DEU EM O GLOBO
Pré-candidata do PT à Presidência, a ex-ministra Dilma Rousseff participou da convenção do aliado PR e se reuniu a portas fechadas com o ex-governador Anthony Garotinho. "É um parceiro antigo", disse ela. "Somos amigos históricos", devolveu ele. Tom muito diferente Dilma usou para atacar a oposição, especialmente o PSDB do ex-governador José Serra, revelando a linha que adotará na campanha: tachar a oposição de "anti-Lula" e "falsos cordeiros". No estilo evangélico de Garotinho, usou urna fábula para chamar Serra, sem citá-lo diretamente, de "lobo em pele de cordeiro". Mais cedo, em entrevista, ela já tinha responsabilizado Serra pelo "apagão" no governo FH. O PSDB classificou o discurso de Dilma de descompensado e terrorista.
"Garotinho é um parceiro antigo", diz Dilma
Já os adversários da oposição ela chama de "lobos em pele de cordeiro"
Maria Lima, Gerson Camarotti e Marcelle Ribeiro
Em seu primeiro dia de voo solo como pré-candidata a presidente, a ex-ministra Dilma Rousseff participou de evento da cúpula do PR que a aproximou ainda mais do casal Garotinho, o que pode complicar sua relação com o governador do Rio, Sérgio Cabral (PMDB), candidato à reeleição. Em encontro reservado após a solenidade de posse do senador Alfredo Nascimento como presidente do PR, Dilma avisou que não participará da festa de lançamento da pré-candidatura de Garotinho ao governo do Rio, no próximo sábado. Mas, em discurso no qual endureceu o tom nos ataques ao PSDB e fez citações religiosas, ressaltou laços históricos com o agora primeiro-secretário do PR, levando o ex-governador a sair do encontro otimista quanto ao seu apoio.
No discurso, Dilma citou parceria bem-sucedida com os ex-governadores Anthony e Rosinha Garotinho. No final, posou para fotos com o aliado político.
- O Garotinho é um parceiro antigo, do tempo do PDT - disse Dilma, citando também a importância da parceria com Rosinha.
- Se eu estou apoiando a campanha dela, é natural que ela retribua. Somos amigos históricos - justificou Garotinho.
Logo após a solenidade, Dilma, acompanhada do presidente do PT, José Eduardo Dutra, se reuniu por cerca de meia hora com Garotinho. Na conversa, ela determinou que o ex-governador desarmasse o palanque que estava sendo montado com sua presença, sábado, no Rio, para o lançamento da pré-candidatura, porque sua agenda estaria lotada. Sobre o futuro próximo, no entanto, Garotinho saiu otimista:
- Na presença do Dutra fechamos que a ministra vai nos dois palanques. A Dilma está firme, disse que vai subir no meu palanque e pedir votos para mim. Estamos juntos, firmes. Está tudo certo. Se o Cabral vai gostar ou não, se vai ficar com ciúmes, não entro em questões emocionais - declarou Garotinho.
Mas o presidente nacional do PT, logo em seguida, disse que não é bem assim.
- Nos casos de palanques duplos, é um processo que ainda vamos discutir. É fato que queremos o apoio de Garotinho, mas quem vai no palanque de quem, se vai nos dois palanques, isso só será decidido em julho - rebateu Dutra.
Para evitar mais desgaste com Cabral, a cúpula do PT planeja novo evento para Dilma, acompanhada do presidente Lula, com sindicalistas no ABC paulista, no sábado.
- Nesse momento a agenda tem que ser para a Dilma. Não tem sentido ela ir para eventos de pré-candidatos nos estados - disse Dutra.
Eles são anti-Lula, discursa a petista
No discurso de estreia da pré-campanha, Dilma endureceu o tom contra o PSDB e revelou a linha que adotará daqui para a frente: tachar os adversários que prometem continuar as conquistas do governo como "anti-Lula" e "falsos cordeiros".
Usando uma citação religiosa, sem citar o candidato José Serra, chamou-o de "lobo em pele de cordeiro", por estar prometendo dar continuidade às coisas boas do governo Lula. Disse que só quem pode garantir essa continuidade é a aliança "virtuosa" que elegeu Lula e apoiará agora sua candidatura.
- Aqueles que venderam nosso patrimônio, que quebraram o Brasil e deixaram o povo sem um salário digno não têm condições de levar isso adiante. São lobos em pele de cordeiro, mas o povo brasileiro está esperto e sabe reconhecer os falsos cordeiros. Um dia falam que vão continuar. Outro dia eles mostram patinha de lobo ao cometer um ato falho e ameaçam acabar com o PAC, com a política econômica. Como eles podem continuar o governo Lula se passaram os últimos sete anos e meio criticando este governo? Antes de mais nada, eles são anti-Lula - disse Dilma.
Em tom irônico, disse que os adversários apostaram na catástrofe, disseram que o Brasil iria quebrar na crise global e que o governo Lula só conseguiu avanços por sorte.
- Sorte nós queremos sim. O que não queremos é nenhum pé frio e nenhum azarado dirigindo o Brasil - disse, solicitando que, daqui para frente, cada um dos aliados peçam aos amigos, a conhecidos para defender "milímetro a milímetro, dia após dia, minuto a minuto" a continuidade do projeto de Lula e do PT.
- Não podemos permitir que as forças do atraso voltem e tragam décadas de estagnação. (não queremos de volta) O chamado voo da galinha, que cresce um pouco (a economia) e para depois.
Pré-candidata culpa Serra por apagão
Mais cedo, em entrevista à rádio Jovem Pan, em São Paulo, Dilma disse que os responsáveis pelo apagão ocorrido no segundo mandato do tucano Fernando Henrique foram o governo e ocupantes dos ministérios de Minas e Energia e também do Planejamento, comandado, à época, por José Serra. Também sem citar o nome do pré-candidato tucano, Dilma disse que, na época, havia a mentalidade de que planejar era algo "ultrapassado, velho". Na opinião de Dilma, entre 2000 e 2002, o Brasil visivelmente ficou sem energia não porque não houvesse linhas de transmissão, mas porque faltava energia para distribuir.
- Como é que um racionamento acontece? Ele não acontece do dia para outro, acontece porque você não planeja. O horizonte de planejamento mínimo do setor elétrico no Brasil é entre dez e cinco anos. O planejamento falhou, houve falha intrínseca do planejamento. Os responsáveis estão nos ministérios que tinham ligação com a área, tanto no do Planejamento quanto no de Minas e Energia. Os responsáveis são vários. O governo inteiro é responsável, porque essa questão é seríssima - disse ela.
Em entrevista publicada ontem no "Estado de S.Paulo", Dilma também relacionou Serra com a suposta falta de planejamento no governo Fernando Henrique.
- O Serra que me desculpe, mas ele não foi só ministro da Saúde. Foi ministro do Planejamento. Planejou o quê, hein? Ali se gestou, sabe o quê? O apagão - disse Dilma, apesar de ela ter sido ministra das Minas e Energia no governo Lula, que sofreu um apagão.
Sobre a influência de Lula caso seja eleita, Dilma disse que pretende consultá-lo porque é um dos líderes "mais lúcidos do mundo".
- Tenho uma relação para além de política com o presidente, tenho um sentimento forte de amizade e respeito. Eu vou ter no presidente Lula uma pessoa que eu vou consultar, escutar. Acho o presidente Lula, politicamente, um dois líderes mais lúcidos, não só no Brasil como no mundo. Aliás, eu não serei a única a consultá-lo. Acredito que hoje vários presidentes o consultam - disse à rádio.
Dilma afirmou que ela e Lula compartilham do mesmo projeto.
- Acredito que sempre vou conversar com o presidente. Obviamente, o meu estilo pode ser diferente, no pessoal, mas aí é detalhe. No fundamental, nós comungamos do mesmo projeto - completou a ex-ministra.
Dilma Rousseff falou ainda sobre a escolha do seu vice na chapa à Presidência. Ela está certa de que o PMDB vai saber escolher bem e disse que o vice será o considerado "mais adequado":
- É natural que haja um processo de diálogo. Tenho certeza de que o PMDB vai saber indiciar os melhores nomes. Até agora, o nome cogitado tem sido o do deputado (Michel) Temer, que, sem sombra de dúvida, é respeitado. É o presidente da Câmara, é uma pessoa que tem todas as qualificações para pleitear o posto.
Na opinião da ex-ministra, o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, que cogitou deixar o cargo para disputar as eleições, seria um bom candidato. Especulava-se que ele poderia disputar o Senado por Goiás ou ser vice-presidente na chapa do PT.
- Henrique Meireles seria, sem sombra de dúvidas, um bom candidato a qualquer posto que pleiteasse - afirmou a ex-ministra.