segunda-feira, 28 de março de 2016

Opinião do dia - Claudio Lamachia

Essa afirmação do governo, com tanta frequência, de que há um golpe em curso me parece ofensiva ao próprio Supremo Tribunal Federal. Se dizem que é golpe, então o Supremo, há poucos dias, regulamentou o golpe. Ou seja, tanto não é golpe que a instância máxima da Justiça, numa sessão histórica, regulamentou o procedimento de impeachment. Isso acaba com a ladainha de golpe.

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Claudio Lamachia, presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), O Estado de S. Paulo, 27/03/2016

Governo já redistribui cargos do PMDB

• Na véspera da decisão, Planalto negocia com deputados no ‘ varejo’

Grupo do vice Michel Temer tentará aprovar o desembarque na reunião de amanhã

Convencido de que o PMDB decidirá amanhã pelo rompimento com o governo Dilma, o Planalto começou a mapear cargos ocupados por apadrinhados peemedebistas para redistribuí-los e tentar atrair apoio contra o impeachment. “Vai ser varejo total, é balcão de feira”, contou um integrante do governo. As conversas já começaram, e o objetivo também é conter o efeito dominó em partidos da base como PP, PR e PSD.

Espólio em liquidação

• Governo mapeia cargos do PMDB para distribuí- los a aliados que votem para salvar Dilma

Júnia Gama, Eduardo Bresciani e Renato Onofre – O Globo

- BRASÍLIA E SÃO PAULO- Após dar como perdida a batalha para manter o PMDB na base aliada, o governo decidiu fazer um mapeamento dos cargos hoje ocupados por apadrinhados peemedebistas — o objetivo é redistribuir esse espólio a outros partidos que possam dar votos para salvar a presidente Dilma Rousseff do processo de impeachment no Congresso.

Até dias atrás, a estratégia do governo era tentar enfraquecer o vice- presidente Michel Temer para evitar que obtivesse uma vitória unânime na reunião do Diretório Nacional, amanhã, em prol do rompimento. Mas, com a avaliação de que a batalha está perdida junto ao PMDB, a ordem no Palácio do Planalto passou a ser identificar os cargos ocupados por peemedebistas e começar as exonerações, abrindo espaço para aqueles mais suscetíveis a uma composição com o governo em troca de benefícios na máquina pública. Foi o que já aconteceu com o aliado de Temer Henrique Pires, exonerado da presidência da Funasa na última quintafeira. O mesmo deverá ocorrer com os cargos da autarquia nos estados, muitos dos quais também controlados por indicados do PMDB.

Nesse raciocínio, cresceu no Planalto a pressão para que o ex- presidente Luiz Inácio Lula da Silva assuma um cargo de assessoria no governo para executar essa articulação. Uma fonte ligada ao governo dá o tom da estratégia para sobreviver ao impeachment:

— Vai ser varejo total, é balcão de feira. O governo vai facilitar a liberação de recursos e atuar com promessa de cargos na estrutura federal para tentar barrar o impeachment na comissão. E sabemos que quem tem voto são deputados e senadores. O foco do governo agora é ir em cima de quem tem voto. Seria gastar energia à toa trabalhar para desmobilizar o PMDB, porque a onda orgânica no partido está muito forte — diz um auxiliar governista.

O líder do PMDB na Câmara, Leonardo Picciani ( RJ), que ainda defende a permanência no governo, vê como natural a decisão do Planalto de redistribuir os cargos caso o partido de fato deixe a base. Mas acredita que, internamente, deve haver tolerância com os ministros que ainda não se decidiram e que optarem por apoiar individualmente Dilma e não deixar os cargos.

— Se o partido decidir pela saída, o governo deve promover a saída dos peemedebistas que têm cargos. Mas o PMDB tem que respeitar as circunstâncias individuais dos filiados — defende.

Com o diálogo com as lideranças cada vez mais restrito no Congresso e sem poder contar com a força de ministros sobre as bancadas, a aposta do governo será cada vez mais na negociação direta com cada deputado. Os governistas já sinalizam a aliados que quem ficar terá mais espaço no governo.

— Quem quer a cassação não vai permanecer no governo. Não tem essa de um pé em cada canoa. Saindo, vamos reestruturar o governo com aqueles que são contra esse golpe — afirma o deputado Paulo Teixeira (PT- SP).

No Congresso, os governistas já trabalham com espaços que serão deixados pelos peemedebistas para dar fôlego à presidente. O objetivo é tentar conter o efeito dominó em partidos da base como PP, PR e PSD. Apesar de o governo dar como certa a saída do PMDB da base, entre os deputados petistas a sensação é que nem todos seguirão a Executiva Nacional.

— Não vejo uma saída em massa, uma debandada, como anunciada por aqueles que defendem o golpe. Acho que teremos alguns nomes que sairão do governo, mas ainda teremos o apoio de parte do PMDB — avalia Teixeira.

Um deputado petista que faz parte da comissão do impeachment, mas prefere não se expor, afirma que o governo já iniciou o trabalho no varejo junto a pequenos partidos para tentar garantir o apoio necessário para manter Dilma. Ele diz que a ideia é usar cargos de quem está desembarcando para tentar garantir outros aliados:

— Tem que tirar o cargo dos infiéis e repassar diretamente para a nova base. Isso já está em curso.

Um líder da base, no entanto, afirma que a tendência é de os grandes partidos seguirem a mesma direção do PMDB e passarem a apoiar o impeachment. A avaliação é que o governo perdeu condições de reagir. Para tentar refluir o movimento, restaria ao governo acelerar negociações pontuais para tentar manter ao menos núcleos governistas em cada legenda, evitando o desembarque completo.

— Tem que ser algo customizado, individualizado, para que você possa, para cada situação, atender a determinadas demandas. Mas o movimento está muito forte, e está difícil para todo deputado manter um apoio ao governo neste momento — diz o líder.

Ontem, Dilma voltou de Porto Alegre, onde passou o feriado, e recebeu à noite o ministro Jaques Wagner (chefia de gabinete) no Alvorada. O ministro é um dos principais articuladores da defesa do governo no Congresso.

Do outro lado da batalha, Temer passou o dia ontem em telefonemas com peemedebistas e manterá hoje agenda intensa de reuniões para buscar a união em torno do desembarque. Segundo seus mais próximos auxiliares, se conseguir o consenso, Temer deve participar da reunião na expectativa de aclamação pelo rompimento com o governo, o que o fortaleceria como liderança.

A bancada do PMDB na Câmara irá se reunir hoje para tentar um posicionamento conjunto, mas a tendência é que os defensores da permanência no governo sequer compareçam ao encontro do Diretório Nacional.

— Se a decisão for de fato sair do governo, tem que ser estabelecido um prazo para os ministros. Tem que ter responsabilidade, não se deixa ministério do dia para a noite. Tem que prevalecer o bom senso. Se decide sair, tem que dar 30 dias, quando já estará definido se tem ou não impeachment. O governo pode até querer substituir antes, pode trocar se quiser, mas o partido deve esperar esses 30 dias — afirma um peemedebista alinhado ao governo.

Até o momento, dos sete ministros do PMDB no governo, apenas Kátia Abreu ( Agricultura), que se filiou ao partido há menos de três anos, tem sinalizado que pode deixar a legenda. Kátia pode retornar ao PSD, legenda comandada por seu filho, o deputado Irajá Abreu, em seu estado, o Tocantins. Os demais ministros, avalia a cúpula do PMDB, devem optar por ficar no partido e sair do governo.

— O governo faz bem em redistribuir esses cargos. Se tenho uma sociedade com alguém e esse alguém diz que não quer mais, muito bem, que vá embora. O filho da Kátia vai ser candidato a governador pelo PSD, e ela pode aproveitar para voltar para lá. Ela sempre foi outsider no PMDB, foi colocada ali pela presidente — afirma um dirigente peemedebista.

Em outra frente, o governo também pretende trabalhar o discurso de que os atuais ministros não terão espaço em eventual governo Temer e que terão de enfrentar a militância petista nas ruas protestando contra o que consideram um golpe. Há expectativa de grande mobilização nesta quinta-feira, dia 31, organizada pelo PT para intimidar os apoiadores do impeachment.

— Michel Temer, para poder governar, vai ter que fazer ampla coalizão, e é muita gente para pouco cargo. E o PT faria do governo dele um inferno. O partido está mobilizando todos os esforços em uma marcha para intimidar Temer e meter pressão sobre a Câmara. Muitos deputados fraquejam na hora de defender o governo, apesar de terem cargos, por causa da pressão popular. O PT quer botar pressão popular do outro lado para equilibrar o jogo — resume um petista.

Lula lidera força-tarefa pela permanência de Dilma

• Parlamentares ligados ao ex- presidente se dividem em três frentes, jurídica, política e de orçamento, para evitar impedimento

Leticia Fernandes e Cristiane Jungblut - O Globo

- BRASÍLIA- Articulador informal do governo, o ex- presidente Lula conta com uma força-tarefa para evitar o impeachment de Dilma Rousseff e salvar o projeto do PT. Na Câmara e no Senado, parlamentares mais ligados ao ex- presidente se organizaram para agir em várias frentes. A atuação junto ao Palácio do Planalto é liderada pelos ministros Ricardo Berzoini (Secretaria de Governo), José Eduardo Cardozo ( AGU) e agora também por Eugênio Aragão, novo ministro da Justiça. Os oito deputados titulares da comissão do impeachment se reúnem semanalmente e também já se encontraram com Aragão.

O grupo de Lula é composto majoritariamente por parlamentares de São Paulo, berço político do PT, e do Rio Grande do Sul, onde os petistas ainda possuem considerável capital político. Os deputados mais ligados ao ex- presidente — entre eles Paulo Teixeira ( PT- SP), Paulo Pimenta (PT-RS) e Wadih Damous (PT-RJ), um dos escalados para defender o governo e que foi alçado a titular na Câmara por articulação do ex-presidente — dividiram a bancada em três frentes de atuação: a jurídica, na qual trabalham Damous, ex-presidente da OAB do Rio, Teixeira, e José Mentor ( PT- SP); a de orçamento, para destrinchar e tentar desmontar os pontos mais ligados à denúncia das “pedaladas fiscais”, sob a tutela de Pepe Vargas ( RS) e Henrique Fontana ( RS); e a frente política, que mede os votos dos parlamentares da base, na qual atuam Arlindo Chinaglia ( SP), Marco Maia ( RS), Paulo Pimenta ( RS) e Carlos Zarattini ( SP).

As questões de ordem apresentadas nas reuniões do órgão e discursos contra o impeachment ficam a cargo dos partidos mais fiéis da base, PCdoB e PDT, além de Silvio Costa (PTdoB- PE), vice- líder do governo na Câmara. Pimenta e Damous também costumam fazer discursos inflamados da tribuna, como na última segunda-feira, quando Damous chamou o QG da força- tarefa da Lava- Jato de “Guantánamo de Curitiba”. Ele também criticou a OAB, que se posicionou a favor do impeachment, e disse que em 1964 a entidade também “embarcou na canoa do golpe”.

— Diversos órgãos de imprensa estão denunciando mundo afora que há em curso neste país um golpe midiático, espetacularizado, com participação de determinados setores do sistema de Justiça brasileiro localizado na nossa Guantánamo chamada Curitiba. Isso não fica assim, não somos um “partideco” — bradou.

Em busca de estratégias
Desde o clima de guerra instalado com a oposição, o deputado Paulo Pimenta se reuniu com os deputados Paulo Teixeira (PT-SP) e Wadih Damous (PT- RJ) para traçar as estratégias na esfera jurídica. Teixeira e Damous foram os primeiros a entrar com ações no STF e estão contestando condutas na Operação Lava- Jato.

No Senado, os maiores aliados de Lula são o líder do PT na Casa, Paulo Rocha ( PA), e do governo no Senado, Humberto Costa ( PT- PE), o senador Linbergh Farias ( PT- RJ) e ainda a senadora Vanessa Grazziotin ( PCdoB- AM).

No encontro de quarta-feira à noite, em Brasília, Lula disse ao senadores aliados que lutará para continuar ministro, por entender que a presidente Dilma tem direito a indicar seus colaboradores.

Os petistas cobraram a presença do ex-presidente na cidade. Destacaram que ele precisava liderar diretamente a campanha contra o impeachment.

Ao lado de Paulo Rocha, outros petistas antigos têm se reunido no Senado para traçar estratégias. Semana passada, Paulo Rocha era esperado pelo deputado José Mentor ( PT- SP) e pelo exdeputado professor Luizinho.

— O Lula fica ligando e perguntando se a gente conhece deputados, prefeitos — contou um senador.

Lula costuma se reunir com os senadores e pedir mobilização contra o impeachment, orientando que procurem os integrantes da comissão na Câmara e tentem medir os votos. O ex-presidente também tem buscado estratégias entre os aliados. No dia em que a nomeação de Lula como ministro foi suspensa, a senadora Vanessa Grazziotin e outros integrantes do PCdoB demostraram seu apoio ao ex-presidente; os parlamentares do PCdoB conversam com Lula até por viva- voz. A deputada Jandira Feghali também tem tido papel importante no combate ao impeachment e na defesa do ex-presidente.

Nesta semana, em encontro em Brasília, Lula também pediu que já preparassem o terreno no Senado, mas parlamentares admitiram que, caso o processo de impeachment seja aprovado na Câmara, ele vai gerar um “efeito bola de neve” que não poderá ser contido.

— Ele está energizado contra o impeachment — contou um senador petista.

Aliados de Temer isolam governistas e buscam unidade em reunião do PMDB

• Vice-presidente buscará últimos focos de resistência ao desembarque do governo e tentará convencer mais diretórios para tentar decisão unânime na reunião de amanhã; para evitar constrangimento, ala pró-Dilma deve faltar ao encontro

Adriano Ceolin, Daniel Carvalho Erich Decat - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Animados com o apoio do PMDB do Rio e na expectativa da adesão de outros diretórios, os aliados do vice-presidente Michel Temer acreditam ser capazes não só de emplacar o rompimento do partido com o governo Dilma Rousseff como de construir unidade na reunião do diretório nacional, marcada para amanhã. A tendência é de que os peemedebistas aprovem a entrega de cargos à presidente, a começar pelos sete ministérios que a sigla comanda.

Temer chegou ontem à noite a Brasília para uma série de reuniões em que tentará eliminar os focos de resistência governista. Para o vice-presidente, alcançar a unanimidade na reunião do diretório é importante como um sinal de que o PMDB está unido em torno dele e de seu eventual governo – o Planalto aposta na divisão do partido para barrar o processo de impeachment na Câmara. Temer cogita, inclusive, presidir o encontro se sentir que pode transformá-lo num ato político a favor de sua chegada ao comando do País.

Para evitar o constrangimento de um derrota acachapante, integrantes de diretórios governistas devem faltar à reunião. É o caso dos cinco representantes do PMDB paraense. O diretório é dominado pelo senador Jader Barbalho (PA), cujo filho, Helder, é ministro da Secretaria de Portos. Na semana passada, Jader tentou, sem sucesso, convencer Temer a adiar a reunião do diretório para 12 de abril.

Governistas querem tentar ao menos adiar a entrega dos cargos para esta data.

Conversas. O primeiro nome da lista de conversas que Temer pretende ter hoje é o do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL). Quer convencê-lo a apoiar o rompimento imediato. No entanto, aliados do senador dizem acreditar que um acerto seria “muito difícil”. Até o fim da semana passada, Renan e demais setores da ala governista do PMDB preferiam ver “o governo cair de podre”.

Temer também deve reunir-se com o ministro Eduardo Braga (Minas e Energia), outro peemedebista que considera “precipitado” o rompimento imediato, como disse em entrevista ao Estado publicada no sábado.

Interlocutores do vice acreditam que os ministros que hoje resistem a abrir mão do cargo mudarão de postura. Parte do PMDB cogita propor a expulsão de quem se recusar a entregar o cargo. Um aliado de Temer observa que, sem representar um partido, os ministros deixariam de ser úteis ao governo, pois teriam pouco poder de atrair votos na Câmara contra o impeachment.

Para o senador Romero Jucá (PMDB-RO), o Planalto mostrou não querer “membro do PMDB no governo” quando demitiu o presidente Fundação Nacional de Saúde (Funasa), Antônio Henrique Pires, indicado por Temer. A exoneração, na quinta-feira, foi vista como retaliação pela tendência de rompimento do partido – o governo nega.

Discurso. A defesa da unidade em torno da decisão a ser tomada amanhã tem sido feita por diversos peemedebistas. “O ideal é que fosse por unanimidade. Vamos buscar isso até o último momento”, afirmou Jucá, que tem trânsito nas alas contra e a favor do rompimento.

Integrantes do núcleo duro de Temer apostam que a decisão de desembarque adotada pelo diretório do PMDB fluminense na quinta-feira contaminará outros Estados. Ao menos dez dos 12 votos da seção do Rio devem ser a favor do rompimento. O gesto ganha ainda mais força por Jorge Picciani, presidente do PMDB-RJ, ser pai do deputado Leonardo Picciani, líder da bancada na Câmara e até então principal defensor da aliança com Dilma. Leonardo não se manifestou.

Segundo maior diretório do partido, o PMDB-MG também pode oficializar apoio ao desembarque do governo. Presidente da seção mineira, o vice-governador Antonio Andrade já avisou a integrantes da ala governista não ter condições de garantir o apoio dos outros 10 integrantes mineiros do diretório nacional.

Há duas semanas, o governo nomeou o deputado Mauro Lopes (MG) ministro da Secretaria de Aviação Civil. “O ministério foi dado contemplando o Mauro. Não vai influenciar a nossa decisão”, disse Andrade . Os mineiros conversarão hoje, mas só devem oficializar a decisão amanhã. O vice-governador afirmou querer sair da reunião com uma decisão unânime. “Vamos discutir até ver se conseguimos chegar a um consenso e a minoria seguir a maioria.” / Colaborou Igor Gadelha

Governo encara próximos 15 dias como decisivos ao impeachment

• De volta a Brasília após feriado, Dilma Rousseff reúne seus principais ministros para discutir saída do PMDB

Isadora Peron – O Estado de S. Paulo

Integrantes do Palácio do Planalto avaliam que os próximos 15 dias serão decisivos para o governo da presidente Dilma Rousseff. A perspectiva é que a comissão que analisa o impeachment da petista termine seus trabalhos em meados de abril e que os acordos com os partidos da base aliada que serão fechados até lá definam se a presidente continua ou não no cargo.

O tema que mais preocupa o governo no momento é o desembarque do PMDB, que deve ser oficializado na próxima terça-feira. Assim que chegou a Brasília ontem à noite, depois de passar o feriado em Porto Alegre, Dilma convocou uma reunião no Palácio da Alvorada para discutir o assunto com os seus principais ministros.

Auxiliares da petista classificam a decisão do partido do vice-presidente Michel Temer como irreversível e chegam a falar que "só um milagre" faria os peemedebistas mudarem de ideia. Não descartam também que a saída do PMDB provoque uma debandada dos demais partidos da base aliada, como o PP e o PSD.

Diante desse quadro, a ordem é atuar no varejo para conquistar o maior número de deputados possível. A estratégia vai ser entregar cargos e prometer a liberação de recursos àqueles que votarem contra o impeachment. Hoje, o cálculo do Planalto é que o governo não tem os 171 votos necessários para barrar o processo na Câmara e que seria muito difícil paralisá-lo no Senado.

Sem interlocução com Temer, Dilma delegou ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva a tarefa de tentar se aproximar do vice. Na última semana, o petista não obteve sucesso na empreitada. Temer sequer atendeu aos telefonemas do ex-presidente. Uma nova tentativa deve ser feita nesta segunda-feira, mas há pouca esperança que isso altere o quadro já desenhado.

Até mesmo a nomeação de Lula para a Casa Civil já é vista, no Planalto como algo que, por ora, perdeu o sentido. Com o caso dependendo de uma decisão do Supremo Tribunal Federal - o que não deve acontecer nesta semana -, a saída vai ser o ex-presidente atuar como interlocutor informal do governo, como já vem fazendo. No centro do escândalo da Operação Lava Jato, porém, Lula já não mostra a mesma influência de outrora.

Páscoa. Dilma Rousseff voltou a Brasília no início da noite de domingo (27) após passar o feriado com a família na capital do Rio Grande do Sul. Além da Páscoa, a presidente celebrou o aniversário da filha, Paula Araújo, mãe de seus dois netos - Gabriel, de 5 anos, e Guilherme, que nasceu em janeiro.

Ela chegou a Porto Alegre na quinta-feira e, como de costume, manteve uma rotina discreta, saindo de casa somente para pedalar.

Câmara votará impeachment com fragmentação partidária recorde

• Casa dividida entre 25 partidos dificulta formação de maiorias e compromete governabilidade

Câmara votará impeachment com fragmentação recorde

Gustavo Patu – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - A Câmara dos Deputados votará o afastamento da presidente Dilma Rousseff em meio a um nível recorde de fragmentação partidária, o que dificultará a governabilidade do país seja qual for o desfecho do processo.

Hoje, nada menos de 25 partidos têm assento na Casa. Os três maiores -PMDB, PT e PP, pela ordem- reúnem juntos pouco mais de um terço dos deputados federais.

Entre as siglas que encabeçaram as últimas seis disputas presidenciais, o PT amarga a menor bancada desde que chegou ao Palácio do Planalto, enquanto o PSDB encolheu à metade nos tempos de oposição, em relação aos anos do governo do tucano Fernando Henrique Cardoso.

A estreante Rede abriga a ex-senadora pelo Acre Marina Silva (ex-PT, ex-PV e ex-PSB), líder nas pesquisas de intenção de voto à Presidência, e apenas cinco deputados. O folclórico Partido da Mulher Brasileira tem apenas um -do sexo masculino.

Com a ajuda de benesses da legislação, o Brasil se tornou um dos líderes mundiais em proliferação de partidos desde sua redemocratização -até 1979, a ditadura militar permitia apenas duas legendas. Os números atuais não têm precedentes no período.

Dito de outra maneira, há na Câmara empecilhos igualmente inéditos para a formação de maiorias e mesmo alianças ocasionais.

Na defesa de Dilma, o PT e seus aliados mais fiéis à esquerda, PDT e PC do B, somam apenas 91 votos, 80 abaixo do mínimo necessário para manter a presidente em sua cadeira.

O trio de siglas encolheu desde a legislatura passada, quando o fracasso das políticas econômicas desenvolvimentistas levou a um desgaste progressivo do governo.

No restante da base de sustentação ao Planalto, as afinidades ideológicas são mais ralas, e os compromissos, mais incertos -a começar pelo PMDB do vice Michel Temer e seus 69 deputados.

Pós-impeachment
Na hipótese cada vez mais palpável de um impeachment, a costura de uma nova coalizão de apoio a Temer tende a ser outra tarefa complexa, independentemente do abalo que os próximos movimentos da Operação Lava Jato venham a provocar no mundo político.

Há pela frente uma agenda de ajustes orçamentários indigestos, que podem incluir da elevação de impostos a uma reforma da Previdência com redução de direitos.

Os candidatos naturais a abraçar essa pauta são PSDB e DEM, principais sustentáculos das reformas liberais do governo FHC na década de 1990. Os dois partidos, no entanto, estão longe de ostentar o poderio de antes.

Em 1998, eles elegeram juntos 204 dos 513 deputados -só a aliança com o PMDB já garantia a maioria da Casa. O segundo governo tucano conseguiu elevar a alíquota da CPMF, a antiga contribuição sobre movimentação financeira, criar o fator previdenciário, que reduziu as aposentadorias, e aprovar a Lei de Responsabilidade Fiscal.

Hoje, tucanos e democratas somam apenas 76 nomes; somados os peemedebistas, que também minguaram nas últimas eleições, não se chega a 30% da Câmara.

Os demais votos terão de ser buscados -provavelmente à base de cargos e verbas– nas legendas de menor protagonismo político, que, atualmente, formam a maioria da Casa.

Com poucas exceções, são agremiações de vocação fisiológica e baixa consistência programática. Os principais exemplos são PP, PR e PSD, todos representados no ministério de Dilma.

Dilma usa cargos para atrair siglas da base

Valdo Cruz, Daniela Lima – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - Diante da certeza de um desembarque do PMDB, o governo Dilma vai oferecer a partidos como PP, PR e PSD cargos hoje em poder dos peemedebistas e a promessa de terem um papel de "protagonistas" caso a petista sobreviva ao impeachment.

Nas contas de assessores da presidente Dilma, quase 500 cargos podem entrar nas negociações se todos os peemedebistas decidirem seguir a decisão do diretório nacional do PMDB, na terça-feira (29), quando deve ser oficializado o rompimento.

Além destas três legendas, o governo vai fazer uma ofensiva de última hora sobre partidos menores e deputados individualmente, numa tática de operar no "varejão", para tentar garantir os 171 votos necessários para barrar o impeachment no plenário da Câmara dos Deputados.

A estratégia começou a ser traçada em reunião na noite deste domingo (28) entre a presidente Dilma e sua equipe no Palácio da Alvorada, que daria o aval para as articulações no "varejão" depois de retornar de Porto Alegre.

Hoje, além do rompimento do PMDB, o Palácio do Planalto considera difícil reverter uma derrota na Comissão Especial que analisa o pedido de impeachment, onde teria cerca de 25 dos 65 votos de seus integrantes.

A ordem é barrar a aprovação da abertura do processo de impeachment na votação em plenário da Câmara, prevista para o início da segunda quinzena de abril.

Hoje, o governo não teria os votos necessários. Os assegurados seriam atualmente no máximo cerca de 150.

Pressa
Na tática de oferecer cargos de peemedebistas no "varejão" da Câmara, o primeiro lance já foi dado. Entregar a presidência da Funasa (Fundação Nacional de Saúde), antes ocupada por um aliado do vice-presidente Michel Temer (PMDB-SP), para a sigla nanica do PTN, que daria dez votos a favor de Dilma.

A preocupação de assessores presidenciais é o tempo curto disponível para segurar e reconquistar aliados em siglas como PP, PR e PSD, que já avisaram à presidente sobre o risco de a maior parte de seus deputados votarem a favor da saída da petista do Palácio do Planalto.

Um interlocutor da presidente reconhece que o tempo joga contra o governo, mas disse que estes partidos, incluindo na conta também o PTB, nunca ocuparam papel de destaque na Esplanada dos Ministérios e agora teriam a promessa de se transformarem em protagonistas caso Dilma sobreviva.

O problema, reconhece outro assessor, é que o PMDB também está articulando na busca de conquistar o apoio destas legendas para um eventual governo Temer.

Votação simbólica
Do lado do PMDB, o fortalecimento da ala que prega o rompimento levou os partidários da manutenção da aliança com o governo, hoje reduzidos a algo entre 20% e 25% da legenda, a fazerem uma série de propostas.

Há, inclusive, quem pregue que não haja mais aferição exata sobre a saída do governo, mas uma espécie de votação simbólica pelo desembarque.

Segundo essa tese, o partido sinalizaria unido pelo desembarque, mas, em contrapartida, os sete ministros do PMDB teriam um prazo maior, até 12 de abril, para entregarem os cargos.

A tentativa de esticar a permanência desses nomes no governo não é bem vista pela ala mais rebelde do partido, que tem dito que isso levaria a uma desmoralização, mas a arbitragem final sobre as propostas caberá a Michel Temer, que terá uma série de conversas com aliados ao longo desta segunda-feira (28).

Temer tenta decisão unânime do PMDB pelo rompimento com Dilma

Por Raymundo Costa e Leandra Peres – Valor Econômico

BRASÍLIA - Distante há mais de uma semana, o vice-presidente Michel Temer voltou ontem à noite a Brasília, tendo como objetivo não mais a maioria, mas costurar a unanimidade do PMDB em favor do rompimento com o governo da presidente Dilma Rousseff. A ruptura amplia as chances do impeachment na Câmara dos Deputados e aumenta a pressão pela renúncia da presidente da República. A decisão do PMDB se tornou virtualmente inevitável na última quarta-feira, quando a seção do Rio de Janeiro, talvez a mais fiel ao governo, decidiu que chegou a hora do desembarque dos pemedebistas.

A reunião do Diretório Nacional do PMDB está marcada para amanhã, terça-feira. Ao todo, quase duas dezenas de moções foram apresentadas. A primeira a ser votada propõe o rompimento da aliança PT-PMDB e a entrega de todos os cargos ocupados pelo partido no governo, inclusive sete ministérios. É de autoria do ex-ministro e ex-deputado baiano Geddel Vieira Lima. Somente a 12ª moção trata da manutenção da aliança e foi proposta pelo ministro Celso Pansera (Ciência e Tecnologia), do Rio de Janeiro.

Se conseguir a unanimidade ou mesmo os mais de 80% esperados, a cúpula do PMDB deve tolerar uma ou outra dissidência. Qualquer resultados abaixo disso deixará de sobreaviso os favoráveis ao impeachment e a posse de Michel Temer. De acordo com uma fonte do PMDB consultada pelo Valor PRO, a exoneração do presidente da Fundação Nacional de Saúde (Funasa), Antônio Henrique Carvalho Pires, nesta quinta-feira, reforçou o desgaste do PMDB do Rio com o Executivo. Carvalho Pires, segundo a fonte, era uma indicação do partido.

Nas contas dos aliados do vice-presidente, apenas as seções do Amazonas e de Alagoas, esta comandada pelo presidente do Senado, Renan Calheiros, mantêm-se resistentes ao rompimento. A maior surpresa, no entanto, foi a reviravolta ocorrida no Rio de Janeiro, o principal sustentáculo da presidente Dilma no PMDB, no qual o governo mais investiu em suas tentativas para evitar o impeachment. O líder da bancada na Câmara, Leonardo Picciani (RJ), por exemplo, indicou dois ministros: Celso Pansera e Marcelo Castro (Saúde).

O que pesou para a mudança do diretório do PMDB do Rio foi o mesmo que leva outros partidos aliados a se associar ao projeto do impeachment, como o PRB, para citar apenas um exemplo: Dilma não é só uma presidente impopular. Ela também já não reúne condição de articular o apoio de um conjunto de forças políticas que lhe permitam governar. "O governo precisa recuperar a sua capacidade de tocar os programas sociais que trouxeram tantos benefícios à população brasileira", diz o ex-ministro Moreira Franco. "Só um milagre salva o governo".

O Palácio do Planalto ainda luta para reverter o quadro, mas teme que o rompimento do PMDB seja definitivo e promova uma reação em cadeia que atinja os outros partidos aliados, como o PP, que desde a semana passada insinua que está prestes a abandonar o barco. Mas todas as investidas palacianas, até agora, inclusive aquelas patrocinadas pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, deram errado. O PMDB tem sete ministros, quase todos do baixo clero e sem influência nas bancadas.

O tom de enfrentamento nos discursos da presidente Dilma elevou a reação do Planalto ao impeachment, nas não é unanimidade entre os ministros palacianos. Os auxiliares próximos da presidente que estão à frente da negociação com o PMDB tem defendido que a postura agressiva de Dilma, que inclusive encerrou uma de suas falas com o bordão "não haverá golpe", dificulta o entendimento e "derruba pontes".

Na visão desses integrantes do governo, partir para o enfrentamento com a Justiça e com os parlamentares que irão decidir, de uma forma ou de outra, o resultado do processo de afastamento da presidente cria mais arestas, especialmente no momento em que o governo se esforça para manter os partidos na sua base de apoio.

A avaliação é a de que o círculo petista mais próximo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o atual advogado-geral da União, José Eduardo Cardozo (PT-SP) tem atuado como os principais incentivadores dessa estratégia. "O problema é que um governo que quer negociar não pode parecer que está brigando com todo mundo o tempo todo", diz uma autoridade.

No Planalto, admite-se que a divulgação da lista de políticos encontrada em poder da Odebrecht, tem o poder de ampliar o foco das denúncias; mas o efeito final não deve ser positivo para o governo: num clima de maior tensão, a reação deve ser acelerar o processo de impeachment.

O clima entre os assessores de Dilma, no entanto, era de alívio pela decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal, Teori Zavascki, que impedirá, na prática, um pedido de prisão do ex-presidente Lula feito pelo juiz Sergio Moro, de Curitiba. "Agora pelo menos o Lula pode fazer com tranquilidade o que ele veio fazer", concluem. (Colaborou André Ramalho, do Rio)

Empresário diz que Dilma não tem mais como governar

Por Graziella Valenti – Valor Econômico

SÃO PAULO - "É como um vaso que quebrou em milhões de pedacinhos." Essa é avaliação que Josué Gomes da Silva, presidente da Springs Coteminas e filho do antigo vice-presidente José Alencar (1931-2011), faz do governo da presidente Dilma Rousseff. "A Dilma perdeu as condições de governar o Brasil." Para ele, por um conjunto de circunstâncias, o governo não será capaz de restabelecer "a autoridade, a confiança e o respeito indispensáveis para aprovar as medidas necessárias para tirar o país da paralisia. E, na opinião do empresário, a economia não chegou ao fundo do poço.

Gomes da Silva só entrou para a política após a morte do pai. Filiou-se ao PMDB em outubro de 2013 e foi candidato ao Senado por Minas Gerais. Teve 42% dos votos e perdeu para o ex-governador Antonio Anastasia (PSDB), que ficou com 53%. O empresário apoiou Dilma abertamente na reeleição, em 2014.

A despeito de julgar que sua incursão na política tenha sido bem sucedida, apesar da derrota, Gomes da Silva disse que seu lugar é no "empresariado, na indústria". Para ele, o atual modelo político oferece pouco espaço para renovações. Mas, se houver reformas importantes, aposta na atração de nomes interessantes para o quadro político. "É urgente reduzir o custo das campanhas", apontou.

Na opinião de Gomes da Silva, o melhor caminho para levar o Brasil até 2018 de forma organizada é o fim do governo Dilma e uma nova eleição. O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) analisa processo que pode cassar a chapa eleita no ano retrasado, o que pode levar a uma eleição presidencial direta, se a chapa for condenada este ano, ou indireta, em 2017. Na sua opinião, o judiciário e as demais instituições "saberão tomar as medidas corretas" e precisam sair desse processo fortalecidas.

Outro caminho seria uma renúncia coletiva, como sugerida pelo senador Ronaldo Caiado (DEM-GO). Na opinião de Gomes da Silva, Dilma não entrega a gestão por ver o processo como uma briga política "tremendamente" injusta.

Sem recobrar a confiança, aponta que dificilmente quadro econômico negativo se reverte - ao contrário, se aprofunda. "Não tem bala de prata." Aprovar a reforma da previdência, por exemplo, seria uma forma de dar um sinal de solvência fiscal para o futuro e que os mercados poderiam antecipar.

Quando Nelson Barbosa assumiu o Ministério da Fazenda, na opinião de Gomes da Silva, o discurso estava na direção correta. Mas, era preciso cortes rígidos.

O empresário argumenta que há consciência sobre o que é necessário, mesmo dentro da atual base política. Ele destacou o programa do PMDB, "Ponte para o Futuro", que teve como mentor o vice-presidente Michel Temer, como um conjunto de medidas para reverter a desconfiança dos agentes econômicos, mas de viabilidade política duvidosa.

"Há consenso quanto às medidas indispensáveis para reversão do quadro. O que o falta é um ambiente político que propicie a implementação destas medidas", enfatiza. Por isso, acredita que só uma solução rápida para o agravado quadro político tenha o "condão" de mudar os rumos da economia. "O momento é sério demais. Há muita indignação e uma descrença generalizada na classe política do país." O receio do empresário é que nem mesmo o impeachment aplacaria a população. Ele não vê o processo como golpe, mas vê risco de produzir apenas efeitos de curto prazo.

O empresário é cético em relação ao impeachment, por entender que as pedaladas fiscais não justificaria o fim da mandato. A gestão de Dilma pode ter exagerado nas ditas "pedaladas", mas não as inventou, argumenta. Sem contar que, para Gomes da Silva, a população não entende o tema. "Não é por isso que o povo está nas ruas."

Segundo ele, sem uma solução rápida para o quadro político, a dívida pública poderá alcançar 75%/80% do PIB. Nesse caso, diz ele, " estaremos transformando o quadro adverso conjuntural em um quadro estrutural complicadíssimo que exigirá muitos anos para consertar". Gomes da Silva prevê piora na inflação, o que teria efeito negativo sobre o ambiente social. "Temos de ter coragem de começar a falar para a população que esse ajuste não será fácil."

"Há empresas que terão mais capacidade de reação. Mas a média da economia vai piorar e disso não tenho dúvida." Ele não vê perspectiva de crescimento, pelo menos, nos próximos dois a três anos.

Gomes da Silva afirma que a Springs Coteminas tem conseguido passar bem pela crise, inclusive no mercado doméstico, onde a alta do dólar tirou competitividade de importados. Sem contar que para as exportações, a desvalorização do real traz margem de rentabilidade. "Vamos superar nossas metas com facilidade", disse. A companhia teve receita líquida de R$ 2, 27 bilhões no ano passado e espera crescer até 20% neste ano.

Atualmente, contou que perde o sono como empresário na hora de decidir como gerir o crédito ao varejo. "Esse setor costumeiramente trabalha com ciclos longos, de 90 dias, para recebimento. Tudo isso, nos deixa mais conservadores e isso é ruim. Estamos perdendo energia empreendedora no Brasil."

Do restante, defende soluções simples. O governo tem que se preocupar, na opinião dele, apenas com os grandes temas macroeconômicos e não interferir muito. "Estou me tornando um grande liberal. Pero no mucho, né?!", diverte-se um pouco. O limite do liberalismo, defendeu, é a garantia de condições isonômicas de competição do empresário nacional - seja para proteger o mercado interno ou para estimular exportação.

Gomes da Silva, que foi por alguns meses membro do conselho de administração da Petrobras, faz um "mea culpa" por ter defendido a política do conteúdo nacional. "Hoje eu estou convencido de que quase tudo que o governo põe a mão estraga. E isso não é só no Brasil, não."

Para Sanches, há razão para processo de impeachment

Por Cristian Klein – Valor Econômico

RIO - A grande diferença entre os pedidos de impeachment do ex-presidente Fernando Collor e da presidente Dilma Rousseff está no apoio político, diz o ex-ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Sydney Sanches, que presidiu no Senado, em 1992, o julgamento do impedimento de Collor.
Dilma conta com a sustentação de seu partido, o PT, de parcelas do PMDB e outros aliados, enquanto Collor estava muito isolado - pertencia à época ao minúsculo PRN. Para se obter os dois terços na Câmara e no Senado necessários ao impeachment "não vai ser tão fácil", prevê.

Por outro lado, Sanches, hoje com 82 anos, diz que haveria razões para imputar a Dilma crime de responsabilidade. No ano passado, foi convidado pela oposição para redigir parecer favorável ao impeachment e se recusou, por entender que não havia motivos. Agora, considera que as pedaladas fiscais podem ser improbidade administrativa, pois se repetiram no atual mandato. Ressalta, no entanto, que julgamento de impeachment é eminentemente político.

Ex-ministro diz que impeachment tem fundamento jurídico
Para o ex-ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Sydney Sanches - que presidiu o julgamento do impeachment de Fernando Collor, em 1992, no Senado - a grande diferença entre o caso do ex-presidente e o da atual, Dilma Rousseff, é o apoio político. Collor estava numa posição de muito isolamento e pertencia à época ao minúsculo PRN. Já Dilma conta com a sustentação de seu partido, o PT, de parcelas do PMDB, e de outros aliados. "Para se obter dois terços na Câmara e no Senado, não vai ser tão fácil assim", prevê.

Por outro lado, o ex-ministro diz que haveria razões para imputar à Dilma crime de responsabilidade. Aos 82 anos, Sanches ainda tem tempo de mudar de opinião. No ano passado, foi convidado pela oposição para redigir um parecer favorável ao impeachment, mas se recusou, por entender que não havia motivos.

Agora, considera que as pedaladas fiscais podem ser classificadas como improbidade administrativa, pois se repetiram no atual mandato. Ressalta, no entanto, que o julgamento do impeachment é eminentemente político e não jurídico.

Sanches comenta a atuação do juiz Sérgio Moro, a quem evita criticar pela condução das investigações da Lava-Jato que envolvem o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Diz que Moro teria sido mais prudente se não tivesse divulgado as conversas telefônicas grampeadas entre Lula e Dilma, e que, no lugar do juiz, teria remetido o caso diretamente para o STF, uma vez que a presidente tem foro privilegiado.

Sanches entende que o conteúdo das gravações, em que Dilma trata da nomeação de Lula para a Casa Civil, pode ser considerado uma obstrução à Justiça, pela tentativa de escapar da jurisdição de Sérgio Moro. Para o ex-ministro, porém, o juiz federal errou quando determinou que Lula prestasse depoimento, de modo forçado, pois o ex-presidente não havia se negado anteriormente a comparecer à Justiça. "Realmente, eu acho que não era caso de condução coercitiva", diz.

A seguir, leia os principais trechos da entrevista concedida ao Valor:

Valor: Qual é a grande diferença entre os processos de impeachment contra Dilma e Collor?

Sydney Sanches: É que o ex-presidente Collor estava completamente sem apoio na Câmara e no Senado. Tanto que os dois terços foram obtidos com alguma facilidade nas duas Casas. Nos últimos tempos, ele estava sem nenhum defensor de partido. Conseguiu três votos de senadores. A presidente ainda tem o partido [PT] a apoiando. E ainda tem parte do PMDB e também alguns partidos aliados. De maneira que, para se obter dois terços na Câmara e no Senado, não vai ser tão fácil assim. Basta um voto de diferença, dois terços menos um, para impedir tanto a autorização pela Câmara quanto a condenação pelo Senado.

Valor: O sr. acha que o pedido tem embasamento jurídico?

Sanches: Pelo que entendi, diz respeito às pedaladas fiscais. Para mim não deixa de ser uma improbidade administrativa. Agora, é preciso não esquecer que os julgamentos na Câmara e no Senado são políticos. Até a avaliação do crime de responsabilidade é uma avaliação política, e não jurídica.

Valor: O que o sr. achou do episódio do grampo e da divulgação das conversas entre Lula e Dilma pelo juiz Sérgio Moro?

Sanches: De certa forma, implicitamente, ele aprovou o prosseguimento da interceptação, embora antes tivesse determinado a interrupção. Quando ele viu uma matéria tão importante quanto aquela, ele achou que retirar dos autos não seria prudente. A dúvida que surgiu é se ele deveria ter parado nisso, se deveria ter divulgado ou não. Ele teria sido mais prudente se se limitasse a admitir a prova nos autos e remeter o processo para o Supremo, que decidiria se mantinha ou não a prova, se a consideraria válida ou não. Evitaria toda essa polêmica.

Valor: Mas ele agiu bem ou mal na divulgação das gravações?

Sanches: Ele poderia ter evitado. Afinal de contas surgiu a dúvida aí, porque se a investigação atingir também a presidenta - era um diálogo entre ela e o investigado - aí teria, com mais cautela, que remeter os autos ao plenário [do Supremo], sem divulgar. Apenas fazendo constar que, havendo menção ao nome da presidente, remetia os autos ao STF. Isso é o que eu faria se estivesse no caso. Mas não o critico não, porque deve estar com tanta coisa na cabeça. Para o país foi mais interessante que ele tenha mantido, e o Supremo vai dizer se a prova é válida ou não.

• "Pedalada fiscal não deixa de ser improbidade administrativa, mas é preciso não esquecer que julgamento é político"

Valor: Com essa atitude, ele não extrapolou a função de juiz, ao criar um fato político, com o objetivo de influenciar a opinião pública?

Sanches: Se der uma interpretação estritamente técnica, teria que anular a prova, porque foi colhida por autoridade incompetente - ou entender que a autoridade era competente e o fato de ter havido diálogo entre a presidente e ele [Lula] não afeta a validade da prova. Porque quem tem que dizer, se a prova é válida ou não, não é o juiz de Curitiba. É o STF, uma vez que surgiu o nome da presidente.

Valor: Não é uma regra remeter os casos para o Supremo quando envolvem pessoas com foro?

Sanches: Quando, em qualquer prova que se está colhendo, surge o nome do presidente da República, o juiz deve remeter o processo ao Supremo. O juiz não pode presidir mais. Sua competência cessa neste momento. Por isso digo que teria sido mais prudente se ele [Moro] não divulgasse, não autorizasse a publicação.

Valor: É uma questão de imprudência ou de equívoco?

Sanches: Por isso é que digo que eu teria feito assim: teria remetido [ao STF], sem divulgar.

Valor: Qual é a tendência do STF?

Sanches: Não faço ideia, cabeça de juiz você sabe como é. Eu consideraria válida a prova.

Valor: E como o sr. vê o conteúdo da gravação?

Sanches: Se essa prova tivesse sido produzida no STF, estaria comprometendo também a presidente da República, pois estava prometendo a ele [Lula] tomar providências para que não corresse o risco de ser preso.

Valor: Isso pode ser considerado obstrução à Justiça?

Sanches: Pode ser considerado também fraude processual, mas principalmente obstrução à Justiça, porque de certa forma está procurando alterar a competência do juízo, tirando do primeiro grau para o Supremo, pelo expediente de nomear alguém [como ministro].

Valor: Mas o STF não tem condição de analisar o caso, ainda mais de repercussão política nacional?

Sanches: É obstrução à Justiça, mas é mais fraude processual mesmo, na minha opinião. Acaba influindo no órgão judiciário.

Valor: Então Dilma pode ser alvo do mesmo tipo de punição que o senador Delcídio do Amaral, que foi preso por obstrução de Justiça?

Sanches: Mas é claro, se se caracterizar essa hipótese. Agora, no Delcídio ficou bem mais claro. Porque o propósito dele era fazer com que aquele acusado [Nestor Cerveró] saísse do país. Era mais grave, mais claro. Ao passo que no caso dela [Dilma], pode-se dizer "Ah não, ela quis dar chance de um ex-presidente fazer o que ela não estava conseguindo fazer. Ela pode ter agido com boa fé, e não com aquela malícia de alterar a competência". Sempre haveria uma tese a ser defendida.

Valor: Como decidir então?

Sanches: Por isso é que eu digo que vai da cabeça do juiz. Um pode achar que o propósito dela não foi o de alterar a competência, mas apenas uma tentativa da presidente de encontrar uma solução melhor para o país. Cada um vê de um jeito. Eu acho que foi uma manobra para alterar a competência. O juiz de Curitiba vem decretando prisões, uma em cima da outra, inclusive aquela condução coercitiva. Não sei se ele estava propenso a decretar a prisão de Lula, mas havia essa possibilidade.

• "Condução coercitiva de Lula foi precipitada. Sempre caberá a alegação de que houve ilegalidade"

Valor: O que o sr. achou da condução coercitiva, que gerou forte reação contrária?

Sanches: Realmente, eu acho que não era caso de condução coercitiva. Nas outras vezes em que ele [Lula] foi intimado, ele compareceu. Foi precipitada, poderia ter sido evitada. Sempre caberá a alegação de que nisso houve ilegalidade.

Valor: Há um exagero na atuação do juiz Sérgio Moro?

Sanches: Isso foi na condução coercitiva. Com relação a outras coisas eu não sei dizer, porque precisaria conhecer os autos.

Valor: No ano passado, o sr. foi convidado a fazer um parecer pelo impeachment. Por que recusou?

Sanches: É que eu ainda não estava convencido de que tinha ocorrido alguma hipótese de crime de responsabilidade.

Valor: O que mudou?

Sanches: Uma dúvida que surgiu é que a pedalada teria ocorrido no mandato anterior, mas parece que se repetiu no mandato atual. Agora, o impeachment é um processo político-partidário. O senador não é obrigado a fundamentar o voto. Na essência você vê que a motivação é política, não é jurídica.

Valor: Como fica então a noção de Justiça num país conflagrado como o Brasil está?

Sanches: Olha, a avaliação política é autorizada pela Constituição, porque diz que o órgão competente é o Senado - e a Câmara. Por isso é que exige dois terços. O Supremo só pode interferir para dizer se o acusado teve seus direitos garantidos, o devido processo legal, a ampla defesa, com produção de provas...

Valor: Mas o Supremo também não resolve questões jurídicas de forma política?

Sanches: Bom, isso é uma avaliação que se faz. Eu me limitava a soluções jurídicas. [Mas imaginar] que o juiz não tenha opinião política não é verdade. O juiz também vota. Então, ele tem preferência por esse ou aquele partido, por esse ou aquele candidato. Eu sempre votei e nunca tive militância partidária, e não tenho até hoje.

Valor: O sr. acha que o ministro Gilmar Mendes, próximo de políticos do PSDB, deveria se dizer impedido em casos envolvendo o PT?

Sanches: Bom, sobre isso eu não quero falar.

Valor: O Supremo deve julgar de forma mais política quando há risco de convulsão social, como se seguiu à condução coercitiva de Lula?

Sanches: Quem praticou foi o juiz de primeira instância. Isso quem pode resolver é o Conselho Nacional de Justiça, ou antes disso, o Conselho da Justiça Federal - não é o Supremo Tribunal Federal.

Valor: O sr. acha que, com a polarização do país, o Supremo deveria ter um papel de moderador, de não botar lenha na fogueira?

Sanches: Eu acho que ele está tendo. Tem tido muito cuidado. Veja bem que a decisão com relação à questão da Câmara, daquele problema de composição da comissão [do impeachment], decidiu segundo sua convicção jurídica. E isso, para o governo, foi melhor. Depende de quem está vendo as soluções. Para uns a solução foi política; para quem está vendo de outro ângulo, a posição foi jurídica. Eu me lembro que, sempre que passava processos nas minhas mãos, o que não queria solução jurídica queria solução política, e o que sabia que não tinha razão queria solução política e não jurídica. O que demonstra que a pessoa não quer perder nunca. E o juiz fica dividido: devo ser político, aqui, ou devo ser jurídico?

Valor: Qual deve ser o papel do Supremo durante a crise atual?

Sanches: O que a história mostra é que o Supremo sempre foi o poder moderador, que às vezes dá solução favorável ao Executivo, às vezes ao Legislativo, e às vezes estritamente com motivação jurídica, mas que no fundo acaba sendo uma posição, no sentido amplo do termo, e mais nobre, de um moderador - porque também não está lá para botar gasolina na fogueira. Mas isso está certo? É aquela velha história: quem tem razão quer que a solução seja jurídica, quem não tem quer que seja política. E aí fica o tribunal dividido. Como é que faz? Tenho que pensar no país ou tenho que pensar no caso concreto? O país tem que ser governado ou pode continuar desgovernado? É difícil dizer qual é a melhor solução, se a política ou a jurídica. O Supremo deve ser fiel à sua história: um moderador.

Crise provoca o fechamento de mais de 4 mil fábricas em São Paulo em um ano

• Encerramento de empresas do setor saltou 24%, elas não resistiram à queda da demanda e aos altos custos de impostos e energia, juros altos e ao corte brutal dos investimentos; País destruiu 1,1 milhão de empregos industriais em um trimestre

Cleide Silva – O Estado de S. Paulo

A crise que paralisa a economia brasileira deixa um rastro de empresas desativadas. Só no Estado de São Paulo, 4.451 indústrias de transformação fecharam as portas no ano passado, número 24% superior ao de 2014, quando 3.584 fabricantes deixaram de operar, segundo a Junta Comercial.

O quadro se estende por todo o País, formando um cemitério de fábricas de variados setores, muitas delas fechadas definitivamente, algumas em busca de alternativas para voltar a operar e outras à espera de compradores.

Muitos trabalhadores demitidos não receberam salários e rescisões. De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), entre novembro e janeiro, a indústria brasileira fechou 1,131 milhão de vagas, número recorde para um trimestre.

“As fábricas fechadas e os empregos perdidos viraram pó; não há como reverter esse quadro nos próximos anos”, diz Fabio Silveira, diretor de pesquisas econômicas da consultoria GO Associados.

Algumas das fabricantes foram líderes em seus segmentos, mas não resistiram à queda da demanda e aos altos custos de impostos, energia, juros elevados e à falta de investimentos que secaram, em parte, em razão da queda da confiança no País, somado a erros administrativos e estratégicos.

A desativação de indústrias segue em níveis alarmantes neste ano. Um exemplo é o da cidade de Guarulhos, na Grande São Paulo, onde, só na semana passada, ocorreram anúncios de encerramento de atividades produtivas das metalúrgicas Eaton, Maxion e Randon.

“O mercado de implementos rodoviários teve retração de 50% e não há perspectivas de mudança de cenário no curto prazo”, informa Daniel Ely, diretor de Recursos Humanos da Randon, que atualmente emprega 130 pessoas, mas já teve mais de mil, segundo o sindicato local.

Sem emprego e com recisão parcelada

• Polyenka não tinha recurso para pagar obrigações

Tradicional fabricante de produtos têxteis, a Polyenka, instalada em Americana (SP) há 45 anos, já foi uma das maiores empresas do ramo de filamentos de poliéster no País e chegou a empregar 2 mil pessoas no fim dos anos 90. Em janeiro, encerrou atividades e fez um acordo com os atuais 350 funcionários para parcelar o valor das rescisões.

A empresa estava em recuperação judicial desde 2006 e, segundo o advogado Geraldo Gouveia operava com “significativo prejuízo”, principalmente após a queda de 30% nas vendas registrada nos últimos meses.

“O principal insumo usado na produção (polímero químico) é importado e ficou mais caro com a alta do dólar, além do custo da energia e da mão de obra”, explica Gouveia.

Ele diz que a Polyenka pertencente a um grupo de empresários brasileiros e busca alternativas para retomar atividades, seja para atender apenas sob encomenda, terceirizar parte das atividades ou apenas importar e revender. “Tudo vai depender dos rumos do País.”

Em Jacareí (SP), a Rhodia fechou a fábrica de fios têxteis de poliamida em abril do ano passado e concentrou a produção desse item na filial de Santo André (SP). Os 130 funcionários demitidos, segundo a empresa, receberam bônus extras de acordo com o tempo de trabalho.

A multinacional francesa informa que o fechamento “é resultado do cenário econômico de forte queda do consumo de produtos industrializados, que acarretou redução das vendas de fios de poliamida”. Também alega que, ao longo dos últimos anos, houve acréscimo substancial dos custos de produção, agravados em 2015 pelo aumento do preço da energia.

Duas fábricas fechadas em 2015

• Finlandesa PK só manteve uma unidade no País

A queda das vendas de componentes elétricos (chicotes) para seus principais clientes – as fabricantes de caminhões, ônibus e tratores –, levou a PK Cables do Brasil a fechar, em dezembro, a fábrica de Curitiba (PR).

Em maio, o grupo de origem finlandesa que atua no Brasil há 17 anos já tinha encerrado as atividades da filial de Itajubá (MG). As duas unidades empregavam 1,1 mil trabalhadores (500 em Itajubá e 600 em Curitiba). Agora a companhia mantém apenas a fábrica de Campo Alegre (SC).

O Sindicato dos Metalúrgicos do Paraná informa que negociou a dispensa dos trabalhadores locais, que receberam participação nos resultados de R$ 12 mil cada um, além de três meses de vale mercado e plano médico. Nenhum representante da empresa foi localizado na semana passada para falar sobre o assunto.

Em junho, em entrevista ao Estado, o responsável pelo setor de Recursos Humanos da PK Cables, Celso Silva, havia confirmado o fechamento das duas unidades, mas, segundo ele, a fábrica de Curitiba seria mantida até março deste ano.

Na época, ele informou que as encomendas tinham caído 45% e não havia alternativa se não a concentração das atividades em um única unidade. “Passamos por dificuldades em 2008, mas a crise atual é muito mais forte”, disse ele.

No ano passado, a produção de caminhões caiu 47,1% em relação aos números de 2014, enquanto as de ônibus tiveram redução de 34,7%. O segmento de maquinas agrícolas apresentou recuo de 32,8%, segundo dados da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea).

Nos dois primeiros meses deste ano o cenário segue crítico, com redução acumulada de 40,7% na produção de caminhões, de 45,2% na de ônibus e de 52% na de máquinas agrícolas.

Antes do fim, ritmo de produção maior

• Na véspera de fechar, Eaton faz estoque de peças

Não houve anúncio oficial de encerramento de atividades. Segundo o Sindicato dos Metalúrgicos de Guarulhos, a direção da Eaton, fabricante de peças hidráulicas, só confirmou o fechamento da unidade após ser procurada pela entidade, no início do mês.

“Os trabalhadores perceberam um movimento fora da rotina na fábrica, pois estavam ampliando a produção num momento em que a própria empresa reclama da crise”, informa José Barros da Silva Neto, diretor do sindicato.
“Eles nos procuraram e fomos falar com o representante da empresa, que confirmou a transferência da produção para a unidade de Guaratinguetá, no interior de São Paulo”.

A fábrica está na cidade há 27 anos, mas pertence ao grupo americano Eaton desde 2001. Já teve entre 500 e 600 funcionários, mas atualmente emprega 140 pessoas, segundo Silva Neto. A empresa não comentou o assunto.

O grupo atua em diversos segmentos e também tem fábricas em Caxias do Sul (RS), Jundiaí, Mogi Mirim, São José dos Campos, Valinhos e Votorantim, todas no Estado de São Paulo.

A produção acelerada nas últimas semanas, na visão do sindicalista, é para garantir estoque de peças no período de transição. “A mudança é uma estratégia para reduzir custos, não é em razão da crise”, acredita Silva Neto.

Na semana passada, os trabalhadores decretaram greve pois reivindicam um pacote de benefícios na demissão, como seis salários extras.

De acordo com o sindicalista, a Eaton queria pagar apenas os direitos normais da rescisão, mas, após a greve, ofereceu R$ 3 mil extras para cada trabalhador, sendo que R$ 1,2 mil já estava acertado anteriormente como participação nos lucros. “Nesse momento de crise não podemos aceitar só isso”, afirma o diretor do sindicato.

Após venda, grupo fecha as portas

• Novo dono não enxergou viabilidade do negócio

Para tentar salvar a metalúrgica Corneta, fundada em São Paulo por seu avô há 80 anos, o empresário Christian Bennecke contratou, no fim do ano passado, uma consultoria de gestão para administrar a empresa, que emprega atualmente cerca de 280 funcionários, e colocar as contas em ordem.

O trabalho culminou com a venda da fabricante de ferramentas e autopeças de Osasco (SP) em agosto, ao grupo de investidores BL Investimentos.

“Inicialmente eles disseram que iriam investir na empresa, mas fizeram o contrário”, afirma Jorge Nazareno, presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de Osasco. Segundo ele, os funcionários entraram em férias coletivas no início de dezembro e, ao retornarem em janeiro, foram informados de que a fábrica seria fechada.

A Corneta fornecia componentes para grandes fabricantes de motocicletas, como Honda e Yamaha. O setor de duas rodas registrou queda de 11% nas vendas no ano passado.

Os funcionários estão sem receber salários desde dezembro, assim como os valores da rescisão. Em reunião na Delegacia Regional do Trabalho (DRT) ficou acertado o pagamento dos valores em até 22 parcelas, que começaram a ser pagas neste mês. A BL não quis falar sobre o caso.

Em janeiro, outra metalúrgica, a Unimol, fabricante de molas de compressão e outros itens em São Paulo, fechou as portas e não pagou salários e rescisão de seus 35 funcionários.

Fundada em 1985, a empresa tinha grandes grupos entre seus clientes, como Alcoa, Dana, Siemens e TRW. O diretor do Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo, Francisco de Assis do Nascimento, afirma que, ao serem dispensados, os trabalhadores foram orientados pela chefia a buscar seus direitos na Justiça.

A entidade move atualmente ação na Justiça do Trabalho. Nenhum representante da empresa foi localizado.

Golpe contra o Brasil – Aécio Neves

- Folha de S. Paulo

Enquanto o país naufraga em águas turvas, vítima da combinação letal de crise política e recessão profunda, o governismo discursa aos incautos e ataca os indignados.

Entrincheirados no bunker palaciano, avessos à realidade que lhes bate às portas, criam uma narrativa golpista, disparando um pesado arsenal de retórica belicosa que precisa ser combatida. Não importa quão delirante seja o discurso da vitimização, o essencial é disseminar o clima incendiário de caça a todos os que ousam levantar a bandeira do impeachment.

O discurso radical é a ponta do iceberg de uma estratégia orquestrada pelo governo para ganhar, no grito, o que ele vem perdendo de fato e de direito. No mesmo pacote de guerrilha pode-se ver o esforço de demonização e as manobras reiteradas de obstrução da Justiça, a pressão sobre a Polícia Federal, até o uso das embaixadas brasileiras no exterior para propagar mensagens de alerta contra o risco de um golpe político no país. Vale tudo para não perder o poder.

Mas a verdade é que o processo de impeachment avança no Congresso, em rito aprovado pelo Supremo Tribunal Federal, absolutamente dentro dos trâmites legais e constitucionais. A própria bancada do PT e os partidos aliados votaram pela constituição da comissão do impeachment.

Tratar a destituição do chefe de Estado prevista em lei como uma ação golpista é atentar contra a democracia e o Estado de Direito. Esse é o verdadeiro sentido dos ataques e do estímulo à intolerância que estão em andamento, contra os quais é preciso reagir com energia e coragem. O governo faria muito melhor se se ocupasse e olhasse de verdade para a realidade do país.

Alguns indicadores da economia, divulgados na véspera do feriado santo, revelam a dimensão da tragédia brasileira: a recessão fechou 277 indústrias, o desemprego já atinge um em cada cinco jovens e, para culminar, depois de mais de duas décadas, o Brasil volta a registrar, ao mesmo tempo, a queda na renda e o aumento da sua desigualdade. Cai por terra, assim, a melhora na equidade social brasileira, uma marca emblemática do marketing petista. Agora, estamos assistindo a um espetáculo patético de diversionismo patrocinado pelo PT.

Na ausência de argumentos e respostas consistentes que façam frente às acusações que lhe são imputadas, investe-se contra a oposição e os milhões de brasileiros que foram às ruas, para protestar legitimamente contra a corrupção e a má gestão. No lugar de ações responsáveis que recoloquem o Brasil na rota do crescimento, o discurso irado e intolerante. O país sangra, mas só há uma obsessão: manter o poder a qualquer custo.

Isso, sim, é um golpe contra o Brasil.
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- Aécio Neves é senador e presidente nacional do PSDB

A utopia parlamentarista - Almir Pazzianotto Pinto*

• Substituir estruturas políticas sedimentadas não é o mesmo que redigir teses cerebrinas

- O Estado de S. Paulo

Após 126 anos de República, o Brasil permanece inseguro acerca do melhor sistema de governo. A monarquia era parlamentarista. Em momentos de crise dom Pedro II atuava como Poder Moderador. Tínhamos o Executivo, o Legislativo e o Judiciário, mas, segundo a Constituição imperial de 1824, a “chave da organização política” era o imperador. Competia a Sua Majestade, como chefe supremo da Nação, “velar sobre a manutenção da independência, equilíbrio e harmonia dos Poderes”, o que fez de maneira admirável entre a maioridade (23/7/1840) e a República (15/11/1889).

Por determinação do marechal Deodoro da Fonseca coube a Rui, após a proclamação, lançar as bases do País republicano. Como escreveu Aliomar Baleeiro, “Rui Barbosa, ao cair da noite de 15 de novembro, sentou-se, de caneta em punho, diante de uma resma de papel almaço, institucionalizando os fatos da manhã. E assim, antes que voltasse ao solo toda a poeira da cavalgada de Deodoro, começou este a assinar o decreto orgânico que instituía o governo provisório da nova República.”

A Constituição de 1891 adotou o presidencialismo. Dizia o artigo 41: “Exerce o Poder Executivo o presidente da República dos Estados Unidos do Brasil, como chefe eletivo da Nação”. Idênticas diretrizes seguiram as que lhe sucederam em 1934 (artigo 51); 1937 (artigo 73); em 1946 (artigo 78); em 1967 (Emenda 1/69), cujo artigo 78 fixava: “O Poder Executivo é exercido pelo presidente da República, auxiliado pelos ministros de Estado”.

A única e funesta experiência parlamentarista se deu em setembro de 1961, quando o ardiloso João Goulart ludibriou os militares, levando-os a crer que aceitava o governo de Gabinete, como lhe exigiam para assumir a Presidência da República. Impedido de substituir o trêfego presidente Jânio Quadros, que havia renunciado (25/8/1961), Goulart convenceu as Forças Armadas de que aceitava ser rebaixado a chefe de Estado, para entregar ao presidente do Conselho de Ministros o exercício efetivo do governo. Uma espécie aclimatada de rainha da Inglaterra, sem a tradição e o glamour da realeza britânica. Como discípulo de Getúlio Vargas, Jango jamais aceitaria renunciar ao papel principal, para se tornar mero coadjuvante. Estava certo de que, uma vez empossado, manobraria os políticos e as massas até recuperar a cadeira presidencial.

Tancredo Neves foi o primeiro presidente do Conselho de Ministros, como representante do PSD. Tomou posse em 8/9/1961, mas não se sustentou um ano. Caiu em 26/6/1962. A ele se seguiu Auro de Moura Andrade, cuja indicação foi aprovada pelo Congresso em 3/7/1962. Antes, porém, de assumir o cargo foi obrigado a se despedir, coagido pela greve decretada pelo Fórum Sindical de Debates, dominado por pelegos petebistas e comunistas, que o abateram na decolagem. O segundo presidente do Conselho foi Francisco de Paula Brochado da Rocha, ex-secretário do Interior e da Justiça do Rio Grande do Sul. Por último, Hermes Lima, detentor de brilhante folha de serviços ao País, iniciada como constituinte em 1946, encerrada como ministro do Supremo Tribunal Federal, onde foi aposentado pelo AI-5.

Em 23/1/1963, em quatro linhas a Emenda Constitucional n.º 6 revogou, sem resistência alguma, o parlamentarismo de fachada fruto da Emenda n.º 4.

A Constituição de 1988 nasceu doentia. Com 28 anos de vida, exibe dezenas de remendos. Os constituintes permitiram a inexplicável inclusão, no Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, de artigo determinando a realização de plebiscito, em 7/9/1993, destinado a definir “a forma (República ou monarquia constitucional) e o sistema de governo (parlamentarismo ou presidencialismo) que devem vigorar no País” (artigo 2.º). O resultado era previsível: o povo optou pela República presidencialista.

A recente proposta do restabelecimento do sistema parlamentar é subproduto da terrível crise que abala o País. Partiu da utopia tucana que acredita no poder mágico das palavras. Tenta ajustar a realidade a seus devaneios. Como registrou o historiador Edward H. Carr, observa-se eterna disputa entre aqueles que tentam, a qualquer custo, adaptar a realidade às suas pretensões e outros que procuram desenvolvem ideias compatíveis com a realidade.

A Carta imperial de 1824 garantia a participação dos cidadãos nos governos provinciais por meio das Câmaras dos Distritos, e dos Conselhos, que com a denominação de Conselho Geral existiam em cada Província, exceto na do Rio de Janeiro, onde se encontrava a capital do império (artigo 71). Faziam as vezes das câmaras de vereadores e das Assembleias Legislativas. A emenda parlamentarista à Constituição de 1946 previa a adaptação das Constituições estaduais ao novo sistema, “no prazo que a lei determinar”, o que nunca foi feito.

A República traz a marca do presidencialismo. Irreparável erro consiste em subestimar o peso da tradição. A essência da nação está na continuidade, escreveu o filósofo argentino Germán José Bidart Campos. Substituir estruturas políticas sedimentadas pelo tempo, para acomodá-las às sofisticadas exigências do regime de Gabinete, não é o mesmo que redigir teses cerebrinas.

Em 1961 as Forças Armadas opunham-se à posse de João Goulart e obrigaram o Congresso a recuperar velha proposta de emenda parlamentarista do deputado Raul Pilla, para afastar ameaça de guerra civil. O cenário hoje é outro. A presidente Dilma Rousseff corre perigo de impeachment, mas o País permanece calmo e as instituições funcionam, à espera de solução política que, de algum modo, virá.

Duas vezes recusado pelo povo, o sistema parlamentar de governo deve ser esquecido. Uma experiência malograda basta.
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*Advogado, foi ministro do Trabalho e presidente do Tribunal Superior do Trabalho

Façam sua escolha, senhores! - Ricardo Noblat

- O Globo

Acabou! Não tem governo” Delfim Netto, ex- ministro da Fazenda

Se não conseguir abortar o desembarque do PMDB do governo marcado para amanhã, restará a Dilma oferecer os cargos que ficarão vagos a deputados e senadores dispostos a votar contra o impeachment. Um dos alvos preferenciais de Dilma é o PR do ex- deputado Valdemar Costa Neto, o mensaleiro em prisão domiciliar que jura controlar 40 votos. Dilma precisa de 172 votos na Câmara para ficar no cargo.

COSTA NETO É UM velho conhecido da presidente. Para garantir o apoio do PR, Dilma já demitiu um ministro de quem gostava e deu a Costa Neto o ministério que ele queria. Na época, Costa Neto despachava na Penitenciária da Papuda, em Brasília. Ele joga duro e cobra caro. Em 2002, por exemplo, cobrou ao PT R$ 6 milhões pelo apoio do seu então partido, o PL, à eleição de Lula. Levou.

O PMDB TEM SETE ministérios e, no mínimo, 600 cargos no governo. Dilma não poderá dispor de todos eles porque ainda imagina que contará com a ajuda de uma fatia do PMDB na votação do pedido de impeachment. O fisiologismo puro, descarado, assumido, é a sua última esperança para não ser derrubada. O impeachment entrou no modo arrastão e parece difícil barrá-lo.

NINGUÉM EM TORNO da presidente acredita que ela completará seu mandato. Ninguém. Nem Lula acredita. No começo, o governo tratou o impeachment como uma espécie de terceiro turno desejado pela oposição. Depois, como uma chantagem do deputado Eduardo Cunha (PMDB- RJ). Ultimamente, como algo que interessa, sobretudo, ao juiz Sérgio Moro e à sua turma.

NÃO O RECONHECE COMO uma exigência de quase 70% dos brasileiros que desaprovam o desempenho de Dilma e a culpam pelo mar de lama escavado pela Lava- Jato. A tentativa do governo de desqualificar o impeachment, chamando- o de golpe, vem sendo repelida por ministros do Supremo Tribunal Federal. O impeachment ganhou o aval da Ordem dos Advogados do Brasil.

O MEDO COSTUMA SER indutor de soluções. Banqueiros e empresários estão com medo da crise e da falta de iniciativa do governo para superá-la. Partidos receiam ser varridos do mapa nas eleições de 2018. Os encrencados na Lava- Jato sentem- se desprotegidos e anseiam por um governo que os proteja. E os brasileiros simplesmente temem dias piores.

SALVO O IMPREVISÍVEL, há três cenários possíveis para a superação do impasse em que se encontra o país — e nenhum deles configura golpe contra a democracia. O primeiro: o impeachment de Dilma pelo Congresso. O segundo: a impugnação da chapa Dilma- Temer se o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) acatar ações que ali tramitam. O terceiro: a permanência de Dilma na presidência.

A APROVAÇÃO DO impeachment depende do voto favorável de 342 deputados de um total de 513, da aceitação pelo Senado do pedido de impeachment e, mais tarde, dos votos de metade mais um dos 81 senadores. Todo esse caminho ou só parte dele deverá ser percorrido até maio. A impugnação da chapa pelo TSE ficará provavelmente para 2017. Se acontecer, o Congresso elegerá um novo presidente.

DILMA PERDEU a chance de sair mediante a realização, este ano, de uma eleição presidencial. Foi aconselhada por amigos a propor isso ao Congresso. Descartou por arrogância e erro de cálculo. Uma eventual renúncia só serviria para apressar a posse de Temer. Ao completar 50 anos, o PMDB está perto de governar de fato. Dará certo? Bem, o que está aí deu errado.