Andrea Freitas, Martha Beck – O Globo
• Alta de energia e alimentos faz IPCA subir mais que esperado e piora projeções para o ano
Com a forte alta de energia e alimentos, a inflação voltou a ficar acima do previsto e subiu 0,74% em maio. Em 12 meses, já chega a 8,47%. “Está mais caro para morar, para comer e para se deslocar”, resumiu Eulina Nunes, do IBGE. Com o aumento dos preços, analistas preveem que os juros subirão ainda mais, aprofundando a crise econômica. - RIO E BRASÍLIA- Alimentos em alta e energia cara.
O aumento dos preços destas duas despesas básicas fez a inflação voltar a subir e fechar maio em 0,74%, de acordo com o Índice de Preços ao Consumidor Amplo ( IPCA), do IBGE. É a maior taxa para o mês desde 2008, quando ficou em 0,79%. Também ficou muito acima do 0,57% esperado por analistas. Em abril, o índice havia ficado em 0,71%. Neste ano, os preços já subiram 5,34% — o maior resultado para o período de janeiro a maio desde 2003 ( 6,80%). Em 12 meses, o IPCA já chega a 8,47%, taxa que só perde para os 9,30% registrados em dezembro de 2003.
A energia elétrica ficou 2,77% mais cara só no mês de maio e foi a maior contribuição individual para a inflação. No ano, a conta de luz já subiu 41,94% e, em 12 meses, 58,47%. Já o grupo alimentação e bebidas, que tem maior peso no índice, passou de alta de 0,97% em abril para 1,37% em maio. A salada do dia a dia foi uma das principais responsáveis: a cebola registrou a maior alta ( 35,59%); vêm em seguida o tomate, com 21,38%, e a cenoura, com 15,90%. Com o resultado de maio, a previsão para a inflação de 2015 foi revista para cima pelas consultorias. Além disso, a expectativa é que, no acumulado em 12 meses, o teto de 9% possa ser ultrapassado em julho e persistir até novembro.
— Os alimentos ficaram acima do índice geral de maio e aceleraram. Quase a metade do IPCA no mês foi por causa da alimentação: 46% foram por conta dos alimentos, que pesam quase 25% no orçamento das famílias. Este mês ( os preços administrados) também ficaram bem acima do IPCA geral, por causa da taxa de água e esgoto, energia elétrica e ônibus. Está mais caro para morar, para comer e para se deslocar — afirmou Eulina Nunes dos Santos, coordenadora dos Índices de Preços do IBGE.
Pressão dos administrados
Tanto no resultado do ano quanto no acumulado em 12 meses, os três principais impactos na inflação são da cesta de preços monitorados pelo governo. Além da energia, há a gasolina, que subiu 9,31% nos primeiros cinco meses de 2015, e os ônibus urbanos ( 12,25%). Em maio, os itens administrados pelo governo subiram 1,23%, bem acima da inflação geral. No ano, acumulam elevação de 10,66% e, em 12 meses, de 14,11%.
Estes preços, monitorados pelo governo, não devem deixar a casa dos dois dígitos até o fim do ano. Segundo Leonardo França Costa, da Rosemberg Associados, os administrados devem fechar 2015 com alta de 14,2%. O resultado de ontem fez a consultoria elevar sua previsão para o grupo ( era de alta de 13,6%) devido à expectativa de novo aumento da gasolina ainda este ano.
Fabio Romão, da LCA Consultores, tem uma expectativa ainda pior para os preços controlados: alta de 15% este ano.
— Não há como fugir dos dois dígitos este ano. O que mais pesa é a energia. Esperamos elevação de 52% no ano. Mas a gasolina deve fechar 2015 12% mais cara, e o diesel, 9%, impactando o frete.
Romão destaca que o IPCA de maio mostra que os efeitos indiretos da alta da energia e da gasolina foram sentidos no grupo alimentação, devido a aumentos como frete e tarifa de água e esgoto. Além disso, a crise hídrica afeta os preços dos itens assim como as expectativas dos produtores. Análise semelhante é feita pela coordenadora do IBGE.
— O tomate está com preço de iguaria. As altas mais fortes foram em itens de produção sensível, e a chuva tem prejudicado — disse Eulina, lembrando que as carnes também estão em alta, acumulando 18,45% em 12 meses.
Os preços do grupo habitação também subiram, passando de 0,93% para 1,22% no mês. Água e esgoto, com alta de 1,23%, também pressionaram, devido a reajustes extraordinários, como de o 4,05% aplicado no Rio pela Cedae.
Já as despesas pessoais subiram de 0,51% em abril para 0,74% em maio, devido principalmente ao reajuste da loteria — que também está entre os preços administrados. Os chamados jogos de azar aumentaram 12,76% em maio e impactarão o IPCA de junho, quando o restante da alta da loteria será aplicado pela Caixa.
O grupo serviços, por outra parte, teve taxa inferior às de abril deste ano ( 0,72%) e de maio de 2014 ( 0,30%), puxado pelo freio no preço das passagens aéreas (- 23,37%). No ano, os serviços acumulam alta de 3,49% e em 12 meses, de 8,22%.
— A inflação de serviços cedeu. Mas ainda está muito alta. Tudo deveria estar mais baixo. Mas a elasticidade de alguns itens é alta. Ou seja, demorase a ver uma queda nos preços. Além disso, os custos, como aluguel e energia estão muito altos e acabam sendo repassados para os serviços — explica Luiz Roberto Cunha, professor da PUC- Rio.
Em entrevista exclusiva ontem ao “Jornal Nacional”, da TV Globo, o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, afirmou que o objetivo do governo é “trazer a inflação para 4,5%”. Segundo o ministro, a inflação tem que ser acompanhada “o tempo inteiro”.
— A inflação alta cria incertezas, inibe investimentos, além de ser uma forma que, em geral, causa maior impacto na vida das pessoas com menor renda. Por isso, é tão importante estar trabalhando para continuar baixando a inflação — afirmou.
O ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, disse que o aumento da inflação em maio é reflexo do realinhamento de preços ocorrido no início de 2015. Segundo ele, o percentual é temporário.
— O Banco Central está fazendo todos os esforços para trazer a inflação para o centro da meta. A gente está vivendo ainda os efeitos do realinhamento de preços que ocorreu no início do ano. Esperamos que isso seja um aumento temporário da inflação — afirmou.
Na visão de Cunha, o pior ainda não passou. E se o IPCA de junho ficar em 0,65% e o de julho em 0,30%, a taxa em 12 meses baterá os 9,06% ainda no início do segundo semestre:
— Em julho, certamente a inflação superará os 9%.É o pico? Não sei. Em agosto a taxa pode ser ainda maior.
Com os dados divulgados ontem, a Rosemberg Associados elevou a projeção para o IPCA de 2015 de 7,9% para 8,2%. Já a LCA revisou de 8,60% para 8,80%.