Barbosa expediu mandados de prisão de 12 réus nas penas já definitivas
Presos serão levados de avião para Brasília, onde começam a cumprir sentença; só depois podem ser transferidos
Mais de oito anos depois da explosão do escândalo do mensalão, nove dos 25 réus condenados em novembro de 2012 foram para a cadeia ontem. Entre eles, o ex-ministro José Dirceu, apontado como chefe do esquema que corrompeu deputados no governo Lula , o ex-presidente do PT José Genoino e o operador financeiro do grupo, Marcos Valério
Dirceu e Genoino na cadeia
Outros sete condenados no processo do mensalão se entregaram, ontem, à Polícia Federal
Carolina Brígido, André de Souza, Gustavo Uribe, Tatiana Farah e Ezequiel Fagundes
BRASÍLIA, SÃO PAULO e BELO HORIZONTE - Quase um ano depois de 25 réus serem condenados no processo do mensalão, o ex-ministro José Dirceu, apontado como o chefe do esquema que corrompeu deputados durante o governo Lula; o ex-presidente do PT José Genoino e outros sete condenados foram para cadeia ontem, dia em que se comemora a proclamação da República. Eles se apresentaram à Polícia Federal a partir do início da noite, logo após o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Joaquim Barbosa, expedir os primeiros 12 mandados de prisão no processo.
Dirceu e Genoino se apresentaram na superintendência da PF em São Paulo e, na entrada, fizeram gestos parecidos para agradecer a amigos e militantes petistas que gritavam seus nomes do lado de fora: ambos ergueram os punhos cerrados, em sinal de resistência, e Dirceu ainda bateu no peito, à altura do coração. Ao sair de casa, Genoino, com dificuldades de andai foi amparado pelos filhos até o veículo sem pronunciar uma palavra, usava uma manta, com um poema escrito, presa aos ombros, como se fosse uma capa de super-herói.
Na lista dos que já estão presos há ainda o operador do mensalão Marcos Valério; a dona do Banco Rural, Kátia Rabelo; Ramon Hollerbach e Cristiano Paz, ex-sócios de Marcos Valério; Simone Vasconcelos, ex-funcionária de Valério; o ex-deputado Romeu Queiroz (PTB-MG); e o ex-tesoureiro do PL (atual PR) Jacinto Lamas. Com exceção de Lamas, os demais se apresentaram na superintendência da PF em Belo Horizonte. Faltavam se entregar, ontem à noite, o ex-dirigente do Banco Rural José Roberto Salgado, o ex-diretor de Marketing do Banco do Brasil Henrique Pizzolato, e o ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares.
Dirceu se reúne com a família
Os mandados de prisão foram entregues à Polícia Federal por dois oficiais de Justiça do STF pouco antes das 17h. Os condenados, segundo a direção da PF, serão todos levados a Brasília para começar a cumprir suas penas. Só depois poderão ser transferidos para outras cidades, se for o caso. A PF vai utilizar um de seus aviões para transportar os presos que se entregaram em São Paulo e Minas Gerais. A previsão inicial é de que o transporte dos presos só ocorrerá amanhã.
Todos ficarão na carceragem da PF na capital federal até que a Vara de Execução Penal determine o local em que eles cumprirão as penas. Como não há cela individuais para todos, eles vão ter que dividir o espaço. Na carceragem da PF, as camas são de concreto e os advogados e familiares costumam levar colchonetes e objetos pessoais. José Dirceu chegou às 20h30m ao prédio da Polícia Federal em São Paulo. O petista havia passado o dia ao lado de familiares e amigos em suja casa em Vinhedo, interior paulista.
No fim da tarde, segundo familiares, ele fez uma pequena mala com roupas, livros e materiais de higiene. Deixou a casa num carro de vidros escuros, sem que a imprensa registrasse sua passagem pelo portão do condomínio. Na PF, onde entrou por um portão alternativo, conseguiu novamente escapar do assédio dos jornalistas. Ainda na área externa do prédio, no entanto, fez questão de posar para os fotógrafos com o braço em sinal de resistência. Assim como Genoino, ele também acenou aos militantes que gritavam palavras de apoio a ele.
Dirceu passou seu último dia em liberdade a acompanhado da atual mulher e de duas ex-mulheres, além dos quatro filhos. Uma das filhas, Joana Saragoça, publicou em uma rede social uma mensagem que mostrava o clima na casa. “Meu pai, José Dirceu, preso político. Hoje te dei o abraço mais difícil da minha vida e te falei o “estamos juntos” mais sincero. Nunca vou cansar de dizer que te amo” escreveu ela.
Emoção na casa de Genoino
Genoino não esperava que a ordem de prisão fosse assinada ontem. Segundo amigos e familiares, quem lhe informou da decisão foi o seu advogado Luiz Fernando Pacheco, que se encontrou com o petista em sua casa, na Zona Oeste da capital paulista, e o levou até a Superintendência da PF.
Ao lado de familiares e amigos, visivelmente emocionados, o deputado deixou a sua residência por volta das 18h. No caminho até o veículo, o único gesto que Genoino fez foi levantar o punho esquerdo, em um sinal de resistência, O gesto foi repetido durante o trajeto e na porta da PF, onde se apresentou às 18h20m. O petista foi aplaudido por cerca de 35 amigos e militantes, que gritavam: “Viva Genoino” e “Preso Político”. Dentro do prédio, Genoino retribuiu: — Viva o PT.
A esposa do deputado federal pôde entrar no prédio da Polícia Federal, mas seus filhos ficaram do lado de fora. — Ele está indignado, como todo preso político — afirmou o coordenador do setorial jurídico do PT em São Paulo, Marco Aurélio Carvalho. Marcos Valério, operador do mensalão, que cumprirá a pena mais alta entre os 25 condenados, apresentou-se à PF em Belo Horizonte às 20h48m, na companhia do advogado, após passar o dia em sua fazenda de Caetanópolis, a uma hora de carro da capital mineira.
Nove réus têm situação indefinida
Na quarta-feira, o STF decidiu que os réus poderiam começar a cumprir penas que não foram questionadas por embargos infringentes, o recurso que pode dar ao condenado um novo julgamento. Desde quinta-feira, duas assessoras de Joaquim Barbosa trabalhavam na elaboração de uma lista de quem poderia ser preso imediatamente. Na lista do presidente do STF, foram incluídos réus que entraram com embargos infringentes, mas não tinham direito a ele.
Isso porque, segundo o Regimento Interno do Tribunal, podem lançar mão do recurso condenados que obtiveram ao menos quatro votos favoráveis. Nem todos obedeceram à regra. Pouco antes de serem decretadas as prisões, foi publicado na página do STF na internet o trânsito em julgado de parte das penas aplicadas a nove réus do mensalão. Entre eles, estavam Dirceu, Genoino, Delúbio e Valério. Parte das condenações desses réus podem ser mudadas no julgamento dos embargos infringentes.
Outros sete condenados que não entraram com infringentes já tinham tido o trânsito em julgado decretado em todas as penas. Para esses, o processo já terminou. Portanto, 16 réus já podem ter pena executada. A situação dos outros nove ainda está indefinida. A partir da expedição dos mandados de prisão, a Polícia Federal começou a executá-los, sem a necessidade de o pedido passar previamente pela Vara de Execuções Penais de Brasília.
Não há restrição legal para o cumprimento das ordens em feriados e fins de semana. A vedação constitucional é apenas para prisões no domicílio dos acusados durante à noite. Após o cumprimento das prisões, começa a execução das penas, aí sim por meio da Vara de Execuções Penais, como já sinalizou Barbosa. As cartas de sentença serão expedidas à vara, que abrirá os processos de execução.
Barbosa não reconheceu parte dos recursos
Dos nove réus que tiveram o trânsito em julgado decretado parcialmente ontem, dois deles entraram com infringentes em toda as condenações: o ex-executivo do Banco Rural José Roberto Salgado e Ramon Hollerbach, ex-sócio de Valério. Portanto, segundo a decisão do plenário, eles não poderiam ser presos. Mas Barbosa, em decisão tomada sozinho, discordou e não reconheceu a possibilidade de infringentes em parte de suas condenações.
Os sete réus que tiveram todo o trânsito em julgado são: Pizzolato; Lamas; os ex-deputados Roberto Jefferson (PTB-RJ), Romeu Queiroz e José Borba; o ex-tesoureiro do PTB Emerson Palmieri; e o doleiro Enivaldo Quadrado. Até à noite, nem todos tinham tido a ordem de execução da pena expedida. Nove réus não tiveram oficialmente o trânsito em julgado decretado. São eles: os deputados João Paulo Cunha (PT-SP), Valdemar Costa Neto (PR-SP) e Pedro Henry (PP-MT), os ex-deputados Pedro Corrêa (PP-PE) e Bispo Rodrigues (PL-RJ); o ex-assessor parlamentar do PP João Cláudio Genu; o advogado Rogério Tolentino; o ex-dirigente do Rural Vinicius Samarane; e o doleiro Breno Fischberg. Não havia expectativa de prisão desses condenados.
O advogado de Genoino informou que o petista passaria a noite na carceragem do terceiro andar da Superintendência da PF. A defesa anunciou que, na segunda-feira, solicitará à Vara de Execuções Criminais de Brasília uma vaga para o cumprimento da pena em uma unidade próxima à capital paulista, onde reside o deputado. Pacheco afirmou ainda que se não houver vagas para cumprimento do regime semiaberto em São Paulo, a defesa irá solicitar que o deputado federal cumpra a pena em regime domiciliar.
Ele também estuda pedir o cumprimento de prisão domiciliar caso os médicos do petista atestem que seu estado de saúde inspira cuidados. O deputado federal sofreu em agosto uma isquemia cerebral e, desde então, está de licença da Câmara dos Deputados. O advogado José Luis de Oliveira Lima, que defende Dirceu, criticou a prisão do cliente em regime fechado, já que o petista foi levado para a PE — Cada dia que meu cliente fica em regime fechado, que não é o que diz a lei, nós vamos nos insurgir contra isso — disse ele, para quem a prisão nessa condição é ilegal. Lima garantiu que vai recorrer contra a prisão em regime fechado.
Os advogados de Dirceu pretendem ingressar com um pedido de autorização para que o ex-ministro mantenha seu blog pessoal enquanto estiver preso. Caso a Justiça não autorize, o espaço será mantido por colaboradores e servirá como espaço de defesa do petista. (Colaboraram: Ronaldo D’Ercole, Jailton de Carvalho e Vinicius Sassine).
Fonte: O Globo