domingo, 30 de dezembro de 2012

OPINIÃO DO DIA Aloysio Nunes Ferreira: falha humana

"Dilma acerta no diagnóstico do apagão. Este é o governo da falha humana. Falha humana na saúde, na educação, na segurança."

Aloysio Nunes é senador (PSDB-SP

Manchetes dos principais jornais do País

O GLOBO
Paes agora promete fazer 277 escolas em 4 anos
Dilma: metade das promessas ainda no papel
Montadoras vão investir US$ 25 bi
Brasileiras buscam petróleo lá fora
Produção do pré-sal decola
Haddad: decisão do STF deve ser aceita

FOLHA DE S. PAULO
Brasil prepara plano para atrair mão de obra de fora
PT, 10 uma década no planalto
Estagiária morre depois de relatar estupro em festa

O ESTADO DE S. PAULO
Haddad quer aumentar caixa com convênios e apoio privado
MP intervém na transição em três capitais
Impasse atrasa obra de ferrovia
Consumidor dá calote recorde de R$ 44 bilhões
Ágil para cobrar, lento para servir
Ambientalista não consegue proteção

CORREIO BRAZILIENSE
Como cuidar bem do seu dinheiro em 2013
Agnelo quer mais ousadia de secretários
Três áreas que desafiam Dilma

ESTADO DE MINAS
O desafio político de Lacerda
Dilma diante de problemas gigantes
Investidores terão de ousar mais em 2013
Quem foge da crise no exterior tem ajuda oficial

O TEMPO (MG)
Boemia de BH se reinventa em meio a espaços tradicionais
Metas e sonhos para 2013
Transplantes dobram em MG
Chuva provoca danos na capital
Prefeitos precisam ficar atentos às contas e ao caixa herdado

GAZETA DO POVO (PR)
Copa das Confederações terá estádios novos e cidades em obras
Na BR-163, o retrato do abandono da infraestrutura brasileira
Os livros vão à praia e ajudam a relaxar
Ex-prefeitos dão conselhos para Gustavo Fruet
Investidores buscam negócios para apadrinhar

ZERO HORA (RS)
O mercado de armas que abastece o crime
O Desafio de Investir Em 2013
Sorria, seus dados estão sendo usados

JORNAL DO COMMERCIO (PE)
João da Costa vê vitória em "sair vivo"
UPAs estão perdendo o encanto

O que pensa a mídia - Editoriais dos principais jornais do País

http://www2.pps.org.br/2005/index.asp?opcao=editoriais

A canção que nos embala - Luiz Sérgio Henriques

Há alguns anos, um artista admirável, como Chico Buarque, vaticinou o fim da canção, tal co¬mo a conhecemos em nossa geração e que muitas vezes, composta com invulgar talento e coragem cívica, com real espírito de "engajamento", nos ajudou a atravessar menos penosamente as agruras do regime autoritário, a tal "página infeliz da nossa História". Acostumamo-nos a um nível de lirismo na canção popular que não raro fazia com que ela desbordasse do terreno daquilo que é meramente agradável e adquirisse dimensão propriamente estética - a dimensão de uma arte crítica e não oficialista, como deve ser toda arte que se preze, se bem que, como insinuava a corrosiva (auto)ironia dos tropicalistas, uma certa função consolatória naquele tipo de música também estivesse presente, enquanto esperávamos, cada qual à sua maneira, o carnaval chegar.

Eram tempos em que podíamos visualizar, socorridos pela imagem forte, a pátria-mãe ser subtraída em "tenebrosas transações", o que - juntamente com o fim da canção apregoado pelo Chico - talvez não possamos mais fazer agora, em tempos de democracia política e de democratização social, a não ser que se queira receber, em troca, a acusação não menos for¬te de udenismo, que seria o traço distintivo de uma classe mé¬dia ressentida e deslocada do poder político com o advento da esquerda petista ao poder a partir de 2003.

Não importa muito que o observador se coloque numa posição rigorosamente constitucional e que, por exemplo, nunca tenha promovido ou promova palavras de ordem como "Fora, Lula" ou "Fora, Dilma", quando, ao contrário, antes ouvimos um temerário "Fora, FHC". Não importa, também, que o mesmo observador condene, ainda hoje e à distância de tantos anos, manobras de pequena navegação, como a alteração das regras do jogo em benefício imediato de quem está no poder - referência evidente à emenda da reeleição presidencial, equívoca por si mesma, in¬dependentemente da compra ou não de votos de deputados da periferia do sistema.

Nada disso importa: o certo é que, com todas essas ressalvas, quem aponta para a necessidade de obediência rigorosa aos princípios de legalidade e impessoalidade na administração da coisa pública, muito especialmente por parte da esquerda política, pode ver-se alcançado pela acusação genérica de participar objetivamente, querendo ou não, de uma conspiração feroz, em cujo vértice estaria nada me¬nos do que um dos Poderes da República, de resto o mais "aristocrático" deles, contra lideranças populares sem paralelo na História do País.

Num outro tempo, era preciso estar embriagado ou muito louco - dizia o poeta Chico - para contestar e botar defeito nos feitos e conquistas do Brasil Grande, aquele mesmo Brasil que nos convidava, autocraticamente, a amá-lo ou deixá-lo de uma vez por todas. Hoje, no entanto, com os recursos inestimáveis da esfera pública democrática, cabe raciocinar serena e pacientemente em tomo de vícios da esquerda no poder - ou melhor, de uma certa esquerda no poder - que parecem repetir-se de modo incômodo, tais como, para indicar dois traços, uma autoavaliação hiperbólica do próprio desempenho à frente do País e um hábito mental que leva a pretender identificar, sem restos, o povo e seu líder máximo.

Na história da esquerda, a mencionada hipérbole se mani¬festou - e volta a se manifestar, de modo até farsesco - como tendência ao culto à personalidade. Vício terrível, que não atinge somente a imensa massa de deserdados, hoje beneficiada por programas relativamente potentes de transferência de renda, mas alcança também intelectuais efetivamente sofisticados, capazes, no entanto, de arriscadamente desvincular tais programas de toda uma época inaugurada e propiciada pela Carta de 1988. De fato, nesse documento crucial, em tomo do qual cabe cotidianamente construir um "patriotismo" inédito entre nós, se expressou um avançado consenso social-democrata, que permitiu, entre outras políticas sociais justas e progressistas, a generalização da previdência rural e a assistência aos idosos e aos deficientes, num com¬bate "substantivo" à pobreza e à indigência efetivamente enceta¬do nos governos Itamar Franco e Fernando Henrique Cardoso.

Por seu turno, a pretensa identidade entre o povo e o líder supremo empobrece a livre dialética democrática e tendencialmente a suprime, ao retirar, em perspectiva, a "legitimidade das partes" que combatem leal¬mente no campo comum da democracia e elaboram distintas e até mesmo antagônicas visões do bem comum. Produz-se, as¬sim, uma concepção de hegemonia que dispensa o tema do pluralismo, bem como promove tá¬ticas "transformistas" de decapitação das forças conservadoras, destas assimilando, contraditoriamente, métodos de atuação e muitas vezes os próprios objetivos estratégicos, como é possível ver na presente onda de restauração de figuras e questões do velho nacional-desenvolvimentismo, inclusive na versão militar. Sem falar da vontade de levar de roldão, ou da ilusão de que isso seja possível, os delicados mecanismos de freios e contrapesos que marcam o moderno Estado Demo¬crático de Direito.

Caetano Veloso, outro protagonista dos tempos de ouro da canção e que, como poucos, há décadas consegue dar forma a alguns dos nossos dilemas mais decisivos, certa feita tomou co¬mo metáfora do País os que dirigiam "motos e fuscas", avançando os sinais vermelhos e perdendo os verdes. Por isso seriamos uns boçais, concluía ferinamente. Podemos tomar essa ideia aguda como índice dos desvios institucionais - e, logo, dos limites hegemônicos, apesar da seqüência de vitórias eleitorais - da esquerda dominante, ao subestimar o grande sinal verde para as reformas sociais representado pelo respeito pleno à democracia política.

Algum dia deixaremos de desafinar em tal sentido negativo?

Luiz Sérgio Henriques, ensaísta, tradutor, um dos organizadores das obras de Gramsci no Brasil e editor do site Gramsci e o Brasil. É vice-presidente da Fundação Astrojildo Pereira.

Fonte: O Estado de S. Paulo

Dilma: metade das promessas ainda no papel

Ao chegar à metade de seu governo, a presidente Dilma está longe de cumprir pelo menos 23 de 46 promessas de campanha, desde a construção de seis mil creches (só 20 foram entregues) à eliminação dos gargalos de infraestrutura que dificultam o crescimento da economia. No entanto, foi bem-sucedida em outras prioritárias, como reduzir o desemprego e combater a miséria

O desafio agora é crescer

Na metade do mandato, Dilma precisa destravar economia para garantir conquistas

Paulo Celso Pereira

MEIO CAMINHO ANDADO

BRASÍLIA - Com a popularidade recorde, a presidente Dilma Rousseff inicia nos próximos dias a segunda metade do seu mandato com muito ainda por fazer. Os gargalos na infraestrutura e o baixo crescimento econômico foram alguns dos problemas de Dilma, apresentada ao país como a gerente do popular governo Lula. O combate à miséria e a manutenção das taxas de emprego são os pontos mais fortes.

Nas últimas semanas, O GLOBO fez um levantamento das 46 promessas mensuráveis contidas no texto "Os 13 compromissos programáticos de Dilma Rousseff para debate na sociedade brasileira". Cotejando dados oficiais e informações de integrantes do governo, conclui-se que pelo menos metade está longe de sair do papel. O texto com as promessas é assinado pelo PT e mais nove partidos da aliança. Foi apresentado no segundo turno da campanha presidencial de 2010 como o documento que consolidava diretrizes do governo.

A lista completa das 46 promessas e seu estado de execução está no site do GLOBO. Analisadas uma a uma, pode-se dizer que 24 caminham em ritmo lento e 22 estão em ritmo bom. Entre as dez promessas mais importantes, seja pela ênfase dedicada a elas durante a campanha eleitoral ou por seu impacto social, a maioria está longe de ser cumprida. A lista das que caminham bem é encabeçada pelas duas medidas que Dilma disse, em seu discurso da vitória, serem seu compromisso fundamental: erradicar a miséria e criar oportunidades de emprego para todos os brasileiros.

Combate à miséria, mas abandono de reformas

No início deste mês, durante o lançamento de um novo benefício do programa Brasil Carinhoso, a presidente anunciou que o número de miseráveis no país - aqueles que vivem com menos de R$ 70 por mês - teria chegado a 2,5 milhões de pessoas, segundo o cadastro do Bolsa Família. Em 2011, de acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), havia oito milhões de miseráveis no país. E o governo ampliou medidas de busca para encontrar os brasileiros que estão na miséria e não são alcançados pelas políticas públicas. A estimativa é que eles somem cerca de 700.000 pessoas.

No campo das oportunidades, apesar dos ventos ruins da economia, o governo conseguiu reduzir ainda mais os níveis de desemprego. Em outubro, o percentual de trabalhadores nessa situação, nas seis principais regiões metropolitanas, era de apenas 5,3%. A renda média também manteve permanente expansão.

Se a presidente vem conseguindo resolver dois dos principais problemas que atingem a vida cotidiana da população, o mesmo não pode ser dito em relação a temas como reforma tributária, obras de infraestrutura, manutenção de um ritmo acelerado de crescimento econômico, reforma política, ampliação de creches e de universidades e expansão dos programas de saúde. Os avanços do governo nesses temas têm sido abaixo do prometido. Algumas promessas foram abandonadas.

Os casos mais exemplares de abandono são os das reformas política e tributária. A reforma política é o primeiro tema citado nas diretrizes de Dilma e, com a tributária, foi abordado por ela com intensidade na sua primeira mensagem ao Congresso, em fevereiro de 2011. Na ocasião, de forma veemente, Dilma asseverou:

- Trabalharemos em conjunto com esta Casa para a retomada da agenda da reforma política. São necessárias mudanças que fortaleçam o sentido programático dos partidos brasileiros e aperfeiçoem as instituições, permitindo mais transparência ao conjunto da atividade pública. A reforma tributária também é tema essencial.

Em relação à reforma política, o governo sequer reconhece que deva exercer papel ativo nesse debate. Mesmo a ideia de aprovar mudanças pontuais, como o fim das coligações proporcionais, empacou no Congresso.

Investimentos em infraestrutura emperrados

Na questão tributária, o Ministério da Fazenda fala em fazer uma "reforma fatiada", mas apenas na última semana, após meses de debate, começou a enviar medidas ao Congresso para pôr fim à guerra fiscal. As desonerações, por sua vez, foram pontuais e setorizadas, mas a carga tributária cresceu. No final de novembro, a Receita Federal anunciou que essa carga atingiu seu maior percentual histórico, chegando a 35,31% do PIB - este ano os brasileiros pagaram cerca de R$ 1 trilhão em impostos.

Apesar da reiterada promessa de expandir os níveis de crescimento e ampliar o investimento, o desempenho da economia foi muito aquém do esperado. Com 2,7% de crescimento em 2011 e, provavelmente, cerca de 1% em 2012, este será o pior primeiro biênio de um governo desde Fernando Collor. A taxa de investimento também caiu nos dois primeiros anos e a inflação foi mantida nos limites, acima do centro da meta.

Na logística, a situação também está aquém do esperado. Apesar das promessas de que o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) eliminaria os gargalos que limitam o crescimento, o governo reconhece que o ritmo da execução das obras logísticas foi baixo. Diante da dificuldade do poder público para tocar obras, as grandes medidas para o setor acabaram sendo os anúncios de concessão de rodovias, ferrovias, portos e aeroportos à iniciativa privada.

Na Educação, a medida mais visível foi a criação do programa Ciência sem Fronteiras, que vem levando milhares de estudantes brasileiros para o exterior. As promessas de expansão de universidades, institutos de tecnologia e, principalmente, creches e quadra cobertas estão distantes dos números citados na campanha. Até agora, foram entregue 20 das 6.000 creches prometidas. Segundo o governo, há 1.256, em construção; e 506, em licitação. Em relação às quadras cobertas, foram aprovadas 4.245 obras, mas o ministério não informa quantas estão concluídas, em construção ou em licitação.

As propostas de expansão dos programas na Saúde, como a promessa de construir 8.000 Unidades Básicas de Saúde (UBS) e 500 Unidades de Pronto Atendimento (UPA), estão atrasadas. Os grandes avanços na expansão dos programas ocorreram apenas no Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu), que teve o número de unidades ampliado em 54%, e no programa de farmácias populares, que aumentou em 4,5 vezes o número de beneficiados: de 1,2 milhão para 5,4 milhões de pessoas atendidas.

Entre as dez grandes promessas, o governo Dilma vem alcançando resultados favoráveis no programa "Minha Casa Minha Vida" e na política de controle das fronteiras. Em dois anos, 1,13 milhão de moradias foram contratadas. E lançou um plano de fronteiras que resultou num aumento expressivo nas apreensões de armas e drogas. Entre junho do ano passado, quando o plano entrou em vigor, e novembro o volume de drogas apreendida foi quatro vezes maior que nos período anterior. De armas, foi quase seis vezes maior.

Fonte: O Globo

Forte na política, mas desgastado, PT faz 10 anos no poder

Favorito para emplacar 4ª vitória presidencial em 2014, partido teve imagem abalada pelo escândalo do mensalão

Petistas aderiram aos métodos tradicionais da política brasileira e fragmentaram divisão do poder com mais siglas

Fernando Rodrigues

BRASÍLIA - O PT completa dez anos no poder exibindo músculos na política, mas com um forte abalo em uma de suas principais bandeiras antes de chegar ao poder, a ética.

Favorito hoje para emplacar a quarta vitória presidencial seguida em 2014 -tanto Dilma Rousseff quanto Luiz Inácio Lula da Silva lideram com folga as pesquisas de intenção de voto-, a sigla tenta superar o desgaste causado pelo mensalão, maior escândalo da era Lula (2003-10).

Quando o PT chegou ao poder federal com Lula em janeiro de 2003, aderiu com rapidez aos métodos tradicionais da política brasileira.

O partido e seus aliados aparelharam o Estado e abriram espaço para a fisiologia no Congresso.

Não há inovação nessas práticas. O PT apenas emulou, ao seu jeito, o que outros faziam. E usa muitas vezes essa explicação para justificar o que pratica. Foi o caso de Lula à época em que eclodiu o mensalão, em 2005.

"O que o PT fez do ponto de vista eleitoral é o que é feito no Brasil sistematicamente", declarou à época. E mais: "Não é por causa do erro de um dirigente ou outro que você pode dizer que o PT está envolvido em corrupção".

Essas explicações do então presidente da República e líder máximo do PT serviram de salvo-conduto para tudo o que o partido fez e viria a fazer no exercício do poder.
Mas existem nuanças em relação ao comportamento de outros grupos políticos anteriores. A comparação mais evidente é com o governo do tucano Fernando Henrique Cardoso (1995-2002).

Tanto FHC como Lula se abriram à política miúda da fisiologia no Congresso. Mas com engenharias distintas.

Nos seus oito anos no comando do Brasil, FHC preferiu construir bancadas governistas menos fragmentadas -com número reduzido de siglas. Concentrou a adesão de deputados nas legendas-âncora de sua administração, PSDB e PFL (hoje DEM).

Já Lula decidiu repelir alianças com alguns partidos maiores, como o PMDB. Optou por horizontalizar sua base, com partidos médios e pequenos. Mas aí teve de cooptar mais agremiações.

O resultado foi simples. Enquanto nos anos FHC a centralização política foi quase total, sob Lula uma miríade de interesses se espalhou, tornando a gestão da fisiologia -demandas paroquiais, legítimas ou não- dos políticos às vezes incontrolável.

Os números das bancadas no Congresso no início de cada mandato são ilustrativos. Quando FHC tomou posse, em 1995, tinha o apoio formal de 387 deputados -dos quais 258 estavam abrigados em apenas três legendas: PSDB, PFL e PMDB.

Já Lula ao assumir, em 2003, tinha uma bancada governista de 336 deputados na Câmara. Ocorre que os três principais partidos lulistas (PT, PL e PSB) somavam apenas 153 deputados.

O passo seguinte na governança política petista foi fatiar os cargos públicos entre os diversos partidos aliados.

O número de ministérios teve de crescer. Eram 27 quando FHC assumiu. Hoje são 38.

Uma base política mais fragmentada é menos controlável. Isso explica por que durante FHC o Congresso teve mais CPIs e nenhuma abalou o governo como o mensalão dos anos Lula.

O tucano conviveu com 54 CPIs, mas teve comando total em todas. Lula enfrentou 42 investigações e perdeu o controle durante a mais relevante, a do mensalão.

FHC também foi hábil ao evitar a abertura de CPIs que poderiam escapar do comando. Um caso relevante ocorreu em 1997, quando o tucano abafou uma investigação sobre a compra de votos a favor da emenda da reeleição.

À época, os deputados envolvidos foram forçados a renunciar aos mandatos. E nove dias depois de o caso eclodir, o PMDB, vital na operação dos interesses políticos tucanos no Congresso, impôs a nomeação de dois ministros.

Lula nunca conseguiu impedir a investigação do mensalão. Não que não tivesse tentado. Mas a política de fragmentação partidária não dava ao petista essa margem. De maneira inadvertida, o petismo e o lulismo ajudaram o Brasil a conhecer um pouco mais como se opera a política no país.

Fonte: Folha de S. Paulo

Três áreas que desafiam Dilma

Reprovados pela população, setores de saúde (74%), segurança (68%) e educação (56%) figuram como os grandes entraves para Dilma em 2013

Popular, mas diante de desafios gigantes

Mesmo com aprovação pessoal recorde, Dilma terá um ano duro pela frente para resolver os diversos problemas que ainda caracterizam o país: pobreza, desmatamentos e deficiências nas áreas de educação, saúde, segurança e moradia

Renata Mariz, Helena Mader

A experiência adquirida com metade do mandato cumprido e um ano novo livre das turbulências político-eleitorais fazem de 2013 um período decisivo para a presidente Dilma Rousseff. Se, por um lado, a mandatária encerra 2012 com índices invejáveis de aprovação pessoal, beirando os 80%, de acordo com a mais recente pesquisa CNI/Ibope, por outro empurra para o terceiro ano de governo desafios gigantescos. O mesmo levantamento que mediu a popularidade da presidente apontou que 74% dos brasileiros condenam as políticas de saúde, 68% querem mais segurança pública e 56% consideram insuficientes as iniciativas na área da educação.

A lista de prioridades envolve outras áreas estruturais, como saneamento e meio ambiente. Sem falar no impulso à economia. Nem os setores bem avaliados do governo, mencionados por Dilma no discurso de Natal dirigido aos brasileiros, escapam de críticas. O Brasil sem Miséria, considerado pela presidente a conquista "mais espetacular" do ano, tem o mérito de fazer transferência de renda, mas carece de atualizações, na avaliação do economista e sociólogo Marcelo Medeiros, especialista em estudos sobre políticas públicas de combate à pobreza.

Ele critica os critérios usados para definir a extrema pobreza — renda familiar per capita mensal inferior a R$ 70. "Usamos linhas de pobreza africanas em um país que é quase europeu. Devido a esses limites questionáveis, temos oficialmente menos pobres que nos Estados Unidos, algo inconcebível até por bom-senso", afirma. Medeiros considera a promessa eleitoral de Dilma de erradicar a pobreza inalcançável, a partir dos padrões atuais das transferências de renda. "Para se tornar um programa de erradicação, e não apenas de alívio da pobreza, o Bolsa Família precisa aumentar os valores repassados. Orçamento para isso tem", diz ele.

Os valores pagos atualmente variam de R$ 32 a R$ 306, de acordo com números de filhos, idade e renda dos domicílios. Um esforço recente do governo para ampliar a complementação financeira, de modo que as famílias superem o patamar de
R$ 70 mensais por pessoa, é o Brasil Carinhoso, com investimento anual de R$ 4 bilhões. Medeiros considera a iniciativa importante, mas volta a lembrar os desafios. "Combater a extrema pobreza é relativamente simples de resolver, enfrentar a desigualdade é outra coisa", diz.

Tempo integral

Na área da educação, reprovada por um em cada dois brasileiros, a presidente Dilma reconhece ser necessário ofertar às crianças escola em tempo integral. Mas a política é garantida apenas a 8,3% dos estudantes do ensino fundamental, conforme dados mais recentes do Ministério da Educação (MEC). Um dos principais programas do governo federal com esse objetivo, o Mais Educação, padece com problemas graves, ressalta Carlos Eduardo Sanches, ex-presidente da União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime) e atual integrante titular do Conselho Estadual de Educação do Paraná. "Andei pelo Brasil inteiro conversando com gestores e todos falam dos valores baixos repassados pelo Mais Educação para pagar os bolsistas, que fazem as atividades com as crianças no contraturno. As escolas não estão conseguindo contratar bolsistas", afirma Sanches.

Compromisso firmado pela presidente ainda durante a campanha, a erradicação do analfabetismo está longe. De 2009 para 2011, a proporção de pessoas com 15 anos ou mais que não sabiam ler nem escrever passou de 9,7% para 8,6% — queda de menos de 2% em dois anos. "O ritmo lento mostra que o tema não tem sido prioridade. É extremamente tímida a atuação do governo federal nessa questão", destaca Sanches. O fato de o Plano Nacional de Educação (PNE), que traça metas para o setor na próxima década, não ter sido aprovado ainda no Congresso Nacional, depois de dois anos de tramitação na Câmara dos Deputados, é uma crítica dos militantes da área.

O projeto defende 10% do Produto Interno Bruto (PIB) para a educação. Hoje, de acordo com o MEC, são gastos pouco mais de 5%. A promessa de Dilma é chegar aos 7%. O índice, porém, é rebatido por especialistas. "Sem colocar a mão no bolso não conseguiremos avançar. Os 10% são necessários. De que adianta ser a quinta economia do mundo com uma educação de país subdesenvolvido?", questiona Sanches.

Item negligenciado no discurso de Natal da presidente, mas motivo de uma das mais organizadas reivindicações da sociedade neste ano, a preservação do meio ambiente tem sido alvo de constantes críticas. "A aprovação do Código Florestal, contra o qual grupos organizados se manifestaram de uma forma muito intensa no país, nos revelou que o meio ambiente não está na agenda do governo", afirma Gustavo Souto Maior, professor do Núcleo de Estudos Ambientais da Universidade de Brasília (UnB). De acordo com ele, dispositivos da lei, como anistia a desmatadores e flexibilizações sobre construções em encostas e outras áreas de preservação permanente, marcaram 2012 como ano de derrotas. "Do ponto de vista ambiental, não temos o que comemorar", destaca Souto Maior.

Saneamento

O desmatamento que preocupa ambientalistas está intimamente ligado a outra área. O saneamento básico mostra índices preocupantes. De cada 10 residências urbanas no país, três não têm acesso à rede geral de esgotos, conforme pesquisa mais recente do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, feita em 2011. O Censo 2010, uma amostra mais precisa porque visita cada residência do país, apontou que apenas 55,4% dos 57,3 milhões de domicílios, tanto nas cidades quanto na área rural, tinham serviço de esgotamento sanitário.

Na área de habitação, a presidente Dilma obteve bons resultados graças ao programa Minha Casa, Minha Vida, lançado em 2009 pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Em seu pronunciamento de Natal, a presidente citou que o projeto assegurou a realização do sonho da casa própria a um milhão de famílias. "E já contratamos mais 1 milhão de novas moradias, que vão beneficiar famílias por todo o Brasil. É o maior programa deste gênero no mundo", comentou a presidente. Para o professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de Brasília Márcio Buzar, que é especialista em habitação, o programa representou um grande avanço no setor. "A redução dos juros também foi muito importante, mas há espaço para reduzir ainda mais. O patamar de 5% ainda é alto para as classes mais pobres", comentou o especialista.

Márcio Buzar defende a criação de grandes bairros para setores menos favorecidos da população, para que haja oferta de moradia com infraestrutura. "O governo tem que continuar com o programa Minha Casa, Minha Vida, incentivando a construção de grandes bairros com escola, transporte, postos de saúde e infraestrutura", comenta o especialista. "Também é preciso dar mais atenção ao cumprimento do Estatuto da Cidade", finaliza Buzar.

Fonte: Correio Braziliense

Dois anos de fiasco econômico – Editorial / O Estado de S. Paulo

A presidente Dilma Rousseff completa meio mandato com um balanço econômico assustador - dois anos de produção estagnada, investimento em queda, inflação longe da meta, exportação emperrada e contas públicas em deterioração. Desemprego baixo e um consumo ainda vigoroso são os dados positivos, mas insuficientes para garantir a reativação de uma indústria sem músculos para disputar espaço nos mercados. Sobram palavras: um discurso triunfal sobre um "novo modelo macroeconômico", baseado em juros mais baixos e câmbio menos valorizado, promessas de grandes obras de infraestrutura e de reformas de amplo alcance. De concreto, houve a redução dos juros, o que certamente contribuiu para o aumento da popularidade de Dilma. Um balanço provisório basta para mostrar o alto custo dos erros cometidos em dois anos pelos condutores da política econômica, liderados, é bom lembrar, por uma presidente voluntariosa.

O crescimento econômico deste ano está estimado em torno de um por cento por economistas do Banco Central (BC), do mercado financeiro e das consultorias mais importantes. Esse resultado seria ruim em qualquer circunstância, mas no caso brasileiro há uma circunstância especial. No ano anterior o Produto Interno Bruto (PIB) havia aumentado apenas 2,7%. O País perdeu o passo entre os emergentes de todo o mundo. Este detalhe é importante, porque desqualifica as tentativas de atribuir o mau desempenho brasileiro à crise global, ao tsunami monetário criado pelos bancos centrais do mundo rico e à má vontade dos deuses.

Os problemas são internos, todos fabricados no Brasil por uma política há muito tempo defeituosa e piorada pela teimosia do atual governo. Segundo o Tesouro, os investimentos do governo central foram de janeiro a novembro 22,8% maiores que os de um ano antes e atingiram R$ 54,9 bilhões. Mas isso equivale a pouco mais de 50% do total previsto no Orçamento. Além disso, o valor inclui os financiamentos do programa Minha Casa, Minha Vida e boa parte dos desembolsos foi de restos a pagar. Se depender da eficiência federal, continuarão faltando investimentos tanto para reativar a economia em 2013 quanto para garantir um crescimento mais vigoroso nos anos seguintes.

Tudo somado, o valor investido pelo setor privado, pela administração pública direta e pelas estatais deve ter ficado em torno de 18% do PIB. Em outros países latino-americanos a proporção ultrapassa 25% e nos emergentes da Ásia supera 35%. Além disso, é preciso levar em conta a qualidade dos projetos e a eficiência da execução. Não basta investir. Os alvos podem ser mal escolhidos e o dinheiro, desperdiçado. O histórico dos projetos federais, tanto da administração direta quanto das estatais, tem sido muito ruim há vários anos. Aparelhamento, loteamento de cargos, incompetência e corrupção têm custado muito caro.

A inflação alta contrasta com o baixo ritmo de atividade. Em outros países, tolera-se alguma alta de preços para garantir algum impulso à economia, e sempre por um tempo muito limitado. No Brasil, o governo vem mantendo há vários anos a meta de 4,5%, muito alta quando comparada com os padrões internacionais. Neste ano, o BC cortou juros e renunciou a combater o aumento de preços, em troca de um crescimento econômico humilhante para um Brics.

Os preços ao consumidor medidos pela Fundação Getúlio Vargas e incluídos no IGPM subiram 5,79% neste ano. De novembro para dezembro houve aceleração de aumentos em seis dos oito componentes do indicador. O IPCA, calculado pelo IBGE e usado como referência para a política oficial, aumentou 5,53% nos 12 meses terminados em novembro. A alta internacional dos preços agrícolas foi obviamente apenas uma parte dessa história.

A balança comercial refletiu a fraqueza da indústria diante dos competidores, o erro de uma política de estímulos voltada para o consumo e, naturalmente, a dependência excessiva das vendas de matérias-primas à China. Até novembro, o valor exportado foi 4,9% menor que o de um ano antes, pela média dos dias úteis, e o saldo comercial, 31,1% inferior ao de igual período de 2011. Os números finais do ano devem sair na quarta-feira e confirmarão, com certeza, o alto custo de vários erros políticos.

Congresso em dívida com a sociedade – Editorial / O Globo

No transcorrer de 2012, as instituições republicanas brasileras, em particular o Poder Judiciário, ganharam maturidade, algo notável em uma região do mundo em que o nacional-populismo avança, quando parecia que esta mazela do lado sombrio da história latino-americana não teria chances de se consolidar na era da globalização. Não é o que acontece, haja vista o retrocesso institucional na Argentina kirchnerista, contaminada pelo chavismo da Venezuela, também exportado para a Bolívia, Equador e Nicarágua. Ainda bem que, no Brasil, esta ideologia cesarista, autoritária, tem sido contida pelas instituições democráticas.

O julgamento do mensalão, com 22 condenações a prisão, 11 a um período em regime fechado, de que não escaparam estreladas lideranças petistas, funciona como um grande teste de resistência da solidez do regime republicano brasileiro. E com resultados e indícios altamente animadores.

Um deles, o fato de, no decorrer dos trabalhos do STF, já com a indicação de um desfecho ruim para o grupo no poder dentro do PT, a presidente Dilma preencher uma vaga no Pleno da Corte (Tori Zavascki), aberta com a aposentadoria compulsória de Cezar Peluso, com base no mesmo e correto critério de incontestável saber jurídico usado nas escolhas anteriores de Luiz Fux e Rosa Weber. Que continue assim, protegendo de interesses deletérios decisões estratégicas como esta.

Isso significa, por parte do Executivo, respeito à independência do Judiciário, prerrogativa que precisa estar lastreada em rigor técnico, como o demonstrado no transcorrer do julgamento do mensalão. Rigor este refletido também na decisão do ministro Joaquim Barbosa, na condição de presidente do Supremo, de negar pedido da Procuradoria-Geral da República para antecipar o início do cumprimento da pena de prisão em regime de fechado pelos mensaleiros condenados.

Ficou mais uma vez evidente que, se Joaquim Barbosa agiu com o necessário rigor na relatoria do processo, foi devido ao peso das provas coletadas pelo Ministério Público na denúncia feita contra a "organização criminosa" que tentou literalmente comprar apoio no Congresso a um projeto de poder à margem da Constituição.

Já o Congresso, até mesmo em função da política de cooptação fisiológica seguida pelo lulopetismo, de que o mensalão é símbolo, encerra 2012 em dívida com a sociedade. O Legislativo não conseguiu escapar da visão míope de interesses de grupos.

Exemplo incontestável é a espúria maioria formada por estados não produtores de petróleo para atropelar a ordem jurídica e expropriar royalties pagos mediante o estabelecido em contratos assinados.

Mais uma vez, a Justiça agiu em defesa da Constituição, da segurança jurídica no país, ao, por liminar, impedir o golpe parlamentar que seria desfechado contra os estados produtores de petróleo. Na verdade, um atentado contra o pacto federativo. O fecho do ano à altura deste desvario foi a iniciativa do presidente da Câmara, Marco Maia, petista gaúcho, de envolver, no papel de militante partidário, o Poder Legislativo numa operação absurda de desrespeito de uma sentença judicial. Não fosse a serenidade do ministro Joaquim Barbosa, haveria uma crise institucional.

O recesso de fim de ano é uma pausa para que lideranças políticas reflitam sobre o distanciamento que se ampliou entre o Congresso e o país real. O tema deveria estar na agenda de deputados e senadores para 2013.

Me engana que eu gosto - Ferreira Gullar

O próprio Lula admitiu que houve o mensalão ao pedir desculpas publicamente em discurso à nação

Muitos de vocês, como eu também, hão de se perguntar por que, depois de tantos escândalos envolvendo os dois governos petistas, a popularidade de Dilma e Lula se mantém alta e o PT cresceu nas últimas eleições municipais. Seria muita pretensão dizer que sei a resposta a essa pergunta. Não sei, mas, porque me pergunto, tento respondê-la ou, pelo menos, examinar os diversos fatores que influem nela.

Assim, a primeira coisa a fazer é levar em conta as particularidades do eleitorado do país e o momento histórico em que vivemos. Sem pretender aprofundar-me na matéria, diria que um dos traços marcantes do nosso eleitorado é ser constituído, em grande parte, por pessoas de poucas posses e trabalhadores de baixos salários, sem falar nos que passam fome.

Isso o distingue, por exemplo, do eleitorado europeu, e se reflete consequentemente no conteúdo das campanhas eleitorais e no resultado das urnas. Lá, o neopopulismo latino-americano não tem vez. Hugo Chávez e Lula nem pensar.

Historicamente, o neopopulismo é resultante da deterioração do esquerdismo revolucionário que teve seu auge na primeira metade do século 20 e, na América Latina, culminaria com a Revolução Cubana. A queda do Muro de Berlim e o fim da União Soviética deixaram, como herança residual, a exploração da desigualdade social, já não como conflito entre o operariado e a burguesia, mas, sim, entre pobres e ricos. O PT é exemplo disso: nasceu prometendo fazer no Brasil uma revolução equivalente à de Fidel em Cuba e terminou como partido da Bolsa Família e da aliança com Maluf e com os evangélicos.

Esses são fatos indiscutíveis, que tampouco Lula tentou ocultar: sua aliança com os evangélicos é pública e notória, pois chegou a nomear um integrante da seita do bispo Macedo para um de seus ministérios. A aliança com Paulo Maluf foi difundida pela televisão para todo o país. Mas nada disso alterou o prestígio eleitoral de Lula, tanto que Haddad foi eleito prefeito da cidade de São Paulo folgadamente.

E o julgamento do mensalão? Nenhum escândalo político foi tão difundido e comprovado quanto esse, que resultou na condenação de figuras do primeiro escalão do PT e do governo Lula. Não obstante, o número de vereadores petistas aumentou em quase todo o país.

E tem mais. Mal o STF decidiu pela condenação de José Dirceu, José Genoino e Delúbio Soares, estourava um novo escândalo, envolvendo, entre outros, altos funcionários do governo, Rose Noronha, chefe do gabinete da Presidência da República em São Paulo e pessoa da confiança e da intimidade de Lula.

Em seguida, as revelações feitas por Marcos Valério vieram demonstrar a participação direta de Lula no mensalão. Apesar de tudo isso, a última pesquisa de opinião da Datafolha mostrou que Dilma e Lula continuam na preferência de mais de 50 % da opinião pública.

Como explicá-lo? É que essa gente que os apoia aprova a corrupção? Não creio. Afora os que apoiam Lula por gratidão, já que ele lhes concedeu tantas benesses, há aqueles que o apoiam, digamos, ideologicamente, ainda que essa ideologia quase nada signifique.

Esse é um ponto que mereceria a análise dos psicólogos sociais. O cara acha que Lula encarna a luta contra a desigualdade, identifica-se com ele e, por isso, não pode acreditar que ele seja corrupto. Consequentemente, a única opção é admitir que o Supremo Tribunal Federal não julgou os mensaleiros com isenção e que a imprensa mente quando divulga os escândalos.

O que ele não pode é aceitar que errou todos esses anos, confiando no líder. Quando no governo Fernando Henrique surgiu o medicamento genérico, os lulistas propalaram que aquilo era falso remédio, que os compridos continham farinha. E não os compravam, ainda que fossem muito mais baratos. Esse tipo de eleitor mente até para si mesmo.

Não obstante, uma coisa é inegável: os dirigentes petistas sabem que tudo é verdade. O próprio Lula admitiu que houve o mensalão ao pedir desculpas publicamente em discurso à nação.

Por isso, só lhes resta, agora, fingirem-se de indignados, apresentarem-se como vítimas inocentes, prometendo ir às ruas para denunciar os caluniadores. Mas quem são os caluniadores, o Supremo Tribunal e a Polícia Federal? Essa é uma comédia que nem graça tem.

Fonte: Folha de S. Paulo

Um pedido para 2013: parem com as promessas - Elio Gaspari

O governo só terá a ganhar se parar de enganar a patuleia dizendo que fará aquilo que sabe que não entregará

A doutora Dilma poderia começar o ano inovando: basta proibir que seus ministros prometam o que não entregaram. Por exemplo: se o PIB de 4% em 2012 não aconteceu, o doutor Mantega fica proibido de prometer qualquer coisa para 2013. Nesse caso, por mais que se suponha um "levantador de PIB", deve-se reconhecer que o cumprimento da promessa não depende apenas dele ou da doutora. Em outros casos, ou depende e o governo não conseguiu fazer, ou sabia desde o primeiro momento que estava apenas parlapatando.

Por exemplo: em 2011 o então ministro Fernando Haddad prometeu pela segunda vez a realização de duas provas do Enem em 2012. Com dois exames a garotada fica livre da tensão de jogar um ano de vida numa manhã. Em janeiro passado, ao renegar a promessa do ano anterior, a doutora Dilma disse que o governo tomaria jeito em 2013. Nada. Ela e seus ministros sabem que, enquanto o MEC não tiver um banco de questões, as duas provas serão impossíveis. Ele não o tinha nem o tem. Basta não prometer.

Em janeiro, ao conceder benefícios fiscais à empresa Foxconn, o governo anunciou que ela produziria iPads e iPhones no Brasil "a preços competitivos internacionalmente". Nada. A empresa já fabrica iPads em Pindorama, e a Apple os vende a R$ 1.349. Na loja americana custam US$ 399, ou R$ 800. Nesse caso, os impostecas sabem que, enquanto não mexerem na tributação nacional, os preços das máquinas continuarão altos. (Até hoje não apareceram os US$ 12 bilhões de investimentos da Foxconn no Brasil, anunciados em 2011 durante a visita da doutora a Pequim.)

Em dois projetos, contudo, a doutora deve ser louvada por prometer e não entregar, porque se tentar será pior. Um é o da compra de caças para a Força Aérea. O outro é o Trem-Bala.

Ilusão

O tucanato convenceu-se de que pode botar a escola de samba na rua em 2014 porque a economia irá mal.

Acha que lucrará numa ruína. Propostas no campo da educação ou da saúde, nada.

Tunga de elite

Boa notícia para as vítimas brasileiras de Bernard Madoff, gente diferenciada, do andar de cima do Rio.

O advogado Irving Picard, que desde 2008 caça pedaços da fortuna do golpista para ressarcir os investidores que perderam algo como US$ 18 bilhões de dólares, conseguiu um acordo com o fundo Fairfield Greenwich, operado por um grã-fino de linda família com conexões na América Latina.

Ele indenizará seus clientes, devolvendo até US$ 80 milhões. Quem quiser deverá se habilitar ao acordo até o dia 17 de abril.

Madoff está na cadeia cumprindo uma sentença de 150 anos. Picard, que foi designado para o serviço pela Justiça, já recuperou US$ 3,6 bilhões, levando a leilão até as cuecas do doutor. O ervanário brasileiro no Fairfield Greenwich pode ter ficado na centena de milhões de dólares, até porque era chique ter dinheiro lá.

Alguma coisa o pessoal poderá receber, desde que ponha o nome na vitrine. É aí que a porca torce o rabo.

A plutocracia brasileira tomou dois grandes chapéus de banqueiros.

Nos anos 80, Tony Gebauer, querubim da Casa de Morgan, ficou com dinheiro de grandes investidores. Alguns deles apareceram, pelo menos um exagerando seus depósitos. Muitos ficaram calados. Gebauer cumpriu três anos e meio de cadeia.

Em 1995 a casa de crédito de Jorge Piano quebrou, muita gente ficou a zero, mas ninguém abriu a boca.

Eremildo, o idiota

Eremildo é um idiota e internou-se para tratar uma crise convulsiva de riso ao ouvir a doutora Dilma dizer que os apagões resultam de falha humana dos encarregados de manter o sistema elétrico em funcionamento: "O dia em que falarem para vocês que é raio, gargalhem. Cai raio todo dia nesse país".

Por cretino, ele acredita em tudo que o governo diz. Em 2009, o ministro de Minas e Energia, Edison Lobão aceitou a teoria do raio, também conhecido como "descargas atmosféricas": "Esse é um episódio que, Deus queira, não acontecerá novamente". Dois anos depois a Eletropaulo justificou-se contando que num só dia caíram 1.700 raios. Há pouco a mesma lorota foi propagada pelo secretário de Energia Elétrica do Ministério de Minas e Energia.

Sugestão

Dizia uma marchinha de Carnaval que no Rio de Janeiro, "cidade que nos seduz", "de dia falta água, de noite falta luz".

A cidade melhorou, mas a Infraero resolveu adaptar a canção aos seus aeroportos. De dia falta ar, de noite falta luz.

Ninguém é maluco para esperar que o último dinossauro das estatais venha a trabalhar direito ou bobo para acreditar que o comissariado da Agência Nacional de Aviação Civil dê refrescos aos passageiros. Mesmo assim, cairia bem uma medida provisória exigindo que os companheiros devolvam as taxas de aeroporto que cobram às vítimas da treva e do forno.

Elas estão entre as mais caras do mundo. O Kennedy, em Nova York, cobra o equivalente a R$ 29 em voos internacionais. O Galeão, R$ 71,50.

O porão dos órfãos numa fazenda chique

A revista "História", da Biblioteca Nacional, chegará às bancas nesta semana com um "Dossiê Nazismo" de 24 páginas, revisitando os flertes da direita brasileira com o nacional-socialismo de resultados de Adolf Hitler. Nele, uma reportagem de oito páginas da repórter Alice Melo reconta a história de 50 crianças, a maioria negras, do orfanato da Santa Casa do Rio de Janeiro, levadas entre 1933 e 1945 para as terras da família Rocha Miranda, no interior de São Paulo. Ela foi revelada em 2008 pela repórter Telma Silvério, do jornal "Cruzeiro do Sul", de Sorocaba.

Os tijolos de uma fazenda, bem como seus bois, eram marcados com uma suástica. Um dos senhores era membro da Câmara dos Quarenta, do simulacro fascista criado no Brasil por Plínio Salgado. Os garotos eram conhecidos por números e está vivo o "22". Trabalhavam nas propriedades, tinham uniformes verdes de gala e saudavam-se aos gritos de Anauê, de acordo com a simbologia do integralismo. Tinham escola, banda e clube de futebol.

Tremenda história, pois aqueles Rocha Miranda não formavam uma família qualquer. Vinham da melhor cepa do início do século 20, viraram nome de bairro e, mais tarde, um dos seus chefes, Celso, com sua mulher Malú foram um dos casais mais discretos, educados e elegantes que passaram pelo Rio. Quando a cidade tinha poucos carros, ele andava de Rolls.

No andar de baixo os doutores coletavam órfãos. No de cima, venderam parte da propriedade para Arndt Krupp, filho do magnata alemão do armamento, que coletava escravos judeus, russos e poloneses. Arndt ficaria famoso por suas maquiagens. Namorou Keith Richards e inspirou o diretor italiano Lucchino Visconti para criar o personagem Frederich, do filme "Os Deuses Malditos". Morreu endividado, aos 48 anos, e deixou uma grande frase a respeito do trabalho: "Era disso que eu precisava".

Fonte: O Globo

Contando os minutos - Eliane Cantanhêde

O ex-presidente Lula e sua pupila e sucessora Dilma não veem a hora de 2012 terminar. Foi, ou está sendo, um ano difícil.

O mito Lula foi reforçado com a vitória de Haddad em São Paulo, mas sacudido por meses de julgamento do mensalão e pelas condenações de Dirceu e de figuras chaves da sua campanha em 2002 e do seu governo.

No fim, enfrentou três ameaças ambulantes a ele e ao PT: o pivô do mensalão, Marcos Valério, a ex-chefe do escritório da Presidência em São Paulo, Rosemary Noronha, e até o nefasto Carlinhos Cachoeira.

Valério e Cachoeira, sobretudo, não são flores que se cheirem e o que dizem não tem lá credibilidade. Mas também é fato que estavam perigosamente próximos do poder e, contem mentiras ou não, sabem de muitas verdades. Se não derrubam o mito, deixam interrogações. Bem não fazem e podem fazer muito mal à aura, à imagem.

Quanto a Dilma: ela peitou bancos e telefônicas, reduziu IPI, recheou prateleiras de remédios gratuitos, privilegiou professores nas negociações salariais, estimulou decisivamente a ida de estudantes brasileiros para o exterior e garantiu um nível de emprego invejável no mapa internacional. Não é pouco, mas não é tudo.

Em duas áreas fundamentais, a presidente chegou ao final do ano sob fortes críticas e crescentes pressões: gestão (logo ela, com toda a marca e pinta de gestora?) e política econômica (pibinho de 1%? Faça-me o favor). Derrapando em portos, aeroportos e apagões, ela bateu na incapacidade de fazer o país crescer. São muitas medidas no varejo e poucos resultados no atacado.

A marca social do governo Lula e os acertos populares de Dilma mantêm a altíssima aprovação de ambos e a expectativa de vitória em 2014. Mas não é à toa que Aécio se mexe, o aliado Eduardo Campos se assanha, Marina Silva sai da toca e eleitores sonham com Joaquim. No mínimo, veem espaço para alternativas.

Fonte: Folha de S. Paulo

O que falta - Amir Kahir

O próximo ano é decisivo para o futuro político da presidente Dilma Rousseff. E seu principal desafio é, sem dúvida, conseguir reativar a economia, que mostrou resultados aquém do potencial que o País tem. Caso falhe nesse propósito, está aberta a possibilidade de ter de enfrentar dura disputa com o candidato que representar a oposição, possivelmente Aécio Neves, e o governador de Pernambuco, Eduardo Campos. Caso consiga seu objetivo de retomar o crescimento, mantendo bom nível de emprego, com salários em ascensão, dificilmente será derrotada por esses dois pretendentes à presidência.

Fato relevante é que, apesar do baixo crescimento nesses dois anos, o emprego e os salários estão bem, criando uma situação de satisfação na população. É isso que mantém em elevado patamar a avaliação da presidente. Mas, se a atividade econômica não deslanchar, tanto o desemprego como os salários podem piorar, diminuindo a satisfação da população. Pelos resultados desses dois últimos anos, a perspectiva de retomada do crescimento não parece das melhores. O desafio é, portanto, imenso.

Creio que a principal mudança que deva acontecer na política econômica é a priorização absoluta ao crescimento, deixando de ser pilotada pelo fantasma da inflação, e por acreditar que a Selic a controla, mantendo-a no nível de 7,25% ao ano, quando já deveria estar há muito tempo em 5%, como nos países emergentes.

Com isso, o governo já teria feito importante economia no pagamento de juros, podendo usá-la em maiores desonerações e transferências de renda, mais recursos para educação e saúde e para investimentos em infraestrutura.

Em 2011, o governo caiu na armadilha do fantasma da inflação e pisou fundo no freio da economia ao editar medidas macroprudenciais que encareceram mais ainda o crédito aos consumidores.

Em 2012, tentou consertar esse erro ao priorizar a queda das taxas de juros cobradas pelos bancos. Com isso, visava a remover um dos potentes freios à atividade econômica. Avançou um pouco nesse objetivo ao reduzir os juros do Banco do Brasil e da Caixa Econômica Federal. Os bancos privados pouco mexeram em suas taxas. Como não foi à frente 11a pressão sobre os bancos privados, não conseguiu remover o principal freio da economia.

Ao não obter o resultado desejado, acabou comprando a "tese" muito difundida de que o consumo tinha atingido seu limite e que para crescer era preciso incentivar os investimentos. Assim, tomou um conjunto amplo de medidas no sentido de ampliar a oferta. Dentre elas, vale destacar: desoneração da folha de pagamento das empresas; redução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) de veículos, linha branca, móveis e construção civil; redução das taxas de juros do BNDES; prioridade para as empresas sediadas no País para as compras governamentais; e lançamento dos planos de concessão ao setor privado nos modais de transporte.

Apesar desse conjunto de medidas, em vez de crescer mais do que os 2,7% de 2011, o País deve ficar em 2012 ao redor de apenas 1%, o que levou a rumores sobre a queda do titular da Fazenda, que há dois anos vem afirmando que o País ia crescer perto dos 4%.

Culpa do ministro da Fazenda pelos maus resultados? Não creio, pois o«comando da economia passa pela presidente que, em conjunto com seu ministro da Fazenda e o presidente do Banco Central, decide as políticas na área econômica.

Talvez haja perplexidade na equipe econômica com os resultados, pois se apostava que reduzindo a Selic, desvalorizando o real, desonerando as empresas, reduzindo os juros a cargo do governo e lançando as concessões para os modais de transporte, o crescimento viria naturalmente. Como não veio, o governo se defende das críticas com um bom argumento: é necessário mais tempo para as medidas surtirem o efeito.

Essa justificativa não deve, no entanto, levar o governo a descuidar do que está faltando, que é tirar o pé do freio, banindo da economia as mais altas taxas de juros ao consumidor do planeta. Bateram em 93% ao ano em novembro, contra uma média de 10% nos países emergentes e 3% nos países desenvolvidos. Esse freio reduz pela metade o poder de compra de quem necessita do crediário.

Creio que o governo pode continuar desonerando as empresas, o que é necessário, mas se não atacar as taxas de juros bancárias, dificilmente vai obter o deslanche da economia. O pé vai pisar mais fundo no acelerador, mas o freio de mão vai continuar atuando forte, impedindo o movimento natural do carro.

Tenho repetido em artigos que o motor do crescimento é e continuará sendo o consumo das famílias. O investimento, que é feito em cerca de 80% pelas empresas, é consequência da ampliação do consumo das famílias. Mas, para aumentar esse consumo de forma segura, existem dois caminhos, que se somam: aumento da massa salarial e redução das despesas com juros nas compras dos consumidores,

O aumento da massa salarial se dá principalmente pelo crescimento econômico, pelo crescimento do salário mínimo e pela melhor distribuição de renda. O crescimento mantém elevado o nível de emprego e possibilita reajustes salariais melhores.

Se, por um lado, o melhor pagamento à mão de obra pode representar maiores despesas para as empresas, por outro pode representar maior faturamento a elas.

Mas o que mais impacto pode causar no orçamento doméstico é a possível redução das despesas com as elevadas taxas de juros bancárias. Como há amplo espaço para essa redução, urge atingir esse objetivo. Mas como fazer isso? Apelando aos bancos para que reduzam suas taxas? Forçando reduções ainda maiores nas taxas de juros do Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal? Não!

A solução para isso deve vir pela via do mercado. Como venho apontando, há que induzir os bancos privados a competir no mercado de crédito. O primeiro passo foi dado pelo governo, ao orientar seus bancos a reduzirem suas taxas. Restam mais dois passos a serem dados pelo governo, sem os quais nada mudará.

O primeiro e mais fácil é posicionar a taxa básica de juros ao nível da inflação, como há tempos é feito por todos os bancos centrais, e proibir o Banco Central de remunerar pela Selic os saldos de caixa dos bancos, o que constitui uma sangria ao Tesouro Nacional Isso reduz a zero os ganhos de tesouraria dos bancos, o que já deveria ter acontecido há muito tempo.

O segundo passo, e esse talvez o governo não ouse fazer, é estabelecer limites às escorchantes tarifas bancárias. É necessário tabelar reduzindo essas tarifas, protegendo a sociedade do abuso dos bancos. Ao reduzir essas duas fontes de ganho, o governo os induz à sua atividade principal, que é o crédito. Aí sim será possível ter uma verdadeira competição bancária pela via de mercado.

Se o governo lograr sucesso nesse embate com os bancos, levando-os à importante função de aliados no desenvolvimento econômico e não em seu freio, o sucesso do crescimento poderá estar garantido. Vale conferir.

Saio de férias e lhe desejo um feliz ano-novo.

Mestre em Finanças Públicas pela FGV e consultor

Fonte: O Estado de S. Paulo

Recuperando a historia - Suely Caldas

Mais um ano se foi. O 2° do governo Dilma, o 10° de gestão petista e o 18º de estabilidade econômica e inflação sob controle. Mesmo resumidamente, recuperar a história é bom, traz luz às novas gerações. Então, vamos lá.

Hiperinflação liquidada com o Plano Real e um programa de governo para modernizar a economia deram, há 18 anos, o imprescindível impulso para desenhar o Brasil atual. Em oito anos de governo faltaram tempo e apoio do Congresso para FHC realizar tudo o que planejou a reforma do Estado avançou, a educação progrediu, a infraestrutura deu passos, mas faltaram as reformas política, tributária, previdenciária e trabalhista. O sistema de saúde andou pouco e o combate à pobreza só engatinhou com a criação de programas sociais, entre eles o Bolsa-Escola e o Vale-Gás, que deram origem ao Bolsa-Família.

Ao chegar ao governo, em 2003, Lula enfrentou desconfiança de empresários, banqueiros, agentes do mercado financeiro e quem mais faz girar a roda da economia. Ele seria capaz de dar continuidade aos avanços de FHC e completar as reformas? Ou daria curso às incendiárias e inexequíveis propostas do PT, como o calote na dívida pública? O pragmatismo de Lula e a habilidade política de seu ministro da Fazenda, Antônio Palocci, funcionaram e a confiança foi recuperada. Claro, Lula assimilou e adotou integralmente (sem tirar nem pôr) o modelo econômico do antecessor e prometeu completar as reformas. Para evitar a óbvia identificação com FHC, passou a adotar o bordão "nunca antes na história deste país"

Mas logo começaram a surgir os escândalos de corrupção, e com eles morriam os planos de reforma e aprofundamento do programa econômico. Primeiro foi o caso Waldomiro Diniz - assessor estratégico do então ministro José Dirceu que aparecia em fita recebendo propina do bicheiro Carlinhos Cachoeira -, em fevereiro de 2004. Um ano depois, o mensalão. Depois, outros e mais outros a alimentar a convicção de que "nunca antes na história deste país" houve tanta corrupção no governo.

Os escândalos atrapalharam, as reformas foram abandonadas, mas Lula conseguiu trazer para a economia os efeitos do boom de crescimento econômico do mundo, ajudado pela ação firme e autônoma do Banco Central (BC), Os avanços no combate à pobreza foram a principal marca de sucesso do governo Lula. Pouco melhorou a qualidade na educação, a saúde foi um desastre, a economia seguia no feijão com arroz, mas ele conseguiu manter a inflação contida e com média de 5,78% nos oito anos e PIB com crescimento médio de 4%.

Errou quem imaginou que Lula escolhera um poste para esquentar a cadeira de presidente até sua volta em 2014, Dilma Rousseff começou a se diferenciar do padrinho já no discurso de posse, ao avisar que não iria tolerar a corrupção e o malfeito. No primeiro ano de governo, demitiu seis ministros acusados de corrupção, todos herdados de Lula. Na política, pouco cedeu ao troca-troca com partidos aliados e, na economia, vai-se diferenciando de Lula e FHC, introduzindo mudanças e construindo um modelo muito próximo ao que vigorou no governo militar de Geisel.

Intervenções miúdas do Estado na economia privada; endividamento do governo; proteção à indústria (sobretudo a automobilística), favorecida por tarifas de importação altas, desvalorização cambial e juros subsidiados; e uso de bancos públicos e empresas estatais (caso da Petrobrás) para controlar a inflação e estimular o consumo são identidades dos modelos Geisel e Dilma.

Tal modelo não foi capaz de estimular o investimento - nem em produção nem em infraestrutura. E, pior, tem atraído desconfiança e insegurança nos investidores em relação ao futuro, reconhecidas pelo BC em seu último Relatório de Inflação. Até os melhores feitos de Dilma - a redução da taxa de juros Selic e taxa de desemprego baixa - ficam perdidos em meio ao desânimo geral. E a disposição de fazer o País crescer a qualquer custo tem contrastado com resultados medíocres do PIB: média de 1,85% nos primeiros dois anos.

Um feliz 2013!

Jornalista e professora da PUC- Rio

Fonte: O Estado de S. Paulo

O ano que não esquentou - Míriam Leitão

Seria um reflexo no espelho do ano anterior. Essa era a aposta geral. O ano de 2012 começaria frio mas esquentaria ao longo dos meses e trimestres e terminaria dezembro num ritmo de 4%; o oposto de 2011. Mas os indicadores foram decepcionando. O país estagnou, a indústria encolheu, o calote aumentou, a inflação permaneceu alta e o país investiu muito pouco.

No mundo, houve problemas que agravaram a nossa situação. A Europa sangrou o ano inteiro, mas terminou 2012 melhor do que começou, felizmente. A união monetária esteve a um passo de se fragmentar e agora se fortalece na preparação da união bancária. Os Estados Unidos namoraram o abismo, testando o limite da polarização política, mas o pior foi evitado com a reeleição de Obama. O programa do Partido Republicano revisitava ideais de intolerância e de abandono dos mais pobres, incompatíveis com os valores contemporâneos.

O que mais atrapalhou o Brasil foi o Brasil mesmo. O investimento público é menor do que pode e muito menos do que se precisa. Os obstáculos ao investimento privado crescem em vez de diminuir. Quando escolhe projetos e modelos para pôr o dinheiro público, o governo tem errado.

É a transposição do Rio São Francisco que fica pela metade, quando o que deveria ter sido escolhido desde o início era fortalecer o Velho Chico; hidrelétricas na Amazônia que repetem alguns velhos erros; o trem-bala que não sai do lugar, mas seu custo decola a cada revisão. Melhor faria se o mesmo dinheiro fosse investido em outros projetos. Em sumo: investir errado é pior do que não investir. Há cinco trimestres consecutivos cai o investimento no Brasil.

O governo gastou o ano com medidas para levantar o PIB, para usar a expressão do ministro Guido Mantega, autodeclarado "levantador de PIB", sem êxito. Redução de IPI, clamor para que a população se endivide, mais dinheiro subsidiado para os mesmos grupos empresariais não foram suficientes para produzir um crescimento que se sustente.

A inflação continuou alta. Se forem descontados os efeitos do congelamento da gasolina, redução do IPI e mudança da forma de cálculo do IPCA, pode-se dizer que ela está rondando a 6,5%, o que é altíssimo dadas as circunstâncias. A inflação de alimentos termina o ano em torno de 10%.

Mas a economia vive de contrastes e há boas notícias, felizmente. O mercado de trabalho está forte, e o desemprego, em níveis historicamente baixos. Os juros caíram de 11% para 7,25%, diminuindo o custo da dívida pública. O dólar subiu, melhorando a vida do exportador, mas encareceu a importação.

Foi de perder a conta a quantidade de pacotes, pacotinhos e pacotões para reativar a indústria automobilística: redução de IPI, liberação de compulsório dirigido a financiamentos, aumento da barreira comercial contra importações. Mas diminuiu a produção de veículos e a indústria como um todo está fechando o ano com uma previsão de queda de 2,3% e queda do emprego de 1,4%.

A Petrobras teve o primeiro prejuízo trimestral em 10 anos e o rating da empresa foi colocado em perspectiva negativa pela Moody"s, apesar de hoje haver muita confiança de que a presidente da companhia vai enfrentar os problemas da estatal e não escamoteá-los. A Vale teve um ano de desinvestimento e de queda do preço da sua principal matéria-prima. Os melhores anos ficaram para trás e a Vale precisa se adaptar.

Enfim, o ano passou, mas não esquentou. Tomara que o governo entenda o momento como uma nova chance. Tem de corrigir rotas e não persistir nos erros. Feliz Ano Novo.

Fonte: O Globo

Boa sorte, prefeitos - Tereza Cruvinel

Os prefeitos que tomam posse em 1º de janeiro vão encontrar, quase sempre, o caixa vazio, quando não pendências financeiras deixadas pelos antecessores. Muitos vão se deparar com salários, ou pelo menos com o décimo terceiro atrasados. Terão que fazer logo um ajuste fiscal e buscar ajuda federal para atravessar o primeiro ano.

Com sorte e trabalho, tudo pode ser resolvido para os que ainda têm quatro anos pela frente. Ainda mais se a economia pegar mesmo um vento de crescimento no início do ano. Já os que deixam o cargo com irregularidades administrativas enfrentarão os tribunais de contas e o Judiciário, responderão a processos e serão incluídos na lei da ficha limpa, não podendo disputar eleições enquanto não acertarem o passo com a Justiça. Por ordem do TCU, os que saem devem deixar um minucioso relatório de transição para os que estão assumindo, mas nem todos estão tomando essa providência.

Na sexta-feira passada, dia 28, o governo federal repassou a última cota anual do Fundo de Participação dos Municípios-FPM, de apenas R$ 1,6 milhão. Distribuído por mais de 5 mil prefeituras, o dinheirinho federal não dará para nada. Uma das razões da penúria municipal deriva exatamente da queda nos repasses do FPM. Os estados, da mesma forma, sofreram com o encolhimento das cotas do FPE. Ao desonerar as empresas de impostos que alimentam os dois fundos para estimular o crescimento, o governo federal acabou atingindo os cofres estaduais e municipais. Se a economia tivesse respondido positivamente, teria havido compensação na arrecadação, mas isso não ocorreu. Para o conjunto de prefeituras, o novo salário mínimo terá um impacto de R$ 1,88 bilhão.

O panorama não é animador para os que assumem mas a crise nas relações federativas é problema nacional. Deve merecer a atenção presidencial em 2013.

A volta de Genoino

José Genoino já foi procurado pela Secretaria Geral da Mesa da Câmara para tratar de sua posse como deputado, na suplência aberta pela renuncia de Carlos Almeida, que tomará posse como prefeito de São José dos Campos. Condenado pelo SFT, Genoino se diz preparado para voltar á Casa onde sempre integrou a elite parlamentar. Diz ele: “Estou sendo convocado pelas regras da representação popular, inscritas na Constituição, produto da luta do povo brasileiro pela democracia. Em 2010, apesar do escândalo de 2005, obtive o voto de 92 mil pessoas, que também devem ser respeitadas. Não farei provocações mas, também, não me submeterei a intimidações. Como sempre, observarei o regimento e participarei do debate político. Lá ficarei até quando for legal e possível. Mesmo tendo discordâncias com o julgamento, acatarei as determinações do Judiciário, não deixando, nunca, de externar minha verdade sobre os fatos julgados, que é diferente da narrativa apresentada. Isso farei enquanto viver. Essa é a maior das liberdades.”

Três vértices

As transmissões ao vivo das sessões do julgamento do mensalão pelo STF produziram alguma discussão sobre a conveniência da exposição dos ministros em plena deliberação, enfrentando divergências e mesmo dúvidas diante de situações complexas e até inéditas. Nem por isso, faltaram louvores ao trabalho da TV Justiça, garantindo transparência a um dos poderes historicamente mais fechados e distantes do grande público. Faltou, porém, falar da natureza daquela emissora. Teria sido útil e ainda é tempo.

No período em que implantei e presidi a Empresa Brasil de Comunicação-EBC e sua emissora pública, a TV Brasil, esforcei-me para colocar o debate sobre o tema em suas bases legais. O artigo 223 da Constituição Federal determina a complementaridade entre canais privados, estatais e públicos na radiodifusão brasileira. Os privados existiram desde o início da radiodifusão no Brasil, ocupando quase todo o espectro eletromagnético. Depois da Constituinte, com base no citado artigo, surgiram os canais estatais dos diferentes poderes: TV Senado, TV Câmara, TV Justiça e TV NBr, do Executivo. Esta, na falta de espaço no espectro, ainda opera apenas por satélite e TVs por assinatura. Em 2007, surgiu a TV Pública federal, subordinada, quanto aos conteúdos, não ao Estado, mas a um conselho de representação da sociedade. Formaram-se os três vértices. A emissora foi implantada, apesar das limitações no espectro analógico, caminha para o digital e transmite conteúdos brasileiros para 68 países. O governo atual não lhe confere alta prioridade, como o de Lula, mas aparentemente garante sua gestão. Não optou pelo desmonte, como ocorreu com outras tentativas no passado. Os outros dois poderes têm fortalecido seus canais. Lamentavelmente, as TVs públicas estaduais enfrentam dificuldades. Inclusive a pioneira TV Cultura de São Paulo. Mas, percalços à parte, o que está feito deve ser mantido, porque expressa uma ordem democratizante ditada pela Constituição. A atuação da TV Justiça no julgamento deve servir a essa reflexão.

Fonte: Correio Braziliense

Com apagão e privatização - João Bosco Rabello

O desfecho do julgamento do mensalão, junto com o ano útil, foi mais forte que a capacidade do governo da presidente Dilma Rousseff de resistir à pressão para que o tema não invadisse o Palácio do Planalto. Está sentado acima do gabinete presidencial incorporado na figura do secretário-geral da Presidência, ministro Gilberto Carvalho.

Voz do ex-presidente Lula no governo, Carvalho entregou-se à militância no cargo, explicitando o que a presidente disse estar proibido no governo: a manifestação sobre a decisão do STF. O que torna a recusa de Dilma em abordar o assunto, no café com jornalistas na última quinta-feira, um recorrente jogo de cena.

Ao investir contra o ministro Luiz Fux, acusando-o de trair a promessa de absolvição para obter a nomeação, Carvalho confessa aos olhos da Nação o critério fisiológico e partidário que orienta as escolhas do governo para a Suprema Corte.

Ao mensalão juntam-se duas outras expressões com as quais o PT demonizou o governo de Fernando Henrique Cardoso e que, agora, incorporam-se à agenda de Dilma de forma politica¬mente constrangedora: o apagão e a privatização. O ano termina com o governo rendido a ambos, atribuindo o primeiro à má gestão do setor elétrico e, a segunda, à necessidade de atrair investimentos.

A perda de capital político do PT, somada ao esgotamento do modelo de crescimento pelo consumo, impõe a Dilma seu maior desafio até aqui: o enfrentamento das dificuldades impostas pelo partido ao desempenho do governo, instado a apresentar resultados porque, acacianamente, antes de 2014 vem 2013.

Desobediência judicial

Há ministros do Supremo Tribunal Federal interpretando a iniciativa do Tribunal de Contas da União e do Tesouro Nacional em repassar os valores do Fundo de Participação dos Estados-(FPE) pelas regras antigas, como desobediência judicial. O STF considerou inconstitucionais os critérios de distribuição do fundo e dera prazo até 31 de dezembro para que o Congresso definisse novas regras, o que não ocorreu. Os ministros avaliam que era suficiente o pra¬zo de dois anos concedido ao Congresso para votar novas regras para o FPE, que hoje privilegia Maranhão, Ceará e Bahia. O assunto se somará à cassação dos mandatos dos parla¬mentares condenados no mensalão e à suspensão da votação do veto à lei dos royalties, que abalam as relações entre Judiciário e Legislativo.

Fala sério...

O presidente do Senado, José Sarney, (PMDB-AP), afugentou um senador que foi lhe apresentar um novo modelo de redistribuíção do FPE. Advogado do Maranhão, disse ao colega que não levasse o te¬ma a sério.

Nova safra

Junto com José Genoino (PT-SP), condenado no julgamento do mensalão, assumirão 28 novos deputados provavelmente no próximo dia 4. Substituem os que trocam a Casa por prefeituras e secretarias municipais. Também voltam à Câmara o ex-ministro dos Direitos Humanos Nilmário Miranda (PT-MG), o ex-secretário do Turismo Colbert Martins (PMDB-BA), preso na Operação Voucher da Polícia Federal, e a ex-deputada Iara Bernardi (PT-SP).

Guerra Fiscal

O senador Delcídio Amaral (PT-MS) deverá ser o relator na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do projeto de unificação das alíquotas do ICMS, que o governo enviou ao Congresso na última sexta-feira, regula¬mentando a matéria. A proposta é unificar gradualmente em 4% as alíquotas estaduais, que hoje variam de 7% a 12%, estimulando a guerra fis¬cal.

Fonte: O Estado de S. Paulo

Alta rotatividade: como reduzir? - José Pastore

A imprensa vem registrando de forma insistente que o governo pretende elevar, por lei, a alíquota do PIS nas empresas que apresentam taxa de rotatividade superior à média do respectivo setor. O motivo da preocupação decorre da uma verdadeira explosão de gastos com o seguro desemprego e FGTS em um tempo em que a taxa de desemprego é baixíssima - 4,9%. Nesse clima, o Dieese constatou uma rotatividade altíssima de 54% ("Rotatividade e flexibilidade no mercado de trabalho, 2011").

Uma importante qualificação precisa ser feita antes de se cair no catastrofismo. A proporção indicada se refere à rotatividade total. Quando se retiram dessa taxa os que se aposentam, falecem ou são meramente transferidos de um local para outro e o desligamento a pedido do trabalhador, a taxa cai para 37%. Além disso, várias questões permanecem em suspenso. Uma delas diz respeito à impossibilidade de se medir com precisão o montante de demissões sem justa causa que são provocadas pelos empregadores e as que são provocadas pelos empregados em acordo entre as partes. Isso ocorre porque os empregados têm interesse em sacar seus recursos do FGTS e, ainda por cima, receber uma indenização de 40%, o aviso prévio, as verbas pendentes e o seguro desemprego - uma soma tentadora que pode chegar a 300% do salário atual.

Outra questão se refere à dificuldade de se captar a sucessão natural que ocorre em certos setores, como é o caso da construção civil, na qual, terminada a tarefa de colocação de pisos e azulejos, por exemplo, a empresa descontrata esses trabalhadores e contrata os pintores, que vêm na sequência natural dos trabalhos. Esse problema tende a superestimar uma rotatividade que não existe.

Na agricultura, igualmente, passados o plantio e a colheita, diminui a necessidade de trabalhadores. Nos empregos do turismo, findas as férias, encolhe-se o quadro de pessoal. No comércio, contratar e descontratar seguem picos sazonais. Há ainda o trabalho temporário, contratado por dias ou semanas.

Tudo isso significa que uma parte expressiva da rotatividade diz respeito à dinâmica dos diversos setores de atividade e não à vontade do empregador de trocar de empregado por motivos pecuniários. Aliás, com a falta de mão de obra atual, essa estratégia seria irracional e insustentável - sem contar as despesas elevadas para recrutamento, treinamento e adaptação de um novo empregado. Isso se aplica aos lares brasileiros. Qual é a dona de casa que dispensaria uma empregada doméstica a cada seis meses para gastar menos com seus salários?

Ou seja, ninguém demite porque quer, mesmo porque no Brasil a demissão é cara e a admissão mais ainda, quando se consideram as despesas acima mencionadas.

Por isso, se a ideia é a de detonar alguma medida para reduzir a rotatividade, convém caprichar na pontaria.

Fonte: O Globo