sexta-feira, 25 de junho de 2021

Fernando Gabeira - Bolsonaro no seu labirinto

O Estado de S. Paulo

Vendo sua margem de manobra se estreitar, ele parece cada vez mais desesperado

É um certo desperdício usar um pensamento de Isaac Deutscher para analisar a extrema direita. Mas, como ele dizia, cada vez que a margem de manobra política se estreita as pessoas começam a fazer bobagens, independentemente até de seu nível de inteligência.

A extrema direita mundial vive um momento difícil. Eslovênia, Hungria, Polônia e agora o Brasil, todos estão às voltas com uma conjuntura negativa. E de certa forma o fracasso diante da pandemia foi fator decisivo nas eleições americanas, contribuindo para a derrota de Donald Trump.

Na Eslovênia cai a popularidade do governo, na Hungria forma-se uma ampla coalizão contra Viktor Orbán e na Polônia o governo está sendo empurrado para posições mais à esquerda.

Aqui, no Brasil, Bolsonaro está com toda a carga negativa sobre ele. Não conseguiu atender às frustrações sociais que o levaram ao governo, tornou-se órfão de Trump e realizou uma política letal no campo sanitário. O País não só ultrapassou os 500 mil mortos, como deve superar os Estados Unidos nessa contagem fúnebre.

Vera Magalhães - CPI em dia de Duda Mendonça

O Globo

A CPI da Covid tem tudo para viver nesta sexta-feira seu “dia de Duda Mendonça”. Essa é a forma como jornalistas e políticos se referem a depoimentos altamente aguardados desde que, em 11 de agosto de 2005, o ex-marqueteiro de Lula incendiou a lona do circo ao contar, na CPI dos Correios, tudo a respeito dos pagamentos em caixa dois que recebera no exterior, com intermediação de Marcos Valério.

Depõem no Senado, num dia inusual de trabalho parlamentar, os irmãos e homônimos Luis & Luis Miranda, respectivamente servidor do Ministério da Saúde e deputado federal bolsonarista de quatro costados.

À diferença do depoimento de Duda, que parou o país pelo ineditismo das revelações e por ser inesperado, agora os irmãos Miranda já anteciparam para o Ministério Público e para a imprensa boa parte do conteúdo de suas revelações sobre a compra de 20 milhões de doses da vacina indiana Covaxin, pelo preço de R$ 1,6 bilhão, com a intermediação suspeita de uma empresa brasileira, a Precisa.

Mas as semelhanças são muitas: tanto quanto o marqueteiro de Lula, os dois irmãos implicam diretamente o presidente da República. Assim como Duda, Luis Miranda, o deputado, é um aliado insuspeito de Jair Bolsonaro.

Eliane Cantanhêde – Salles vai, Covaxin fica

O Estado de S. Paulo

Desnorteado pelos casos Covaxin e Salles, Bolsonaro ataca as máscaras

É ou não é espantoso o presidente da República mandar uma menininha retirar a máscara durante um evento no Rio Grande do Norte? Enquanto no mundo inteiro presidentes e primeiros-ministros usam, estimulam e em alguns casos impõem o uso das máscaras, o sr. Jair Bolsonaro faz justamente o oposto no Brasil, onde 505 mil brasileiros já morreram de covid e a pandemia continua inclemente. 

Como toda manhã, o presidente acordou e se perguntou: como vou irritar o povo brasileiro hoje? Criativo ele é, seu estoque não acaba nunca, vai de helicópteros, jet-skis e motos até as frases mais chocantes a favor do coronavírus e contra tudo o que a ciência prega. Com a CPI da Covid, a queda nas pesquisas, a história cabeluda da Covaxin e os processos contra o agora ex-ministro Ricardo Salles, ele fica ainda mais impossível. 

Bolsonaro atacou a Coronavac do Butantan e desprezou a Pfizer, uma empresa sólida, mas seu governo saiu em desabalada carreira para comprar a desconhecida Covaxin, a mais cara de todas, apresentada por um atravessador de má fama, de uma empresa que responde a processo. Mais: além de não ter sido aprovada, a vacina indiana foi criticada pela Anvisa. Então, por que não a Pfizer e a Coronavac e por que sim a Covaxin? 

Bernardo Mello Franco - O covidão sobe a rampa do Planalto

O Globo

O bolsonarismo queria usar a CPI da Covid para investigar governadores e prefeitos de oposição. Agora o presidente ganhou um escândalo bilionário para chamar de seu.

O rolo da Covaxin já exibia potencial para comprometer o Ministério da Saúde. Sob gestão militar, a pasta contratou a vacina indiana em tempo recorde. Aceitou pagar R$ 80 por dose, valor mais alto entre todos os imunizantes comprados pelo país.

A negociação ainda envolveu um atravessador sob suspeita, a Precisa Medicamentos. Em 2018, sócios da empresa aplicaram um calote no ministério. Venderam por R$ 20 milhões remédios que nunca foram entregues.

Luiz Carlos Azedo - O candidato de centro

Correio Braziliense

A pesquisa divulgada pelo Ipec pode ser devastadora para os planos do presidente Jair Bolsonaro. A aprovação do governo caiu para 23% e a reprovação subiu para 50%”

A principal vantagem estratégica de um candidato à reeleição é a expectativa de poder que galvaniza, o que lhe permite uma largada na campanha eleitoral na chamada pole position. Por isso mesmo, a taxa de reeleição no Executivo é muito grande, mesmo quando as coisas vão mal, como aconteceu com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em 2006, e com a ex- presidente Dilma Rousseff, em 2014. Mas há casos em que estar no governo pode funcionar contra o governante, e não a favor, como já aconteceu em alguns estados — o Rio Grande do Sul nunca reelegeu seus governadores — e, mais frequentemente, nas prefeituras, devido ao mau desempenho.

Isso acontece quando seu índice de rejeição atinge um patamar muito alto e a aprovação despenca. Por essa razão, a pesquisa divulgada ontem pelo Ipec — instituto criado por executivos do antigo Ibope Inteligência — pode ser devastadora para os planos eleitorais do presidente Jair Bolsonaro. A aprovação do governo caiu para 23% e a reprovação subiu pa- ra 50%. O Ipec ouviu 2.002 pessoas, em 141 municípios, de 17 a 21 de junho. A margem de erro é de dois pontos para mais ou para menos. Na pesquisa anterior, a aprovação era de 28% e a reprovação, de 39%.

Ricardo Noblat - Enquanto Bolsonaro estrebucha na maca, Lula avança nas pesquisas

Blog do Noblat  / Metrópoles

Se a eleição presidencial de 2022 fosse hoje, Lula venceria no primeiro turno porque teria mais votos do que a soma dos seus adversários

Lula é favorito a se eleger presidente na eleição do ano que vem. Segundo pesquisa do Instituto Ipec, sucessor do extinto Ibope, neste momento Lula tem mais do dobro das intenções de voto do presidente Jair Bolsonaro – 49% a 23%,

O resultado é parecido com o da pesquisa aplicada por uma empresa americana sob encomenda de um banco, e publicada neste blog na última segunda-feira (44% a 22%). A margem de erro da pesquisa do Ipec é de dois pontos, para mais ou para menos.

Tanto numa pesquisa como na outra, Lula venceria no primeiro turno, superando a soma de votos dos seus eventuais adversários. Na pesquisa do Ipec, Ciro Gomes (PDT) tem 7%, João Doria (PSDB) 5% e Luiz Henrique Mandetta (DEM) 3%.

Ricardo Rangel - É hora de votar o impeachment

Revista Veja

No desmonte da democracia, Jair Bolsonaro não para

Com as denúncias em torno da vacina Covaxin, Jair Bolsonaro enfrenta sua maior crise até agora. Em um país normal, sua queda seria certa, mas o Brasil não é um país normal, a queda já foi considerada certa antes e ele sobreviveu. O que acontece se sobreviver a mais esta crise?

Jair Bolsonaro não é apenas um radical, é um antidemocrata, acredita não apenas que as pessoas não são iguais, mas que os inferiores (mulheres, homossexuais, negros, pobres, índios) devem se submeter. Com a exceção das mulheres, que teriam a função de satisfazer sexualmente o homem e de procriar, melhor seria que desaparecessem.

Não diz isso com clareza, porque perderia voto, mas já deu incontáveis declarações mostrando que despreza e odeia minorias e, no poder, passou a atacá-­las. A Fundação Palmares persegue a cultura negra. A Funai não defende índios, o Ibama e o ICMBio acobertam desmatadores, grileiros e garimpeiros em terras indígenas. Bolsonaro liberou armas para milícias e as encoraja a matar pretos e pobres nas favelas.

Dora Kramer - Alta ansiedade

Revista Veja

Bolsonaro é um governante atordoado, cujo abalo contamina seus aliados

Acossado, Jair Bolsonaro está com raiva. Da CPI que lhe arranha os calcanhares e imprime frio à nuca com os recentes indícios de corrupção na aquisição da vacina Covaxin; das manifestações que começam a tomar conta das ruas em ritmo crescente; da independência da imprensa profissional; raiva da possível derrota em 2022 que faria dele o primeiro presidente a não conseguir renovar o mandato desde o instituto da reeleição, há 24 anos.

A ira é das piores companhias que uma pessoa pode escolher como conselheira. Isso, na vida em geral. Na política tal aliança costuma ser mortal. Embora às vezes confira ao colérico uma aura de assertividade e dê a ele a chance de vestir o figurino da coragem, são atributos temporariamente emprestados. Ao longo do tempo a fúria retira-lhe a escada e o furioso, quando teimoso, acaba no chão.

César Felício - A usina de Bolsonaro

Valor Econômico

Alimentar teorias conspiratórias é um método do presidente, sempre usado nos momentos de dificuldades

O momento culminante da retórica antivacina do presidente Jair Bolsonaro aconteceu em Porto Seguro, em 17 de dezembro do ano passado. Foi uma fala estranha, mais estranha do que costumam ser as referências estapafúrdias do presidente a problemas que afligem a humanidade. Comentava ele sobre as exigências que a Pfizer fazia para fechar o contrato de vacinação com o país. Entre elas, a de não se responsabilizar pelos efeitos colaterais do imunizante.

Disse o presidente: “Se você virar um chip, virar um jacaré, é problema de vocês, pô. Não vou falar outro bicho porque se não vão começar a falar besteira aí, né? Se você virar um super-homem, se nascer barba em alguma mulher, ou se algum homem começar a falar fino, eles não têm nada a ver com isso, e o que é pior, vão mexer no sistema imunológico das pessoas...” O vídeo está disponível no YouTube.

José de Souza Martins* - A consciência da corrupção

Valor Econômico / Eu & Fim de Semana

No Brasil, o governante corrupto é revestido de uma aura de quem está acima da materialidade cotidiana da vida

Em 2022, ocorrerá o 370º aniversário da publicação da “Arte de Furtar”, obra-prima do Padre Antonio Vieira, “Zeloso da Pátria”, como ele assinou. O livro é dedicado a dom João IV, duque de Bragança, restaurador do trono de Portugal após os 80 anos da dominação espanhola dos reis Filipes. Vieira nasceu em Portugal, foi missionário no Brasil e no Brasil morreu.

O duque de Bragança era um homem culto. Fino compositor. Autor da conhecida “Adeste Fidelis”, música natalina até hoje cantada em todo o mundo cristão. Compôs também “Crux Fidelis”, ainda nos tempos atuais cantada nas cerimônias da Semana Santa celebradas na bela e monumental capela gótica vertical do King’s College, em Cambridge, na Inglaterra.

Não é dos batedores de carteira que trata a “Arte de Furtar”. É dos que se valem do poder político para meter a mão no que não lhes pertence. O livro é uma antecipação de tratado de sociologia da corrupção. Para que a conduta desonesta seja desvendada, sugere o autor atenção às máscaras. Um tema bem sociológico.

O corrupto político é também ator da arte política de parecer honesto quando não o é. Para desvelar a corrupção, não basta, pois, seguir o dinheiro, como se diz por aqui. É preciso descobrir do que é que se fingem os corruptos para parecer patriotas e santos. O verde e amarelo pode esconder muita coisa que não é verde-amarela. Repetir versículos bíblicos não santifica quem o faz.

Fernando Abrucio* - Democracia é maior que o presidente

Valor Econômico / Eu & Fim de Semana

O que está em jogo em 2022 não é apenas quem ocupará o Planalto; é preciso prestar atenção às outras arenas do poder

O cargo de presidente da República é a peça-chave do sistema político brasileiro. É por esta razão que no centro do debate atual está a eleição presidencial de 2022. Porém, há outras arenas políticas que serão decisivas para o futuro do país e da democracia brasileira e não podem ser esquecidas. Uma análise multidimensional é fundamental para escapar de uma visão simplista sobre a governabilidade no Brasil e perceber como o bolsonarismo quer ir além da conquista do Palácio do Planalto. E só uma estratégia política ampla poderá combater o avanço do populismo de extrema direita.

Antes de analisar a multiplicidade de arenas decisivas do sistema político brasileiro é preciso esmiuçar um pouco mais a natureza do poder presidencial. Sua força tem três raízes. A primeira é institucional, derivada dos poderes que a Constituição dá ao ocupante desse posto. O presidente tem um grande poder de nomeação (algo em torno de 20 mil cargos comissionados, além das indicações para os tribunais superiores), de iniciar e influenciar os processos legislativos, de controlar discricionariamente boa parte do fluxo de despesas. A caneta é forte, como gosta de lembrar o próprio presidente Jair Bolsonaro.

O poder presidencial também se alimenta, em segundo lugar, da legitimidade popular majoritária. Ao início do mandato, há até uma lua de mel inicial com os outros atores do sistema político. Passado um período governamental, que varia segundo a capacidade política de cada presidente, os atores começam a olhar a popularidade presidencial como medidor de sua força política. No momento, por exemplo, Bolsonaro não tem suporte social suficiente para evitar uma CPI importante como a da covd-19, que já está arranhando sua imagem, mas tem por ora o percentual de apoio popular necessário para que o presidente da Câmara tema colocar a votação de impeachment na pauta.

José Eli da Veiga*- Outra mente brilhante

Valor Econômico

A um mês de seu centenário, Edgar Morin esbanja incomparável agilidade cognitiva

Se um inverno nuclear, ou cibernético, puder ser evitado, demorará bem menos do que se imagina para que boa parte dos humanos possa comemorar suas 120 ou 130 primaveras. Já se considera certeza que metade das atuais crianças americanas chegue aos 104 e metade das japonesas, aos 115.

A dúvida é quantas permanecerão lúcidas. Continua a ser raríssimo que alguém se aproxime dos 100 em razoável gozo de suas qualidades mentais. Motivo para que seja tão admirável a longa entrevista concedida por Edgar Morin ao melhor programa da televisão francesa - “La Grande Librairie” -, no último dia 9.

A um mês de seu centenário, no dia 8 de julho, ele esbanjou incomparável agilidade cognitiva ao discorrer sobre o mais recente de seus setenta livros: “Lições de um século de vida”, já lançado pela editora Denoël. Uma poderosa síntese de seu percurso intelectual, exemplarmente transdisciplinar.

Muita hesitação precedeu a redação desta coluna, que só pode ser de agradecimento, além de homenagem. Pois é impossível dar conta, neste espaço do Valor, da importância de suas contribuições científicas, filosóficas, antropológicas, sociológicas, pedagógicas, mas, sobretudo, epistemológicas.

Hélio Schwartsman - Agora tem corrupção?

Folha de S. Paulo

Já posso escutar o bolsonarista obstinado afirmando que prevaricação não é corrupção

 “Pelo menos não tem corrupção.” É com esse brocardo que bolsonaristas convictos tentavam racionalizar seu apoio ao governo, depois que o presidente traiu, uma a uma, suas principais bandeiras eleitorais: apoio à Lava Jato (foi ele, e não Temer, quem enterrou a operação), rejeição ao sistema (ele deitou no colo do centrão) e agenda econômica liberal (nem a abertura comercial, que depende basicamente da caneta do ministro, avançou).

É claro que a frase sobre a corrupção tampouco era exata. O núcleo familiar do presidente está envolvido até a medula em esquemas de rachadinhas. A própria primeira-dama recebeu cheques nunca bem explicados do notório Fabrício Queiroz. Família não é governo, dirá o bolsonarista contumaz.

Bruno Boghossian - Sociedade do golpismo

Folha de S. Paulo

PGR dá sinais de que deve deixar caminho livre para ataques do presidente a urnas eletrônicas

Em maio, o vice-procurador-geral eleitoral disse que o discurso de fraude na urna eletrônica era uma teoria da conspiração e que a defesa do voto impresso tentava "criar um estado de confusão mental" na população. Em junho, ele pediu que Jair Bolsonaro fosse condenado por campanha antecipada. Nesta quinta (24), ele saiu do cargo.

A Procuradoria-Geral da República dá sinais de que pretende deixar o caminho livre para o presidente na disputa de 2022. Até agora, a gestão de Augusto Aras foi dócil com os sucessivos comícios realizados por Bolsonaro com a máquina do governo e ignorou o movimento golpista que espalha informações falsas sobre a segurança das eleições.

Ruy Castro - A terra treme sob Bolsonaro

Folha de S. Paulo

Uma simples palavra começa a desafiar o seu quociente de macheza ---corrupção

Um dia, quando se escrever a história do Brasil à luz da macheza de alguns presidentes, será instrutivo ler a respeito de, entre outros, Floriano Peixoto, Arthur Bernardes, Getulio Vargas, João Batista Figueiredo, Fernando Collor e Jair Bolsonaro. Alguns, como Floriano, Figueiredo e Collor, eram grosseiros, cafajestes. Outros, como Bernardes e Getulio, falavam macio para esconder a crueldade. Todos, um dia, bateram o pau na mesa presidencial. E todos ficaram mal na história.

Mas nenhum tão primário, estúpido e cruel quanto Bolsonaro. Seu estilo de governar às bofetadas, inspirado em Átila, Vlad Dracul e Mussolini, já é um marco na história da boçalidade. Ninguém, em tão pouco tempo, desrespeitou tanto uma nação e seu governo, suas instituições e sua dignidade. Ninguém nos reduziu tão bem a um país de merda —ou, segundo o próprio Bolsonaro, de maricas, idiotas e otários.

Reinaldo Azevedo - O que é inegociável para os liberais?

Folha de S. Paulo

Para montar coligação para disputar o poder, é fundamental querer a mesma coisa

Façamos um esforço para enxergar a eleição presidencial do ano que vem além desses dias acanalhados, embora seja grande a tentação de fazer a crônica policial deste governo, apontando a sua atuação fanaticamente criminosa. Mas não resisto a uma pergunta: cadê Eduardo Pazuello no imbróglio da Covaxin?

Retorno ao prazo mais longo. Ainda que eventos recentes tenham tornado mais evidentes os aspectos grotescos da turba que nos governa, é inevitável constatar que, em muitos aspectos, os reacionários ganharam terreno.

Noto, mesmo em ambientes infensos à pregação fascistoide, uma hesitação em chamar o inaceitável por aquilo que é. O golpismo, o negacionismo, o racismo, a misoginia, a homofobia e o "milicianismo" policial são o outro lado da civilização, não uma ideologia entre muitas —e todas são, a seu modo, restritivas, com uma carga de conceitos preconcebidos que a realidade não endossa.

Vinicius Torres Freire - A ‘terceira via’ se omite na crise

Folha de S. Paulo

Crise política piora, mas atores decisivos estão com Bolsonaro ou se omitem

A política nas próximas semanas deve ser agitada. Haverá uma ofensiva da oposição mais à esquerda, com alguns agregados acidentais. O bunker do governo está em desarranjo por causa da CPI e de outros problemas com a Justiça.

A popularidade de Jair Bolsonaro parece se arrastar pela mínima de 23%, segundo pesquisa Ipec (o pessoal que fazia pesquisa de opinião para o Ibope). Ainda nesse quase mês adiante, o governo promete uma contraofensiva, com agrados sociais e fiscais.

Pode tudo se resumir a mais uma opereta de horror político, condizente, portanto, com os tempos bolsonarianos, mas que não vai a lugar algum.

Um ator decisivo dessa peça, o centrão comandado por Arthur Lira (PP-AL), presidente da Câmara, está em outra, assim como o grosso da Câmara. A esquerda, acusada de amaciar o impeachment de Bolsonaro, está quase sozinha nessa ofensiva e nas manifestações de rua. A terceira via, ou quase tudo que possa encalhar nessa terceira margem do rio, faz corpo mole ou cara de paisagem.

Flávia Oliveira - Tragédia evitável

O Globo

Enquanto avança numa inesperada linha de investigação de favorecimento a agente privado — quiçá corrupção — na compra da vacina indiana Covaxin, a CPI da Covid deu importante contribuição à sociedade brasileira em esmiuçar a dimensão da crise que já ceifou a vida de mais de meio milhão de habitantes. Na sessão de ontem, Jurema Werneck, diretora da Anistia Internacional Brasil e representante do Grupo Alerta, e Pedro Hallal, epidemiologista e ex-reitor da Universidade Federal de Pelotas, deixaram claro que o país não precisava ser campo de doença e morte. Havia conhecimento, alternativa e gente capaz de nos desviar da tragédia. O governo de Jair Messias Bolsonaro nos guiou para o abismo.

O estudo sobre mortes evitáveis, produzido por pesquisadores de UFRJ, Uerj e USP para as organizações sociais que formam o Alerta, mostrou que medidas de distanciamento social e controle — incluindo testagem e rastreamento nunca implementados — reduziriam em 40% o potencial de transmissão da doença. Mesmo sem vacina ou medicação específica, 120 mil brasileiros teriam sobrevivido ao primeiro ano da pandemia, houvesse uma adequada política de enfrentamento, informou Jurema.

Rogério Furquim Werneck - Folga fiscal?

O Globo / O Estado de S. Paulo

A aceleração da inflação nos últimos meses dá a impressão de que as contas públicas melhoraram

Ao cabo de longos meses de alarmante deterioração das contas públicas, o país surpreende-se, agora, com o surgimento de uma “folga fiscal” que — pasmem — permitiria expansão substancial dos gastos primários do governo federal. Para não cair nesse conto, é preciso entender com clareza o que vem sendo entendido como “folga fiscal”.

Para início de conversa, é bom lembrar qual era o diagnóstico consensual, compartilhado pela equipe econômica do governo, sobre o difícil quadro fiscal com que se deparava o país no início de 2020, antes da eclosão da pandemia. Só a muito custo, fora possível sustar o descontrole das contas públicas do governo Dilma Rousseff.

A dívida bruta do setor público saltara de 51,5% do PIB, em dezembro de 2013, para 66,7% do PIB, em maio de 2016, quando a presidente foi afinal afastada do cargo, para ser submetida a impeachment. Graças a esforços de controle fiscal do governo Temer e do primeiro ano do governo Bolsonaro, o endividamento público pôde, afinal, ser precariamente contido em cerca de absurdos 75% do PIB, até o início do ano passado.

O Que a mídia pensa: Opiniões / Editoriais

EDITORIAIS

Putrefação moral

O Estado de S. Paulo

O governo de Jair Bolsonaro está se decompondo. E o mau cheiro começa a ficar insuportável.

Na quarta-feira, mesmo dia em que o escândalo da estranha negociação para a compra da vacina indiana Covaxin ganhou componentes explosivos, anunciou-se a saída do ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, cujo passivo judicial é quase tão vistoso quanto os prejuízos ambientais e de imagem que ele causou ao País.

Espíritos céticos dirão que não se trata de simples coincidência. Sempre que irrompe um novo escândalo com potencial para danificar a fantasia de campeão anticorrupção que Bolsonaro vestiu desde a campanha eleitoral, o presidente se livra de algum dos seus ministros ditos “ideológicos” – isto é, ventríloquos do bolsonarismo mais estridentes – para tentar desviar a atenção.

Foi o que aconteceu, por exemplo, com o notório Abraham Weintraub, colocado por Bolsonaro no Ministério da Educação para destruir o sistema de ensino do País. Estava sendo muito bem-sucedido em sua missão até a manhã do dia 18 de junho do ano passado, quando foi preso Fabrício Queiroz, o faz-tudo da família Bolsonaro, pivô do escândalo das rachadinhas. À tarde, Weintraub – que havia defendido a prisão dos “vagabundos” do Supremo Tribunal Federal – foi demitido.

No caso de Salles, o ministro perdeu o emprego não por liderar o maior processo de desmonte da proteção ambiental de que se tem notícia no País, pois o fazia a mando de Bolsonaro, e sim porque o cerco judicial em torno do chefe do Executivo poderia piorar ainda mais a crise política do governo.

Poesia | Graziela Melo - Pensar...

Pensar,

pensar

pensar!

 

Nas trevas

na luz,

no ar...

 

       Pensar

        em andar

        na terra

        ou

        em voar!

 

Pensar

na amargura

ou

na doçura

que a gente

não cansa

 

de procurar...

Música | Mariana Aydar + Fejuca - Medo bobo |