que lógicas, naturais. Afinal, a nossa geração e “adjacentes” vivenciou uma segunda guerra que envolveu o mundo. Décadas depois, a queda do muro, quer dizer, o “desmanche” do socialismo real além de outras “micro-guerras” pontualizadas, aqui e ali.

Agora, é diferente. Parece mais uma mudança da consciência coletiva da humanidade, em vários países. Atos consecutivos de rejeição à convivência com ditaduras, são mais do que evidentes e que vem dando resultados políticos positivos. Primeiro foi a queda de Mubarak no Egito. Depois a Tunisia. Agora a queda inevitável e sangrenta do Kadaf varre do “mapa-mundi” mais uma ditadura. Sem esquecer que já houve eleição na Tunísia. Será que vai dá para ver um mundo melhor e mais pacífico? Tomara!!!

Tudo isso sem esquecer que dentro das grandes capitais os relegados que protestam na Europa e no centro de Nova York, contra as desigualdades sociais. Bom, acho sim, que podemos chegar lá!!!

Livros - Do Stalinismo à Democracia e Democracia, Valor Universal.

Do Stalinismo à Democracia
Marco Mondaini
Fundação Astrojildo Pereira / Contraponto, 194 págs., R$ 30


Democracia, Valor Universal
Enrico Berlinguer
Fundação Astrojildo Pereira /Contraponto, 306 págs., R$ 34

Enrico Berlinguer e Palmiro Togliatti imaginaram um comunismo bem longe das “operações de sangue”, atentados planejados por partidos radicais na Itália. Um desses atentados chegara a arriscar a vida de Togliatti, em 1948, mas o pensador continuara, firmemente, a defender uma política pacífica. Por isso, “talvez nenhum partido comunista no mundo ocidental tenha dado, mais do que o Partido Comunista Italiano (PCI), um maior número de contribuições ao desenvolvimento de uma estratégia de transformação socialista adequada à nova realidade política democrática de massas, que começou a se constituir enquanto tal no fim do século XIX”, sustenta em seu livro Do Stalinismo à Democracia o estudioso Marco Mondaini.

“Responsável teórico-político” pelo arcabouço que produziu a chamada “via italiana ao socialismo”, Togliatti foi também um líder político de peso, ativo na estratégia antifascista da esquerda. Editor dos Cadernos do Cárcere, de Antonio Gramsci, formulou o ideário da “democracia progressiva”, com forte apoio na práxis gramsciana e no comunismo de massas, longe da ideia de um partido de quadros fechado nos moldes soviéticos. Fruto de sua tese de doutorado, o livro de Mondaini descortina a importância de Togliatti, geralmente eclipsada pela teoria de Gramsci e pela ação política do ex-secretário do PCI Berlinguer.

Democracia, Valor Universal traz os artigos deste selecionados e traduzidos por Mondaini, para quem Berlinguer foi responsável pelo terceiro salto qualitativo no arsenal teórico-político do PCI (após Gramsci e Togliatti). Mondaini destrincha sua trajetória em três textos de Berlinguer correspondentes a três períodos de sua liderança no PCI. Sua proposta de um “eurocomunismo”, via alternativa de esquerda ao mesmo tempo ética e democrática, que levaria ao “compromisso histórico”, grande passo da esquerda pragmática italiana de se aliar a outras vertentes políticas para tirar o país da est agnação, entraria para a história, escreve o autor. E, mais importante, ele se colocava contra a saída terrorista.

FONTE: REVISTA CARTA CAPITAL, 26/10/2011

Argentina avança para o 'cristinismo'

Ariel Palacios

BUENOS AIRES - "Vitória contundente", "Cristina arrasou" e "Quatro anos a mais" foram algumas das manchetes na Argentina sobre os resultados das eleições presidenciais de domingo, quando Cristina Kirchner - segundo 98% das urnas apuradas - foi reeleita para um novo mandato de quatro anos, com 53,96% dos votos.

A marca supera os 45% obtidos em sua primeira eleição, em 2007, e ultrapassa amplamente os 22% conseguidos por seu marido, Néstor Kirchner, em 2003, quando o casal chegou ao poder. Cristina, candidata da Frente pela Vitória (uma sublegenda do partido peronista) também obteve a maioria da Câmara de Deputados e do Senado.

Os analistas políticos destacam que, com essa vitória - e com o novo peso do governo no Parlamento - encerra-se o "kirchnerismo" (a vertente peronista criada pelo ex-presidente Néstor Kirchner) e surge o "cristinismo", que terá a presidente Cristina como figura central nos próximos anos.

O filósofo Ernesto Laclau, mentor ideológico da presidente, considera que o cristinismo poderia representar um "kirchnerismo mais aguçado". Segundo ele, o kirchnerismo é uma etapa "transcendental" do peronismo. Nesse contexto, afirma, o cristinismo, com a colaboração de grupos como "La Cámpora" (a juventude kirchnerista), poderia "dar um passo além" do kirchnerismo.

Segundo o colunista político Julio Blank, do jornal Clarín, o kirchnerismo, que continha o aparato peronista, sai de cena e entra o cristinismo, que seria "uma tribo heterogênea onde convivem movimentos sociais, grupos de intelectuais, artistas e acadêmicos, sindicatos, patrulhas perdidas da esquerda dos anos 70 e fragmentos das formações políticas tradicionais". "Todos eles, bem azeitados com o talão de cheques estatal. E com uma única chefe, sem estado-maior".

O segundo colocado foi o socialista Hermes Binner, que conseguiu 16,87% dos votos. Binner, famoso por sua honestidade - e ausência de carisma - seria o novo referencial da oposição, já que teve uma performance superior à de seus concorrentes. Ele anunciou ontem que pretendia "dialogar" com o governo.

Parlamento leal. Na Câmara de Deputados, Cristina terá uma maioria definida como "compacta". O reforço do governo no Legislativo não será apenas quantitativo, mas também qualitativo. A base governista será composta por deputados escolhidos a dedo pela presidente, ao contrário de outras ocasiões, quando os governadores ou as autoridades provinciais do peronismo definiam os candidatos. Desta vez, Cristina decidiu colocar somente pessoas de lealdade inquestionável. Ela pretende evitar dissidências como as ocorridas nos últimos anos, especialmente com a partida dos setores da "esquerda pura" do peronismo que, desencantados com os Kirchners, deixaram o governo.

De olho na formação de uma tropa de choque no Parlamento, a presidente endossou a candidatura de vários jovens de "La Cámpora", de fervorosa lealdade a Cristina e Néstor Kirchner. Os resultados ontem indicavam que cinco deputados de "La Cámpora" tinham sido eleitos. Outros integrantes do grupo serão postos em altos cargos dos ministérios, no controle da caixa previdenciária e em estatais.

Conforme estimativa do Clarín, o governo terá 131 deputados, entre os peronistas e os aliados de primeira hora. Na contramão, a oposição, que antes da eleição tinha, no total, 136 cadeiras, terá 126 a partir de 10 de dezembro - data da posse dos eleitos no domingo.

No Senado, o governo Kirchner e seus aliados contarão com 38 votos. Os demais 34 senadores estarão divididos entre os vários partidos da oposição.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO